Carta IEDI
Rumo a uma Economia Verde: Desafios e Oportunidades
A Carta IEDI de hoje traz uma resenha de um extenso relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio-ambiente (UNEP, na sigla em inglês), Towards a green economy: pathways to suitainable development and poverty eradication (disponível em http://www.unep.org). Elaborado como uma contribuição para a conferência mundial Rio +20 que será realizada no Rio de Janeiro em 2012, o relatório defende que os três pilares do desenvolvimento sustentável – o econômico, o ambiental e o social – recebam atenção equânime no desenvolvimento e planejamento econômico do século XXI.
Como ponto de partida, o estudo procura esclarecer mitos e equívocos que cercam a economia verde. O primeiro deles refere-se à existência de um dilema incontornável entre sustentabilidade ambiental e progresso econômico. Há evidências substanciais que o enverdecimento das economias não inibe as oportunidades de criação e de utilização de riqueza. Ao contrário, muitos setores verdes oferecem oportunidades significativas de investimento, crescimento e emprego.
Outro mito que o estudo procura combater é aquele que vê a economia verde como um luxo acessível apenas aos países mais industrializados, ou pior, como um estratagema das nações desenvolvidas para conter o desenvolvimento e perpetuar a pobreza nos países em desenvolvimento. Contrariamente a esta percepção, o estudo traz numerosos exemplos de transições para economia verde encontrados no mundo em desenvolvimento, que podem ser replicados em outros lugares.
De acordo com o relatório, uma economia verde reúne os seguintes traços principais:
- Reconhece o valor do capital natural e investe nele;
- É fundamental para a redução da pobreza;
- Gera empregos e impulsiona a equidade social;
- Substitui combustíveis fósseis por energia renovável e por tecnologias de baixo carbono;
- Promove o uso mais eficiente de recursos e energia;
- Viabiliza a vida urbana mais sustentável e reduz a emissão de carbono associada ao deslocamento;
- Cresce mais rapidamente que a “economia marrom” e permite conservar e recuperar o capital natural.
Com intuito de oferecer um roteiro para uma gestão muito mais inteligente do capital humano e do capital natural, a qual influencie, para além de 2012, a criação de riqueza e a direção do mundo, o relatório analisa os desafios e oportunidades associadas à transição para uma economia verde em diversos setores e atividades. Além de agricultura, pesca, floresta e água, identificados como setores de capital natural, o relatório examina os setores denominados de capital construído: energia, indústria de transformação, gestão de resíduos, transporte, construção e turismo. Nos três primeiros destes setores da chamada “economia marrom”, o estudo identifica as maiores oportunidades para iniciativas poupadoras de recursos e energia.
O relatório da UNEP realiza igualmente uma simulação das consequências macroeconômicas de um investimento adicional anual, ao longo das próximas décadas, da ordem de 2% do PIB mundial ao ano para o desenvolvimento de atividades recurso-eficiente de baixo carbono em setores considerados centrais para o enverdecimento da economia. Comparativamente ao modelo atual de negócios (business as usual), a transição para uma economia verde catalisaria a atividade econômica pelo menos na mesma magnitude, mas com redução significativa de crises e choques. De acordo com a simulação realizada para o período 2011-2050, a economia verde cresceria com maior rapidez que a “economia marrom”, após um prazo de 10 a 15 anos, gerando incremento nas reservas de recursos renováveis.
No cenário da economia verde, em média, um volume total da ordem de US$ 198 bilhões por ano seria investido no setor de reciclagem para aumentar a taxa de coleta de resíduos e promover a reciclagem. Além de contribuir para geração de empregos, o aumento da reciclagem deverá resultar na diminuição da demanda de energia e da emissão de gases de efeito estufa, bem como na redução dos custos de produção, com efeito positivo para o PIB industrial.
Os governos nacionais têm um papel-chave a desempenhar na transição para uma economia verde mediante a adoção de políticas e medidas de estímulo. Além de destacar medidas concretas de apoio à transição para uma economia verde já adotadas em vários países ao redor do mundo, o relatório sugere algumas diretrizes para intervenção governamental:
- Estabelecimento de marcos regulatórios sólidos;
- Priorização do investimento e gasto públicos para impulsionar o enverdecimento dos setores econômicos;
- Redução do gasto público em áreas que esgotem o capital natural;
- Uso da tributação e de instrumentos baseados no mercado para modificar as preferências dos consumidores e estimular os investimentos verdes e as inovações;
- Investimento na formação e desenvolvimentos de capacidades;
- Fortalecimento da governança internacional.
O Que é Economia Verde? De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP, na sigla em inglês), nos últimos dois anos, o conceito de economia verde vem ganhando força como um novo paradigma econômico, no qual a riqueza material da sociedade não é forçosamente obtida à custa de aumento dos riscos ambientais, da escassez de recursos e das disparidades sociais. Para isso, contribuíram as diversas crises da primeira década do século XXI: crise dos alimentos e dos combustíveis, crise financeira e finalmente a econômica global de 2008. Embora com causas e naturezas distintas, essas crises compartilham um elemento comum: a alocação indiscutivelmente incorreta de capital.
Durante as últimas duas décadas, montante expressivo de capital foi aplicado em propriedades, combustíveis fósseis e ativos financeiros estruturados, mas comparativamente pouco foi investido em energia renovável, eficiência energética, transportes públicos, agricultura sustentável, proteção da biodiversidade e ecossistemas e conservação de solo e água. Em verdade, a maioria das estratégias de crescimento e desenvolvimento econômico incentivou a rápida acumulação de capital físico, financeiro e humano, mas à custa de exploração excessiva e da degradação do capital natural, que inclui recursos naturais e ecossistemas.
