Carta IEDI
O “pouso suave” da economia mundial
Para o FMI, a economia mundial mostrou-se surpreendentemente resiliente durante a desinflação global de 2022-2023 associada à política monetária restritiva na maioria das economias avançadas (EAs) e de mercado emergente e em desenvolvimento (EMED).
Em seu cenário básico, divulgado em abr/24, o Fundo projeta um crescimento global no mesmo ritmo registrado em 2023, isto é, de +3,2%, no biênio 2024-2025. Frente ao cenário anterior, de jan/24, houve uma revisão muito marginal para 2024, de +0,1 ponto percentual (p.p.), enquanto a projeção para 2025 não se alterou.
Em cenários de outras instituições, também divulgados recentemente, para 2024, a expansão do PIB global deve ser de +3,1%, segundo a OCDE (mai/24), e de +2,6%, de acordo com a UNCTAD (abr/24). Para 2025, a OCDE projeta um desempenho de +3,2%, mesma estimativa do FMI.
O balanceamento entre os grupos de países, segundo o cenário do FMI, deve ser pequeno de 2023 para 2024. A expansão esperada do PIB das EAs em 2024 é de +1,7% ante +1,6% em 2023. Esta projeção é +0,2 p.p. superior àquela de jan/24, como reflexo da revisão para cima do crescimento nos EUA, que mais do que compensou a revisão para baixo da área do Euro. Para 2025, o crescimento deve acelerar para +1,8% neste grupo de países, sem alteração frente ao cenário de jan/24.
Já para economias de mercado emergente e em desenvolvimento, o FMI prevê uma tênue desaceleração de +4,2% em 2023 para +4,1% em 2024 e 2025. Neste caso, apenas 2024 sofreu alteração em comparação com as projeções divulgadas em jan/24: +0,1 ponto percentual. A projeção para 2025 manteve-se a mesma.
Tal como já vinha ocorrendo para este grupo de países (Carta IEDI n. 1200), o Fundo avalia que seguirão ocorrendo disparidades regionais importantes. No cenário atual, o reforço do crescimento do PIB no Oriente Médio e na Ásia Central e África Subsaariana não será suficiente para compensar a desaceleração esperada na Ásia Emergente e em Desenvolvimento, Europa Emergente e em Desenvolvimento e América Latina e Caribe.
Dente as EMEDs, o desempenho mais fraco, segundo o FMI, será registrado pelo PIB latino-americano: +2,0% em 2024, implicando uma desaceleração frente a 2023 (+2,3%). Esta projeção, entretanto, foi ajustada em +0,1 p.p. em relação àquela de jan/24.
O Brasil contribuirá para esta perda de dinamismo da região, já que seu PIB deve crescer +2,2% em 2024 ante +2,9% em 2023, mas é o México que se destaca por uma maior perda de fôlego: de +3,2% em 2023 para +2,4% em 2024. Para estes dois países, a revisão das projeções caminhou em direção oposta: +0,5 p.p. no caso brasileiro e -0,3 p.p. no caso mexicano frente ao cenário de jan/24.
Para 2025, o PIB da América Latina e Caribe deve ganhar velocidade, registrando +2,5%, a despeito de nova desaceleração do Brasil (+2,1%) e principalmente do México (+1,4%). Ainda assim, vale notar que a revisão para cima do desempenho brasileiro em +0,2 p.p. anteo crescimento esperado em jan/24.
Ainda no grupo de países emergentes e em desenvolvimento, é importante destacar a evolução da China para os próximos anos, dado seu peso em nosso comércio exterior e sua influência para a evolução dos preços internacionais de commodities que exportamos.
O Fundo avalia que a economia chinesa terá um dinamismo econômico progressivamente mais fraco nos próximos anos, embora suas projeções não tenham se alterado em relação ao cenário de jan/24: +5,2% em 2023, +4,6% em 2024 e +4,1% em 2025. Na Ásia, ainda que também com uma perda de ritmo, a Índia deve apresentar uma performance superior a esta: +6,8% em 2024 e +6,5% em 2025.
