Carta IEDI
Amenização das perdas industriais no 2º trim/22
Depois de quatro meses seguidos de crescimento, algo que não ocorria desde a segunda metade de 2020, a indústria voltou ao negativo em jun/22, anulando integralmente a expansão de mai/22. Já descontados os efeitos sazonais, registrou -0,4% ante o mês anterior e -0,5% frente ao mesmo período do ano passado. Como o dinamismo recente tem sido fraco, há sempre o risco de reversões de sinal.
Assim, segundo os dados do IBGE, a indústria concluiu a primeira metade do ano em um situação inferior a que estava em igual período de 2021. No acumulado de jan-jun/22, o setor registra declínio de -2,2% em sua produção, como todos os seus macrossetores no vermelho, bem como 69% dos 26 ramos pesquisados. Ao menos, por ora, 2022 não é um ano de retomada industrial.
Isso porque, embora o controle da pandemia de Covid-19 tenha favorecido o desempenho não apenas da indústria, mas de todos os setores da economia, os obstáculos a uma expansão mais robusta continuam bem presentes, com o desemprego ainda elevado; pressões inflacionárias ensejando aumentos da taxa básica de juros (Selic), ainda não integralmente repassados às taxas de empréstimos; recomposição do consumo de serviços pela população de maior renda; gargalos remanescentes nas cadeias produtivas, agravados pela guerra na Ucrânia; incertezas externas e internas, advindas do quadro político-eleitoral deste ano etc.
Os indicadores de confiança dos empresários industriais ficaram na média do primeiro semestre de 2022 abaixo dos patamares em igual período do ano anterior, tanto na pesquisa da CNI (-3%) como na pesquisa da FGV (-8%). Neste último caso, o indicador indicou pessimismo na maioria dos meses em questão.
Apesar da trajetória insatisfatória, o 2º trim/22 trouxe importante amenização das perdas. Seu resultado ficou mais próximo de um quadro de estabilidade do que de redução da produção industrial: -0,2% ante o mesmo período do ano passado. No 1º trim/22 a queda havia sido de -4,4%. Dado que o ramo extrativo encolheu -4,7% em abr-jun/22, esta melhora relativa deveu-se à evolução da indústria de transformação, que chegou a deixar a zona negativa em que se encontrava desde meados de 2021 e registrou +0,4%.
Com base na pesquisa do IBGE, o IEDI analisou a indústria de transformação “por dentro”, desagrupando esta parcela da indústria em 93 segmentos. Ficou claro que seu retorno ao positivo no 2º trim/22 atingiu uma pequena minoria dos seus segmentos (14% ou apenas 6% em termos líquidos, já que alguns segmentos saíram do positivo e voltaram a cair) e também não houve grande ampliação do número de segmentos com forte crescimento (de 11 para 14 segmentos com alta de dois dígitos).
Nada disso, porém, comprometeu um movimento amplo de melhora relativa dos resultados entre o 1º trim/22 e o 2º trim/22 (73% dos segmentos). O determinante para isso foi uma redução significativa de casos com perdas profundas no 2º trim/22. O número de segmentos com queda de dois dígitos passou de 47% dos 93 segmentos no 1º trim/22 para 26% no 2º trim/22.
Embora este seja, sem dúvida, um aspecto favorável a melhora relativa não significou crescimento na grande maioria dos casos. Além disso, também é importante observar que praticamente ¼ da indústria de transformação se manteve em situação bastante grave, com perdas interanuais mais intensas do que -10%.
Resultados da Indústria
Em junho de 2022, a produção industrial assinalou variação de -0,4% frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais, anulando integralmente o crescimento de +0,3% registrado em mai/22. Com isso, foi interrompida uma sequência de variações positivas que não ocorria desde a segunda metade de 2020, quando recebia ajuda de bases muito baixas de comparação, devido ao choque da Covid-19.
Assim, o setor voltou a ficar mais longe de eliminar o recuo de -1,9% registrado em jan/22, de modo que o nível de produção industrial em jun/22 permaneceu 0,5% aquém do patamar de dez/21, já descontados os efeitos sazonais. Frente ao nível pré-pandemia, isto é, de fev/20, a produção segue 1,5% inferior.
Em comparação com os dados do mesmo mês do ano anterior, em jun/22, a indústria também voltou ao negativo (-0,5%), fazendo da expansão de mai/22 (+0,5%) um resultado isolado, muito provavelmente resultante da existência de um dia útil a mais em relação a mai/21. Vale observar ainda a inexistência de efeito calendário no mês de junho, já que jun/22 e jun/21 tiveram o mesmo número de dias úteis (21 dias).
