Carta IEDI
Declínio sistemático
O ano avança e a indústria continua perdendo produção, devido a obstáculos tanto pelo lado da oferta como pelo lado da demanda. Em ago/21 caiu -0,7% na série com ajuste sazonal. Foi o sexto resultado negativo dos oito meses já cobertos pela pesquisa do IBGE. Até as bases deprimidas de comparação já não disfarçam mais a falta de dinamismo.
Em relação ao mesmo período do ano passado, depois de onze meses consecutivos de crescimento, a indústria recuou -0,7% em ago/21, prenunciando um terceiro trimestre fraco para o setor. Com bases de comparação recompostas, dada a retomada da segunda metade de 2020, o resultado do bimestre de jul-ago/21 ante jul-ago/20 foi de mero +0,3%.
A difusão dos sinais adversos também é expressiva em termos setoriais. Dos 26 ramos acompanhados pelo IBGE, 15 ficaram no negativo em ago/21 ante jul/21 (58% do total) e 19 deles estão em um patamar inferior ao pré-pandemia (73%), isto é, abaixo de fev/20. Do ponto de vista regional, o quadro foi um pouco melhor, com 7 dos 15 parques industriais em queda (47%) em relação a jul/21 e 9 deles abaixo de fev/20 (60%).
Entre os macrossetores industriais, tal como vinha ocorrendo em meses anteriores, o pior desempenho coube a bens de consumo duráveis. Na passagem de jul/21 para ago/21 com ajuste sazonal foi o macrossetor que mais caiu: -3,4%. Também é o que se encontra mais longe do pré-pandemia (-21,8% ante fev/20) e o que acumula maior perda na entrada da segunda metade do presente ano em comparação com igual período do ano passado (-13,8% ante jul-ago/20).
Em contraste, com uma performance muito superior estão os bens de capital, embora tenham apresentado acomodação em ago/21 ante jul/21 (-0,8% com ajuste). Sua produção está 15,8% acima do pré-pandemia e acumula alta de +31,8% em jul-ago/21 ante o mesmo período do ano anterior, impulsionado principalmente por bens de capital para a construção (+67,4%) e para transporte (+47,9%).
Os demais macrossetores também não estão se saindo bem. Intermediários caíram seguidamente nos últimos cinco meses. Agora em ago/21 a queda foi -0,6% ante jul/21. Em relação a jul-ago/20, o recuo foi de -1%. Bens de consumo semi e não duráveis, por sua vez, têm alternado altas (como em ago/21: +0,7%) e baixas, mas o resultado final é negativo. No bimestre jul-ago/21 frente ao mesmo período do ano anterior registra declínio de -1,4%.
Os obstáculos a uma conjuntura positiva para a indústria em 2021 são de diferentes naturezas. Do lado da oferta, há gargalos na obtenção de insumos e pressão de custos; do lado da demanda, a inflação corrói o poder de compra da população em um quadro de elevado desemprego. Além disso, o ambiente de incerteza se mantém, renovando suas causas sob os riscos da crise hídrica e da tensão política.
Os dados da CNI mostram que os estoques permanecem abaixo do nível planejado na maioria dos ramos industriais, o que mantem a vulnerabilidade das cadeias à escassez de insumos. Em ago/21, era esta a situação em 21 dos 26 ramos analisados pela CNI. Há algum progresso em comparação com o final do ano passado, quando 96% dos ramos tinham estoques abaixo do planejado, mas esta porcentagem segue elevada (81% em ago/21).
Diante da evolução recente da indústria, a confiança dos empresários industriais, segundo o indicador da CNI bem como o da FGV, vêm se deteriorando embora ainda permaneça na zona de otimismo. As projeções do Boletim Focus do Banco Central para o desempenho da produção industrial e do PIB da indústria em 2021 e em 2022 têm sido reduzidas desde final de ago/21.
Resultados da Indústria
Em agosto de 2021, a produção industrial voltou a ficar no negativo: -0,7% na comparação com o mês anterior, já descontados os efeitos sazonais. Este resultado foi a sexta variação negativa nos oito meses já cobertos pela pesquisa do IBGE, período em que houve crescimento em apenas um mês (mai/21). Com isso, o setor está novamente abaixo do nível de produção pré-pandemia, isto é, de fev/20: -2,9%, tendo perdido tudo aquilo que conquistou na segunda metade de 2020.
