Carta IEDI
Indústria, Desenvolvimento e Política Industrial
A Carta IEDI de hoje procura mostrar que a indústria continua muito relevante nos modelos de desenvolvimento promovidos por vários países emergentes que procuram ampliar a participação do setor no PIB. No Brasil, a indústria vem perdendo espaço, o que tolhe o nosso crescimento, e nos últimos anos encontra-se em franco declínio. Para o IEDI a recuperação da indústria requer várias medidas, incluindo as de ordem estrutural e de longo prazo. Além de abordar esses temas, a presente Carta IEDI faz um resumo e analisa a última política industrial executada no país.
A mais nova política industrial, lançada sob o título de “Plano Brasil Maior" em agosto de 2010 e complementada com o "pacote" de 3 de abril de 2012, trouxe medidas pioneiras, como a desoneração da folha de salários, a retirada integral dos impostos federais sobre o investimento, a devolução de até 3% do valor das exportações aos exportadores a título de impostos não compensados e reforçou recursos e ampliou programas voltados à inovação e ao investimento.
A nova política industrial procurou ainda articular objetivos conjunturais e estruturais. Medidas conjunturais visam dar aos setores mais afetados pela crise da indústria uma capacidade de defesa ou de reação diante da concorrência do produto importado. Ou seja, foram adotadas medidas compensatórias para minimizar o impacto da concorrência externa na produção doméstica enquanto ações de maior alcance não surtem efeito. Países com condições parecidas com a que vive o Brasil adotam medidas dessa natureza para amortecer o impacto de uma crise ainda que temporariamente para, assim, permitir que sejam adotadas novas estratégias empresariais e sejam promovidos ajustes na produção, na produtividade e no emprego nos setores mais atingidos.
A desoneração da folha de salários se inscreve como ação de efeito imediato, mas na prática seu alcance será maior. Não é particularmente expressivo o benefício de redução do recolhimento empresarial ao INSS na passagem da base folha de salários para a base faturamento, mas a mudança permitirá que o recolhimento seja excluído das exportações e incluído nos impostos cobrados na importação. Colabora, assim, para a isonomia tributária entre a produção realizada no país e no estrangeiro, o que dará maior igualdade de condições com o produto importado, embora a medida seja de pequena envergadura diante do enorme diferencial de custos que se acumulou contra o produto nacional. A chamada “desoneração da folha” consistiu em eliminar a contribuição previdenciária das empresas de 20% sobre a folha e instituir o recolhimento de um valor correspondente a 1% a 2% (dependendo do setor) para o INSS. Ao todo, foram contemplados 15 setores industriais e o governo acena com a possibilidade de inclusão de novos setores.
Dentre as medidas mais estruturais, além do reforço conferido aos programas de inovação e financiamento do investimento, a nova política industrial alçou à primeira linha de objetivos o aumento do conteúdo local de produção, estabelecendo a partir daí mecanismos e incentivos para atrair investimentos em setores selecionados. Anteriormente o governo já adotara uma norma de conteúdo local para as encomendas da Petrobrás com o objetivo de alavancar segmentos como a indústria naval e bens de capital a partir das grandes inversões do pré-sal. No âmbito do Plano Brasil Maior, instituiu nas compras governamentais uma margem de preço de preferência de até 25% para produtos nacionais, beneficiando segmentos como a indústria de medicamentos, fármacos e biofármacos. Criou ainda um programa de desenvolvimento da indústria da defesa e anunciou um novo e importante regime automotivo. O Brasil dispõe de um dinâmico mercado de veículos como poucos países têm e é relevante que disso resulte um correspondente dinamismo da produção, da produtividade e do emprego de qualidade na cadeia automotiva. O novo regime para vigorar entre 2013 e 2017, pretende estabelecer um marco de regulação para a nova etapa que se abre no desenvolvimento da produção automobilística no Brasil, definindo, dentre outros parâmetros o grau de nacionalização da produção e um percentual mínimo de investimentos em P&D&I no país. O Plano Brasil Maior também concedeu isenções de impostos para a produção nacional de bens da tecnologia de informação e comunicações que deverá dar impulso a esse segmento inovador e disseminador de ganhos de produtividade.
A nova política industrial vai na direção correta de buscar uma articulação entre as medidas de alcance mais curto e as medidas de alcance mais longo que objetivam a modernização da indústria e a inclusão entre seus setores daqueles onde a inovação tende a ser maior e a produtividade é mais alta. Mas, a nosso ver, não deveria deixar de envolver mais explicitamente três grandes objetivos: aumento de produtividade, ampliação da competitividade e atração de investimentos.
A produtividade em uma economia reage tanto a fatores muito gerais, porém de grande complexidade e relevância – desenvolvimento educacional e da infraestrutura são exemplos – quanto a fatores particulares atinentes aos setores. No caso da indústria, melhoras na formação de mão de obra, no desenvolvimento tecnológico das empresas e na modernização do parque industrial dariam ensejo ao aumento na produtividade do setor.
