Carta IEDI
O Papel da Substituição de Importação em um Novo Modelo de Ajuste Externo
Para aumentar o ritmo de crescimento econômico e obter um superávit comercial de US$ 13 bilhões a US$ 14 bilhões até 2005, o Brasil necessita não só de uma política de exportações muito mais eficaz, como de uma estratégia que promova a substituição competitiva de importações.
Modelo de Ajuste Atual. As importações brasileiras vêm apresentando uma persistente tendência de queda (ver o gráfico a seguir). A evolução significativa iniciada com a abertura do país ao comércio exterior foi interrompida em 1997, ano em que atingiram quase US$ 60 bilhões.
Em 2002 devem alcançar US$ 50 bilhões, o que significa uma redução de US$ 10 bilhões (ou 16%) com relação ao valor máximo registrado nos anos 1990.

Foram as expressivas desvalorizações cambiais de 1999, 2001 e no corrente ano, além do crescimento econômico baixo (2% ao ano, em média, entre 1999 e 2002) que levaram a isso. A queda das importações concorreu para um ajuste da balança comercial, o que ajudou a promover uma ainda incipiente contenção do déficit em transações correntes.
A despeito disso, o atual modelo de ajuste não é adequado para um prazo mais amplo. Não é desejável e talvez nem seja possível manter a quantidade e o ritmo das desvalorizações cambiais sucessivas dos últimos quatro anos e represar o crescimento por mais tempo.
Por outro lado, como mostra o gráfico a seguir, esse modelo tem levado a uma estagnação da corrente de comércio (exportação mais importação), além da já referida queda das importações.