Os dados de ago/21 mostram que, apesar do retorno do auxílio emergencial, da reativação da economia mundial e do avanço da vacinação contra a Covid-19, a indústria brasileira ainda não conseguiu retomar uma trajetória consistente de crescimento. Escassez de partes, peças e demais componentes continuam prejudicando o desempenho do setor, assim como, cada vez mais, a aceleração inflacionária, a corroer o poder de compra da população e pressionar a estrutura de custos das empresas. Também há aumento da incerteza, decorrente da esfera política, bem como dos efeitos da crise hídrica e do andamento da reforma tributária.
Na comparação com o mesmo período do ano anterior, a indústria ficou igualmente no vermelho, registrando -0,7%. Com o reforço das bases de comparação decorrente da recuperação da segunda metade de 2020, o desempenho interanual tende a deixar de ser tão favorável quanto vinha sendo nos meses anteriores em função de efeitos estatísticos. Cabe observar ainda que a queda de ago/21 ante ago/20 ocorreu a despeito de um efeito calendário positivo, já que no presente ano o mês de agosto teve um dia útil a mais.
Deste modo, o desempenho no acumulado em jan-ago/21 foi de +9,2% ante +11,0% em jan-jul/21. A maior parte desse avanço está concentrado no segundo trimestre do ano (+22,7%), dada a baixa base de comparação de abr-jun/20, devido ao choque da Covid-19. No bimestre jul-ago/21, que sugere o desempenho a ser obtido no 3º trim/21, o resultado foi muito fraco, de apenas +0,3% ante jul-ago/20. Ou seja, de virtual estagnação.
No acumulado dos últimos doze meses findos em ago/21, por sua vez, a indústria registrou +7,2%, sendo o quinto resultado positivo consecutivo nesta base de comparação e ainda com alguma aceleração, já que os piores meses do ano passado estão deixando de compor o período considerado.
Em relação macrossetores industriais, na comparação de ago/21 com jul/21, descontados os efeitos sazonais, houve variação positiva somente em bens de consumo semi e não duráveis (+0,7%). Todos os demais ficaram no negativo, sendo a maior queda em bens de consumo semi e não duráveis (-3,4%), que reúne muitos setores vulneráveis ao quadro de escassez de insumos. Bens intermediários (-0,6%) recuaram pela quinta vez consecutiva e bens de capital que vinham ficando sistematicamente no positivo registraram acomodação (-0,8%).
Na comparação de ago/21 com ago/20, diferentemente de meses anteriores, em que havia variação positiva em todos os quatro macrossetores industriais, apenas bens de capital (+29,9%) ficaram no azul. Mais uma vez, bens de consumo duráveis foram os que mais perderam (-17,3%), seguidos por bens intermediários (-2,1%) e bens de consumo semi e não duráveis (-0,8%).
O macrossetor de bens de capital, que registrou alta de +29,9%, foi positivamente influenciado pela maior parte dos grupamentos, com destaque para bens de capital para equipamentos de transporte (+40,0%). Também cresceram os grupamentos de bens de capital agrícolas (+43,9%), para construção (+67,7%), para fins industriais (+5,3%) e de uso misto (+14,7%). O único impacto negativo coube ao subsetor de bens de capital para energia elétrica (-1,8%).
Ainda no confronto com igual mês do ano anterior, o segmento de bens de consumo semi e não-duráveis (-0,8%) ficou próximo da estabilidade, embora não tenha escapado do sinal negativo devido ao desempenho dos grupamentos de alimentos e bebidas elaborados para consumo doméstico (-3,4%) e de semiduráveis (-0,7%). Em contraste, os subsetores de carburantes (+4,8%) e de não-duráveis (+0,7%) apresentaram taxas positivas.
Já a produção de bens intermediários, que recuou -2,1% ante ago/20, foi muito influenciada pelos declínios registrados nas atividades de produtos alimentícios (-12,2%), de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-9,5%), de produtos de borracha e de material plástico (-5,8%), de outros produtos químicos (-3,4%), entre outros. Pressões positivas vieram de metalurgia (+20,0%), produtos de minerais não-metálicos (+5,8%), máquinas e equipamentos (+10,9%) e produtos têxteis (+2,6%), entre outros.
Por fim, a queda mais intensa em ago/21 ante ago/20, que ficou por conta de bens de consumo duráveis (-17,3%) foi provocada pela redução na fabricação de automóveis (-27,8%) e de eletrodomésticos da “linha marrom” (-29,1%), além de eletrodomésticos da “linha branca” (-11,9%) e pelo grupamento de móveis (-13,1%). Em direção oposta, atenuaram a queda deste macrossetor os aumentos registrados na fabricação de motocicletas (+23,2%) e de outros eletrodomésticos (+6,6%).