Assim, se este quadro esperado pelo FMI vier a se confirmar, o ritmo de expansão da economia mundial seguirá abaixo da média histórica pré-pandemia: +3,2% em 2024-2025, como visto anteriormente, ante +3,8% ao ano entre 2000 e 2019. O diferencial, segundo o Fundo, deve-se aos efeitos de longo prazo da crise da Covid-19, mas também aos conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio, à crescente fragmentação geopolítica e ao fraco aumento da produtividade.
A evolução do comércio global de bens e serviços deve melhorar nos próximos anos, mas espera-se que fique abaixo do pré-pandemia e aquém do PIB mundial. No cenário básico, o FMI projeta aumento de +3% em 2024 e +3,3% em 2025 ante uma virtual estabilidade em 2023 (+0,3%). A taxa média de crescimento anual das duas décadas anteriores à pandemia (2000-2019), entretanto, chegava a +4,9%.
Outras hipóteses do cenário de referência do FMI incluem queda dos preços de commodities energéticas e do petróleo, ajudando no processo de arrefecimento da inflação mundial ao consumidor (de 6,8% em 2023 para 5,9% em 2024 e 4,5% em 2025), abrindo espaço para uma trajetória de redução das taxas básicas de juros nas EAs a partir do segundo semestre de 2024.
Ademais, o FMI espera que as EAs adotem uma política fiscal mais restritiva em 2024, enquanto que nas EMEDs, a orientação da política fiscal deve ser, em média, neutra, com um pequeno viés restritivo somente em 2025.
A ameaça de uma evolução adversa da economia global diminuiu desde out/23, resultando em um balanço de riscos mais equilibrado. Contribuiu para isso reduções da inflação mais rápidas do que o esperado em vários países. Todavia, vários riscos adversos continuam plausíveis, segundo o Fundo.
Entre os fatores que podem deprimir o dinamismo econômico mundial estão: novo repique dos preços das commodities no contexto de conflitos regionais; inflação persistente e estresse financeiro; recuperação chinesa vacilante; ajuste fiscal disruptivo e crise de dívida; falta de confiança no governo erodindo ritmo das reformas; intensificação da fragmentação geopolítica.
Do lado positivo, fatores expansionistas que podem vir a ocorrer incluem: aumento do gasto público devido a eleições; surpresas do lado da oferta que reduzam a inflação; aumento da produtividade devido à inteligência artificial e impulso às reformas estruturais.
De acordo com o FMI, na medida em que a economia global encaminha para um “pouso suave”, a prioridade de curto prazo dos bancos centrais é garantir que a inflação desacelere gradualmente.
Ao mesmo tempo, com a orientação da política monetária se tornando menos restritiva, um renovado foco na consolidação fiscal é necessário para restaurar o raio de manobra do orçamento, priorizar investimentos e garantir a sustentabilidade da dívida.
Além disso, intensificar reformas que melhorem o lado da oferta da economia facilitaria a redução da inflação e do endividamento, permitiria às economias retornarem às taxas de crescimento pré-pandemia e aceleraria a convergência níveis de renda mais elevados.
O reforça da cooperação multilateral, por sua vez, é necessária para limitar os riscos e os custos da fragmentação geopolítica e da mudança climática, acelerar a transição para a energia verde e encorajar a reestruturação das dívidas nas EMEDs.
Introdução
Esta Carta IEDI apresenta o cenário atual do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o desempenho da economia global em 2024 e 2025, divulgado no World Economic Outlook (WEO) de abril de 2024.
A primeira seção apresenta os principais dados deste cenário, bem como a de outras instituições multilaterais, a título de comparação. Nas seções seguintes, o cenário básico do FMI é detalhado por grupos de países, o balanço de riscos é sumarizado e, por fim, a última seção resume as recomendações de política do Fundo.
Cenário para a economia global
Para o FMI, a economia mundial mostrou-se surpreendentemente resiliente durante a desinflação global de 2022-2023 associada à política monetária restritiva na maioria das economias avançadas (EAs) e de mercado emergente e em desenvolvimento (EMED).
