Carta IEDI
A Indústria na primeira metade de 2021
A primeira metade de 2021 foi um período de baixo dinamismo para a indústria como um todo, cujo processo de recuperação herdado de 2020 claramente perdeu força em decorrência do novo surto de Covid-19, do atraso na vacinação, da interrupção dos programas emergenciais e da aceleração inflacionária. O setor chegou ao final deste período em estabilidade, já que obteve variação de 0% na passagem de maio para junho, já descontados os efeitos sazonais.
Os meses anteriores, contudo, tampouco foram favoráveis: as quedas prevaleceram e houve apenas um único mês de crescimento, em mai/21, de modo que o nível de produção em jun/21 ficou 3,2% abaixo daquele de dez/20. Com isso, o setor voltou exatamente ao nível pré-pandemia de fev/20.
Assim, se a indústria como um todo registra avanço acumulado de jan-jun/21 (+12,9%) frente ao mesmo período do ano passado é, em grande medida, devido a uma base de comparação extremamente deprimida e ao carregamento estatístico provocado pela reação do segundo semestre de 2020, quando houve melhora no quadro sanitário e medidas emergenciais mais robustas para lutar contra os efeitos econômicos da pandemia.
Os desempenhos mais insatisfatórios vêm de partes da indústria em que o consumo doméstico tem um papel importante: bens de consumo duráveis ficaram em jun/21 em patamar 16,2% inferior ao de dez/20 e 14,8% inferior ao de fev/20, isto é, do pré-pandemia, enquanto bens de consumo semi e não duráveis registraram nível 7,8% abaixo de dez/20 e 7,6% abaixo de fev/20.
O processo de retomada parece mais consistente em bens de capital, que apresentaram alta persistente nos três últimos meses, já descontados efeitos sazonais, levando seu patamar de produção a ficar 0,7% acima de dez/20 e 16% acima do pré-pandemia. Por isso, seu crescimento de +45,6% no acumulado de jan-jun/21 ante o mesmo período do ano anterior é expressivo por outros motivos além de uma base deprimida de comparação.
Bens de capital para a agricultura (+54,4% ante o 1º sem/20) e construção (+66,8%) cresceram no 2º sem/20 e reforçaram seus resultados agora no 1º sem/21 na comparação interanual, na esteira da expansão do agronegócio e do setor imobiliário. Bens de capital para transporte tem uma reação mais recente, porém forte (+68,6%). Além do mercado doméstico, as exportações também têm estimulado a produção de bens de capital.
Bens intermediários, por sua vez, a despeito das recorrentes notícias de gargalos no fornecimento de insumos industriais, vem apresentando baixo dinamismo. Seu nível de produção em jun/21 era 3% abaixo de dez/20 e apenas 1,5% acima do pré-pandemia. Na passagem de mai/21 para jun/21, o macrossetor registrou -0,6%, a terceira taxa negativa consecutiva na série com ajuste sazonal.
Deste modo, a recuperação industrial continua enfrentando obstáculos à normalização de suas cadeias produtivas. É o que também indica a avaliação dos empresários a respeito dos estoques, que desde abr/20 se encontram em níveis considerados insatisfatórios. A boa notícia, é que o quadro vem se tornando menos grave em comparação com o final de 2020, segundo os indicadores da CNI.
Na indústria de transformação, depois de praticamente todos os ramos industriais apresentaram estoques menores do que o planejado em dez/20 (96% do total), em jun/21 esta avaliação foi identificada em 19 dos 26 ramos acompanhados pela CNI, ou 73,1% do total. Isto é, ainda é um problema difundido, mas menos generalizado do que já foi. Estoques mais equilibrados reduzem a vulnerabilidade das cadeias produtivas a repiques inesperados de comandas, amenizando os gargalos existentes.
Para o segundo semestre do ano, as expectativas são positivas, como sugerem os indicadores de confiança dos empresários industriais no mês de julho, tanto da CNI como da FGV. Muito disso está associado à aceleração da vacinação no Brasil, mas também em outros países, possibilitando vislumbrar a superação das causas sanitárias da crise recente.
No caso brasileiro, porém, há riscos no horizonte, a exemplo da crise hídrica, da persistente elevação inflacionária e de seus efeitos sobre os níveis de juros do país, que, como sabemos, tende a afetar muito os mercados de produtos industriais, devido à importância de bens duráveis, seja de consumo, seja de investimento, cuja demanda exige condições favoráveis de financiamento.
