Carta IEDI
Exportações de manufaturados: Brasil em rota declinante
A indústria brasileira continua perdendo terreno no comércio mundial, em muito devido aos obstáculos que o país criou para a competitividade do setor, a exemplo da complexo e oneroso sistema tributário, cuja reforma deveria ser uma das principais prioridades do pós-pandemia. O baixo dinamismo dos fluxos globais de comércio, ao acirrar a concorrência, explicita nossos gaps de competitividade.
Segundo os dados mais recentes da OMC, o Brasil regrediu da 32ª posição no ranking mundial dos maiores exportadores de manufaturas para a 34ª colocação entre 2018 e 2019. O valor de US$ 70,6 bilhões no ano passado implicou uma queda de nada menos do que -14% ante 2018 e representou somente 0,55% do total mundial.
A contar pelos dados do Ministério da Economia, este movimento pode ter tido continuidade em 2020 com a crise da Covid-19. A participação das exportações da indústria de transformação no total exportado pelo Brasil vem passando por uma nova fase de declínio e nunca atingiu um patamar tão baixo desde os anos 1990. De 67% em dez/16 passou para 55% em dez/20.
Nas primeiras colocações do ranking da OMC de maiores exportadores de bens manufaturados em 2019, estavam a China, como líder, respondendo por 18,2% do total mundial, Alemanha, com 10,2%, e EUA, com 8,1%. Não por acaso, são países que lideram a nova revolução industrial, adotando estratégias de modernização e inovação em torno das chamadas tecnologias 4.0.
A lista segue com muitos países também muito engajados neste processo de fortalecimento industrial, a exemplo do Japão (4,8% do total de manufaturas exportadas no mundo), Hong Kong (3,9%), Coreia do Sul (3,7%), França (3,6%) e Itália (3,4%), entre outros.
Ou seja, embora o Brasil tenha acumulado muitas competências industriais ao longo de sua história, sua posição no comércio internacional de manufaturas é marginal, vem se reduzindo sistematicamente nos últimos anos, e pode encolher ainda mais se não corrigirmos nossos problemas de competitividade e não tratarmos a indústria 4.0 com a mesma importância que nossos concorrentes estão fazendo.
Em contraste, no ranking das importações mundiais de manufaturas, o Brasil ocupa uma posição superior, ficando na 28ª colocação do ranking global em 2019, e responde por uma participação maior no total dos fluxos mundiais, de 0,93%, se comparado com nossa fração das exportações. Neste caso, não perdemos posições em relação a 2018. Tal inserção global, mais pelo lado das importações do que das exportações, pode se agravar se os desafios atuais não forem devidamente enfrentados.
Os postos de liderança do ranking da OMC de maiores importadores de manufaturas do mundo são ocupados pelos EUA, em 1º lugar com 14,5%, China em 2º com 9% e Alemanha em 3º lugar com 6,8% do total. Em seguida, estão Hong Kong, França e Reino Unido. A Holanda passou da 8ª para a 7ª posição e o México caiu da 9ª para a 10ª entre 2018 e 2019.
Na última década, não foi apenas no comércio de manufaturados que o Brasil perdeu posições no ranking mundial. Consideradas as transações totais com mercadorias, saímos da 22ª colocação para a 27ª entre 2010 e 2019. Nossa participação no período saiu de 1,32% para 1,19% do total. Involução ainda mais acentuada marcou as importações, em que nossa participação declinou de 1,23% para 0,91%. Saímos da 20ª posição para a 28ª neste mesmo período.
Este é um sinal de que assumimos um caminho de isolamento, seja porque ficamos de fora de importantes acordos comerciais nos últimos anos, seja porque, sobretudo do lado das exportações, nos especializamos em produtos de menor dinamismo e mais sujeitos aos ciclos de preço de commodities.
No relatório anual da OMC (World Trade Statistical Review 2020), o Brasil é destacado como um dos maiores exportadores de alimentos e de produtos agrícolas. Em alimentos, as exportações foram da ordem de US$ 76 bilhões em 2019 (-5% ante 2018), mantendo a 3ª posição no ranking mundial depois de União Europeia e EUA.
Em produtos agrícolas, as exportações brasileiras foram de US$ 89 bilhões, o que também lhe conferiu o 3º lugar no ranking dos exportadores mundiais desses bens, atrás igualmente da União Europeia e EUA. Outro setor em que também ocupamos um lugar de destaque é ferro e aço, em que aparecemos como o 8º maior exportador do mundo.
