Carta IEDI
Plano Biden e América Latina
No governo Biden, os EUA adotaram uma estratégia de grande envergadura para o aprimoramento da infraestrutura nacional, a aceleração da transição verde e o fortalecimento de competências tecnológicas e industriais do país. Isso em um contexto de firme catching up tecnológico da China, com desdobramentos não apenas econômicos, mas também geopolíticos.
Três legislações aprovadas pelo Congresso estruturaram esta iniciativa: o Infrastructure, Investment and Jobs Act (IIJA), de novembro de 2021, o Creating helpful incentives to produce semiconductors and Science Act (CHIPS) e o Inflation Reduction Act (IRA), ambos de agosto de 2022. Juntos, estes Atos mobilizam cerca de US$ 2 trilhões em um prazo de dez anos e deram origem a 160 programas específicos.
A Carta IEDI de hoje retoma este tema já tratado em outras oportunidades, como na Carta n. 1083 e n. 1154, mas agora com uma perspectiva mais voltada à sua implementação e significados para outros países, como o Brasil. Para isso, recorre ao estudo recentemente divulgado pela CEPAL “From Legislation to Implementation: building a new industrial policy in the United States”, de autoria de Raquel Artecona, Helvia Velloso e Hoa Vo.
Por meio destas iniciativas, os EUA buscam estimular o desenvolvimento e difusão de tecnologias verdes e fortalecer cadeias produtivas críticas para a competitividade futura, notadamente semicondutores e baterias, ganhando vantagem sobre as aspirações chinesas de se tornar uma potência global em tecnologias avançadas e reduzindo a dependência dos EUA de bens e insumos produzidos por países sujeitos a tensões geopolíticas.
Os investimentos em infraestrutura previstos no plano Biden, além de dinamizarem regiões menos favorecidas e criarem resiliência frente às mudanças climáticas, também funcionam como potenciais fontes de demanda e tiveram estreitada sua vinculação com a produção industrial nacional. Exigências de conteúdo local para acessar benefícios fiscais e priorização nas compras governamentais são mecanismos que vêm sendo empregados.
Os autores do estudo enfatizam, porém, que a execução do plano é permeada por importantes desafios ao exigir a coordenação de inúmeras agências federais, distintas esferas governamentais, tecnologias múltiplas e um envolvimento intenso do setor privado. As dificuldades são organizadas em cinco frentes no estudo:
1. A escala do plano Biden exige uma oferta massiva de mão-de-obra qualificada e especializada em áreas críticas que leva tempo a ser formada; a interdependência das iniciativas impede abordagens e acompanhamento de programas individualizados; o gerenciamento dessas interdependências exigirá uma documentação extensiva produzida por diversas agências federais envolvidas.
2. A complexidade dos objetivos demanda tolerância com “curvas de aprendizado” para cada programa e requer a implementação de incentivos apropriados para os agentes privados e uma boa compreensão da dinâmica dos mercados relevantes; como o arcabouço desenhado está baseado na colaboração, posturas individualizadas precisam ser evitadas.
3. Para uma adequada accountability, há dificuldades para mensurar o impacto dos recursos disponibilizados pelos Atos e acompanhar sua execução evitando desperdícios. Será importante, portanto, segundo os pesquisadores da Cepal, definir com clareza as autoridades responsáveis por cada programa e pela tomada de decisões, assim como hierarquizar os objetivos e criar métricas claras para avaliação das políticas.
4. Quanto ao desenvolvimento regional, há o risco de que os governos locais não estejam em condições de tirar o máximo proveito do Plano Biden; além disso, o IRA opera sobretudo por meio do apoio a agentes privados, para quem os investimentos nestas regiões podem não se justificar.
5. Como as iniciativas do plano Biden tem critérios de proveniência de produtos e componentes (conteúdo local), podem gerar conflitos com a política externa (a exemplo da reação da União Europeia), levando a retalhações e prejudicando o dinamismo econômico no curto prazo. Harmonizar política industrial, política comercial e relações externas é um importante desafio.
Cabe observar que muitos destes desafios apontados pelo estudo para o caso dos EUA também são frequentemente apontados para o caso brasileiro, cuja estratégia Nova Indústria Brasil (NIB) foi divulgada recentemente, em jan/24.
Embora avaliem ser cedo para mensurar potenciais impactos do plano Biden, em especial do IRA, os pesquisadores da Cepal indicam alguns sinais preliminares:
• Desde a aprovação do IRA e do CHIPS Act, foram anunciados mais de 110 projetos industriais de larga-escala, segundo levantamento do Financial Times citado no estudo da Cepal;
• Os projetos identificados são variados, com destaque para veículos elétricos, baterias e equipamentos para energia solar e eólica, mas predominam aqueles relacionados à produção de semicondutores (Intel, TSMC, IBM e Micron).
• Novos hubs industriais estão surgindo, em função da diversificação regional dos investimentos, com Georgia e Carolina do Sul tendo recebido, por enquanto, o maior número de projetos.