Com intuito de oferecer um roteiro para gestão muito mais inteligente do capital humano e do capital natural e para formulação de políticas que alavanquem o potencial produtivo da economia verde, o estudo procura derrubar mitos e equívocos que cercam a economia verde. O primeiro deles refere-se à existência de um dilema incontornável entre sustentabilidade ambiental e progresso econômico. Há evidências substanciais que o enverdecimento das economias não inibe as oportunidades nem de criação nem de utilização de riqueza. Ao contrário, muitos setores verdes oferecem oportunidades significativas de investimento, crescimento e emprego.
Outro mito que o estudo procura combater é aquele que vê a economia verde como um luxo acessível apenas aos países mais industrializados, ou pior, como um estratagema das nações desenvolvidas para conter o desenvolvimento e perpetuar a pobreza nos países em desenvolvimento. Contrariamente a esta percepção, o estudo traz numerosos exemplos de transições para economia verde encontrados no mundo em desenvolvimento, que podem ser replicado em outros lugares.
Os autores sustentam que existem sólidos fundamentos para que os governos e o setor privado intensifiquem seus esforços no sentido da transformação econômica verde. De um lado, os governos devem: garantir condições iguais de concorrência aos produtos verdes, eliminando progressivamente os subsídios às atividades e setores poluidores e/ou que promovam o esgotamento dos recursos naturais; redefinir políticas, criando novos incentivos e fortalecendo a infraestrutura e os mecanismo de mercado; reorientar os investimentos públicos e adotar políticas de compras públicas mais verdes. De outro lado, o setor privado deve compreender as oportunidades abertas em inúmeros setores pela transição para uma economia verde, elevando o financiamento e os investimentos em resposta às políticas governamentais e aos sinais de preço.
Segundo a definição do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, uma economia verde é aquela que resulta na “melhoria do bem-estar humano e equidade social, reduzindo significativamente os riscos de rupturas ambientais e ecológicas”. Em sua expressão mais simples, uma economia verde é: de baixo teor de carbono, recurso eficiente e socialmente inclusiva. Nesse tipo de economia verde, o crescimento da renda e do emprego resulta de investimentos públicos e privados que reduzem a poluição e as emissões de carbono, melhoraram a eficiência energética e dos recursos e evitam a perda de biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. Assim, de acordo com o relatório, uma economia verde teria os seguintes traços principais:
- Reconhece o valor do capital natural e investe nele;
- É fundamental para a redução da pobreza;
- Gera empregos e impulsiona a equidade social;
- Substitui combustíveis fósseis por energia renovável e por tecnologias de baixo carbono;
- Promove o uso mais eficiente de recursos e energia;
- Viabiliza a vida urbana mais sustentável e reduz a emissão de carbono associada ao deslocamento;
- Cresce mais rapidamente que a “economia marrom” e permite conservar e recuperar o capital natural.
De acordo com os autores do estudo, o conceito de uma economia verde não substitui o de desenvolvimento sustentável, definido, em 1987, pela Comissão Mundial sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, como aquele “que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades”. Porém, existe um crescente reconhecimento de que alcançar a sustentabilidade baseia-se quase inteiramente em fazer a economia funcionar de “forma verde”. Afinal, décadas de criação de riqueza nova por meio de um modelo de “economia marrom”, apoiada em combustíveis fósseis, resultaram em marginalização social, degradação ambiental e esgotamento de recursos, que não foram enfrentados. Assim, os autores sugerem que o conceito de desenvolvimento sustentável seja interpretado como “desenvolvimento que melhora a qualidade da vida humana dentro da capacidade de suporte dos ecossistemas”.
Para a transição a uma economia verde é fundamental criar as condições para que os investimentos públicos e privados incorporem critérios ambientais e sociais. Além disso, os principais indicadores de desempenho econômico, como o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), precisam ser ajustados para considerar a poluição, degradação de recursos e dos serviços de ecossistema e as consequências distributivas para os mais pobres da perda de capital natural.
De acordo com os autores, a transição para um desenvolvimento verde é um meio praticamente certo para alcançar aumento do bem-estar em toda sociedade, bem como um meio para alcançar um maior crescimento futuro. Isso ocorre porque uma mudança de modos básicos de produção de desenvolvimento com base na extração e consumo para modos de desenvolvimento mais complexos pode ser uma boa estratégia para o crescimento de longo prazo.
Haveria várias razões por que essa mudança seja igualmente boa para a competitividade e para o bem-estar social. A adoção de fortes políticas ambientais pode, por exemplo, reduzir ineficiências da economia, mediante a expulsão do mercado de empresas e indústrias que só existem por causa dos subsídios implícitos nos preços dos recursos naturais. Introduzir uma regulamentação eficaz e mecanismos baseados no mercado para conter a poluição e limitar o acúmulo de passivos ambientais impulsionaria assim a economia em uma direção mais eficiente.
A precificação dos recursos naturais também seria importante não apenas para a fixação do preço do capital natural e serviços, mas também para os preços relativos de todos os outros insumos de uma economia. Uma economia que pretende se desenvolver em torno de conhecimento, P&D, capital humano e inovação não deve fornecer recursos naturais livres.
A precificação dos recursos naturais pode igualmente estimular investimentos em P&D e inovação de novos métodos de produção, que permitam maior eficiência no uso de recursos dispendiosos. Tais investimentos podem gerar rendas de inovação, dado que uma solução para um problema de escassez de recursos, identificada localmente mediante investimento de P&D, pode ser patenteada, licenciada e comercializada amplamente.