No período entre jan-jun/22, isto é, no agregado do primeiro semestre do ano, a indústria acumulou declínio de -2,2% e nos últimos 12 meses, intensificou a queda para -2,8%, sendo a terceira variação negativa consecutiva nesta base de comparação. O aspecto positivo é que ao menos a gravidade do quadro se atenuou no 2º trim/22, quando o resultado de -0,4% ante o 2º trim/21 aproximou-se da estabilidade. No 1º trim/22, a perda havia sido de -4,4%.
Em relação às grandes categorias industriais, na comparação de jun/22 ante mai/22, na série com ajuste sazonal, houve variação negativa em 3 dos 4 macrossetores industriais. Bens de capital (-1,5%) foram os que mais recuaram, apresentando uma trajetória de oscilação entre altas e baixas no segundo trimestre do ano. Os bens de consumo duráveis, por sua vez, reagiram e foram a exceção do mês, com crescimento de +6,4%, apoiados na indústria automobilística.
O macrossetor de bens de consumo semi e não duráveis (-0,7%) caiu depois de dois meses seguidos de aumento de produção, com um desempenho bastante próximo ao de bens intermediários (-0,8%). Neste último caso, porém, já são dois meses seguidos de recuo na produção (-1,5% em mai/22).
Apesar desta evolução recente, metade dos macrossetores industriais ficou em patamares de produção inferiores ao pré-pandemia, isto é, abaixo de fev/20. Os casos negativos referem-se a bens de consumo, mais diretamente impactados pelo ainda elevado desemprego no país e pela corrosão do poder de compra da população pela inflação. Bens de consumo semi e não duráveis ficaram 6,7% aquém de fev/20 e bens de consumo duráveis em patamar 15,6% inferior. Bens de capital superam o pré-pandemia em 13,8% e bens intermediário estão muito próximos do mesmo patamar de fev/20: +0,7%.
Frente ao mesmo mês do ano anterior (jun/21), a maioria dos macrossetores ficou na zona positiva. Os melhores resultados couberam a bens de consumo duráveis (+2,3%), que como visto anteriormente é quem está mais longe de se recuperar plenamente do choque da pandemia, bens de consumo semi e não duráveis (+1,3%), que também têm o que recuperar, e bens de capital (+0,2%), que ficaram próximos da estabilidade nesta comparação.
A exceção negativa ficou por conta de bens intermediários, cuja produção caiu -1,8% ante jun/21. Em se tratando do núcleo do sistema industrial e diante de persistentes gargalos nas cadeias de suprimento, não é uma boa notícia, ainda mais quando se verifica uma sucessão de resultados negativos em 2022, afetando, por ora, cinco dos seis meses cobertos pela pesquisa do IBGE. No único mês em que não houve queda na comparação interanual, o resultado foi de 0%.
No 2º trim/22, frente ao mesmo período do ano anterior, enquanto a indústria geral registrou -0,2%, dois macrossetores se saíram ainda pior: bens intermediários caíram -0,9%, devido a intermediários têxteis (-6,6%), de alimentos (-4,7%) e metalurgia básica (-6,0%), entre outros no vermelho; bens de consumo duráveis, por sua vez, recuaram -4,6%, sob influência notadamente de eletrodomésticos (-16,9%), móveis (-10,3%) e outros equipamentos de transporte (-3,1%).
Quanto aos macrossetores que cresceram nesta comparação trimestral, quem registrou o melhor resultado foi bens de consumo semi e não duráveis (+2,2%), sob influência de abate de reses, exceto suínos (+9,4%), calçados (+21,8%), bebidas (+4,4%) e álcool e gasolina (+3,4%), entre outros. A produção de bens de capital variou +0,4%, com contribuições positivas de bens de capital para a construção (+22,9%) e para energia (+15,6%) e influência negativa da produção de bens de capital para a própria indústria (-7,5%).
No acumulado de jan-jun/22, frente ao mesmo período do ano anterior, o perfil dos resultados mostrou menor dinamismo para bens de consumo duráveis (-11,7%), pressionados, em grande parte, pelas reduções verificadas na fabricação de automóveis (-7,0%), de eletrodomésticos da “linha branca” (-21,7%) e da “linha marrom” (-12,6%) e de móveis (-24,4%). Bens intermediários (-2,1%), bens de consumo semi e não duráveis (-1,0%) e bens de capital (-0,9%) também assinalaram resultados negativos nos seis primeiros meses do ano, mas todos com recuos menos intensos do que o observado na média da indústria (-2,2%).