No cenário básico de abr/24, o FMI espera que o crescimento global seguirá no mesmo ritmo registrado em 2023 (3,2%) no biênio 2024-2025. Frente ao cenário de jan/24, houve uma revisão muito marginal para 2024, de 0,1 ponto percentual (p.p.), enquanto a projeção para 2025 não se alterou.
Tomando as expectativas mais recentes, isto é, veiculadas a partir de fev/24, cabe uma comparação com outros organismos multilaterais de destaque. Para 2024, a OCDE espera uma expansão de 3,1% e para 2025 de 3,2%, mesma projeção que o FMI. Já a UNCTAD tem um cenário mais pessimista, projetando um crescimento de 2,6% em 2024.
Todavia, se ao cenário básico do FMI se confirmar, o ritmo de expansão da economia mundial seguirá abaixo da média histórica (2000-2019), que foi de 3,8% ao ano, como reflexo das consequências de longo prazo da pandemia do Covid-19dos conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio, da crescente fragmentação geopolítica e do fraco crescimento da produtividade.
O cenário básico do FMI baseia-se nas seguintes hipóteses:
Preços das commodities: as projeções para as cotações das commodities em 2024 são mais favoráveis do que o observado em 2023. O Fundo projeta uma queda de 9,4% dos preços das commodities energéticas e de 2,5% do Petróleo decorrente da grande capacidade ociosa e forte crescimento da oferta pelos países que não pertencem à OPEC+. As projeções para as cotações do carvão e gás natural são de quedas mais significativas (-25,1% e -32,6%, respectivamente). O mercado de gás está tendendo ao equilíbrio devido ao aumento da oferta, redução da demanda e estoques elevados. Para as commodities não-energéticas, o FMI espera estabilidade, mas as cotações dos metais básicos devem cair 1,8% e dos alimentos 2,2% - percentual superior ao estimado em jan/24 devido a expectativas de oferta abundante de trigo e milho.
Comércio global: o volume do comércio global deve apresentar melhor desempenho na comparação com o ano passado, acelerando seu ritmo de crescimento de 0,3% em 2023 para 3% em 2024 – mas ainda abaixo da média anual de 4,9% registrada nas duas décadas anteriores à pandemia (2000-2019).
Política monetária: No atual cenário básico, o FMI projeta que as taxas de inflação nas principais EAs continuarão convergindo para as metas e as expectativas de inflação ancoradas. Neste contexto, as taxas de juros básicas nessas economias iniciarão sua trajetória descendente no segundo semestre de 2024.
As projeções para as taxas de juros no último trimestre de 2024 são: 4,6% nos Estados Unidos, 4,8% no Reino Unido e 3,3% na área do Euro (contra os patamares atuais de, respectivamente, 5,4%, 5,3% e 4%). No Japão, por sua vez, a taxa de juros básica deve aumentar gradualmente como reflexo da confiança crescente de que a inflação convergirá para a meta no médio prazo apesar do histórico deflacionário.
Política fiscal: o FMI projeta que as EAs devem adotar uma política fiscal mais restritiva em 2024. O balanço fiscal estrutural em porcentagem do PIB deve aumentar 1,9 ponto percentual (p.p.) nos Estados Unidos e 0,8% p.p. na área do Euro. Já nas EMEDs, a orientação da política fiscal deve ser, em média, neutra, com um pequeno viés restritivo somente em 2025 (0,2 p.p.).
Nas EAs a inflação deve retornar aos patamares próximos dos vigentes pré-pandemia (em torno de 2% em 2025) um ano antes das EMEDs (em torno de 5% em 2026). Todavia, espera-se grande de divergência no âmbito das EMEDs, com as projeções para a inflação variando entre 2,4% para a Ásia emergente e em desenvolvimento e 18,8% para a Europa emergente e em desenvolvimento.