A transição para uma economia verde deverá variar consideravelmente entre os países, em razão das especificidades do capital natural e do capital humano de cada um deles e de seu nível relativo de desenvolvimento. Alguns países já alcançaram níveis elevados de desenvolvimento humano, mas, muitas vezes, à custa de sua base de recursos naturais, da qualidade de seu ambiente e de altas emissões de gases de efeito estufa. Estes países têm como desafio aumentar sua pegada ecológica per capita sem prejudicar a sua qualidade de vida e de bem-estar. Em contraste, outros países ainda mantêm pegadas ecológicas per capita relativamente baixas, mas precisam garantir melhores níveis de bem-estar material e serviços para seus cidadãos. Para isso, enfrentam o desafio de elevar o desenvolvimento humano sem aumentar drasticamente a sua pegada ecológica.
Desafios e Oportunidades na Transição para uma Economia Verde. Além dos setores de capital natural (agricultura, pesca, floresta e água), o relatório analisa os desafios e as oportunidades associadas à transição para uma economia verde nos setores denominados de capital construído: energia, indústria de transformação, transporte, resíduos, construção e turismo. Nos três primeiros destes setores da chamada “economia marrom”, o estudo identifica as maiores oportunidades para produção de riqueza usando menos recursos materiais e energia.
Energia. O sistema energético atual, baseado em combustíveis fósseis, está na raiz das mudanças climáticas. O setor da energia é responsável por dois terços das emissões de gases de efeito estufa, e estima-se que os custos da adaptação à mudança climática chegarão a US$ 50-170 bilhões até 2030, metade dos quais poderá recair sobre os países em desenvolvimento. Muitos desses países, como importadores líquidos de petróleo, enfrentam também o desafio de preços de combustíveis fósseis crescentes e voláteis. Por exemplo, nos países africanos importadores de petróleo, o petróleo responde por 10-15% das importações totais e absorve mais de 30% das suas receitas de exportação em média. Alguns países africanos, incluindo o Quênia e Senegal, dedicam mais da metade de suas receitas de exportação para as importações de energia; na Índia, esse percentual supera 45%.
Além dos benefícios da mitigação das mudanças climáticas, o aumento da oferta de energia proveniente de fontes renováveis reduziria os riscos de preços crescentes e voláteis para combustíveis fósseis. De acordo com o estudo, investir em fontes renováveis – que em muitos casos estão disponíveis localmente de forma abundante – poderia aumentar consideravelmente a segurança energética – e, por extensão, a segurança econômica e financeira dos países em desenvolvimento.
O enverdecimento do setor energético requer a substituição dos investimentos em fontes de energia de carbono-intensivo por investimentos em energia limpa, bem como melhorias de eficiência. Muitas oportunidades para aumentar a eficiência energética já pagam a si próprias, enquanto os investimentos em tecnologias de energias renováveis estão crescendo no mercado atual, uma vez que estão se tornando cada vez mais competitivas. Ambas as frentes apresentam grandes oportunidades econômicas para o setor privado.
A maturidade das tecnologias e os efeitos de aprendizagem associados têm ajudado a tornar os custos das energias renováveis cada vez mais competitivos. No contexto europeu, por exemplo, as tecnologias eólicas e hidráulica já competem com tecnologias de combustíveis fósseis e nucleares, em breve tecnologia para exploração eólica no continente será competitiva com tecnologias de gás natural. Tecnologias de energias renováveis também têm tido grandes avanços, incluindo combustíveis de transporte baseadas em bioetanol no Brasil, a energia solar para propósito de aquecimento na China, a energia geotérmica na Islândia e em El Salvador e da energia eólica on-shore e off-shore em vários países.
Os avanços tecnológicos e redução de custo têm viabilizado a ampliação dos investimentos em energias renováveis. De acordo com o estudo, de 2002 até meados de 2009, o total de investimentos em energias renováveis exibiu uma taxa composta de crescimento anual da ordem de 33%. A despeito da recessão global em 2009, espera-se que os novos investimentos em energia limpa alcancem o patamar recorde de US$ 243 bilhões em 2010 (ante US$ 186 bilhões em 2009 e US$173 bilhões em 2008). O crescimento dos investimentos em fontes de energias renováveis tem sido impulsionado, cada vez mais, por países não membros da OCDE, cuja participação no investimento global em energias renováveis aumentou de 29% em 2007 para 40% em 2008, com Brasil, China e Índia, respondendo pela maior parte desse avanço.
As energias renováveis tornam-se uma fonte alternativa de energia ainda mais competitiva quando as externalidades negativas associadas às tecnologias de combustíveis fósseis são levadas em conta. A combustão de combustíveis fósseis causa poluição e impactos sobre a saúde humana. Muitas tecnologias de energias renováveis tornar-se-iam altamente competitivas se essas externalidades fossem incluídas nos custos de produção de combustíveis fósseis e as subvenções para a sua produção e o consumo fossem removidas.
O relatório estima que um investimento médio de cerca de US$ 650 bilhões nos próximos 40 anos na geração de energia (utilizando fontes de energia renováveis) e na produção de biocombustíveis de segunda geração (de combustíveis de transporte) poderia aumentar a quota de energias renováveis no fornecimento de energia total para 27 por cento até 2050, em um cenário de economia verde comparado, com menos de 15% no cenário de Padrão Atual de Negócios (BAU, na sigla em inglês). A participação de energias renováveis na geração de energia é projetada para atingir 45% até 2050, em comparação com 24% no cenário BAU. Juntamente com os investimentos para melhorar a eficiência energética, estimados em US$ 650 bilhões em média por ano, o uso total de combustíveis fósseis é projetado para ser 41% menor em 2050, produzindo uma economia estimada de capital e custos de combustível, em média, da ordem de US$ 760 bilhões por ano entre 2010 e 2050. As emissões de carbono seriam 60% inferior ao cenário BAU até 2050.