Cenário do comércio internacional de mercadorias
O mais recente anuário da Organização Mundial do Comércio (OMC, World Trade Statistical Review 2020), mostra que em 2019 as exportações mundiais de mercadorias foram de US$ 19 trilhões, implicando uma variação em relação ao ano anterior de -0,1% em volume e de -3,0% em termos de valor nominal (US$ dólares). Vale lembrar que em 2018, o comércio internacional de bens tinha expandido 2,9% em volume e 10,2% em valor.
A queda em 2019 foi mais expressiva em valor devido aos declínios nos preços de exportação e importação de alguns setores, especialmente de commodities energéticas (combustíveis), de -19%, matérias primas agrícolas (-5%) e alimentos (-3%).
O comércio de serviços, por sua vez, também passou por deterioração. O crescimento de 2,1% em 2019, significou importante perda de dinamismo em comparação com a alta de 8,4% registrada em 2018.
Ou seja, o comércio mundial tanto de bens como de serviços ficou abaixo do ritmo de crescimento do PIB mundial, que foi de +2,9% em 2018 e de +2,3% em 2019. Na verdade, funcionou como um elemento de contenção do nível de atividade mundial. Este comportamento tem se repetido após a crise financeira global de 2008/2009.
Ademais, a variação do comércio em 2019 ficou muito aquém da média histórica da última década, enquanto o ritmo de crescimento do PIB tem se mostrado estável. Entre as causas para este menor dinamismo, a OMC destaca a guerra tarifária entre EUA e China, o Brexit e as mudanças nas políticas monetárias de países avançados. Para 2020, espera-se retumbante retração da produção e do comércio mundial devido à crise da COVID-19.
Várias regiões apontaram retração nas exportações de mercadorias em 2019. Este foi o caso, principalmente, do Oriente Médio, com -6,6%, e da América do Sul e Central, com -2,2%, devido à retração do Brasil (-3,2%). Em sentido oposto, em 2019 houve expansão das exportações na América do Norte (1,0%) e Ásia (0,9%).
Já os volumes de importação aumentaram 0,5% na Europa, 5,5% na Comunidade dos Estados Independentes e 0,7% na África. Porém, as importações de bens em volume caíram 0,4% na América do Norte, 0,6% na Ásia e 2,1% nas Américas do Sul e Central.
Europa e Ásia, que representam quase dois terços do comércio de mercadorias, puxaram o declínio de 3,0% em valor dessa modalidade de comércio mundial em 2019. Tomando-se os tipos de mercadorias comercializadas, seu principal componente, os bens manufaturados, registraram queda de 2,0% nas exportações mundiais em 2019. Por sua vez, as exportações agrícolas mundiais diminuíram 1,5%, enquanto as de combustíveis e minérios retraíram 7,5%.
Em 2019, o ranking de maiores exportadores de mercadorias apresentou mais alterações do que o dos maiores importadores. As 30 economias que mais exportaram em 2019 somaram participação de 93% do valor total de bens exportados, ampliando este nível de concentração em cerca de 10% em relação a 2018.
A China continuou líder exportador, com parcela de 13,2% das exportações de bens, apesar de estas não terem crescido em 2019. Em seguida vieram, em ordem, os Estados Unidos, Alemanha, Holanda e o Japão, que passou da 4ª para a 5ª posição, trocando de lugar com a Holanda.
A França subiu mais uma posição do ranking, tornando-se a 6ª maior exportadora de bens, invertendo a posição com a Coreia do Sul. O México, por sua vez, subiu novamente uma posição, agora para 11ª, superando assim o Canadá e a Bélgica. Mesmo com retração de 7%, o Brasil continuou na 27ª posição, com 1,2% das exportações mundiais de bens.
No ranking dos maiores importadores de bens mundiais, não houve alterações nas colocações dos 20 líderes na passagem de 2018 para 2019. Os países do topo da lista foram: Estados Unidos, China, Alemanha, Japão e Reino Unido, que apontaram retrações similares em 2019.
Destaca-se, porém, a ascensão da Rússia e do Vietnã para a 20ª e a 21ª posições, respectivamente. Mesmo com retração de 2%, o Brasil também manteve sua posição nesse ranking, como 28º maior importador mundial, com parcela de 1% nas importações totais de bens do mundo.
No ranking de maiores exportadores de bens manufaturados em 2019, a China permaneceu líder, mas o valor em dólares das exportações caiu ligeiramente: -0,1% em relação a 2018. Novamente, a Alemanha apontou na frente dos EUA neste ranking, com Japão e Hong Kong na 4ª e 5ª posição, respectivamente. Destaca-se que a Coreia caiu de 5º para 7º maior exportador de manufaturados, enquanto Vietnã subiu da 20ª para 18ª posição, entre 2018 e 2019.