No tema da competitividade, o objetivo é conferir maior capacidade de colocação do produto industrial nacional em mercados externos e assegurar condições de o produto nacional concorrer com o produto estrangeiro no mercado interno. O tema tem conotações diferentes segundo os vários segmentos e cadeias industriais, mas em termos mais gerais, o aumento da produtividade e da inovação nas empresas brasileiras seriam importantes indutores da competitividade industrial. Diversos outros determinantes “sistêmicos”, ou seja, fora da alçada propriamente setorial ou empresarial, são decisivos. O primeiro deles é o câmbio que a política econômica vem tentando preservar em certo nível mais adequado à indústria. O governo também vem promovendo avanços ou reformas em outros temas como na infraestrutura que, no entanto, permanece como muito deficiente e no custo do crédito que é um dos mais caros do mundo. Na reforma tributária ainda se espera uma ação mais concentrada do governo.
Uma contribuição relevante para a competitividade da indústria brasileira como um todo viria de uma política industrial direcionada aos setores produtores de insumos básicos utilizados pelas principais cadeias produtivas instaladas no país. O objetivo seria baratear os insumos fundamentais da indústria, a começar pela energia. Na atração de investimentos uma oportunidade parece se abrir e deveria ser aproveitada para ampliar as inversões de empresas estrangeiras e nacionais em segmentos de notório atraso do país, como no setor eletrônico. A perspectiva de crescimento de escalas de produção das empresas em operação no país, dada a maior envergadura projetada do mercado brasileiro é um fator de atração de investimentos diretos estrangeiros, além dos investimentos nacionais.
O Papel da Indústria no Desenvolvimento. A indústria ainda constitui a principal alavanca para o desenvolvimento utilizada por países que nas últimas três décadas (o período da chamada “globalização”) simbolizaram o impulso econômico para superação do subdesenvolvimento. De fato, países com altas taxas de crescimento tiveram na indústria o principal apoio para esse processo. China, Coréia do Sul, Indonésia, Índia, Malásia, Tailândia e Irlanda, por exemplo, todos eles com taxas médias anuais de crescimento superiores a 5% ao ano no período que vai dos anos 1970 até 2007, este o ano anterior à crise mundial, tiveram aumentos relevantes na participação de seus setores manufatureiros no PIB. No outro extremo, países já industrializados e várias economias latino-americanas, dentre elas o Brasil, acusaram médias de crescimento abaixo de 5% ao ano e declinantes participações nos respectivos PIBs.
Voltar a ter alto dinamismo em seu setor industrial poderá representar, para um país como o Brasil, o retorno da perspectiva de alcançar mais prontamente a condição de país desenvolvido. Nesse sentido, e sem prejuízo dos demais setores econômicos, a indústria deve estar no centro do programa de desenvolvimento.
Cabe aprofundar o tema do significado da indústria no desenvolvimento econômico e suas relações com os demais setores da economia. Os setores econômicos têm particularidades a partir das quais é possível identificar contribuições relevantes para a economia, como na criação de empregos ou na geração de divisas. A indústria tem características que a fazem um vetor do progresso técnico, do investimento e do crescimento.
Não é por acaso que se deu o nome de Revolução Industrial ao processo de generalização do sistema fabril. Esse processo que tem início no século XVIII, foi além de aniquilar a produção até então dominante porque instituiu um sistema interligado e complexo de geração de valor e de progresso técnico. Interligado porque a indústria cria novos bens e serviços, novos métodos e instrumentos e máquinas que potencializam a produção de si própria e dos demais setores. A agricultura e serviços, evidentemente, produzem tecnologia independentemente do setor industrial e o Brasil é um exemplo disso, através da Embrapa e sua enorme capacidade de inovar no campo. Mas, em geral, são os insumos e os meios de produção concebidos na indústria os responsáveis pelo progresso técnico e aumento da produtividade não só nesse setor como em toda a economia.
A indústria tem outra poderosa característica, além da geração e difusão de tecnologia: ela é capaz de induzir, a partir de sua produção, demanda para outros setores e para si mesma. Isso tem um significado todo especial para o desenvolvimento econômico, pois implica que um dado estímulo de demanda – proveniente do investimento, consumo ou exportações líquidas – resultará em crescimento maior da renda e do emprego na condição de que a economia tenha um setor industrial relevante. A indústria tem esse poder porque através de suas compras de bens e serviços intermediários, simultaneamente torna a sua produção uma produção adicional para outros segmentos industriais e para os demais setores da economia. Além disso, como para produzir é necessário empregar e investir mais, novos efeitos dinâmicos são desencadeados a partir daí.
Assim, a indústria define um sistema de produção. Não é por outra razão que os processos mais representativos do avanço econômico moderno passam pela industrialização. Inglaterra, França, Estados Unidos, Alemanha, Japão, Coreia e agora a China, conceberam seu desenvolvimento em torno à indústria. Primeiro, pela capacidade de difusão do dinamismo desse setor para a economia como um todo; segundo, porque aí reside a condição do maior progresso técnico. Inovar é uma decorrência da industrialização avançada, especialmente, no segmento produtor de bens de capital, bens intermediários e bens de consumo de última geração tecnológica.
