Carta IEDI
Economia em fraca evolução
O nível geral de atividade da economia brasileira vem recentemente dando sinais de enfraquecimento cada vez mais evidentes, já que as bases de comparação não estão mais tão deprimidas. Dois dos três grandes setores econômicos ficaram no vermelho em ago/21: ao comércio coube a maior perda, mas é a indústria que apresenta a pior trajetória.
Frente ao mês anterior, já descontados os efeitos sazonais, as vendas reais do comércio varejista recuaram -2,5% em seu conceito ampliado, que inclui os ramos de veículos, autopeças e material de construção, anulando toda a alta de jul/21. A produção industrial, por sua vez, encolheu -0,7%, consistindo na sexta taxa negativa entre os oito primeiros meses do ano.
Até mesmo em comparação com o ano passado estes dois setores não conseguiram crescer, interrompendo a sequência de variações positivas que vinham sendo registradas até então, em grande medida, devido a bases de comparação muito baixas. Ante ago/20, o varejo ficou estagnado em 0% em seu conceito ampliado e caiu -4,1% em seu conceito restrito, enquanto a indústria retrocedeu -0,7%.
Além do elevado desemprego e das incertezas ainda presentes – muitas com origem na esfera política –, contribuem para este quadro a persistente elevação da inflação (preço de commodities, câmbio, crise hídrica etc.) e os desequilíbrios nas cadeias produtivas. A convergência de trajetórias da indústria e comércio pode não ser casual, já que o varejo é um importante canal de escoamento da produção industrial.
O mau desempenho do comércio em ago/21 atingiu 70% de seus ramos e dois padrões adversos podem ser identificados. Há quem oscile muito perto da estabilidade, isto é, em torno de zero, (supermercados, alimentos, bebidas e fumo; veículos e autopeças; produtos farmacêuticos e de perfumaria) e há quem venha apresentando quedas seguidas, após um período de resultados erráticos (material de construção; combustíveis e lubrificantes; equipamentos de escritório, informática e comunicação; móveis e eletrodomésticos; livros, jornais e papelaria).
Na indústria, a perda de produção do setor como um todo em ago/21 também foi espalhada. Atingiu 58% dos seus ramos e 47% de seus parques regionais, embora tenha poupado centros industriais importantes, como o de São Paulo e do Rio de Janeiro. Dos quatro macrossetores, apenas bens de consumo semi e não duráveis ficaram no positivo (+0,7% ante jul/21), enquanto bens de consumo duráveis (-3,4%) seguiram apresentando o pior resultado.
Já o setor de serviços se saiu bem em ago/21. Com o avanço da vacinação vão sendo retirados obstáculos que impediam a retomada das atividades que exigem mobilidade, presença física e contato pessoal. Vale lembrar, porém, que este é o setor que mais demorou a se recuperar.
Ainda assim, o faturamento real dos serviços variou apenas +0,5% frente a jul/21, já descontados os efeitos sazonais. Foi a menor taxa positiva de 2021, ainda que o setor tenha voltado a patamares anteriores à pandemia só muito recentemente. Como ainda conta com bases deprimidas de comparação, dado o “atraso” em sua recuperação, registrou alta de +16,7% ante ago/20.
Com serviços crescendo menos e indústria e varejo no vermelho, o indicador IBC-Br do Banco Central, que funciona como uma proxy do PIB, registrou variação de -0,15% na passagem de jul/21 para ago/21, com ajuste sazonal. A bem da verdade, este indicador aponta para um nível de atividade econômica virtualmente estagnado a partir de mai/21.
Esta evolução já afeta as expectativas dos agentes sobre o desempenho da economia neste e no próximo ano. A alta de +5,99% para o PIB em 2021 que o Boletim Focus do BC apontava em meados de jul/21 refluiu para +5,15% na entrada de set/21 e então para +5,04% no início de out/21. Neste mesmo período, as expectativas para o PIB de 2022 foram reduzidas de +2,28% para +1,93% e então para +1,54%.
Indústria
O desempenho industrial vem deixando muito a desejar em 2021. A contar pelos dados do IBGE, variações positivas, quando existem, ocorrem mais em função de bases de comparação muito baixas do que por um processo de retomada do nível de atividade do setor.
Os obstáculos são de diferentes ordens: do lado da oferta, ainda há gargalos na obtenção de insumos e pressão de custos; do lado da demanda, a inflação corrói poder de compra da população em um quadro de elevado desemprego. Além disso, o ambiente de incerteza se mantém, renovando suas causas sob os riscos da crise hídrica e da tensão política.