Resultados da Indústria
Em junho de 2021, a produção industrial mostrou variação nula (0,0%) na comparação com o mês anterior, já descontados os efeitos sazonais. Esse resultado sucedeu o avanço de 1,4% em maio, quando interrompeu três meses consecutivos de queda, período em que acumulou perda de 4,7%. Com isso, o setor voltou a ficar no mesmo nível de produção de fev/20, embora permaneça 3,2% abaixo daquele de dez/20.
Os dados de jun/21 mostram que apesar do retorno do auxílio emergencial e reativação da economia mundial, a indústria brasileira ainda não conseguiu retomar uma trajetória consistente de crescimento.
Na comparação com o mesmo período do ano anterior a indústria continua a crescer, porém a um ritmo menor: a alta foi de +12,0%. Deste modo, o desempenho no acumulado do primeiro semestre do ano foi de +12,9%. A maior parte desse avanço está concentrado no segundo trimestre do ano: +22,6% frente ao mesmo trimestre do ano anterior, dada a menor base de comparação, visto que os efeitos da pandemia começaram a ser mais sentidos na economia brasileira a partir do 2ºtri/20. Em jan-mar/21 o resultado positivo foi menos intenso (+4,3%).
Já no acumulado dos últimos doze meses findos em jun/21, a indústria registrou +6,6%, sendo o terceiro resultado positivo consecutivo nesta base de comparação (+1,1% e +4,9% em abr/21 e mai/21, respectivamente).
Em relação macrossetores industriais, na comparação de jun/21 com mai/21, descontados os efeitos sazonais, houve acréscimo apenas em bens de capital (+1,4%), terceira expansão seguida nesse tipo de comparação. Bens intermediários recuaram -0,6%, isto é, ficando ainda muito próximo da estabilidade. O declínio de bens de consumo duráveis foi de -0,6%, sendo o sétimo mês consecutivo em que este macrossetor ficou no negativo. Ou seja, sem crescimento desde final do ano passado. Os bens de consumo semi e não duráveis, rpoe sua vez, recuaram -1,3%, eliminando parte do avanço de +3,6% registrado em maio de 2021, quando interrompeu três meses seguidos de queda na produção.
Na comparação de jun/21 com jun/20, houve variação positiva em todos os quatro macrossetores industriais. Enquanto o total da indústria cresceu +12,0% nesta comparação, bens de capital e bens de consumo duráveis apresentaram dinamismo muito superior: +54,8% e +31,0%, respectivamente, ajudados pelas bases de comparação ainda deprimidas. Bens intermediários registraram +10,8% e bens de consumo semi e não duráveis, apenas +1,6%.
O macrossetor de bens de capital foi quem melhor se saiu na comparação com jun/20, registrando alta de +54,8%, com expansão na maior parte dos grupamentos, com destaque para bens de capital para equipamentos de transporte (+90,3%). As demais taxas positivas foram registradas pelos grupamentos de bens de capital para fins industriais (+36,2%), para construção (+158,4%), de uso misto (+35,1%) e agrícolas (+29,9%). Por outro lado, o único impacto negativo foi assinalado pelo subsetor de bens de capital para energia elétrica (-8,4%).
O aumento interanual de +31,0% na produção de bens de consumo duráveis, a seu turno, derivou do crescimento associado maior fabricação de automóveis (+62,9%). Cabe destacar também os resultados positivos assinalados por eletrodomésticos da “linha branca” (+7,2%), motocicletas (+37,0%) e outros eletrodomésticos (+34,0%). Em contraste, os impactos negativos vieram de eletrodomésticos da “linha marrom” (-6,1%), influenciado, em grande medida, pela menor produção de televisores; e do grupamento de móveis (-7,8%).
Ainda no confronto com igual mês do ano anterior, o segmento de bens intermediários, que cresceu +10,8% em jun/21, teve seu resultado influenciado principalmente por avanços nos produtos associados às atividades de metalurgia (+47,7%), de veículos automotores, reboques e carrocerias (+68,6%), de produtos de minerais não-metálicos (+25,3%), de máquinas e equipamentos (+51,7%) e de outros produtos químicos (+13,1%), dentre outros. A única pressão negativa de peso foi registrada por produtos alimentícios (-12,6%), enquanto embalagens (-0,4%) ficaram no vermelho, mas próximo da estabilidade, o suficiente para interromper nove meses de crescimento.