Nem todo país pode contar com setor industrial capaz de gerar esses efeitos endógenos, se a população é pequena ou a dimensão territorial é restrita. Não sendo assim, o desenvolvimento passa pela indústria. Nesses casos, as políticas macroeconômicas e as políticas de tributação, crédito, câmbio, P&D&I, comércio exterior, atração de investimentos e capitais estrangeiros, dentre outras, devem estar em consonância com o objetivo do avanço industrial. O Brasil, um país continental, populoso e de grande mercado interno, paradoxalmente vive um momento em que nunca foram tão favoráveis as condições internas e externas para sua reindustrialização, ao mesmo tempo em que se apresentam, como nunca antes, os perigos de uma desindustrialização.
De fato, o percurso da indústria brasileira, ao contrário de outros países emergentes, foi de queda, apesar de o País ainda ter renda per capita baixa. Segundo dados a preços constantes de 1990, na média do período 1972/1980, a indústria de transformação respondia por 30% do valor adicionado total, mas, no ano anterior à crise, 2007, esse percentual baixou para 23,7%, 6,3 pontos percentuais a menos. A indústria brasileira também vem perdendo posições no âmbito mundial, mas ainda preserva condições de reerguimento. Sua participação no valor adicionado da indústria de transformação mundial, que chegou a superar 3% no início dos anos 1980, caiu para 2,2% em 2007. Embora essa queda, assim como a redução da participação da indústria de transformação brasileira no PIB do país, constitua sintoma de empobrecimento relativo da industrialização no país (ou sintoma de desindustrialização relativa), a indústria brasileira ainda mantém certa expressão em nível mundial.
Ou seja, mesmo tendo se fragilizado e perdido oportunidades, a indústria conserva uma estrutura relativamente forte, é diversificada e se faz presente no panorama industrial mundial, preservando condições de retomar uma condição de liderança do crescimento e da transformação característicos de um desenvolvimento econômico que se espera para o Brasil.
Crescimento Industrial e Crescimento Econômico. Analisando uma série de 64 resultados para o crescimento do valor agregado brasileiro a preços básicos relativamente ao mesmo trimestre do ano anterior, para um período recente (primeiro trimestre de 1996 ao quarto trimestre de 2011), a associação entre o crescimento da indústria de transformação e o crescimento do PIB é patente. Dessa mesma série, é possível constatar que em 13 trimestres o aumento do PIB superou 5% em bases anuais. Em todos esses trimestres com exceção de um deles a indústria de transformação cresceu em percentuais próximos ou superiores a esse percentual. Em nove desses trimestres, a expansão da indústria situou-se entre 6% e 9%. Ou seja, promover um processo de alto crescimento para a economia brasileira, entendido como a evolução de longo prazo da economia em bases como 5% ao ano, requer um crescimento ainda maior da indústria de transformação.
Crescimento mais elevado também esteve associado à expansão em serviços, o setor de maior peso no PIB e que no período recente beneficiou-se de processos muito relevantes ocorridos na economia brasileira, como a intensa evolução do crédito e a redistribuição da renda, que impulsionaram atividades dinâmicas de serviços em áreas como comércio varejista e atacadista, software, informação e telecomunicações e crédito e serviços financeiros. Em parte, o dinamismo de serviços também acompanhou o crescimento industrial.
Outro ponto deve ser observado: para quem crê que o dinamismo industrial se manteve limitado no passado e se mantém ainda mais restringido agora por uma valorização da moeda causada pelas exportações de produtos primários, o reerguimento do crescimento industrial do país esbarraria em enorme dificuldade, pois requereria alguma forma de bloquear a influência das “commodities” sobre a taxa de câmbio como pré-condição ao desenvolvimento da indústria. Situações como essa são conhecidas como “doença holandesa” e, do nosso ponto de vista, podem de fato ocorrer no caso de uma grande preponderância de uma riqueza mineral, como a exploração do pré-sal brasileiro, que pode representar um mal como esse se não for acompanhada de extremos cuidados. Mas, não nos parece que a valorização do Real dos últimos anos, que de fato conteve o crescimento da indústria, tenha, pelo menos por enquanto, sua origem nas commodities exportadas pelo Brasil.
Uma interpretação mais correta seria que a desindustrialização relativa do Brasil vem como decorrência não das de commodities, mas, sim, de fatores extra-comércio exterior. Em outras palavras, não é o saldo comercial do agronegócio e da mineração que vem determinando a valorização da moeda. Um diferencial de juros interno com relação ao externo, que há muito tempo é excessivamente elevado, potencializa as ondas de movimentos de capitais e das expectativas.
Nesse sentido, não há oposição entre agricultura e indústria ou entre a economia industrial e a economia de commodities, e muito menos a necessidade de o País optar por uma especialização pendente para um ou para o outro lado. O êxito simultâneo da indústria e dos demais setores é perfeitamente possível.
A Trajetória Industrial Recente. Mesmo sendo descartado o período da crise e do após crise internacional de 2008, o desempenho médio de longo prazo da indústria brasileira tem sido baixo. O crescimento da produção industrial em média nos quinze anos que vão do ano da estabilização (1994) até 2008 foi de 3,1%. A indústria de transformação (+2,7%) puxou para baixo o desempenho da indústria como um todo, enquanto a produção do setor extrativo, liderado por petróleo e ferro, crescia 7,2%. Acompanhou o baixo crescimento médio uma amplitude muito curta dos ciclos industriais. Praticamente o setor registrou taxas elevadas apenas em períodos breves associados a eventos notórios e “externos” à dinâmica industrial.