O que é necessário mudar no modelo atual não é a política cambial. Faz-se necessário, todavia, um cuidado todo especial para que uma eventual valorização cambial (como a que ocorreu entre fins de 2001 e início de 2002) não reduza a remuneração do exportador e neutralize os efeitos de uma política de exportação.
O objetivo de um novo modelo de comércio exterior continua sendo a geração de saldos comerciais crescentes, mas com menor dependência de desvalorizações cambiais e de baixo crescimento da economia.
Um ajuste mínimo do setor externo brasileiro recomenda um superávit comercial de US$ 13 a US$ 14 bilhões a ser obtido em um período de três anos.
O novo modelo deve contemplar um crescimento expressivo das exportações, como 10% ao ano ou aproximadamente duas vezes mais do que o obtido até agora com as desvalorizações cambiais (4,4% ao ano entre 1999 e 2001).
Tal resultado pressupõe um “esforço concentrado” para estimular a exportação e o investimento voltado à exportação. O IEDI tem sugerido os seguintes instrumentos para tentarmos acelerar a evolução das exportações:
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Total e ampla desoneração fiscal. Nas atuais circunstâncias, em que ainda exportamos impostos, isso significaria um incentivo fiscal. Consistiria na fixação de índices substancialmente maiores do que os atuais para a desoneração dos impostos incidentes sobre as exportações. A desoneração cobriria, além do PIS e COFINS, a CPMF e o custo de carregar créditos sem contrapartida de débitos fiscais por parte das empresas exportadoras, incluindo o ICMS. O incentivo perduraria até que uma real reforma tributária estivesse em pleno vigor no país;
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Ampliação tanto quanto possível do crédito à exportação por intermédio do Banco do Brasil e do BNDES, incluindo o financiamento do investimento necessário para expandir as exportações e maior premiação dos exportadores que cumprem suas metas nos programas de financiamento do BNDES-Exim, na modalidade de capital de giro.
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Financiamento e incentivo fiscal para gastos com marketing e promoção comercial no exterior e apoio aos investimentos externos de empresas brasileiras;
É também importante que o Brasil desenvolva outras linhas de política, como, apenas para citar um exemplo, as ações que ultimamente vem executando para diversificar mercados para produtos brasileiros e remover o protecionismo nos países mais desenvolvidos.
O protecionismo concorre para deprimir preços e estreita os mercados de produtos em que temos grande vantagem competitiva, como nos casos dos bens primários, da agroindústria e da indústria tradicional.
Substituição competitiva de importações. Se desejarmos um maior crescimento da economia, é inevitável um aumento das importações. O crescimento das importações é desejável para auxiliar no crescimento interno e elevar a competitividade do produto nacional.
No entanto, uma expansão das importações pode neutralizar o aumento das exportações, frustrando o ajuste externo.
Suponhamos um crescimento do PIB de 5% ao ano nos próximos três anos e que as importações avancem o dobro disso, ou seja, 10% (esta foi, aproximadamente, a “elasticidade das importações” média do biênio 2000/2001).
Se isso ocorrer, mesmo na hipótese de um expressivo crescimento das exportações, dificilmente faremos o ajuste externo. O “Cenário A” do gráfico abaixo mostra que, nesse caso, o superávit comercial permanecerá em torno a US$ 3,5 bilhões a US$ 4 bilhões, insuficiente para o ajuste. (O leitor interessado em informações adicionais poderá consultar o trabalho “O Papel da Substituição de Importações no Ajuste Externo”, que estará, em breve, disponível no site do IEDI: www.iedi.org.br.)
Esse resultado ilustra a necessidade de complemento da política de exportações com uma política de substituição de importações.
A crítica comumente feita à substituição de importações é que ela levaria a uma queda de importações, significando isso “fechar” a economia. Ora, vimos que o que está levando à persistente queda das importações e está “fechando” a economia é o modelo atual de ajuste externo.
É evidente que se um produto antes importado passa a ser produzido internamente, e a produção doméstica abastece o mercado consumidor, há uma queda da importação desse produto.
No entanto, se a economia crescer mais, a importação que se deixa de fazer de um ou mais produtos, mediante a substituição de importações, é anulada ou mesmo ultrapassada pela compra externa de outros itens. Assim, as importações totais podem crescer. A substituição de importações abre espaço para o aumento de importações de outros produtos que a economia e os consumidores do país mais necessitam.
Por que é necessário um programa para substituir importações? A razão é simples: muitos produtos não são fabricados no Brasil devido aos nossos custos de capital e tributário proibitivos, se comparados aos de outros países.
É a esse diferencial de custo que deve remeter uma política de substituição de importação.
Ela deve procurar igualar os custos brasileiros com os do exterior de forma a deixar exclusivamente para os fatores empresariais de análises de projetos a decisão sobre o investimento a ser feito. Com isso, estará assegurada a substituição competitiva de importações.
As sugestões de instrumentos para uma política de incentivo a projetos de substituição de importações são:
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Desoneração dos custos tributários de investir e produzir, que são maiores no Brasil;
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Programa de financiamento que procure igualar os custos e prazos de financiamento no país, em relação às condições internacionais;
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Atração de investimentos, visando à produção não só para o mercado doméstico, ou seja, a substituição de importações, mas também para a venda em mercados globais.
O objetivo da substituição de importações é assegurar um crescimento das importações menor do que o das exportações, condição para ampliar o superávit comercial.
Para ilustrar, suponhamos que uma substituição de importações permita um crescimento das importações igual ao crescimento projetado do PIB (5%). Os resultados, que correspondem ao “Cenário B” do gráfico abaixo, mostram que isso é suficiente para o ajuste externo.

Qual deve ser o “esforço concentrado” de exportação e quanto é requerido de substituição de importações?
O gráfico abaixo mostra os resultados de simulações que resultam da diferença entre os valores de exportação e importação correspondentes ao “Cenário B” e os valores da projeção de exportação e importação, caso evoluíssem de acordo com o modelo de ajuste atual (4,4% ao ano para a exportação e -1,2% para importação, taxas de crescimento correspondentes ao período 1999/2001).
Ambos têm contribuição relevante, mas a do primeiro é maior: para o triênio 2003/2005, a promoção de exportação contribui com US$ 13,8 bilhões e a substituição de importações com US$ 8,7 bilhões.
Em contraposição, no primeiro caso, os resultados podem levar mais tempo para aparecer (são mais expressivos em 2004 e 2005), enquanto os da substituição de importações podem ser mais imediatos.
A tabela final mostra que, em obtendo êxito, as políticas de exportação e substituição de importações reduziriam à metade a atual relação déficit em transações correntes/exportações em 2005.
Muito antes disso, a avaliação internacional do risco brasileiro melhoraria e a vulnerabilidade externa seria menor.