Por dentro da Indústria de Transformação
A queda de -0,7% da produção industrial geral em ago/21 ante jul/21, já realizado o ajuste sazonal, foi acompanhado de variação de -0,7% na indústria de transformação e de +1,3% no ramo extrativo. Dessa forma, a indústria de transformação se encontra 8% abaixo do nível de produção de dez/20 e 2,7% abaixo do pré-pandemia, isto é, de fev/20.
Em relação a ago/20, tal como a indústria geral (-0,7%), o desempenho da indústria de transformação também foi negativo, porém menos intenso: -0,5%. A despeito do efeito calendário positivo (ago/21 teve um dia útil a mais do que ago/20), bases de comparação mais elevadas tornaram mais difícil a obtenção de taxas positivas. No caso do ramo extrativo, houve declínio de -1,6%.
Frente a jul/21, na série com ajuste sazonal, o resultado de -0,7% da indústria geral teve influência negativa de 15 dos 26 ramos pesquisados. Dentre os destaques negativos estão: químicos (-6,4%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-2,6%), veículos automotores, reboques e carrocerias (-3,1%) e produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-9,3%), entre outros. Entre as onze atividades em alta, além da indústria extrativa (+1,3%), estão produtos alimentícios (+2,1%), bebidas (+7,6%), metalurgia (+1,1%), produtos de madeira (+3,0%) e têxteis (+2,1%).
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou queda de -0,7% na produção em ago/21, variações negativas marcaram o desempenho de 37 dos 79 grupos e 46,0% dos 805 produtos pesquisados. Cabe lembrar que ago/21 (22 dias) teve um dia útil a mais do que ago/20 (21 dias).
As maiores influências negativas nesta comparação interanual vieram de: produtos alimentícios (-7,4%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-5,2%), borracha e de material plástico (-6,6%), bebidas (-6,4%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (-10,1%), outros produtos químicos (-3,4%), entre outros, além das indústrias extrativas (-1,6%).
Entre as doze atividades em alta, destacaram-se: máquinas e equipamentos (+23,7%) e metalurgia (+20,0%), que exerceram as maiores influências positivas, veículos automotores, reboques e carrocerias (+3,6%), produtos de minerais não-metálicos (+5,6%), confecção de artigos do vestuário e acessórios (+8,5%) e couro, artigos para viagem e calçados (+8,5%).
Exportação
Segundo os dados da Funcex, divulgados pelo IBGE juntamente com os resultados da produção industrial, o quantum das exportações de manufaturados no mês de ago/21 cresceu +17%, impulsionado pela baixa base de comparação e pela reativação da economia mundial. Por sua vez, as importações em quantum de matérias-primas para a indústria avançaram +38,4% na comparação com ago/20. Foi a décima taxa positiva consecutiva; todas de dois dígitos.
Assim, no acumulado de 2021, as exportações industriais, que pararam de apresentar sinal negativo a partir de abr/21, registraram crescimento de +15,8% em jan-ago/21 frente a igual período do ano anterior. Esta foi a segunda taxa positiva de dois dígitos após o choque da Covid-19. Quanto às importações de matérias-primas para o setor, apresentaram alta expressiva de +30,8% em jan-ago/21, um quadro bem diferente de 2020 como um todo (-4,1%).
Utilização de Capacidade
A utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, caiu de fev/21 a mai/21, quando voltou a mostrar alguma reação. A tendência teve continuidade nos meses seguintes e atingiu 79,7%, implicando uma queda frente a jul/21. Em set/21, porém, voltou a reagir e ficou em 80,2%.
Cabe observar, porém, que o nível de utilização recente voltou a superar a média histórica anterior à Covid-19, que é de 79,5%. Apesar disso, fica um pouco abaixo do patamar imediatamente anterior à crise de 2014-2016, que era de 82,6% no 1º trim/14.