Assim, em 1994, um crescimento que chegou a 7,6% decorreu do estímulo à demanda doméstica decorrente do Plano Real. Em 2000 e novamente em 2004, os aumentos pronunciados de 6,6% e 8,3%, respectivamente, corresponderam à saída de crises cambiais como as que ocorreram em 1999 e 2003. O motor para a recuperação industrial em ambos os casos foi a desvalorização da moeda, o que elevou o poder de colocação no exterior do produto manufaturado no Brasil. Em nenhum dos casos acima o crescimento se sustentou, seja devido a ocorrência de crises externas muito frequentes no período, seja devido ao aumento da inflação ou ao agravamento da situação das contas externas que o crescimento elevado ensejava e era combatido com elevação das taxas de juros.
Somente nos sete últimos anos, a indústria brasileira conheceu uma trajetória mais sustentada. As diferenças com relação aos padrões que vigoraram até então são notórias, a começar pelo fato de que o crescimento não se apoiou na demanda de exportações, mas sim na demanda interna movida pelo maior poder de compra da população a partir simultaneamente do aumento da massa de rendimentos e do crédito para as famílias. Nesse processo, os destaques são os ciclos de bens duráveis e de investimentos, responsáveis pelas evoluções intensas dos setores de bens de capital e bens duráveis. No período 2004/2010, para uma média geral de 3,6% de crescimento médio anual, a produção nesses dois casos aumentou 8,7% e 7,7%.
A crise internacional teve efeitos importantíssimos na indústria brasileira. O primeiro deles foi deprimir violentamente o crescimento no último trimestre de 2008 e durante o ano de 2009. A indústria se recuperaria desse impacto já em 2010, mas os demais efeitos da crise externa tiveram consequências mais duradouras. A crise descortinou o que já era uma realidade para, pelo menos, os analistas que acompanham de perto a indústria. O Brasil tem relativamente baixo aumento de produtividade e se transformou em um país caro demais para produzir, resultado de muitos anos em que internamente os custos de toda ordem foram subindo até se tornarem um dos mais altos do mundo. Estamos falando de temas conhecidos como o da tributação, custo de capital de terceiros fora do BNDES, custo do investimento, custo de energia, custo dos encargos trabalhistas e custo de logística. A associação entre altos custos e padrões de produtividade que deixam a desejar só poderia ser compensada a curto prazo pela taxa de câmbio. Não tem sido esse o caso, pelo contrário, já que a valorização do real aumentou adicionalmente os custos em dólar de se produzir no País.
Ademais, na medida em que a crise mundial ainda não teve uma solução e não acena com o retorno ao crescimento ao menos nos países centrais, ela determinou uma hiperconcorrência internacional pelos poucos mercados consumidores dinâmicos existentes no mundo, dentre eles o Brasil. Nesse processo, como se sabe, países emergentes de grande poder industrial no mundo, preservaram ou mesmo ampliaram sua capacidade produtiva industrial. Além disso, esses países adotam políticas claramente de defesa de sua moeda subvalorizada, o que causa uma assimetria de grande gravidade, sobretudo para economias com moeda valorizada.
A combinação das três facetas - relativas a custos, produtividade e câmbio - associadas ao quadro internacional vigente está na base da virtual estagnação da indústria manufatureira brasileira que se apresenta desde o ano passado. Não há como não ficar apreensivo sobre o percurso futuro da indústria, a menos que ocorram mudanças relevantes nas questões acima, uma perspectiva que vem melhorando com as ações relevantes recentemente adotadas pelo governo em áreas como custo do crédito, câmbio e política industrial (Plano Brasil Maior). Contudo, os efeitos destas ações são de médio prazo, enquanto os problemas relativos à penetração do produto importado no mercado brasileiro e ao encolhimento da exportação de manufaturados são imediatos.
Os dados mais recentes da produção industrial parecem indicar certas tendências novas da economia, as quais convém sublinhar. Primeiramente, a produção do setor como um todo caiu 0,5% no primeiro trimestre de 2012, relativamente ao período imediatamente anterior. Esse índice negativo completa um conjunto de quatro trimestres seguidos de queda, uma demonstração de que já há algum tempo a indústria encontra-se em recessão e não em uma mera desaceleração.
Uma segunda conclusão diz respeito aos segmentos que estão liderando a recessão industrial. Se a indústria como um todo recuou 1,1% nos últimos doze meses encerrados em março de 2012 em comparação com os doze meses anteriores, a produção de bens duráveis regrediu 6,1% e a de bens de capital caiu 1,5%. Esses resultados podem estar superdimensionados em função de problemas de produção de caminhões, utilitários, ônibus e automóveis no primeiro trimestre deste ano, mas, de qualquer forma parecem denotar a interrupção do ciclo de bens duráveis e, simultaneamente, do ciclo de investimentos na economia brasileira.
Daí, uma terceira conclusão é que a indústria não sofre apenas um revés devido a uma insuficiente competitividade frente ao produto importado, mas agora é afetada também pela deficiência da demanda efetiva que se apresenta na economia. Mudou o fator preponderante que puxa a indústria - e a economia como um todo - para baixo, sem que a competitividade industrial tenha melhorado significativamente, muito embora a desvalorização que vem ocorrendo no real tenha evitado um quadro ainda pior.