• Em relação ao investimento direto externo (IDE), predominam aqueles advindos de empresas sul-coreanas e europeias.
• Com relação à mão-de-obra, análises de empresas ou associações empresariais indicam escassez de engenheiros e cientistas de computação, mas também de trabalhadores da construção civil.
• Do ponto de vista do comércio, o Center for Economic Policy Research (CEPR) estima perda entre -0,2% e -0,9% do comércio global, mas pode ser muito maior em alguns setores, como o de equipamentos elétricos e óticos, que inclui baterias, variando entre -1% e -6%.
O estudo da CEPAL identifica dois vetores de impacto do plano Biden para a América Latina e ao Caribe (ALC). A “transição verde” e as tensões geopolíticas atuais favorecem um grande aumento na demanda dos EUA por minerais e insumos críticos que são abundantes na região.
Adicionalmente, o estimular a reconfiguração das cadeias globais de valor (CGV) em busca de resiliência, países mais próximos geograficamente dos EUA e mais confiáveis do ponto de vista geopolítico surgem como destacados candidatos a receber investimentos estrangeiro não apenas dos EUA mas de outros países considerados como mais vulneráveis a conflitos geopolíticos.
Em decorrência, os autores do estudo enfatizam o potencial aumento de investimentos em alguns da ALC, assim como a ampliação das importações de insumos produzidos na região. Esse fenômeno beneficiará, segundo eles, especialmente países com os quais os EUA têm acordos de livre comércio, como é o caso de muitos países da região, a exemplo do México.
Introdução
O estudo “From Legislation to Implementation: building a new industrial policy in the United States”, de autoria de Raquel Artecona, Helvia Velloso e Hoa Vo, e publicado na série “Studies and Perspectives”, da CEPAL, faz uma análise de três importantes peças legislativas elaboradas pelo Governo Biden e aprovadas pelo Congresso estadunidense nos últimos anos, e que têm como claro objetivo o fomento à indústria nacional. São elas:
• Infrastructure Investment and Jobs Act (IIJA), de nov/21;
• Creating helpful incentives to produce semiconductors and Science Act (CHIPS), de ago/22; e
• Inflation Reduction Act (IRA), também de ago/22.
Em conjunto, estes três atos autorizam a destinação de mais de US$ 2 trilhões, em dez anos, para o aprimoramento da infraestrutura nacional, a aceleração da transição verde e o fortalecimento das competências tecnológicas e industriais domésticas, com destaque para semicondutores.
Associadamente, espera-se que os impactos sociais sejam também relevantes, sobretudo no que diz respeito à geração de empregos, capacitação da mão-de-obra e redução das desigualdades. O volume de investimentos previstos para promover o aumento da competitividade da indústria nacional não encontra paralelos na história dos Estados Unidos da América (EUA), segundo os autores do artigo.
Esse pacote de medidas vem na esteira de uma revitalização dos debates sobre política industrial em diversas partes do mundo e de uma mudança na opinião pública estadunidense em relação à pertinência de maiores intervenções do Estado na economia.
Nesse bojo, os Atos procuram enfrentar alguns dos desafios estruturais que vêm afetando a economia do país nas últimas décadas e que se explicitaram com a pandemia de COVID-19 e os conflitos geopolíticos recentes. Mas se o contexto permitiu a aprovação desses atos, que constituem um grande arcabouço de política industrial, sua implementação é permeada por importantes desafios.
O estudo de Artecona e seus coautores se dedica, em um primeiro momento, a uma apresentação sumarizada desses três Atos e, então, a uma discussão sobre os desafios relativos à passagem da legislação à implementação dessa “nova política industrial”.
A busca por um reequilíbrio entre ações do governo e forças de mercado
A aprovação dos três Atos anteriormente mencionados no Congresso dos EUA revela uma mudança importante na estratégia de ação do governo federal estadunidense, sobretudo por constituir um pacote de medidas amplo e ambicioso de política industrial, inclusive com a proteção de empresas em setores considerados estratégicos.
Outro ponto destacado pelos autores é que, em geral, os Atos priorizam o oferecimento de recompensas aos agentes que aderirem às medidas, ao invés de punições aos que não aderirem.
O debate econômico é permeado por polêmicas a respeito da pertinência de políticas industriais, já que elas inerentemente se associam a intervenções do governo no mercado, podendo gerar ineficiências. O contexto atual, no entanto, vem gerando uma renovação no interesse por política industrial, sobretudo por três motivos:
i) a percepção de que o crescimento econômico deveria ser mais sustentável e inclusivo;
ii) a clareza sobre a necessidade de redução da vulnerabilidade da economia nacional nos momentos de desorganização das CGVs;
iii) os receios relativos às tensões geopolíticas e seus impactos socioeconômicos.
Esse contexto favoreceu um consenso entre os policymakers estadunidenses sobre a necessidade de políticas que estimulassem inovações e favorecessem a competitividade da economia nacional.