Desempenho por grupo de países
No cenário básico do FMI, o crescimento nas EAs deve aumentar de 1,6% em 2023 para 1,7% em 2024. Essa projeção é 0,2 p.p. superior àquela de jan/24 como reflexo da revisão para cima do crescimento nos Estados Unidos, que mais do que compensou a revisão na direção oposta para a área do Euro. Para 2025, o crescimento deve acelerar para 1,8%, mesma previsão do cenário de janeiro.
Neste cenário, o crescimento da economia americana aceleraria de 2,5% em 2023 para 2,7% em 2024. Este percentual é 0,6 p.p. superior ao projetado em jan/24, como reflexo, principalmente, do efeito carry-over decorrente do crescimento maior do que esperado no quarto trimestre de 2023 e da expectativa que esse maior dinamismo deve persistir, ao menos em parte, em 2024. Para 2025, a projeção atual é de uma desaceleração para 1,9% associada à previsão de aperto fiscal e mercado de trabalho menos aquecido, que resultarão em menor dinamismo da demanda agregada.
Para a área do euro, o FMI prevê uma recuperação mais forte do que nos Estados Unidos, com uma aceleração de 0,4% em 2023 – em consequência da guerra da Ucrânia – para 0,8% em 2024 e 1,5% em 2025. A hipótese subjacente é de que esta recuperação será ancorada no maior dinamismo do consumo das famílias, num contexto de aumento da renda real associada à dissipação dos efeitos do choque de preços da energia e à queda da inflação.
Em comparação a jan/24, contudo, o ritmo esperado de expansão da área do euro para 2024 foi reduzido em 0,1 p.p. e em 0,2 p.p. para 2025. No caso da Alemanha, a expectativa para 2024 ficou 0,3 p.p. inferior ao projetado em jan/24, devido à persistência de baixa confiança dos consumidores, mas houve aumento da projeção de crescimento para a Bélgica e Portugal.
A projeção é também de aumento do crescimento no Reino Unido, de 0,1% em 2023 para 0,5% em 2024, mesma intensidade (+0,4 p.p.) que na área do Euro e também associada à dissipação dos efeitos dos altos preços da energia. A recuperação deve prosseguir em 2025, com um crescimento previsto de 1,5% na medida em que a queda da inflação permitirá um afrouxamento das condições financeiras e aumento da renda real.
O Japão, por sua vez, é a única EA para a qual a projeção é de desaceleração do crescimento, de 1,9% em 2023 para 0,9% em 2024, com uma ligeira recuperação em 2025 para 1%. A hipótese subjacente é de que os fatores que sustentaram o crescimento em 2023, incluindo o aumento do turismo doméstico, não persistirão.
Já para EMEDs, o FMI prevê uma módica desaceleração de 4,2% em 2023 para 4,1% em 2024 e 2025. Contudo, as divergências regionais persistirão. No cenário atual, o aumento do crescimento em duas regiões não será suficiente para compensar sua diminuição em três outras. No caso das economias em desenvolvimento de baixa renda, o crescimento deve aumentar de 4% em 2023 para 4,7% em 2024 e 5,2% em 2025.
A Ásia Emergente e em Desenvolvimento continuará sendo a região líder em termos de crescimento nesse grupo, mas registrará a maior desaceleração em 2024. O crescimento de seu PIB deve recuar de 5,6% em 2023 para 5,2% em 2024 (-0,4 p.p.) e 4,9% em 2025. O desempenho das duas principais economias da região está subjacente a esse cenário.
O crescimento chinês deve desacelerar de 5,2% em 2023 para 4,6% em 2024 e 4,1% em 2025, devido ao enfraquecimento do boom de consumo e do estímulo fiscal que sucedeu a pandemia do Covid-19 e à persistência dos problemas no setor imobiliário.
O crescimento da economia indiana também deve diminuir, mas se manterá mais elevado do que na China – 6,8% em 2024 e 6,5% em 2025 contra 7,8% 2023 – como resultado da demanda doméstica aquecida e do aumento da população em idade ativa.