Em parte, essa maior abrangência da retração deveu-se ao próprio contágio da crise industrial sobre outros setores da economia e sobre a disposição dos bancos em manter o vigor dos seus financiamentos. O processo ainda não atinge a produção de bens-salário que se mantém relativamente protegida porque o nível de emprego na economia até agora não acompanhou o declínio da produção industrial, mas nem mesmo isso se revela agora uma certeza absoluta, já que os últimos dados da produção industrial desse setor mostram diminuição de 0,8%.
Não se trata mais, portanto, de "salvar" a indústria, mas, sim, além de executar políticas que reconstituam a competitividade industrial, se faz necessário revigorar as decisões de investir dos empresários e as decisões de consumir bens duráveis por parte das famílias, além das decisões de emprestar dos bancos que financiam os outros dois agentes.
No curto prazo, vale dizer, ao longo do corrente ano, entrarão em cena alguns fatores de estímulo que poderão melhorar o desempenho industrial, como a redução da taxa básica de juros iniciada em agosto do ano passado, a elevação do salário mínimo, as medidas de desoneração da indústria e o aumento do investimento público em infraestrutura e em programas de habitação popular. Algumas dessas medidas ampliarão o consumo de setores empregadores e de baixa penetração das importações. Com isso, a produção industrial que praticamente estagnara em 2011, poderá ser mais favorecida este ano – elevação de 2% a esta altura parece ser a melhor projeção para o valor agregado e a produção da indústria de transformação em 2012 contra índices próximos a zero no ano anterior. Mas, o melhor desempenho, caso ocorra, não deve obscurecer os problemas de fundo que se sobrepõem e que estão deprimindo a indústria e a economia brasileira como um todo, vale dizer, os problemas relacionados à competitividade industrial e à mudança endógena da fase do ciclo da economia em razão de esgotamentos dos ciclos de investimento – sobretudo o investimento industrial – e de bens duráveis.
Competitividade e o Comércio Exterior de Produtos Industriais. Antes mesmo da crise internacional, que derrubou as exportações de manufaturados do Brasil e de todos os demais países do mundo, as vendas externas brasileiras desses produtos já vinham declinando, denotando perda gradativa de competitividade mesmo em um quadro de intenso progresso do comércio mundial. Assim, avaliada em termos de quantum de exportação, o quadro de variação na média em doze meses das exportações no mês que antecedeu ao agravamento da crise internacional (agosto de 2008) segundo as categorias, pode ser assim resumido: o crescimento chegava a 3,8% para produtos básicos, 0,6% para bens semimanufaturados e –1,5% para manufaturados. Após a crise e com a gradativa retomada do comércio mundial, cresceram as exportações brasileiras em quantum, mas foi notório o atraso no caso de manufaturados.
O mesmo tema da falta de competitividade pode ser ilustrado pelos resultados do comércio exterior de bens da indústria de transformação e pelos coeficientes de comércio exterior. Vejamos esses dois lados da questão.
Conjugada a um crescimento da economia mais forte nos anos de 2007 e 2008 antes do agravamento da crise externa, a perda de competitividade industrial se traduziu na passagem de uma condição de saldo comercial confortável de bens típicos da indústria de transformação (segue-se aqui uma classificação da OCDE), na faixa de US$ 30 bilhões em 2006, para déficits de US$ 7,1 bilhões em 2008 e de US$ 8,3 bilhões em 2009. Em 2010, o déficit comercial de produtos industriais chegou a US$ 34,8 bilhões, o que revela um processo muito grave de deterioração da competitividade do setor. Mas, esta deterioração se mostraria ainda maior em 2011, ano em que os grandes produtores industriais do mundo amplificaram suas ações no mercado brasileiro e o déficit industrial sobe a US$ 48,7 bilhões. Nesse processo, chama a atenção a passagem de saldo para déficit e, em seguida, o agravamento desse déficit, o que não teve precedentes no comercio exterior brasileiro, dada a sua rapidez combinada com sua enorme intensidade.
Cabe identificar os setores que lideraram o processo. A princípio, a liderança coube aos bens de alta intensidade tecnológica – cujo déficit passou de cerca de US$ 12 bilhões em 2006 para a faixa de US$ 22 bilhões em 2008 e daí para US$ 26 bilhões em 2010. Em 2011, o déficit continua subindo, mas desacelera, chegando a US$ 30 bilhões. Já os bens de média-alta tecnologia passam de um déficit de valor muito baixo como US$ 1 bilhão em 2006 para US$ 30 bilhões em 2008, atingindo US$ 39,3 bilhões em 2010. Em 2011, o déficit explode para US$ 52 bilhões. Como convém observar, em média-alta tecnologia encontram-se os setores mais dinâmicos do ciclo industrial recente da economia brasileira, notadamente, bens de capital e indústria automobilística, além do setor químico. A dinâmica do intenso processo de aumento do déficit comercial de produtos industriais responde, portanto, a um fator de base do desenvolvimento industrial brasileiro – a dependência tecnológica – mas também, de forma crescente, ao interesse dos produtores estrangeiros nos dinâmicos mercados de bens de consumo e de bens de investimento do país.