Já bens de consumo semi e não duráveis, cujo resultado foi de +1,6% ante jun/20, com desempenho positivo influenciado pelo grupamento de semiduráveis (33,1%) e o de carburantes (+6,9%), influenciado pela maior produção de gasolina automotiva. Em sentido oposto, os subsetores de alimentos e bebidas elaborados para consumo doméstico (-3,4%) e de não duráveis (-5,5%) apontaram taxas negativas nessa categoria.
Por dentro da Indústria de Transformação
A variação nula (0,0%) da produção industrial geral em jun/21 ante mai/21, já realizado o ajuste sazonal, foi acompanhado de variação de -0,5% na indústria de transformação e de -0,7% no ramo extrativo. Dessa forma, a indústria de transformação ainda se encontra 5,8% abaixo do nível de produção de dez/20 e 0,2% abaixo do pré-pandemia, isto é, de fev/20.
Em relação a jun/20, tal como a indústria geral (+12,0%), o desempenho da indústria de transformação também foi positivo, porém menos intenso que nos dois meses anteriores: +13,1% ainda contando com bases de comparação baixas. No caso do ramo extrativo, houve variação de +4,1%.
Frente a mai/21, na série com ajuste sazonal, o resultado nulo 0,0% da indústria geral teve influência negativa de 14 dos 26 ramos pesquisados. Dentre os destaques negativos estão: veículos automotores, reboques e carrocerias (-3,8%), celulose, papel e produtos de papel (-5,3%), e produtos alimentícios (-1,3%). Por outro lado, entre as onze atividades que apontaram crescimento na produção destacam-se: coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+4,1%), máquinas e equipamentos (+2,9%), outros equipamentos de transporte (+11,0%), couro, artigos para viagem e calçados (+6,0%) e impressão e reprodução degravações (+12,3%).
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou alta de +12,0% na produção em jun/21, variações positivas marcaram o desempenho de 19 dos 26 ramos, 60 dos 79 grupos e 65,6% dos 805 produtos pesquisados. Junho de 2021 (21 dias) teve o mesmo número de dias úteis que o mesmo mês de 2020.
As maiores influências positivas nesta comparação interanual vieram de: veículos automotores, reboques e carrocerias (+81,5%), metalurgia (+47,7%), máquinas e equipamentos (+52,5%), produtos de minerais não-metálicos (+25,5%), outros produtos químicos (+13,1%), confecção de artigos do vestuário e acessórios (+54,0%), couro, artigos para viagem e calçados (+53,8%), entre outros. Entre as sete atividades em queda, produtos alimentícios (-7,3%) exerceu a maior influência negativa na formação da média da indústria.
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE juntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de jun/21 cresceu +43,3%, impulsionado pela baixa base de comparação. Por sua vez, as importações em quantum de matérias-primas para a indústria avançaram +17,8% na comparação com jun/20. Foi a oitava taxa positiva consecutiva; todas de dois dígitos.
Assim, no acumulado de 2021, as exportações industriais pararam de apresentar sinal negativo e registraram crescimento de +8,4% nos seis primeiros meses do ano frente a igual período do ano anterior. Quanto às importações de matérias-primas para o setor, apresentaram alta expressiva de +20,7% em 2021, um quadro bem diferente de 2020 como um todo (-4,1%).
Utilização de Capacidade
A utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, caiu seguidamente a partir de fev/21, chegando a 76,7% em abr/21, em linha com os resultados desfavoráveis da produção industrial aferida pelo IBGE. Em mai/21 e jun/21 voltou a mostrar alguma reação: 77,8% e 79,4%, respectivamente. A tendência teve continuidade em jul/21, registrando 80,1%; um bom sinal para o setor.
Cabe observar, porém, que o nível de utilização de jun/21 praticamente voltou ao nível da média histórica anterior à Covid-19, que é de 79,5%, mas ficou abaixo do patamar imediatamente anterior à crise de 2014-2016. No 1º trim/14, a utilização da capacidade estava em 82,6%.