O IIJA, o CHIPS Act e o IRA constituem, portanto, os pilares centrais do que os autores chamam de uma “nova política industrial”, voltada a reconfigurar a economia estadunidense por meio da priorização de empresas, setores industriais e atividades econômicas específicas. As medidas de estímulo são variadas, passando por incentivos fiscais, subsídios, desenvolvimento de infraestrutura, regulação protecionista e apoio a pesquisa e desenvolvimento (P&D).
O estudo define política industrial como um conjunto de ações voltadas à promoção de determinados setores que o governo entende como estratégicos para o atingimento de certos objetivos. Para tanto, a política industrial precisa ir além de meras intervenções voltadas a corrigir falhas de mercado, que são mais amplamente aceitas no debate contemporâneo.
O CHIPS and Science Act, por exemplo, baseia-se em três componentes centrais: um incremento nos investimentos em ciência e tecnologia, aumentando as condições de competição com a China; um estímulo ao deslocamento de etapas da CGV de semicondutores para os EUA ou para países considerados como aliados; e restrições ao comércio, aos investimentos e aos fluxos de transferência de tecnologia para a China.
Essa revitalização de uma política industrial nos EUA vem suscitando reações diversas, segundo o estudo.
Por um lado, os críticos alegam que a priorização de certos setores e empresas associa-se sempre ao perigo de que as decisões do governo sejam capturadas por interesses privados; e de que o protecionismo gera pressões inflacionárias e torna mais lenta a transição energética, já que os equipamentos chineses são hoje os mais baratos.
Por outro lado, apoiadores dessa nova política entendem que essa intervenção estatal é necessária para curar feridas sociais e ambientais causadas pelo período chamado por Dany Rodrik de “hiperglobalização” e, nas palavras do autor, para “estabelecer para o futuro um formato mais saudável de globalização”.
O estudo divulgado pela Cepal ponta que o governo Biden reage às críticas alegando que o pacote é necessário para que os EUA tenham uma economia resiliente e sustentável diante dos desafios econômicos e geopolíticos contemporâneos.
Para enfrentar as fragilidades estruturais da economia estadunidense, os três Atos voltam-se à promoção da competitividade industrial e à criação de garantias quanto ao acesso a materiais e produtos críticos, associadas ao desenvolvimento de tecnologias ambientalmente sustentáveis, ao aumento da oferta de bons postos de trabalho e à redução das desigualdades.
Quando tomou posse, em janeiro de 2021, o diagnóstico do governo Biden indicava quatro grandes desafios a serem enfrentados: i) a fragilização da base industrial nacional; ii) as disputas geopolíticas, sobretudo com a China; iii) a crise climática e a urgência de uma transição energética; iv) as desigualdades e as decorrentes ameaças à democracia.
A resposta a essa situação também foi desenhada em quatro frentes, que envolvem um compromisso do governo de maior integração de suas políticas doméstica e externa. São elas:
i) uma estratégia industrial que priorize setores considerados como essenciais para o crescimento econômico e para a segurança nacional;
ii) uma política externa propícia à participação de parceiros estratégicos nessa rede de resiliência e inclusão;
iii) para a construção dessa rede, inovações no campo das parcerias internacionais, para que elas não se limitem apenas aos tradicionais acordos comerciais;
iv) a mobilização de recursos financeiros para investimentos em mercado emergentes – em uma clara resposta à Belt and Road Initiative, da China.
De fato, a pandemia de COVID-19 trouxe à luz vulnerabilidades importantes da economia estadunidense, segundo os autores do estudo. Para lidar com elas, os três Atos, em conjunto, visam ao fomento do maior volume de investimentos da história do país, por meio da mobilização de recursos públicos e privados.
Artecona, Velloso e Vo lembram que Janet Yellen, Secretária do Tesouro dos EUA – que tem importância crucial para o sucesso do programa –, caracteriza esse arcabouço de política como “modern supply-side economics”, ou seja, que prioriza as condições de produção em relação aos estímulos pelo lado da demanda. Mais especificamente, Yellen defende que o pacote de medidas terá três impactos relevantes sobre a economia estadunidense, discutidos a seguir.
Em primeiro lugar, os três Atos permitirão um aumento da capacidade produtiva nos EUA, já que mobilizam um montante elevado de recursos para financiamento a investimento, algo que vinha sendo negligenciado nas últimas décadas.
No ranking do Fórum Econômico Mundial, os EUA ocupam apenas a 13ª colocação no critério de qualidade da infraestrutura. As novas peças legislativas procuram corrigir essa fragilidade, incentivando investimentos em estradas, portos e transporte público, mas também levando internet de alta velocidade para regiões mais carentes do país.
No que concerne aos investimentos em P&D como percentual do PIB, os EUA hoje ocupam apenas a décima posição no globo. Para lidar com esse problema, o CHIPS Act busca elevar a competitividade do país em tecnologias disruptivas, tais como energias renováveis e semicondutores.