Por si só o agravamento do déficit comercial de produtos industriais é muito grave porque daí decorre um crescente desequilíbrio das contas externas do país que as exportações de commodities não industriais apenas em parte são capazes de compensar. Mas, como se colocam perspectivas favoráveis de crescimento para a economia brasileira a partir do mercado interno consumidor e da realização de programas de investimento de grande vulto, a exemplo das inversões previstas para a exploração do pré-sal, a baixa competitividade industrial traz o risco de que o país deixe escapar poderosas alavancas para o seu desenvolvimento. Estancar o desequilíbrio externo e tornar mais pleno o desenvolvimento econômico pressupõe que a indústria brasileira conquiste maior produtividade e competitividade.
Uma análise dos coeficientes de comércio exterior da indústria brasileira permite chegar à mesma conclusão sobre a necessidade da indústria recuperar condições de competitividade. Nessa análise, três pontos principais devem ser destacados: a) a perda de expressão do mercado de exportação para as empresas industriais instaladas no Brasil tem sido intensa e poderá deixar sequelas para a dinâmica da economia doméstica; b) está em curso um aumento que se não é explosivo, é regular e vigoroso da participação do produto importado nos mercados de produtos industriais no país; c) a forte elevação da dependência de insumos importados para a produção de bens industriais brasileiros pode desestruturar cadeias produtivas inteiras instaladas no país, dentre elas as mais representativas das etapas superiores da evolução industrial.
Quanto ao coeficiente de exportação - vale dizer, a relação entre o quanto o país exporta em valor e o que produz sua indústria de transformação -, este, segundo estimativas da CNI e da FUNCEX, chegou a alcançar 21,6% após as desvalorizações de 1999 e 2002, o que denotava uma expressiva orientação exportadora da indústria brasileira. O ano de 2011culmina um processo de reversão da anterior abertura exportadora, com o coeficiente de exportação retornando a um nível de 15% que é próximo à média dos anos finais dos 90. Este retrocesso pode representar uma menor propensão ao investimento e mais baixo ímpeto inovador por parte da empresa brasileira, caso o mercado interno do qual ela passa a depender excessivamente, diminua seu dinamismo.
Certos segmentos ainda sustentam o índice exportador médio de 15% para a indústria, a exemplo de alimentos (22%) e de setores cujos investimentos no passado foram orientados para exportação, a exemplo de celulose e papel (23,1%), metalurgia (30,2%) e aviões e outros equipamentos de transporte (35,8%). Mas, segmentos antes exportadores com grande ou média expressão já estão deixando de apresentar esta condição, como produtos de couro e calçados (25,5% em 2011 e 41% em 2005), produtos de madeira (17,8% e 49,7%, respectivamente), equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (9% e 21,5%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (10,2% e 17,2%), máquinas e equipamentos (19,9% e 30,8%) e veículos (12,7% e 25%).
O coeficiente de penetração de importações que avalia a participação em valor das importações no mercado interno de produtos industriais, já é de 18,5% (14,5% em 2005) e tem tendência de forte aumento à frente a julgar pela progressão dos últimos dois anos. Cresce muito em mercados tradicionais, como em produtos têxteis (18,5% em 2011 contra 9,1% em 2005) e mostra-se alto em mercados de produtos químicos (26,3% em 2011), produtos farmacêuticos (30,2%), produtos de informática, eletrônicos e ópticos (51,0%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (24,0%) e máquinas e equipamentos (36,8%). Como já foi observado, esses mercados vinham tendo muito dinamismo na economia brasileira.
Finalmente, o coeficiente de insumos importados avalia, em valor, o peso do insumo importado na produção industrial. Em um contexto de perda de competitividade e valorização da moeda a maior utilização de insumos importados foi a alternativa mais imediata que as empresas encontraram para baratear a fabricação de seus produtos. Não é por acaso que este coeficiente vem aumentando celeremente nos últimos anos, em um percurso interrompido apenas em 2009 devido à crise. O índice global passa de 17,2% em 2005 para 22,4% em 2011, mas é ainda mais importante avaliar o que ocorreu em alguns setores da indústria de transformação.
Para certos segmentos, as elevações no período mais recente resultam índices de insumos importados muito elevados, como no caso de produtos de informática, produtos eletrônicos e ópticos (76,7% em 2011 e 49,0% em 2005), metalurgia (46,4% e 26,2%), produtos farmacêuticos (44,4% e 38,8%), produtos químicos (44,1% e 28,1%) e aviões e outros equipamentos de transporte (38,1% e 26,4%). Em outro bloco, o coeficiente subiu para níveis altos: produtos têxteis (28,5% e 14,0%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (23,1% e 18,5%), máquinas e equipamentos (21,4% e 15,4%) e veículos (25,1% e 18,9%). Possivelmente, um determinante cíclico tenha condicionado em alguns casos o aumento do coeficiente de insumos importados, mas não nos parece ser este o caso geral. A penetração das importações através da produção finca raízes mais profundas do que a penetração das importações nos mercados de bens finais. Por outro lado, as elevações dos coeficientes de insumos importados ocorreram mais intensamente em setores de maior tecnologia e mais representativos de revoluções industriais recentes. Somente mudanças mais profundas na economia, em seus padrões de custo, produtividade e competitividade, associadas a execução de políticas industriais poderão reacomodar este quadro.