O relatório ressalta que, com o aumento da escala, o setor de energias renováveis oferece novas e importantes oportunidades de emprego. Em razão da maior intensidade de mão-de-obra na produção de energias renováveis em comparação com a geração de energia térmica, o aumento do investimento em energias renováveis elevaria o emprego a curto prazo. Em longo prazo, no cenário de uma economia verde, o emprego no setor de fornecimento de energia declinaria a uma taxa comparável ao esperado sob o cenário BAU. Porém, haveria ma substituição substancial de postos de trabalho na mineração de carvão e usinas de carvão por postos na produção de geração e biocombustíveis de energia renovável. Se forem considerados ainda os cinco milhões de empregos que seriam criados em empresas de serviços e produtos necessários à melhoria da eficiência energética, a criação total de emprego direto resultante do enverdecimento do setor de energia poderia superar em 15% a geração de empregos no cenário do padrão atual de negócios.
O relatório menciona que estudos realizados pela Agência Internacional de Energia mostram que um pacote de investimentos de baixo carbono da ordem de 1-2% do PIB global seria suficiente para reorientar a economia global para uma trajetória de crescimento de baixo teor de carbono. A substituição dos investimentos em fontes de energia de carbono-intensivo por investimentos em energia limpa quase triplicaria a taxa de penetração das energias renováveis na geração de energia de 16% para 45% até 2050. Políticas governamentais podem desempenhar um papel fundamental no incentivo aos investimentos em energias renováveis.


Indústria de Transformação. A indústria de transformação enfrenta vários desafios e oportunidades para ampliar a eficiência dos recursos. Nesse setor, os ramos mais intensivos em energia e/ou intensivos em recursos naturais são: siderurgia, cimento, química e produtos químicos, papel e celulose, alumínio, têxteis e couro, indústria elétrico-eletrônica.
De acordo com o estudo, em termos de utilização dos recursos, esses oitos ramos da indústria são responsáveis por cerca de 35% da eletricidade global consumida, por mais de 20% das emissões mundiais de CO2 do mundo e mais de um quarto de extração de recursos primários. Esses ramos respondem igualmente por cerca de 10% da demanda global de água, com as previsões indicando que essa demanda superará de 20% até 2030, competindo assim, com a agricultura e uso urbano.
No que se refere aos impactos ambientais, o estudo ressalta que a grande maioria dos processos industriais causa, em diferentes graus, poluição do ar, da água e do solo, gerando ônus para a sociedade e para o ambiente que precisam ser contabilizados e/ou “internalizados” e reduzidos. Além de emissões de gases de efeito-estufa, as plantas e instalações industriais liberam poluentes, como as partículas em suspensão de dióxido de enxofre, dióxido de nitrogênio e chumbo e outras substâncias químicas que reagem ao ozônio troposférico, ou seja, aquele existente próximo da superfície terrestre, ocasionando poluição atmosférica. Esses poluentes perigosos degradam os ecossistemas e podem causar problemas de saúde bem conhecidos.
Os impactos ambientais da indústria de transformação são, todavia, diferenciados. Por exemplo, os ramos da siderurgia, cimento e indústrias químicas respondem pela maioria das emissões totais de CO2 provenientes da indústria de transformação. Já nos setores de química e produtos químicos, papel e celulose, têxteis e couro há risco de externalidades negativas significativas se os seus resíduos tóxicos não forem tratados adequadamente. Já as indústrias de produtos elétrico-eletrônicos, uma das mais dinâmicas da indústria de transformação, podem ter também impactos ambientais prejudiciais se produtos químicos e metais utilizados na produção não forem gerenciados cuidadosamente quando da eliminação dos produtos pelos usuários finais.
De acordo com o estudo, a indústria de transformação é responsável por 17% dos danos de saúde decorrentes da poluição. Estimativas indicam que os danos causados pela poluição ambiental são equivalentes a 1-5% do PIB, superando os custos da transição para uma economia verde.
Com a expansão da produção industrial nos países em desenvolvimento tem crescido, tem crescido também a preocupação com o aumento na utilização de substâncias perigosas e por consequência com ampliação dos riscos associados à poluição ambiental. Várias atividades lidam com os desafios da toxicidade, tais como curtimento e tingidura de produtos, processos de branqueamento de papel e processos de alta temperatura nos quais ocorre formação de resíduos ou emissões de metais tóxicos.
O setor da indústria de transformação enfrenta igualmente o sério desafio da escassez de recursos – incluindo reservas limitadas de petróleo e gás, minérios metálicos e água doce –, que representa uma ameaça crescente para o crescimento econômico futuro. De acordo com o estudo, como as indústrias utilizam minérios de baixo-teor, a extração do conteúdo útil do metal exigirá um consumo maior de energia. O mesmo se aplica à água utilizada pela indústria, cujo consumo deverá crescer para mais de 20% da demanda mundial total até 2030. Por essa razão, melhorias na reutilização e reciclagem deverão se tornar cada vez mais um fator decisivo para o desempenho econômico e para a sustentabilidade ambiental.
Na avaliação dos autores, o enverdecimento da indústria de transformação é essencial para qualquer esforço no sentido de dissociar as pressões ambientais e o crescimento econômico. A atividade manufatureira verde se difere da convencional na medida em que se propõe a reduzir a quantidade de recursos naturais necessários para produzir bens acabados por meio de processos mais eficientes de uso a de energia e materiais, reduzindo também as externalidades negativas da produção associadas aos resíduos e à poluição.