Para tanto, prevê investimentos de US$ 280 bilhões nos próximos dez anos, com US$ 200 bilhões indo para P&D (incluindo comercialização) e US$ 57,2 específicos para a indústria de semicondutores (incluindo P&D e capacitação de mão de obra), além de U$ 24 bilhões em crédito tributário para a produção de chips. Adicionalmente, o IRA – a ser discutido em detalhes abaixo – destina US$ 370 bilhões para investimentos voltados a sustentabilidade, segurança energética e redução dos preços de energia.
Em segundo lugar, Yellen destaca que o pacote de medidas aumentará significativamente a resiliência econômica dos EUA, sobretudo por suas ações em dois campos críticos: energia e semicondutores. Se na década de 1990 os EUA detinham 37% da produção global de semicondutores, essa participação caiu para 12% em 2022. Desde a assinatura do CHIPS Act, no entanto, a Associação da Indústria de Semicondutores já contabiliza ao menos 50 novos projetos relativos a esse ecossistema.
No que concerne aos choques oriundos dos eventos climáticos, que se tornaram nos últimos anos mais frequentes e mais fortes, o IIJA destina US$ 50 bilhões para a resiliência climática – além dos recursos do IRA alocados para o combate à mudança climática, mencionados acima.
O estudo destaca ainda que os Atos estimularam um aumento muito expressivo nos gastos para construções relativas ao setor manufatureiro. Do fim de 2021 a meados de 2023, esses gastos dobraram em termos reais para o total da manufatura; e quase quadruplicaram para construções relativas à manufatura nos setores elétrico, eletrônico e computadores. Em relação ao Investimento Direto Estrangeiro (IDE) nos EUA, a tendência foi a mesma, como mostra o gráfico abaixo.
Por fim, os gastos públicos com construção relativa à infraestrutura pública também já aumentaram substancialmente, por exemplo com o fornecimento de água e a melhoria de ruas e rodovias. Os autores destacam que não há registros de que esses investimentos públicos estejam gerando um crowding-out dos investimentos privados.
Em terceiro lugar, os Atos não são apenas pró-crescimento, mas também pró-justiça social, segundo os autores do estudo da Cepal. Com esse intuito, são estimulados investimentos em regiões ou comunidades que foram até então negligenciadas, permitindo um aumento da produtividade nesses locais que ao fim tenderá inclusive a aumentar o retorno dos investimentos. Em paralelo, há ações do IRA voltadas à construção de um sistema tributário mais justo e de combate à evasão fiscal de grandes empresas e de indivíduos de alta renda (detalhes na Parte III).
Os desafios para a execução dos Atos
IIJA, CHIPS Act e IRA combinam gastos diretos do setor público com medidas indiretas de fomento ao gasto, tais como subvenções, incentivos fiscais e garantias para empréstimos, em um intervalo de dez anos.
Conjuntamente, os três Atos do governo Biden autorizam a destinação de mais de US$ 2 trilhões de fundos federais e incentivos voltados a lidar com a fragilização da estrutura produtiva dos EUA, a crise climática e os desafios impostos pela ascensão chinesa.
Esses Atos, contudo, apresentam importantes desafios para sua plena execução. Afinal, as leis e o arcabouço de política industrial desenhado exigem a coordenação de inúmeras agências federais, distintas esferas governamentais, tecnologias múltiplas e um envolvimento intenso do setor privado.
A coordenação dessas leis e das iniciativas delas derivadas em um esquema coerente é, portanto, uma tarefa extremamente complexa, cujos principais desafios, segundo os autores do estudo divulgado pela Cepal, podem ser resumidos em cinco categorias.
Escala. Em primeiro lugar, porque os três Atos são interdependentes e uma abordagem isolada sobre cada programa gerará ineficiências; em segundo lugar, o gerenciamento dessas interdependências exigirá uma documentação extensiva e uma miríade de relatórios cruzados entre as diversas agências federais envolvidas; em terceiro lugar, porque a escala pretendida para os investimentos e a transformação estrutural almejada exigirão uma oferta massiva de mão-de-obra qualificada e especializada nos setores priorizados.
Complexidade. O primeiro desafio advém da necessidade de coordenação não apenas de múltiplos atores, mas também de múltiplos objetivos; em segundo lugar, da curva de aprendizado exigida para cada programa – lembrando que, conjuntamente, os três Atos resultaram na criação de mais de 160 programas. Um terceiro desafio se impõe porque posturas individualizadas devem ser evitadas, já que o arcabouço desenhado se baseia na colaboração entre entes públicos e privados, o que requer a implementação de incentivos apropriados para os agentes privados e uma boa compreensão da dinâmica dos mercados relevantes.
Accountability. Neste caso, um primeiro desafio consiste na dificuldade em determinar quem são os responsáveis pelos fundos recebidos; em seguida, há dificuldades para mensurar o impacto desses fundos e, um terceiro desafio é evitar o desperdício de recursos. Será importante, portanto, segundo os pesquisadores da Cepal, definir com clareza as autoridades responsáveis por cada programa e pela tomada de decisões, assim como hierarquizar os objetivos e criar métricas claras para avaliação das políticas.