Como solução isolada para o déficit de competitividade da indústria brasileira, o aumento do coeficiente de insumos importados pode ter alcance limitado se os reais fatores que estão deprimindo a competitividade industrial não forem atacados. Ademais, como o maior coeficiente de importação pode empobrecer as cadeias produtivas e retirar o poder de encadeamento que a indústria tem sobre outros ramos da própria indústria e sobre outros setores econômicos, pode também reduzir o potencial de crescimento da economia.
A Questão da Produtividade. Um trabalho do economista Rogério Cesar de Souza, do IEDI (Na Era da Produtividade o Brasil Precisa Acelerar o Passo, IEDI, 2012) acompanhou a evolução da produtividade total em 100 países nas últimas 6 décadas. Mostrou que apesar de ter experimentado um desempenho modesto nas últimas três décadas o Brasil melhorou nos anos 2000. O ponto, no entanto, é que essa melhora não coloca o país na fronteira dos ganhos de produtividade, nos deixando ainda atrás de outras experiências. Portanto, nossa produtividade se, por um lado, já não parece evoluir com a lentidão de antes - um ponto que nos favorece -, por outro ainda não se posiciona em bases próximas aos países que já conquistaram ou estão procurando conquistar posições superiores na escala do desenvolvimento. Nesse tema, o Brasil precisa acelerar o seu avanço.
Quanto à produtividade do trabalho na indústria brasileira, esta foi condicionada no período recente pela crise mundial que derrubou a indústria ainda no quarto trimestre de 2008 e ao longo do ano de 2009 e concorreu para o baixo desempenho da produção e da produtividade do setor. Em 2008, a produtividade só aumentou 1,1% e em 2009 houve queda de 2,1%. No ano seguinte a situação deveria ter retornado à normalidade devido a uma recuperação elástica da produção e da produtividade, que cresceria 6,1%. Mas, em 2011 voltaria a apresentar declínio, desta feita de 0,2%. Na média dos quatro últimos anos o aumento anual foi de apenas 1,2%, um índice muito baixo, distante do seu correspondente no quadriênio anterior (2004/2007) de 3,6% e insuficiente para acomodar aumentos de custos e melhorar a competitividade frente à concorrência do produto importado. A produtividade industrial precisa reencontrar o caminho do crescimento, o que em parte será obtido com um crescimento maior da produção.
Notas Sobre a Nova Política Industrial. Nos últimos anos o Brasil vem promovendo políticas industriais mais ativas. A Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançada em maio de 2008 estabeleceu metas gerais para a economia relativas ao investimento, aos gastos privados com inovação e exportações. Teve vários méritos, como, por exemplo, assegurar uma condição de destaque ainda maior ao BNDES no financiamento das inversões da infraestrutura, da indústria e da inovação. Como se sabe, há uma carência muito acentuada de fontes voluntárias de financiamento de longo prazo na economia, um problema que em parte foi minimizado pela PDP. A crise internacional, no entanto, limitou o alcance desta política.
A mais nova política industrial, lançada sob o título de “Plano Brasil Maior" em agosto de 2010 e complementada com o "pacote" de 3 de abril de 2012, trouxe medidas pioneiras, como a desoneração da folha de salários, a retirada integral dos impostos federais sobre o investimento, a devolução de até 3% do valor das exportações aos exportadores a título de impostos não compensados e reforçou recursos e ampliou programas voltados à inovação e ao investimento.
A nova política industrial procurou ainda articular objetivos conjunturais e estruturais. Medidas conjunturais visam dar aos setores mais afetados pela crise da indústria uma capacidade de defesa ou de reação diante da concorrência do produto importado. Ou seja, foram adotadas medidas compensatórias para minimizar o impacto da concorrência externa na produção doméstica enquanto ações de maior alcance não surtem efeito. Países com condições parecidas com a que vive o Brasil adotam medidas dessa natureza para amortecer o impacto de uma crise ainda que temporariamente para, assim, permitir que sejam adotadas novas estratégias empresariais e sejam promovidos ajustes na produção, na produtividade e no emprego nos setores mais atingidos. Nessa direção foram acionadas medidas para o aperfeiçoamento da defesa comercial (maior controle e vigilância das importações irregulares), ampliação do crédito a juros favorecidos do BNDES e postergação de pagamento de impostos dos setores mais afetados pela crise (os setores de autopeças, têxtil, confecções, calçados e móveis).
A desoneração da folha de salários se inscreve como ação de efeito imediato, mas na prática seu alcance será maior. Não é particularmente expressivo o benefício de redução do recolhimento empresarial ao INSS na passagem da base folha de salários para a base faturamento, mas a mudança permitirá que o recolhimento seja excluído das exportações e incluído nos impostos cobrados na importação. Colabora, assim, para a isonomia tributária entre a produção realizada no país e no estrangeiro, o que dará maior igualdade de condições com o produto importado, embora a medida seja de pequena envergadura diante do enorme diferencial de custos que se acumulou contra o produto nacional. A chamada “desoneração da folha” consistiu em eliminar a contribuição previdenciária das empresas de 20% sobre a folha e instituir o recolhimento de um valor correspondente a 1% a 2% (dependendo do setor) para o INSS. Ao todo, foram contemplados 15 setores industriais e o governo acena com a possibilidade de inclusão de novos setores.