A América Latina e o Caribe é a segunda região emergente e em desenvolvimento que deve desacelerar em 2024, mas em menor intensidade que a Ásia Emergente e em Desenvolvimento. O ritmo de expansão deve recuar de 2,3% em 2023 para 2% em 2024 (-0,3 p.p.). Todavia, ao contrário da sua congênere asiática, o crescimento latino americano volta a se acelerar para 2,5% em 2025.
No caso do Brasil, o crescimento deve diminuir de 2,9% em 2023 para 2,2% em 2024 e 2,1% em 2025 num contexto de efeitos defasados da política monetária restritiva, consolidação fiscal e menor contribuição da agricultura. A economia mexicana deve desacelerar ainda mais que a brasileira, de 3,2% em 2023 para 2,4% em 2024 e 1,4% em 2025 devido à política fiscal mais restritiva.
A Europa Emergente e em Desenvolvimento é a terceira região cujo crescimento desacelerará em 2024, mas em menor intensidade do que nas duas regiões precedentes. As projeções são de expansões de 3,1% em 2024 e 2,8% em 2025 contra 3,2% em 2023. O principal determinante dessa desaceleração é a dissipação dos efeitos do investimento e consumo privado robustos associados a um mercado de trabalho aquecido que possibilitou o crescimento dos salários.
Em contrapartida, o FMI espera que o dinamismo nas demais regiões emergentes e em desenvolvimento ganhará força. No Oriente Médio e Ásia Central, o crescimento registrará a maior aceleração entre as regiões emergentes e desenvolvimento, de 2% em 2023 para 2,8% em 2024 e 4,2% em 2025. Esta evolução positiva decorre, sobretudo, do desempenho da sua maior economia, a Arábia Saudita, que deve acelerar de uma taxa negativa em 2023 (-0,8%) para 2,6% em 2024 e 6% em 2025.
O crescimento na África Subsaariana também ganhará impulso, mas em menor intensidade do que a região precedente. As projeções são de taxas de crescimento de 3,8% em 2024 e 4% em 2025 contra 3,4% em 2023 num contexto de diminuição dos efeitos negativos de choques climáticos e melhora das condições de oferta.
As duas principais economias da região devem crescer a uma taxa mais elevada do que em 2023: a Nigéria deve acelerar de 2,9% em 2023 para 3,3% em 2024 e a África do Sul de 0,6% para 0,9% no mesmo período. A recuperação deve persistir em 2025, quando o crescimento deve atingir, respectivamente, 0,9% e 1,2%.
Balanço de riscos
Os riscos para o desempenho da economia global diminuíram desde out/23, resultando em um balanço de riscos mais equilibrado– após os vieses negativos dos cenários de abril e outubro de 2023. Com a inflação diminuindo mais rapidamente em vários países, os riscos para a inflação também se tornaram equilibrados. Todavia, vários riscos adversos continuam plausíveis. Os principais fatores de risco – tanto positivos como negativos - são sintetizados a seguir.
Do lado positivo, quatro fatores podem contribuir para que o crescimento seja maior do que o esperado no cenário básico.
(1) Política fiscal expansionista devido ao período eleitoral: vários países terão eleições para o governo nacional em 2024. Neste contexto, os decisores de política podem adiar o ajuste fiscal ou se comprometer com novos estímulos. Esta hipótese alinha-se com o resultado de vários estudos que indicam um aumento do déficit fiscal neste período.
Medidas como corte de impostos aumento das transferências e investimentos em infraestrutura podem estimular o crescimento econômico, principalmente em economias onde o risco soberano é considerado baixo. Contudo, políticas fiscais expansionistas podem resultar em pressões inflacionárias e alta nas taxas de juros básicas, com impactos negativos sobre o crescimento.
(2) Surpresa positivas no lado da oferta com impactos negativos sobre a inflação: essas surpresas são plausíveis, incluindo uma compressão maior do que a esperada das margens de lucro para absorver aumentos anteriores dos custos. Nos Estados Unidos, por exemplo, onde o mercado de trabalho continua particularmente aquecido, um aumento maior que o esperado da taxa de desemprego pode aliviar as pressões inflacionárias.