Implementação justa. O arcabouço desenhado pelo “Plano Biden” prevê a destinação de investimentos para áreas menos desenvolvidas, mas há o risco de que os governos locais não estejam em condições de tirar o máximo proveito dessa nova legislação; além disso, o IRA baseia-se prioritariamente na provisão de recursos para agentes privados, com riscos potenciais de gerar injustiças e desigualdades de oportunidades.
Harmonização das políticas industrial, comercial e externa. Diferentemente das políticas de livre comércio das últimas décadas, os pesquisadores da Cepal argumentam que a política industrial elaborada por meio desses três Atos do governo Biden tem um forte componente de discriminação geográfica em relação à proveniência dos produtos e componentes, podendo gerar importantes conflitos com a política externa do país, conforme será discutido em maiores detalhes mais à frente.
Características do Inflation Reduction Act (IRA)
O IRA foi aprovado em 16 de agosto de 2022, como parte da Agenda “Build Back Better”, do presidente Biden. A expectativa é que seus resultados econômicos e sociais de maior relevância comecem a ser sentidos apenas em 2024-25, mas quando o Ato completou um ano de existência, análises de diversas fontes já indicavam importantes desdobramentos:
• 270 novos projetos relacionados a energias renováveis (totalizando investimentos de US$ 132 bilhões);
• anúncios de projetos de tecnologias verdes e de semicondutores que, somados, chegam a US$ 224 bilhões e prometem criar 100 mil novos postos de trabalho;
• projetos em 44 estados, criando 176 mil novos empregos relacionados a energia limpa.
Tudo indica, portanto, que os incentivos do IRA, em complemento aos dois outros Atos, estão acelerando a criação de postos de trabalho, com diversidade regional, como originalmente previsto.
De toda forma, a aderência desses impactos às ambições iniciais do pacote de medidas dependerá de como o setor privado reagirá aos incentivos oferecidos. Esta reação, por sua vez, está vinculada ao desempenho macroeconômico do país e das tendências percebidas no que concerne ao desenvolvimento tecnológico e ao aparato regulatório.
Mas afinal, do que se trata o IRA, perguntam-se os autores do estudo. A peça legislativa define três principais áreas para ação:
• combate à mudança climática e fomento a energias limpas;
• melhorias no sistema de saúde;
• e redução do déficit público federal.
Para tanto, são previstas importantes ações relativas tanto a receitas como a gastos públicos.
Do ponto de vista das receitas públicas, espera-se viabilizar um aumento de US$ 739 bilhões na arrecadação, no intervalo de uma década. Isso seria feito por meio de alguns instrumentos:
• criação do “Corporate Alternative Minimum Tax” (CAMT), que impõe um nível mínimo de 15% para o imposto sobre a receita das grandes empresas (aquelas com receita anual média acima de US$ 1 bilhão).
• reforma no mecanismo de precificação dos medicamentos prescritos no âmbito do Medicare, com penalidades para empresas que reajustarem o preço de alguns medicamentos acima do nível da inflação.
• Alocação de US$ 79,4 bilhões para o Internal Revenue Service (IRS) aprimorar seus serviços, modernizando seus sistemas e fortalecendo sua capacidade de fiscalizar e garantir o cumprimento das obrigações tributárias dos agentes da economia – no entanto, acordos posteriores no Congresso reduziram em US$ 21,4 bilhões o montante inicialmente alocado para esse fim.
• Por fim, a lei criou um novo imposto de 1% sobre empresas para buyback de ações.
Com relação aos gastos, o IRA aloca US$ 369 bilhões para investimentos relacionados a segurança energética e combate às mudanças climáticas – detalhes abaixo – e US$ 64 bilhões para uma ampliação do sistema de saúde (Affordable Care Act), além de US$ 4 bilhões para lidar com a seca do Oeste do país.
Com essa estimativa de gastos totalizando um pouco mais de US$ 400 bilhões e a esperança de um aumento da arrecadação que supere os US$ 700 bilhões, a expectativa é que o Ato tenha como saldo uma contribuição de aproximadamente US$ 300 bilhões para o orçamento federal estadunidense, colaborando com o objetivo de redução do déficit fiscal no país nos próximos anos.
A principal frente de atuação do IRA diz respeito à segurança energética e ao combate à mudança climática. Dos US$ 369 bilhões estimados para esse fim, cerca de dois terços referem-se a créditos tributários federais, a serem concedidos a empresas e consumidores, e o restante para gastos diretos. O objetivo é ao mesmo tempo incentivar a produção de energias limpas e reduzir o custo de sua adoção por parte dos consumidores.
Os créditos tributários para produção e investimento representam mais de 1/3 dos recursos alocados pelo IRA para questões energéticas e climáticas. Essa modalidade de crédito autoriza as empresas a deduzirem, dos impostos federais que incidem sobre suas receitas, uma parcela dos custos da adoção ou expansão de sistemas de energia renovável. Para os investimentos, definiu-se que 6% a 30% dos custos com sistemas de energias renováveis podem transformar-se em crédito tributário.