O Brasil continuou fora da lista dos 30 maiores exportadores de manufaturas do mundo e, ademais, perdeu duas posições, caindo do 32º para o 34º lugar, com retração de 14% nas exportações de manufaturas, isto é, mais intensa do que a média mundial.
No ranking dos maiores importadores mundiais de manufaturas, EUA mantiveram a liderança, mesmo com a queda de 1,1% em relação a 2018. Em seguida, vieram China, Alemanha, Japão e França – tal qual em 2017 e 2018. A Holanda passou da 8ª para a 7ª posição entre 2018 e 2019 e enquanto o México caiu da 9ª para a 10ª.
O Brasil permaneceu na 28ª posição, tal como em 2018, confirmando seu papel de maior absorvedor de produtos da indústria de transformação do que exportador, com déficit na balança comercial de manufaturas.
A inserção do Brasil no comércio internacional
Como mencionado anteriormente, as variações em valor das exportações e das importações de bens do Brasil em 2019 foram negativas: -7% e -2%, respectivamente. Assim, a parcela brasileira nas exportações mundiais de bens, em valor, recuou de 1,23% em 2018 para 1,19% em 2019, mas sem alterar sua posição, que é a de 27º no ranking mundial (incluindo comércio intra-União Europeia). O valor absoluto das exportações de bens foi de US$ 225 bilhões em 2019, e a média de crescimento anual entre 2010 e 2019 foi de apenas 1%.
Já as importações de bens do Brasil em 2019 foram de US$ 184 bilhões, o que significou uma parcela no total mundial de 0,96%, com ligeiro aumento em relação ao ano anterior (0,91%). Mantivemos a 28ª colocação no ranking mundial.
No ranking das exportações mundiais de manufaturas, o Brasil caiu novamente. Em 2017, estava na 31ª posição, em 2018 passou para a 32ª posição e em 2019 para a 34ª, com parcela de 0,55% em dólares nominais. O valor das exportações de manufaturas brasileiras em 2019 foi US$ 70,6 bilhões, com taxa de variação de -14% em relação a 2018 – expressivamente aquém do resultado mundial de -2%.
No ranking das importações mundiais de manufaturas, por sua vez, o Brasil ficou na 28ª posição em 2019, tal como em 2018, com participação de 0,93%, tendo sido 0,97% em 2018. O valor das importações foi de US$ 135 bilhões em 2019, com queda de 1% em relação ao ano anterior em dólares nominais, ou seja, mais branda que a queda da média mundial, que foi de -1,9%.
Comparando-se a evolução das exportações de bens e manufaturas do Brasil e do mundo, verifica-se que as variações são alinhadas em termos de sentido, mas de maior magnitude no primeiro caso – exibindo maior volatilidade.
Nas pautas de exportações e importações de bens brasileiras, continua havendo sinais de “reprimarização” de nossas exportações e contínua concentração em manufaturas no caso das importações.
Nas exportações, os produtos agrícolas, incluindo alimentos, mantiveram-se como o principal grupo de mercadorias exportadas, com 40% do total em 2019, seguido de manufaturas (31%) e combustíveis e minérios (27%). Vale ressaltar que as manufaturas perderam parcela na pauta de exportações brasileiras, tendo sido 34% em 2018. Nesse grupo, destacam-se os equipamentos de transporte, com 8% do total exportado de bens, mas que em 2016 detinham 12%.
Nas importações de bens do Brasil, ao contrário, as manufaturas representaram 73% do total em 2019, tendo sido 72% em 2018. Neste grupo, equipamentos de transporte perderam participação, passando de 15% em 2018 para 11% do total importado em 2019, enquanto produtos químicos passaram de 23% para 24%. Produtos agrícolas e combustíveis e minérios detiveram, respectivamente, parcelas de 6% e 16%.
No relatório da OMC, o Brasil é destacado entre os maiores exportadores de alimentos e de produtos agrícolas. Em alimentos, as exportações foram da ordem de US$ 76 bilhões em 2019, implicando queda de 5% em relação a 2018. Mesmo assim, manteve-se na 3ª posição no ranking mundial deste setor, depois de União Europeia e EUA.
Em produtos agrícolas, as exportações brasileiras foram de US$ 89 bilhões, o que também fez do Brasil o 3º maior exportador mundial desses bens, atrás de União Europeia e EUA. E ainda, o Brasil foi o 8º maior exportador de ferro e aço, alcançando o valor de US$ 12 bilhões em 2019, tendo sido US$ 13 bilhões em 2018.