Em concordância com os dados da FGV, a pesquisa da CNI, mostra que a utilização da capacidade instalada da indústria assinalou alta de mai/21 para jun/21. Atingiu 82,9%, após ajuste sazonal, registrando acréscimo de 0,9 ponto percentual ante o mês anterior. Isso consolida um nível persistentemente superior ao observado antes da crise (78% em fev/20). Em relação a jun/20, o aumento foi de 9,1 pontos percentuais. Com esse resultado, a utilização da capacidade instalada também superou o nível pré-crises de 2014-2016 e Covid-19, visto que no 1º trim/14 o nível da utilização foi de 82%.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, o indicador da evolução dos estoques de produtos finais da indústria em jun/21 variou -0,9 ponto em relação a mai/21, para 49,0 pontos. Por se encontrar muito próximo da marca de 50 pontos, o indicador ainda sugere estoques em certa estabilidade. No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador registrou 49,2 pontos (-0,9 ponto frente a mai/21), e na indústria extrativa ficou em 41,4 pontos (-5,0 pontos), sinalizando diminuição de estoques.
Estoques mais equilibrados sugerem uma redução da vulnerabilidade das cadeias produtivas a repiques inesperados de comandas, amenizando os gargalos em diversos elos que temos visto desde o ano passado.
Na avaliação dos empresários, os estoques efetivos da indústria geral ficaram, mais uma vez, abaixo do nível planejado (50 pontos), com um indicador de satisfação em 48,7 pontos em jun/21, isto é, patamar melhor do que em dez/20 (+3,2 pontos), mas inferior ao de mai/21(-0,5 ponto).
No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 48,4 pontos e 48,8 pontos, respectivamente, isto é, abaixo do nível de equilíbrio (50 pontos) nos dois casos. Apesar disso, a insuficiência de estoques na indústria de transformação tem se amenizado, depois de atingir a pior avaliação no bimestre set-out/20 (43,1 pontos).
No grupo da indústria de transformação, a situação dos estoques até pode ter se tornado mais amena no início de 2021, mas o problema continua difundido para um amplo conjunto de ramos. Depois de praticamente todos os ramos industriais acompanhados pela CNI apresentaram estoques menores do que o planejado (50 pontos) em dez/20 (96% do total), em jun/21 essa tendência de redução dos estoques manteve-se em 19 dos 26 ramos acompanhados pela CNI, ou seja, em 73,1% do total.
Entre os 7 ramos acima de 50 pontos destacam-se: calçados (56,9 pontos), borracha (54,3 pontos), têxteis (52,3 pontos) e farmacêuticos (51,3 pontos), entre outros. Estão mais distantes do equilíbrio os seguintes ramos: couro (37,9 pontos), madeira (42,8 pontos), produtos diversos (43,2 pontos) e outros equipamentos de transporte (44,2 pontos) etc.
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI, que vinha evoluindo negativamente desde jan/21, voltou a subir a partir de abr/21 e atingiu 62,4 pontos em jul/21. Assim, não só está na região de otimismo (acima de 50 pontos), como atingiu sua melhor marca desde dez/20, trazendo perspectivas mais favoráveis para o setor nos próximos meses.
O componente do indicador de confiança referente às expectativas em relação ao futuro passou de 65,0 pontos em jun/21 para 65,7 pontos em jul/21, e a percepção dos empresários quanto à evolução presente dos negócios também progrediu de 54,7 pontos em jun/21 para 55,8 pontos em jul/21, ficando na região de otimismo (acima de 50 pontos). Vale lembrar que este último componente do indicador de confiança havia registrado 60,2 pontos em dez/20.
O Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV também passou por um movimento descendente. Encontrava-se em 114,9 pontos em dez/20 e em jul/21 ficou em 108,4 pontos, já descontados os efeitos sazonais. Frente a jun/21, porém, houve alta de +0,8 ponto. Como se manteve acima da linha dos 100 pontos, indica que os empresários industriais estão confiantes, mas menos do que estavam no final do ano passado.
O resultado em jul/21, foi influenciado por seus dois componentes. A avaliação em relação ao futuro passou de 104,0 pontos em jun/21 para 104,9 pontos em jul/21, na região de otimismo. Já a avaliações da situação atual aumentou 111,3 pontos em jun/21 para 111,8 pontos em jul/21.
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Este indicador está acima dos 50 pontos desde jun/20, apontando melhora das condições de negócio neste período. Em jul/21, depois de meses de deterioração, deu sequência à reação iniciada em mai/21, passando de 56,4 pontos em jun/21 para 56,7 pontos.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)