Já no acumulado nos doze últimos meses, com a terceira variação negativa desde meados de 2021 para o agregado da indústria geral, apenas bens de capital se mantiveram em crescimento, com +7,0%. Bens de consumo duráveis tiveram a maior queda, com -16,0%, seguidos por bens de consumo semi e não duráveis (-3,4%) e bens intermediários (-2,6%).
Por dentro da Indústria de Transformação
A variação de -0,4% da produção industrial geral em jun/22 frente a mai/22, na série livre dos efeitos sazonais, foi acompanhada de variação de -0,3% na indústria de transformação e de +1,9% no ramo extrativo. Dessa forma, a indústria de transformação ainda se encontra 1,1% abaixo do nível de produção pré-pandemia, isto é, de fev/20, enquanto o ramo extrativo está 3,0% abaixo deste patamar.
Em relação a jun/21, enquanto a indústria geral recuou -0,5%, o desempenho da indústria de transformação apontou para um quadro de estabilidade, registrando +0,1%, isto é, bem menos do que o resultado de mai/22 (+1,6%), mas seu segundo mês na região positiva. O ramo extrativo, por sua vez, não escapou de um revés, apresentando variação de -5,4% frente ao mesmo mês do ano passado, depois de ter caído -8,2% em mai/22.
No acumulado do 2º trim/22, também em relação ao mesmo período do ano anterior, a indústria de transformação apresentou sua primeira variação positiva, de +0,4%, depois do 3º trim/21. Assim, foi a queda de -4,7% no período que ajudou a manter a indústria geral no vermelho (-0,2%). Já em jan-jun/22, o sinal negativo prepondera: -2,2% na indústria geral, -2,1% na indústria de transformação e -3,3% na indústria extrativa.
Frente a mai/22, na série com ajuste sazonal, o resultado de -0,4% da indústria geral teve influência negativa de 15 dos 26 ramos pesquisados pelo IBGE. Entre eles ficaram: farmoquímicos e farmacêuticos (-14,1%), coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-1,3%), máquinas e equipamentos (-2,0%), metalurgia (-1,8%), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (-2,8%) e outros equipamentos de transporte (-5,5%).
Em sentido oposto, entre as atividades que apontaram ampliação da produção na passagem de mai/22 para jun/22, veículos automotores, reboques e carrocerias (+6,1%), além das indústrias extrativas (+1,9%), exerceram os principais impactos positivos em jun/22.
Na comparação com igual mês do ano anterior, em que a indústria geral apresentou retrocesso de -0,5% na produção em jun/22, variações negativas marcaram o desempenho de 14 dos 26 ramos, 49 dos 79 grupos e 54,2% dos 805 produtos pesquisados. Vale citar que jun/22 teve o mesmo número de dias úteis do que jun/21 (21 dias).
As maiores influências negativas nesta comparação interanual vieram das seguintes atividades da indústria de transformação: metalurgia (-8,3%), produtos farmoquímicos e farmacêuticos (-19,6%), minerais não metálicos (-6,9%), produtos de metal (-6,0%), outros produtos químicos (-2,6%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (-6,3%) e produtos de borracha e de material plástico, entre outros.
Já entre as contribuições positivas, destacaram-se: coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (+8,6%), veículos automotores, reboques e carrocerias (+5,9%), celulose, papel e produtos de papel (+7,5%), couro, artigos para viagem e calçados (+15,9%), manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (+18,5%) e produtos alimentícios (+1,0%), entre outros.
Utilização de Capacidade
Em jun/22, a utilização da capacidade instalada da indústria de transformação, de acordo com a série da FGV com ajustes sazonais, progrediu de 80,8% em mai/22 para 81,4%, ficando acima da média histórica anterior à Covid-19 (79,5%). Em jul/22 este indicador cresceu novamente, chegando a 82,3%.
O indicador da CNI, também com ajuste sazonal, vem se mantendo em patamar muito semelhante desde jan/22, apontando para a relativa estagnação do setor. Em jun/22, ficou em 80,4%, pouco abaixo de mai/22 (80,7%). Assim, o indicador encontra-se pouco abaixo da média histórica anterior à pandemia de Covid-19 (isto é, até fev/20), que é de 80,7%.