Dentre as medidas mais estruturais, além do reforço conferido aos programas de inovação e financiamento do investimento, a nova política industrial alçou à primeira linha de objetivos o aumento do conteúdo local de produção, estabelecendo a partir daí mecanismos e incentivos para atrair investimentos em setores selecionados. Anteriormente o governo já adotara uma norma de conteúdo local para as encomendas da Petrobrás com o objetivo de alavancar segmentos como a indústria naval e bens de capital a partir das grandes inversões do pré-sal. No âmbito do Plano Brasil Maior, instituiu nas compras governamentais uma margem de preço de preferência de até 25% para produtos nacionais, beneficiando segmentos como a indústria de medicamentos, fármacos e biofármacos. Criou ainda um programa de desenvolvimento da indústria da defesa e anunciou um novo e importante regime automotivo. O Brasil dispõe de um dinâmico mercado de veículos como poucos países têm e é relevante que disso resulte um correspondente dinamismo da produção, da produtividade e do emprego de qualidade na cadeia automotiva. O novo regime para vigorar entre 2013 e 2017, pretende estabelecer um marco de regulação para a nova etapa que se abre no desenvolvimento da produção automobilística no Brasil, definindo, dentre outros parâmetros o grau de nacionalização da produção e um percentual mínimo de investimentos em P&D&I no país.
O Plano Brasil Maior também concedeu isenções de impostos para a produção nacional de bens da tecnologia de informação e comunicações que deverá dar impulso a esse segmento inovador e disseminador de ganhos de produtividade. As medidas que pretendem aumentar a produção de equipamentos de telecomunicações, bens e serviços utilizados na infraestrutura de internet em banda larga, computadores portáteis e semicondutores, têm maiores chances de êxito porque vêm acopladas a programas governamentais de grande envergadura, tais como o Programa Nacional de Banda Larga e o Programa “Um Computador Por Aluno”.
A nova política industrial vai na direção correta de buscar uma articulação entre as medidas de alcance mais curto e as medidas de alcance mais longo que objetivam a modernização da indústria e a inclusão entre seus setores daqueles onde a inovação tende a ser maior e a produtividade é mais alta. Mas, a nosso ver, não deveria deixar de envolver mais explicitamente os três grandes objetivos que temos salientado: aumento de produtividade, ampliação da competitividade e atração de investimentos. Em torno a esses objetivos, as diversas ações - muitas delas já adotadas pelo Plano Brasil Maior - deveriam ser estruturadas, a exemplo dos programas de incentivo ao investimento, incentivo à inovação, políticas de compras governamentais, financiamento ao investimento e para P&D&I, incentivo à modernização produtiva de micro, pequenas e médias empresas, política comercial, formação e treinamento de mão de obra, etc.
A produtividade em uma economia reage tanto a fatores muito gerais, porém de grande complexidade e relevância – desenvolvimento educacional e da infraestrutura são exemplos – quanto a fatores particulares atinentes aos setores. No caso da indústria, melhoras na formação de mão de obra, no desenvolvimento tecnológico das empresas e na modernização do parque industrial dariam ensejo ao aumento na produtividade do setor.
No tema da competitividade, o objetivo é conferir maior capacidade de colocação do produto industrial nacional em mercados externos e assegurar condições de o produto nacional concorrer com o produto estrangeiro no mercado interno. O tema tem conotações diferentes segundo os vários segmentos e cadeias industriais, mas em termos mais gerais, o aumento da produtividade e da inovação nas empresas brasileiras seriam importantes indutores da competitividade industrial. Diversos outros determinantes “sistêmicos”, ou seja, fora da alçada propriamente setorial ou empresarial, são decisivos. O primeiro deles é o câmbio que a política econômica vem tentando preservar em certo nível mais adequado à indústria. O governo também vem promovendo avanços ou reformas em outros temas como na infraestrutura que, no entanto, permanece como muito deficiente e no custo do crédito que é um dos mais caros do mundo. Na reforma tributária ainda se espera uma ação mais concentrada do governo.
Uma contribuição relevante para a competitividade da indústria brasileira como um todo viria de uma política industrial direcionada aos setores produtores de insumos básicos utilizados pelas principais cadeias produtivas instaladas no país. O objetivo seria baratear os insumos fundamentais da indústria, a começar pela energia. Um programa desta envergadura teria o significado de reduzir custos ao longo das cadeias de produção chegando até a ponta dos produtos finais cuja competitividade, por isso, seria ampliada.
Na atração de investimentos uma oportunidade parece se abrir e deveria ser aproveitada para ampliar as inversões de empresas estrangeiras e nacionais em segmentos de notório atraso do país, como no setor eletrônico. A perspectiva de crescimento de escalas de produção das empresas em operação no país, dada a maior envergadura projetada do mercado brasileiro é um fator de atração de investimentos diretos estrangeiros, além dos investimentos nacionais. No mesmo sentido, a avaliação internacional do Brasil como o grande centro de crescimento econômico da América do Sul e em nível mundial amplia a sua capacidade de atrair investimentos de longo prazo em segmentos de mais alta tecnologia.