Esses fatores podem resultar numa queda maior que esperada das expectativas inflacionárias, o que permitirá aos bancos centrais anteciparem seus planos de afrouxamento monetário, possibilitando redução dos custos do endividamento, aumento da confiança dos consumidores e maior crescimento global.
(3) Aumento da produtividade devido à inteligência artificial: avanços recentes na inteligência artificial, como a emergência de modelos de linguagem, podem impulsionar os investimentos no curto prazo, com empresas alocando mais recursos para implementar as inovações e redefinir os processos de produção. No médio prazo, análises da equipe do FMI sugerem que a inteligência artificial pode aumentar a produtividade do trabalho e contribuir para o crescimento, mas, em contrapartida, provocar deslocamento de trabalhadores e desigualdade.
Os impactos nas EAs devem ocorrer mais rapidamente do que nas EMED. No primeiro grupo de países, 60% dos trabalhadores podem ser afetados, no segundo grupo 40% e nas economias em desenvolvimento de baixa renda 26%. Com isso, nos dois últimos grupos o efeito adverso sobre o mercado de trabalho será menor, mas, em contrapartida, haverá menos escopo para aumento dos ganhos de produtividade.
(4) A adoção mais rápida dos que esperada de reformas macroestruturais podem impulsionar os ganhos de produtividade e contribuir para o crescimento no médio prazo acima das projeções atuais, contribuindo para reverter parcialmente as perdas de produto decorrente da pandemia. Reformas direcionadas para o aumento da taxa de participação no mercado de trabalho e a redução da má alocação de recursos podem reverter as duas últimas décadas de baixo crescimento.
A análise da equipe do FMI também sugere que em várias EMEDs, o progresso mais rápido na implementação de reformas com impactos positivos do lado da oferta – como nas áreas de governança, regulação de negócios e politicas do setor externo – podem impulsionar os investimentos doméstico e externo e, assim, o crescimento. Aumentar os esforços para reduzir a desigualdade de gênero no mercado de trabalho podem ampliar os efeitos dessas reformas.
Já do lado negativo, os fatores de risco apontados pelo FMI foram os seguintes:
(1) Novo repique dos preços das commodities em função da intensificação de conflitos regionais em Gaza e Israel e na Ucrânia. Ataques contínuos no Mar Vermelho e a guerra na Ucrânia podem gerar novos choques de oferta adversos para o crescimento global, como aumento dos preços dos alimentos, da energia e do custo de transporte.
Intensificação das tensões geopolíticas também podem conter os fluxos transfronteiras de alimentos, petróleo e fertilizantes, causando maior instabilidade de preços e deteriorando a confiança das firmas e famílias. Esses choques geopolíticos, por sua vez, podem comprometer a trajetória atual de queda da inflação e postergar o afrouxamento monetário, com efeitos negativos sobre a economia global.
Tais choques de oferta adversos tendem a afetar os países assimetricamente, com efeitos mais agudos nas economias em desenvolvimento de baixa renda onde as despesas com alimentos e energia respondem por uma parcela maior dos gastos das famílias.
(2) Um declínio mais lento do que o esperado da inflação nas principais economias – devido, por exemplo, à manutenção de mercados de trabalho aquecidos ou novas tensões nas cadeias globais de valor – podem desencadear uma alta nas expectativas em relação às taxas de juros e uma queda dos preços dos ativos.
Além disso, a probabilidade de que os efeitos adversos do aperto monetário podem ainda se manifestar continua presente, particularmente onde o endividamento das famílias é alto e as hipotecas com taxa de juros fixa são significativas.
Neste contexto, a falência em muitos setores pode aumentar, resultando em riscos para a estabilidade financeira. Além disso, as condições financeiras globais podem se deteriorar, desencadeando um movimento de fuga para qualidade e apreciação do dólar americano, com implicações negativas para o crescimento global.