Já pesquisa da CNI, mostra que a utilização da capacidade instalada da indústria de ago/21 manteve-se muito próxima do nível de jul/21. Atingiu 82,3%, após ajuste sazonal, registrando decréscimo de mero -0,1 ponto percentual ante o mês anterior. Isso consolida um nível persistentemente superior ao observado antes da crise (78% em fev/20). Em relação a ago/20, o aumento foi de 4,7 pontos percentuais. Com esse resultado, a utilização da capacidade instalada também superou o nível pré-crises de 2014-2016 e Covid-19, visto que no 1º trim/14 o nível da utilização foi de 82%.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, o indicador da evolução dos estoques de produtos finais da indústria em ago/21 ficou acima do patamar de jul/21: 49,7 pontos ante 49,0 pontos, respectivamente. Por se encontrar abaixo, porém próximo da marca de 50 pontos, o indicador sugere estoques em leve redução. No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador registrou 49,8 pontos (+0,7 ponto frente a jul/21), e na indústria extrativa ficou em 45,3 pontos (+1,0 ponto), sinalizando redução de estoques.
Estoques mais equilibrados sugerem uma redução da vulnerabilidade das cadeias produtivas a repiques inesperados de comandas, amenizando os gargalos em diversos elos que temos visto desde o ano passado.
Na avaliação dos empresários, os estoques efetivos da indústria geral ficaram, mais uma vez, abaixo do nível planejado (50 pontos), com um indicador de satisfação em 48,6 pontos em ago/21, isto é, praticamente o mesmo patamar de jul/21 (48,7 pontos). Deste modo, o quadro não está tão adverso quanto em dez/20 (+3,1 pontos), mas permanece aquém dos níveis de fev/20 (-1,0 ponto), isto é, antes do choque da Covid-19.
No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 47,4 pontos e 48,6 pontos, respectivamente, isto é, abaixo do nível de equilíbrio (50 pontos) nos dois casos. A insuficiência de estoques na indústria de transformação, que tinha se amenizado, aproximando-se muito da linha de 50 pontos em abr-mai/21, se afastou dela a partir em jun/21, não dando sinais de reaproximação desde então.
No grupo da indústria de transformação, a situação dos estoques até pode ter se tornado mais amena do que na passagem de 2020 para 2021, mas o problema continua difundido para um amplo conjunto de ramos. Depois de praticamente todos os ramos industriais apresentarem estoques menores do que o planejado (50 pontos) em dez/20 (96% do total), em ago/21 essa tendência de redução dos estoques manteve-se em 21 dos 26 ramos acompanhados pela CNI, ou seja, em 81% do total.
Entre os poucos ramos iguais ou acima de 50 pontos destacam-se: caçados (55,1 pontos), móveis (52,2 pontos) e papel e celulose (51,5 pontos). Estão mais distantes do equilíbrio os seguintes ramos: biocombustíveis (42,0 pontos), madeira (42,8 pontos), impressão e reprodução (45 pontos) e máquinas e materiais elétricos (45,3 pontos).
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI, que vinha subindo desde mai/21, atingindo 63,1 pontos em ago/21, recuou para 58,5 pontos em set/21, sinalizando para um quadro menos favorável nos próximos meses. Apesar disso, permaneceu na região de otimismo, isto é, acima de 50 pontos.
O declínio recente do otimismo deveu-se aos dois componente do indicador. O componente referente às expectativas em relação ao futuro passou de 66,1 pontos em ago/21 para 61,6 pontos em set/21. Já o componente que capta a percepção dos empresários quanto à evolução presente dos negócios regrediu de 57,2 pontos em ago/21 para 52,4 pontos em set/21. Vale lembrar que este último componente do indicador de confiança havia registrado 60,2 pontos em dez/20.
O Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV caminhou na mesma direção do indicador da CNI em set/21, dando continuidade ao movimento descendente já verificado em ago/21. Em elevação a partir de mai/21, atingiu 108,4 pontos em jul/21, regredindo em ago/21 para 107 pontos e agora em set/21 para 106,4 pontos, já descontados os efeitos sazonais. Como se manteve acima da linha dos 100 pontos durante todo este período, indica que os empresários industriais estão confiantes, mas menos do que estavam em meses anteriores.
O resultado em set/21, foi influenciado sobretudo por seu componente que capta a avaliação dos empresários em relação ao futuro, que passou de 104,6 pontos para 103,6 pontos de ago/21 para set/21. A avaliação da situação atual pouco se altou, ficando em 109,4 pontos em ago/21 e 109,2 pontos em set/21.
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Este indicador está acima dos 50 pontos desde jun/20, apontando melhora das condições de negócio neste período. Depois de uma fase de elevação a partir de mai/21, chegando a 56,7 pontos em jul/21, refluiu para patamares inferiores desde então. Em set/21 ficou em 54,4 pontos, recompondo parte das perdas de ago/21.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)