Para a produção, o crédito é concedido por kilowatt/hora (KWh) de geração de energia limpa, durante os dez primeiros anos de operação. Os valores do crédito tributário dependem do tipo de energia, do porte do projeto e do cumprimento de certos requisitos laborais.
Esses valores podem ser acrescidos por bônus outorgados a projetos que cumpram requisitos relativos ao uso de produtos e insumos produzidos nos EUA ou que sejam realizados em determinadas regiões ou áreas do país, como ilustra a tabela abaixo.
Projetos relativos a sistemas de energia renovável são qualificáveis para créditos de investimento ou produção, mas não podem se beneficiar de ambos simultaneamente.
O Ato prevê também a provisão de crédito tributário para instalações responsáveis pela captura ou sequestro de dióxido de carbono na atmosfera, por doze anos após sua implementação, e com valores que variam de US$ 60/tonelada de CO2 reutilizado e U$ 85/tonelada de CO2 permanentemente armazenado.
Adicionalmente, oferece crédito, até 2032, para plantas de energia nuclear já existentes e que produzam eletricidade sem emissão líquida de carbono. Ainda, provê crédito para a produção de combustíveis limpos para transporte, produção industrial e aviação, o que inclui biodiesel e hidrogênio verde.
Nessas modalidades, o cumprimento a requisitos laborais também é condição para a concessão do crédito ou permite bonificações.
Como indicado acima, o IRA também prevê créditos tributários pelo lado do consumo, a contribuintes individuais. Para estimular o uso de energia limpa ou medidas que aumentem a eficiência no consumo de energia, são previstos créditos para determinados tipos de equipamento, como painéis solares, equipamentos de produção doméstica de energia eólica e mecanismos de isolamento térmico.
Complementarmente, são oferecidos créditos de até US$ 7.500 para a compra de veículos elétricos ou a hidrogênio, desde que respeitados certos requisitos de conteúdo local em veículos e certos componentes. Estes critérios, apontam os pesquisadores da Cepal, visam ao aumento da resiliência na cadeia de suprimentos, já que no momento da aprovação da lei, certa de 70% das baterias de lítio importadas eram provenientes da China.
Assim, para qualificar-se para o crédito tributário, os veículos elétricos devem ser produzidos na América de Norte, possuir um percentual mínimo – e crescente ao longo do tempo – dos componentes da bateria produzidos no subcontinente e dos metais críticos extraídos ou processados nos EUA ou países com os quais os EUA tenham acordos de livre comércio.
Cabe enfatizar que importantes aliados dos EUA – incluindo Europa, Japão e Coreia do Sul – reagiram fortemente a essas medidas, considerando-as discriminatórias, e o governo estadunidense acabou por ceder em alguns pontos – autorizando, por exemplo, o crédito tarifário mencionado acima para veículos elétricos adquiridos por empresas de leasing, independentemente da origem do veículo e da bateria.
Para veículos elétricos usados, são também oferecidos créditos tarifários de US$ 4.000 ou 30% do valor do veículo (o que for menor), desde que o veículo tenha menos de dois anos e seu valor seja inferior a US$ 25.000. Para a concessão desses créditos para a aquisição de veículos elétricos, há também alguns requisitos relativos ao perfil do consumidor – em particular à sua renda.
O IRA não definiu um limite para o montante total de crédito tributário que poderá ser fornecido nos próximos dez anos, conferindo um grande grau de incerteza ao impacto orçamentário dos programas. De acordo com algumas análises, as medidas estão se tornando populares, de forma que as estimativas iniciais do governo podem estar bastante subestimadas.
Para além da opção de abatimento de tributos, o IRA abre também a possibilidade de monetização do crédito tributário, com duas opções distintas.
Em primeiro lugar, há a opção do “pagamento direto”, no qual o crédito se transforma em uma renda para o beneficiário. Isso é possível para agentes não tributados, como governos subnacionais e cooperativas elétricas rurais, e para algumas modalidades de crédito de investimento ou produção relativas a energia renovável.
Em segundo lugar, há a opção de “transferência”, na qual os agentes transferem seu crédito a terceiros, em troca do valor monetário correspondente. No caso de veículos elétricos, esse crédito é transferido ao vendedor, que o transforma em desconto no preço de venda.
Como aventado acima, os bônus e provisões adicionais de crédito tributário são oferecidos em função do cumprimento de certos requisitos relativos a conteúdo local em produtos e insumo, condições de trabalho e local do investimento/produção.
As cláusulas de conteúdo doméstico são parte do esforço para redinamizar a indústria estadunidense, com atenção particular aos setores de aço e ferro, além daqueles relacionados à transição energética.
Os requisitos laborais visam ao incremento dos postos de trabalho de qualidade – em particular na indústria de energia limpa – e à capacitação de mão-de-obra para responder à demanda desses setores priorizados.