Estoques
De acordo com os dados da Sondagem Industrial da CNI, o indicador da evolução dos estoques de produtos finais da indústria total, após ter ficado no nível de equilíbrio em abr/22 (50 pontos), voltou a cair, ficando em 49,7 pontos em mai/22 e em 49 pontos em jun/22.
No caso do segmento da indústria de transformação, o indicador da CNI também registrou 49,0 pontos (-0,7 ponto frente a mai/22), apontando mais uma vez redução dos estoques, embora próximo da linha de estabilidade (50 pontos). A indústria extrativa também registrou declínio, ficando em 47,5 pontos (-2,3 pontos ante mai/22).
Para a indústria geral, o indicador de satisfação dos estoques ficou em 49,2 pontos, sinalizando estoques abaixo do planejado, em jun/22, após um período de excesso de estoques em fev-abr/22. Vale lembrar que a marca de equilíbrio é dada pelo valor de 50 pontos, acima da qual há excesso de estoques e abaixo dela, estoques menores do que o desejado.
No caso do setor extrativo e no caso da indústria de transformação, o indicador de satisfação registrou 52,8 pontos e 49,1 pontos, respectivamente. No caso da indústria de transformação, tal qual da indústria geral, o indicador apontou estoques abaixo do desejado após três meses de excesso de estoques entre fev/22 e abr/22.
Depois de praticamente todos os ramos industriais apresentarem estoques menores do que o planejado (abaixo de 50 pontos) em dez/20 (96% do total), em dez/21 a insatisfação quando ao nível dos estoques ocorreu em 58% dos setores e, em jun/22, ficou em 64% do total de ramos, o que equivale a 16 dos 25 ramos acompanhados pela CNI com índices abaixo dos 50 pontos.
Entre os ramos iguais ou acima de 50 pontos em jun/22 destacam-se: móveis (55,5%), farmacêuticos (51,6%), minerais não metálicos (51,6%), metalurgia (50,6%) e máquinas e equipamentos (50,3%), entre outros. Ficaram abaixo e mais distantes do equilíbrio os seguintes ramos: limpeza e perfumaria (42,7 pontos), bebidas (45,3 pontos) e papel e celulose (45,5%).
Confiança e Expectativas
O Índice de Confiança do Empresário da Indústria de Transformação da CNI registrou 57,6 pontos em jul/22, isto é, abaixo do patamar de 58,3 pontos de jun/22. Por ter ficado acima de 50 pontos neste período, o indicador aponta otimismo dos empresários do setor, mas menos do que indicava em jun/22, ou ainda, na entrada do segundo semestre de 2021, quando superou a marca de 60 pontos por seguidos meses.
Na passagem de jun/22 para jul/22, o componente referente às expectativas em relação ao futuro caiu de 61,6 pontos para 61,0 pontos, ainda sugerindo otimismo. Já o componente que capta a percepção dos empresários quanto à evolução presente dos negócios permaneceu na região de otimismo, embora tenha passado de 51,7 pontos para 50,7 pontos. O indicativo recente não é tão positivo para a produção em julho próximo.
O Índice de Confiança da Indústria de Transformação (ICI) da FGV apontou deterioração da confiança em jul/22, interrompendo o movimento iniciado em abr/22. Em junho último, este índice chegou a 101,2 pontos, já descontados os efeitos sazonais, superando a marca dos 100 pela primeira vez desde dez/21, mas em jul/22 voltou a regredir para 99,5 pontos. Deste modo, por ter ficado abaixo dos 100 pontos em jul/22, os empresários não se mostraram confiantes.
O resultado de jul/22 foi influenciado por seus dois componentes, mas principalmente pelas expectativas em relação ao futuro, cujo indicador recuou de 100,2 pontos em jun/22 para 97,6 pontos. A avaliação da situação atual, por sua vez, passou de 102,3 pontos em jun/22 para 101,4 pontos em jul/22, superando a região de otimismo (acima de 100 pontos).
Outro indicador frequentemente utilizado para se avaliar a perspectiva do dinamismo da indústria é o Purchasing Managers’ Index – PMI Manufacturing, calculado pela consultoria Markit Financial Information Services. Em jul/ficou em 54,0 pontos, permanecendo relativamente estável neste patamar desde mai/22. Como ficou acima da marca dos 50 pontos, indica melhora do quadro de negócios do setor.
Anexo Estatístico
Mais Informações
Tabela: Produção Física - Subsetores Industriais
Variação % em Relação ao Mesmo Mês do Ano Anterior (clique aqui)