(3) Recuperação chinesa vacilante: na ausência de um amplo pacote de reestruturação do setor imobiliário na China, uma maior e mais prolongada queda dos investimentos pode ocorrer, o que, acompanhada de expectativas de quedas adicionais dos preços das propriedades e uma menor demanda e confiança das famílias, pode ter implicações negativas para o crescimento global. Um ajuste fiscal nos governos locais com problemas financeiros pode amplificar o impacto.
Neste cenário, a desaceleração da demanda doméstica pode resultar em pressões deflacionárias levando a uma baixa inflação ou deflação. Os impactos sobre os parceiros comerciais podem ser adversos, com os efeitos negativos da menor demanda por importações mais do que compensando os ganhos associados a menores preços das commodities.
(4) O FMI aponta que a consolidação fiscal é necessária em muitas EAs and EMEDs para reduzir as razões dívida/PIB e reconstruir a capacidade de reagir a choques. Todavia, um aumento dos impostos e corte dos gastos mais intensos do que o esperado podem resultar num crescimento também menor do que o esperado.
Países que não possuem um plano de consolidação fiscal de médio prazo tendem a enfrentar reações negativas dos mercados financeiros ou aumento do risco de crise de dívida que force um ajustamento drástico. Apesar da recente melhora nas condições vigentes no mercado internacional de capitais, o risco de crise de dívida nas economias em desenvolvimento de baixa renda continua contendo a capacidade para investimentos que estimulem o crescimento.
(5) Considerando todos os grupos de economias, a confiança no governo, parlamentares e partidos políticos encontra-se abaixo de 50% de acordo com alguns indicadores mencionados pelo FMI. Baixa confiança no governo e nas instituições num contexto de polarização política pode enfraquecer o apoio a reformas estruturais, dificultar a adoção e adaptação a avanços tecnológicos, criar resistência ao aumento requerido da renda para viabilizar investimentos cruciais e, em alguns casos, aumentar o risco de agitação social.
(6) A separação da economia mundial em blocos no contexto da guerra da Ucrânia e outras tensões geopolíticas pode aumentar, implicando maiores restrições ao comércio global e aos movimentos transfronteiras de capital, tecnologia e trabalhadores e comprometendo a cooperação internacional.
Pesquisa do FMI sugere que a intensificação da fragmentação geopolítica pode reduzir os investimentos de portfólio e investimentos direto externos, diminuir o ritmo de inovação e de adoção de novas tecnologias e limitar o fluxo de commodities entre os blocos, resultando em maiores perdas de produto e volatilidade dos preços das commodities.
Dado o contexto eleitoral em vários países no corrente ano, aumento de barreiras ao fluxo internacional de trabalhadores podem reverter os ganhos obtidos no lado da oferta no período recente, reforçar o aquecimento do mercado de trabalho e a escassez de trabalhadores em alguns países e aumentar as pressões inflacionárias. Aumento de tarifas comerciais podem desencadear respostas retaliatórias, aumentar os custos e prejudicar a lucratividade das firmas e o bem-estar dos consumidores.
Recomendações de política
De acordo com o FMI, na medida em que a economia global encaminha para um “pouso suave”, a prioridade de curto prazo dos bancos centrais é garantir que a inflação desacelere gradualmente. Ao mesmo tempo, com a orientação da política monetária se tornando menos restritiva, um renovado foco na consolidação fiscal é necessário para restaurar o raio de manobra do orçamento, priorizar investimentos e garantir a sustentabilidade da dívida.
Além disso, intensificar reformas que melhorem o lado da oferta da economia facilitaria a redução da inflação e do endividamento, permitiria às economias retornarem às taxas de crescimento pré-pandemia e aceleraria a convergência níveis de renda mais elevados.
A cooperação multilateral é necessária para limitar os riscos e os custos da fragmentação geopolítica e da mudança climática, acelerar a transição para a energia verde e encorajar a reestruturação das dívidas.
O quadro abaixo detalha as recomendações de política do FMI.