Por fim, os quesitos associados às localidades têm o intuito de fomentar investimentos relativos à energia limpa em comunidades de baixa renda ou naquelas que historicamente foram muito dependentes da indústria de combustíveis fósseis.
Por fim, o IRA prevê gastos diretos do setor público, voltados à conservação ambiental e à transição energética:
• são alocados US$ 21 bilhões para programas de conservação agrícola e florestal e sequestro de carbono;
• cerca de US$ 100 bilhões para programas de empréstimos voltados à transição energética;
• cerca de US$ 10 bilhões em gastos diretos para o aprimoramento da eficiência energética residencial;
• US$ 27 bilhões para o Greenhouse Gas Reduction Fund, que oferece compensações financeiras (grants) para projetos de combate à mudança climática em comunidades de baixa renda; e
• US$ 1 bilhão para o Methane Emission Reduction Program, que oferece assistência técnica e financeira para a redução das emissões de metano nos setores de petróleo e gás natural, além de cobrar uma determinada taxa para a emissão de metano de determinadas fontes.
Estimativas dos efeitos iniciais do IRA
Com pouco mais de um ano desde a assinatura do IRA, ainda não é possível conhecer com exatidão seus efetivos impactos socioeconômicos e o conjunto das dificuldades para sua plena implementação. No entanto, algumas análises já podem ser feitas a esse respeito, segundo o estudo da Cepal.
Do ponto de vista do comércio, estima-se que os impactos do Ato não serão grandes. De acordo com o Center for Economic Policy Research (CEPR), o comércio global deve sofrer uma perda pequena, entre -0,2% e -0,9%.
No entanto, em função do escopo dos programas, o impacto sobre determinados setores – como o elétrico ou de equipamentos óticos, que inclui baterias – tende a ser mais forte, variando entre -1% e -6% do conjunto do comércio global. Para alguns países, os efeitos serão ainda maiores. Para as exportações da USMCA (ou “NAFTA 2.0”), as perdas estimadas vão de 10% a 45% e para as da China, de -10% a -50%.
Um importante impacto esperado é a realocação de certas etapas da produção em determinadas CGV, com os objetivos de reshoring, nearshoring ou friendshoring. Como visto acima, o intuito é aumentar a atratividade dos EUA para investimentos em energia renovável, redinamizar o setor industrial no país – com consequente geração de postos de trabalho industriais –, passando também por um aumento da competitividade da indústria nacional.
Em termos gerais, esse movimento deve ter impactos positivos sobre a competitividade, a produção industrial e o market-share dos EUA, às custas de prejuízos para os países que perderão empresas industriais. Por exemplo, as estimativas relativas ao setor de equipamentos elétricos e óticos, discutido acima, indicam que os EUA deverão ganhar 9% de market-share, com uma perda de 6% da China.
Em relação ao PIB, estudos indicam ganhos expressivos para EUA, com correspondentes perdas para UE e China, como mostra a figura a seguir.
Por mais que essas perdas não sejam tão grandes para o conjunto das economias europeia e chinesa, as análises setoriais são novamente relevantes e estimam perdas de respectivamente 1,6% e 2,4% na produção relativa a esse setor na UE e na China, com um ganho de 15% nos EUA.
Assim, as ações “Made in America” embutidas no IRA já geraram tensões nas relações diplomáticas dos EUA com alguns de seus aliados, que reclamam que o governo dos EUA deve levar em conta os efeitos colaterais de suas políticas sobre os parceiros globais. Um outro efeito colateral indesejado – e questionado pela UE – é que as distorções causadas nas CGV e nos fluxos comerciais podem atrasar a transição energética.
Em relação à migração para veículos elétricos, os autores do estudo lembram que os EUA estão bastante atrasados em relação à UE e à China, em função de uma preferência dos consumidores por carros maiores e com grande autonomia, mas também dos altos preços dos elétricos.
Uma primeira política voltada a essa transição foi adotada com o American Recovery and Reinvestment Act, de 2009, que também oferecia créditos tributários, mas limitados a 200 mil unidades de veículos, gerando um impacto muito pequeno no mercado doméstico estadunidense, como ilustra o gráfico abaixo. A expectativa é que os impactos do IRA sejam bem maiores, até mesmo pela ausência de um limite para o número de beneficiários do crédito tributário.
De acordo com um levantamento do Financial Times citado no estudo da Cepal, desde a aprovação do IRA e do CHIPS Act, foram anunciados mais de 110 projetos industriais de larga-escala. Os projetos são variados, incluindo veículos elétricos, baterias e equipamentos para energia solar e eólica, mas predominam aqueles relacionados à produção de semicondutores, com novos investimentos da Intel, Taiwan Semiconductor Manufacturing Company, IBM e Micron.
O levantamento também revelou o surgimento de novos hubs industriais, em função da diversificação regional dos investimentos, com Georgia e Carolina do Sul tendo recebido, por enquanto, o maior número de projetos. Em relação ao capital estrangeiro, predominam os investimentos de empresas sul-coreanas e europeias.