O estudo identifica uma ampla gama de áreas para investimento e inovação verde na indústria de transformação, incluindo design e desenvolvimento de produto, substituição de materiais e energia, controle e modificação de processo, e novos processos e tecnologias limpas. Estas áreas são elementos-chave para a formatação de estratégias de oferta e de demanda para melhorar a eficiência dos recursos na indústria de transformação.
Uma estratégia da oferta envolve redesenho e melhoria da eficiência dos processos e tecnologias empregadas nos principais subsetores da indústria de transformação intensivos em materiais (metais ferrosos, alumínio, cimento, plástico, etc.). Já a estratégia da demanda envolve a alteração da composição da demanda tanto da indústria como do consumidor final. Isso requer modificação do produto final, ou seja, priorizar o uso de bens finais que incorporem materiais e energia com muito mais eficiência e/ou de produtos de design que exigem menos material na sua fabricação. Essas estratégias incluiriam os seguintes componentes:
- Redesenho de produtos e/ou modelos de negócios para que a mesma funcionalidade possa ser obtida com um menor uso de energia e materiais;
- Substituição de insumos “marrons” por insumos “verdes” sempre que possível. Por exemplo, utilizar biomassas como fonte de matérias-primas químicas no processo industrial;
- Reciclagem de resíduos nos processos internos, incluindo águas residuais, calor de alta temperatura, pressão, etc. Usar materiais e energia com menor impacto ambiental, utilizando, por exemplo, energias renováveis ou resíduos como insumos do processo de produção. Encontrar ou criar mercados para outros resíduos de processo, especialmente orgânicos;
- Introdução de tecnologias novas, mais limpas e melhoria da eficiência dos processos existentes, estabelecendo novos modos de produção com elevada eficiência energética e de materiais;
- Redesenho dos sistemas, especialmente o sistema de transporte e infraestrutura urbana à jusante, para utilização de insumos menos intensivos em recursos. O objetivo principal deve ser a redução do uso de veículos automotores movidos a combustíveis líquidos em prol da utilização de transporte ferroviário de massa, ônibus em vias rápidas e bicicletas.
Os autores ressaltam que essas mudanças só ocorrerão automaticamente se forem percebidos pelas empresas e seus gestores como necessárias para o aumento da competitividade. Além disso, os setores da indústria transformadora são intermediários, o que significa que o que eles produzem depende tanto a disponibilidade e do custo das matérias-primas como da demanda dos setores à jusante, dos consumidores finais e governos. Este último pode, todavia, influenciar a tomada de decisões dos empresários por meio de novas normas ou de subsídios.
A transição verde na indústria de transformação implica reduzir a demanda por materiais virgens e estender a vida útil dos produtos e bens manufaturados por meio de redesenho, remanufatura e reciclagem, que constituem o cerne da manufatura de circuito fechado. Redesenhar sistemas de produção envolve o redesenho de produtos para estender sua vida útil, tornando-os fáceis de reparar, recondicionar, refabricar e reciclar.
Na remanufatura, os produtos e peças são desmontados, limpos, reparados e remontados, dando origem a um bem com qualidade, desempenho e vida útil similar ao do produto original. Os processos de remanufatura já em operação, que se baseiam no reprocessamento e reutilização de produtos e peças usados, coletados por meio de sistemas de devolução, geram atualmente uma economia de cerca de 10,7 milhões de barris de petróleo por ano.
De acordo com o relatório, cerca de 70% do peso de uma máquina típica podem ser reutilizados como tal, enquanto outros 16% podem ser reciclados. Os aviões são outro exemplo de produtos que são essencialmente remanufaturados por substituição e recondicionamento da maioria das partes. Atualmente algumas empresas estão instalando, ao redor do mundo, plantas especializadas na coleta, desmantelamento e classificação, com propósito seja de obter peças de reposição, seja para produzir versões de baixo custo de seus produtos top de linha. Um dos exemplos mencionados é o da Caterpillar, que opera plantas de remanufatura em três países, com um volume global de negócios de US$ 1 bilhão.
Além de apresentar alternativas para substituição de insumos na indústria de transformação, a reciclagem encoraja o uso de subprodutos e/ou resíduos do processo de produção. A reciclagem de materiais, como alumínio, por exemplo, requer apenas 5% da energia de produção primária. Uma importante e subutilizada oportunidade de curto prazo é a reciclagem de calor residual dos processos industriais de alta temperatura, como fornos de coque, altos fornos, fornos elétricos e fornos de cimento, especialmente para geração de energia elétrica, em usinas de cogeração de eletricidade e calor (CHP, na sigla em inglês).
De acordo com o estudo, todos os diferentes ramos da indústria de transformação têm potencial significativo de melhoria da eficiência energética ainda que em grau variável e com várias necessidades de investimento. Estimativas indicam que investimentos em eficiência energética durante as próximas quatro décadas poderiam reduzir o consumo de energia industrial por quase metade em comparação com o modelo atual de negócios. Em relação à melhoria da eficiência no uso de materiais, o desenvolvimento de parques ecoindustriais permitiria a implementação eficaz da produção em circuito fechado, elevando a vida útil dos materiais.
O cenário de investimento verde para a indústria de transformação sugere que consideráveis melhorias na eficiência energética podem ser alcançadas. Até 2050, as projeções indicam que a indústria pode praticamente "dissociar" o consumo de energia do crescimento econômico, sobretudo na maioria das indústrias intensivas de energia.
O investimento verde também aumentará o emprego no setor. Todavia, como a automatização crescente da indústria de transformação tem sido acompanhada pela diminuição dos postos de trabalho, os efeitos da transição para a economia verde sobre os empregos diretos deverão ser pequenos. Em contraste, as estimativas indicam que os efeitos sobre os empregos indiretos serão significativamente mais elevados.