Nota-se, portanto, que já há impactos importantes e concretos. No entanto, a falta de mão-de-obra qualificada e eventuais restrições na oferta de matérias-primas são potenciais obstáculos à plena implementação e execução do IRA. Com relação à mão-de-obra, análises de empresas ou associações empresariais indicam escassez de engenheiros e cientistas de computação, mas também de trabalhadores da construção civil.
Em suma, o IRA congrega um conjunto de políticas bastante amplo e ambicioso, tratando-se de uma peça legislativa com importância histórica. No entanto, sua plena implementação é um processo ainda em aberto e com desafios bastante diversos e que não dizem respeito apenas às complexidades internas à lei e à sua execução, mas também ao risco de mudanças no ambiente macroeconômico e geopolítico.
Oportunidades e desafios para a América Latina e o Caribe
Embora elaborados para atender a objetivos domésticos, esses três importantes Atos aprovados nos EUA têm fortes impactos sobre muitos outros países do globo e sobre suas políticas econômica e industrial.
Em relação à América Latina e ao Caribe (ALC), a situação não é diferente, segundo o estudo da Cepal. Em particular, há dois vetores que favorecem um grande aumento na demanda dos EUA por minerais e outras matérias primas que são abundantes na região, quais sejam, a transição verde e as tendências geopolíticas.
Em relação à transição verde, a demanda por esses minerais e materiais críticos exportados pelos países da ALC não deverá promover um boom passageiro, como ocorreu com a demanda chinesa por petróleo, carvão e ferro do início do século XXI, de acordo com o estudo.
Ao contrário, a transição verde exigirá investimentos por muitas décadas. Como a região concentra vastos depósitos de minerais críticos e metais, poderá beneficiar-se desse processo por um longo prazo. A título de ilustração, a ALC concentra quase 60% das reservas conhecidas de lítio no mundo; e Peru e Chile juntos detêm cerca de 30% das reservas exploráveis de cobre do planeta.
Além disso, a mineração e o processamento desses minerais são bastante intensivos em energia, o que favorece que ocorram na região, já que é grande o potencial latino-americano de oferta de energia renovável e com um dos menores custos do globo.
No tocante aos movimentos geopolíticos, o acirramento da rivalidade com a China leva os EUA a uma busca por diversificação das fontes de bens e matérias-primas, reforçando a tendência de elevação da demanda junto aos países latino-americanos.
O estudo divulgado pela Cepal enfatiza ainda que o market-share da China no mercado global de extração e processamento de minerais é tão grande que, a despeito de todos os estímulos associados aos três Atos, os EUA não serão capazes de substituir suas importações da China meramente por produção doméstica, precisando importar de outros países.
Adicionalmente, os EUA procuram também realocar etapas das CGV para países mais próximos geograficamente e mais confiáveis do ponto de vista geopolítico. Em decorrência, devem aumentar os investimentos estadunidenses em alguns países da ALC, assim como as importações de insumos produzidos na região. Esse fenômeno beneficiará especialmente países com os quais os EUA têm acordos de livre comércio, como é o caso de muitos países da região.
Por exemplo: para as cláusulas de proveniência relativas à provisão de créditos tributários em compras de veículos elétricos, prevista pelo IRA, são qualificáveis os minerais críticos fornecidos por Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá e Peru.
Por esta razão, há outro efeito destacado pelos pesquisadores da Cepal que é o fato de as empresas não estadunidenses (e.g. alemãs e sul-coreanas) também terem aumentado seus investimentos em países latino-americanos, buscando proximidade do mercado dos EUA. Esse fenômeno de nearshoring beneficia particularmente ao México, por sua proximidade geográfica e pelos acordos comerciais firmados com os EUA.
Se em um primeiro momento o IRA favorece a transição energética nos EUA, a expectativa é que ele venha a promover energias limpas em âmbito global. Assim, os países da ALC devem estar bem posicionados para se beneficiar dessas leis e de seus impactos sobre o processo de transição.
Para tanto, é importante um arcabouço legal que dê segurança aos investidores, com uma estrutura regulatória clara para o setor e processos de licenciamento suficientemente ágeis. Além disso, é recomendável que os países da região ofereçam garantias para o investidor internacional, com estabilidade macroeconômica, transparência e garantindo que as comunidades locais se beneficiem dos projetos.
Havendo sucesso na atração de capital estrangeiro, a região deve lidar com os eventuais riscos engendrados por um forte influxo de divisas, tais como uma excessiva apreciação das moedas nacionais e uma concentração de recursos na indústria extrativa, que resulte em escassez de recursos para outros setores industriais.
Para minorar esses riscos, o estudo da Cepal sugere que os governos possam intervir nos mercados cambiais e poupar os ganhos acumulados em momentos de preços elevados. Por sua vez, as empresas exportadoras podem valer-se do mercado futuro para proteger-se contra eventuais flutuações no preço de seus produtos.