Gestão de Resíduos. Segundo o estudo, a maior eficiência na utilização e recuperação dos recursos, estimulada por políticas públicas inteligentes, pode reduzir os fluxos de resíduos associados com elevação do padrão de vida, evitando problemas futuros. Atualmente somente 25% de todos os resíduos são reutilizados ou reciclados, enquanto o mercado mundial de resíduos, da coleta à reciclagem, movimenta um volume anual estimado em US$ 410 bilhões, excluído o expressivo segmento informal nos países em desenvolvimento. Isso sugere o grande potencial de forte crescimento tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimentos.
A reciclagem viabiliza uma economia substancial de recursos. Por exemplo, para cada tonelada de papel reciclado, são poupadas 17 árvores e 50% de água usada na fabricação de papel. Já a reciclagem de uma tonelada alumínio resulta na economia de 1,3 tonelada de resíduos de bauxita, 15 m3 de água usada no resfriamento, 0,86 m3 de água de processo e 37 barris de petróleo. Adicionalmente, evita-se na reciclagem do alumínio a emissão de duas toneladas de CO2 e 11 kg de dióxido de enxofre.
Na avaliação dos autores, as iniciativas e atividades que podem resultar no enverdecimento desse setor incluem:
- Conservação de recursos, o que evitaria o consumo excessivo de recursos;
- Redução de resíduos mediante a otimização do uso para minimizar o desperdício de recursos;
- Coleta e separação do lixo, garantindo o adequado tratamento de resíduos;
- Reutilização de resíduos, que promove a circulação de resíduos e evita o uso de recursos virgens;
- Reciclagem dos resíduos, que converte resíduos em produtos úteis;
- Recuperação energética, que aproveita a energia residual proveniente de resíduos;
- Prevenção de aterro sanitário, que conserva a terra e evita os riscos de contaminação;
- Construção e manutenção de infraestruturas para a coleta de resíduos, recuperação de materiais e aplicação de tecnologias 3R (reabilitar, reutilizar, reciclar) e atividades associadas.
As atividades de recuperação de energia e de reciclagem de resíduos estão se tornando cada vez mais rentáveis e com elevado potencial de crescimento, fazendo com que os resíduos sejam considerados recursos valiosos. É possível transformar lixo urbano e resíduos industriais e agrícolas em produtos comercializáveis, como no caso do mercado de transformação de resíduos em energia (WtE, na sigla em inglês), estimado em US$ 20 bilhões em 2008 e com crescimento projeto em 30% até 2014. De acordo com o relatório, só os resíduos agrícolas, em volume global de 140 bilhões de toneladas métricas, têm um potencial de energia equivalente a 50 bilhões de toneladas de petróleo. Em um cenário de economia verde, até 2050, todos os resíduos de biomassa poderiam ser transformados em adubos ou transformados em energia.
O estudo apresenta alguns exemplos de iniciativas públicas bem-sucedidas de estímulo à reciclagem de resíduos. Entre os casos mencionados destaca-se o caso da Coreia do Sul, onde em 2003 foi adotada uma política de responsabilidade estendida do produtor (EPR, na sigla em inglês) para embalagens (papel, vidro, ferro, alumínio e plástico) e de produtos específicas (bateria, pneus, lubrificantes óleo e lâmpada fluorescente). Essa iniciativa, que elevou em 14% a taxa de reciclagem no país, resultou na reciclagem de 6 milhões de toneladas métricas de resíduos, gerando benefício econômico equivalente a US$ 1,6 bilhão entre 2003 e 2007.
O Brasil também é destacado pelos autores como um caso de país com tradição na reciclagem e com níveis de recuperação de materiais superiores aos observados nos países industrializados: 95% de todas as latas de alumínio e 55% de todos os frascos de polietileno são reciclados. Igualmente, cerca de metade de todos os tipos de vidro e papéis é recuperada. Segundo o estudo, a reciclagem no Brasil gera um valor de quase US$ 2 bilhões e evita a emissão de 10 milhões de toneladas de gases com efeito de estufa. Não obstante os avanços já obtidos, cerca de US$ 5 bilhões em recursos recicláveis vão parar nos aterros sanitários. Se todo esse material fosse destinado à reciclagem, o PIB brasileiro teria um acréscimo da ordem de 0,3%.
Com o propósito de aproveitar esse potencial, o governo brasileiro lançou, em agosto de 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que definiu as normas para coleta, tratamento e destino final dos resíduos urbanos, industriais e tóxicos. A legislação resultante foi baseada em amplo consenso, obtido mediante diálogo social, envolvendo governo, setor industrial, universidades e partes interessadas na gestão de resíduos.
Outra iniciativa de incentivo à reciclagem é a da África do Sul, onde, em 2003, o governo introduziu a cobrança de uma taxa sobre o saco de plástico para reduzir o lixo indesejado. Em sua revisão do orçamento de 2009, o Ministro das Finanças anunciou aumento da taxa sobre os sacos de plástico e a introdução de um imposto sobre lâmpadas incandescentes no nível de produção e sobre as importações. A tributação de saco plástico deve gerar receitas da ordem de US$ 2,2 milhões, e a de lâmpada incandescente deve gerar receitas adicionais de US$ 3 milhões. A política sul-africana tem inspirado outros países africanos, como é caso de Botsuana, a adotar regulamentação semelhante.
O relatório ressalta que a gestão verde de resíduos oferece oportunidades expressivas de emprego. Atualmente, a atividade de reciclagem, em todas as suas formas, emprega cerca 12 milhões de pessoas em três países – Brasil, China e Estados Unidos. A atividade de triagem e processamento de materiais recicláveis sozinha gera dez vezes mais empregos por tonelada do que as atividades de incineração ou de aterro sanitário. Estimativas realizadas pela UNEP sugerem que, se uma média de US$ 143 bilhões fossem investidos na gestão de resíduos durante o período de 2011-2050, seriam gerados no setor um total de 25-26 milhões de emprego até 2050, o que representa 2 a 2,8 milhões de empregos a mais do que os 23 milhões projetados sob o cenário do padrão atual de negócio.
As atividades de coleta, processamento e redistribuição dos materiais recicláveis são geralmente feitas por trabalhadores com baixa qualificação, com poucas possibilidades de emprego fora do setor. Assim, apesar da contribuição potencialmente significativa à criação de emprego associada à gestão e reciclagem de resíduos, nem todos os empregos relacionados a essa atividade podem ser considerados empregos verdes. Para que os empregos gerados nesse setor sejam empregos verdes é preciso que também atendam às necessidades do trabalho digno, incluindo proibição do trabalho infantil, segurança e saúde ocupacional, proteção social e liberdade de associação.
Desenvolvimento e Qualidade Ambiental. Para mostrar que uma “economia verde” cresce com maior rapidez que uma “economia marrom” e permite conservar e restaurar o capital natural, os autores do relatório realizaram uma simulação das consequências macroeconômicas de um investimento adicional anual da ordem de 2% do PIB mundial ao longo das próximas décadas tanto no modelo atual (business as usual) como no cenário de uma economia verde. O modelo incorpora diretamente a dependência da produção econômica em relação aos recursos naturais para avaliar as implicações de longo prazo do uso desses recursos para a economia e bem-estar social, bem como para a geração de riqueza e prosperidade futura.
Na simulação realizada, cerca da metade do investimento verde é alocado na eficiência energética, especialmente na construção civil, indústria e transportes, bem como no desenvolvimento de fontes de energia renovável. Além do enorme potencial para redução de custos, os investimentos em eficiência energética refletem a prioridade concedida pela política internacional ao combate da mudança climática. O restante do investimento é destinado à melhoria da gestão dos resíduos, da infraestrutura de transporte público e a uma série dos setores baseados no capital natural, tal como a agricultura, na pesca, florestas e recursos hídricos. Já no cenário atual, o investimento adicional é alocado de acordo com o padrão usual de consumo de recursos e uso de energia, sem alvos prioritários específicos.
O cenário de investimento verde possibilitaria um crescimento ao longo do período 2011-2050 pelo menos tão elevado quanto o que seria possível esperar, sendo otimista, com o modelo atual. Ainda que no curto e médio prazo o investimento verde em serviços-chave de ecossistemas e em desenvolvimento de baixo carbono resulte em crescimento econômico um pouco mais lento, no longo prazo o crescimento seria mais rápido e mais sustentável. Isto porque seriam evitados os riscos consideráveis relacionados aos efeitos da mudança climática, escassez de água e deterioração dos ecossistemas. Assim, de acordo com relatório, até com previsões conservadoras, o investimento verde permitiria alcançar taxas de crescimento anual superiores ao do modelo atual em um prazo de 10 a 15 anos, gerando incremento nas reservas de recursos renováveis.
De acordo com os autores, mesmo se as consequências negativas da mudança climática e da deterioração dos ecossistemas forem desconsideradas, o crescimento econômico mundial no modelo atual seria limitado, em qualquer hipótese, pela escassez crescente de recursos energéticos e naturais. Pelas projeções, no modelo atual, a taxa anual de crescimento do PIB mundial cairia gradualmente de cerca de 2,7% por ano no período 2010-2020 para 2,2% anuais em 2020-2030 e para 1,6% anuais no período 2030-2050. Em 2050, o PIB mundial atingiria US$ 172 trilhões no atual modelo de negócios, enquanto no cenário verde seria 16% maior, alcançando US$ 199 trilhões. Essa diferença seria ainda maior, elevando-se a 21,8%, caso se considere o Produto Interno Líquido Ajustado, que deduz, além da depreciação do capital físico, a variação no valor do capital natural. A estratégia verde possibilitaria, de acordo com a simulação, melhoria nos estoques de recursos naturais, com consequente aumento da riqueza global.
No que se refere ao consumo de energia, a simulação sugere que a demanda primária recuperaria os níveis atuais em 2050, o que representa 40% a menos do que se prevê com a manutenção do modelo atual de negócios. A combinação das medidas focalizadas na oferta e na demanda permitira reduzir os preços de energia durante as próximas décadas, com consequente redução da vulnerabilidade da economia mundial em relação aos possíveis oscilações no preço dos combustíveis, contribuindo assim a uma maior estabilidade do desenvolvimento econômico. A economia em termos de custo de capital e de combustíveis para gerar eletricidade em uma economia verde seria, em média, segundo as projeções, da ordem de US$ 760.000 milhões entre 2010 e 2050.
No cenário da economia verde, um volume total, em média, da ordem de US$ 198 bilhões por ano seria investido no setor de reciclagem para aumentar a taxa de coleta de resíduos e promover a reciclagem. Com uma maior taxa de coleta de resíduos (aproximadamente 83% entre 2010 e 2050), bem como o desenvolvimento econômico projetado no cenário verde, o volume total de resíduos utilizável aumentaria de 3% em 2020 para 12% em 2050. Além de contribuir para geração de empregos, o aumento da reciclagem deverá resultar na diminuição da demanda de energia e da emissão de gases de efeito estufa, bem como na redução dos custos de produção, com efeito positivo para o PIB industrial.



Políticas e Instrumentos. Os governos nacionais têm um papel-chave a desempenhar na transição para uma economia verde mediante a adoção de políticas e medidas de estímulo. O relatório destaca um conjunto de medidas concretas de apoio a transição a uma economia verde que já estão sendo adotadas em vários países ao redor do mundo.
- Estabelecimento de marcos regulatórios sólidos. Um marco regulatório corretamente desenhado pode identificar direitos e gerar incentivos que favoreçam atividades próprias de uma economia verde, bem como eliminar os obstáculos aos investimentos de caráter ambiental. Atividades prejudiciais à sustentabilidade podem ser limitadas ou mesmo proibidas mediante a definição de padrões mínimos e normas claras, o que por sua vez reduzirá os riscos normativos e comerciais, contribuindo para aumentar a confiança dos investidores e dos mercados. As normas podem ser instrumentos eficazes para alcançar objetivos ambientais e promover mercados de bens e serviços sustentáveis. Igualmente, um sistema de compras públicas sustentáveis pode, ao criar uma demanda significativa em longo prazo, ajudar a criar e a fortalecer um mercado de bens e serviços verdes. Programas compras públicas sustentáveis em vigor em países como Alemanha, Áustria, Dinamarca, Holanda, Finlândia, Reino Unido e Suécia resultaram em diminuição da ordem de 25% em média das emissões de gás carbônico. De igual modo, as compras públicas estão ajudando a abrir mercado para alimentos e bebidas orgânicas, veículos com consumo eficiente de combustível e para produtos de madeira sustentável;
- Priorização do investimento e gasto públicos para impulsionar o enverdecimento dos setores econômicos. Medidas como apoio aos preços, subsídios diretos, incentivos fiscais e concessão de empréstimos podem ser ferramentas adequadas para a promoção da transição a uma economia verde. Estas medidas permitem: a) assegurar o desenvolvimento de infraestrutura e tecnologias verdes, em particular, aquelas que geram importantes vantagens não-financeiras ou aquelas que geram vantagens financeiras difíceis de obter pelos agentes privados, b) fomentar indústrias verdes incipientes como parte de uma estratégia de desenvolvimento de vantagens competitivas com vistas a estimular o crescimento e o emprego em longo prazo. Todavia, os autores do relatório sugerem que os programas de subsídios incluam revisões periódicas, com condições definidas de ajuste, limite de gasto e prazo definido de vencimento;
- Limitação do gasto público em áreas que esgotem o capital natural. De acordo com o relatório, quando o governo concede subsídios a atividades não sustentáveis, diminuindo artificialmente seus custos e riscos, os investimentos privados em alternativas verdes tornam-se desvantajosos. Entre os exemplos, está o suporte público a pesca predatória e aos combustíveis fósseis. Em relação a esses últimos, o estudo afirma que a redução artificial de custo dissuade a adoção por consumidores e empresas de medidas de eficiência energética, bem como representa um obstáculo efetivo ao desenvolvimento de tecnologias baseadas em energias renováveis. Por essa razão, defende-se uma redução nos subsídios e realocação dos recursos para áreas de alta prioridade para o gasto público como educação e saúde, mas com uma avaliação cuidadosa do impacto desse tipo de reforma nas comunidades mais pobres;
- Uso da tributação e de instrumentos baseados no mercado para modificar as preferências dos consumidores e estimular os investimentos verdes e as inovações. Para incentivar a redução das emissões de gases de efeito estufa, estimular o uso eficiente dos recursos naturais e promover inovações, os governos podem taxar atividades econômicas que geram externalidades negativas, mediante impostos ambientais, ou, em alguns casos, usar outros instrumentos do mercado, como os sistemas de permissões negociáveis. Em geral, os impostos ambientais podem ser classificados em duas amplas categorias: “quem contamina paga”, com os impostos aplicados aos produtores e/ou consumidores responsáveis pela poluição; e aqueles do tipo “usuário paga”, focalizado na cobrança pela extração ou pelo uso de recursos naturais. Já os instrumentos baseados no mercado, como as permissões negociáveis são ferramentas apropriadas para solucionar a questão da “indivisibilidade econômica da natureza” presente em diferentes situações de caráter ambiental;
- Investimento na formação e desenvolvimentos de capacidades. A capacidade para aproveitar as oportunidades oferecidas pela economia verde e para desenvolver políticas de estímulo varia de um país a outro. A transição para uma economia verde requer uma maior capacidade dos governos para análise dos desafios, identificação das oportunidades, priorização dos investimentos e mobilização de recursos, desenvolvimento de políticas e avaliação dos progressos. A comunidade internacional em sua totalidade deverá ter um papel essencial na provisão de assistência técnica e financeira para que os países em desenvolvimento possam adquirir o conhecimento e tecnologia necessários para a transição para uma economia verde. Igualmente, é fundamental a adoção de medidas de suporte para os trabalhadores dos setores afetados, o que inclui requalificação profissional da força de trabalho, dado que, por definição, a transição para uma economia verde implicará em profunda reestruturação econômica;
- Fortalecimento da governança internacional. Os acordos ambientais internacionais podem facilitar e estimular a transição para uma economia verde. Em particular, os acordos ambientais multilaterais (MEA, na sigla em inglês) com vistas à definição dos marcos legais e institucionais para o enfrentamento dos desafios ambientais em âmbito mundial podem ter um papel significativo na promoção da atividade econômica verde. A participação ativa dos governos nacionais nesses processos internacionais ajuda a garantir a coerência e a colaboração na transição a uma economia verde. Igualmente, o sistema internacional de comércio pode influenciar significativamente na atividade econômica verde, permitindo ou obstruindo o fluxo verde dos bens, das tecnologias e dos investimentos. Este seria o caso das negociações atuais, no âmbito da Organização Mundial de Comércio, centradas na redução de barreiras tarifárias e não tarifárias para produtos e serviços ambientais.