Os dados do IBGE para ago/21 apontam recuou de -0,7% da produção industrial frente a jul/21, já descontados os efeitos sazonais. Esta é a sexta taxa negativa nesta comparação entre os oito meses com informações oficiais disponíveis. O setor não escapou do vermelho nem mesmo na comparação com o mesmo mês do ano passado, como vinha ocorrendo, e isso a despeito de um efeito calendário positivo, já que ago/21 teve um dia útil a mais do que ago/20. A queda neste caso também foi de -0,7%.
A falta de dinamismo não está restrita a um ou outro ramo da indústria, mas se mostra bastante difundida. Em ago/21 dos 26 ramos acompanhados pelo IBGE, 15 ficaram no negativo ante jul/21 (58% do total) e 19 deles estão em um patamar inferior ao pré-crise (73%).
Dos quatro macrossetores, três perderam produção no bimestre jul-ago/21 frente a jul-ago/20. A maior queda coube a bens de consumo duráveis, com -13,8%. Bens e intermediários (-1%) e bens de consumo semi e não duráveis (-1,4%) também ficaram no vermelho, mas com perdas mais brandas. Bens de capital foi o único a manter sua trajetória de recuperação, registrando alta de +31,8%.
Em termos regionais, o IBGE mostra que quase metade dos parques industriais ficaram no vermelho na passagem de jul/21 para ago/21. Funcionou como um atenuante o fato de centros industriais importantes terem ficado no positivo, mesmo que com resultados fracos.
Em ago/21, registraram queda 7 dos 15 parques industriais acompanhados pelo IBGE, ou seja, 47% do total na série com ajuste sazonal. O posto de último colocado voltou a ser ocupado pelo Nordeste, que é a região onde a indústria enfrenta maior dificuldade para reagir à crise provocada pela pandemia.
Com recuo de -3,5% agora em ago/21, muito influenciada pelo desempenho da indústria pernambucana (-12,5%, com ajuste sazonal), a produção industrial do Nordeste como um todo encontra-se 19,9% abaixo do patamar pré-pandemia, isto é, de fev/20. Nenhuma outra região está tão distante assim do início de 2020.
A despeito do persistente retrocesso do Nordeste e das fragilidades da performance da região Sul, grandes centros industriais, como São Paulo e Rio de Janeiro, conseguiram ficar no azul em ago/21.
A indústria paulista registrou crescimento de apenas +0,4% frente a jul/21, ficando muito próxima da estabilidade. Poderia ter sido mais, já que vinha de dois meses seguidos de queda. Frente a ago/20, São Paulo também se saiu melhor do que o total Brasil (-0,7%), mas não escapou do baixo dinamismo, ao variar apenas +0,9%, decorrente de quedas expressivas em alimentos, bebidas e produtos farmacêuticos e crescimento de dois dígitos em veículos e máquinas e equipamentos.
Ainda no Sudeste, a indústria do Rio de Janeiro cresceu +1,3% ante jul/21, com ajuste sazonal, e +1,4% em relação a ago/20, em uma trajetória superior à de São Paulo, portanto. Setores como veículos, outros equipamentos de transporte, metalurgia e farmacêutica ajudaram a compensar os recuos dos ramos extrativos e de derivados petróleo, assegurando alta na comparação interanual.
Na região Sul, que vinha apresentando mau desempenho nos últimos meses, Paraná e Santa Catarina conseguiram crescer em ago/21, mas o Rio Grande do Sul continuou em declínio. A indústria gaúcha caiu -1,0% frente ao mês anterior, a terceira taxa negativa seguida. Ante ago/20, a queda foi de -1,5%, puxada principalmente por veículos, bebidas, fumo e produtos químicos.
Por fim, vale mencionar que coube à indústria do Norte do país os melhores resultados na passagem de jul/21 para ago/21: +7,3% no Amazonas e +7,1% no Pará, já descontados os efeitos sazonais. No Centro-Oeste, tanto Mato Grosso (-2,3%) como Goiás (-0,3%) ficaram no vermelho.
Comércio
Assim como para a indústria, ago/21 também foi um mês de perdas para o comércio varejista, segundo os dados do IBGE. A variação frente a jul/21 foi de -3,1%, já descontados os efeitos sazonais, e de -2,5%, se também consideradas as vendas de veículos, autopeças e material de construção, isto é, no conceito ampliado do varejo.
E as semelhanças com a indústria não param por aí: taxas negativas também marcaram a maioria dos ramos do varejo (70% deles) e, com bases de comparação menos deprimidas, dada a recuperação na segunda metade de 2020, o desempenho interanual acusou recuo das vendas (-4,1% no conceito restrito e 0% no conceito ampliado).
Esta convergência de trajetórias pode não ser casual, já que o varejo é um importante canal de escoamento da produção industrial, e pode estar sinalizando para um enfraquecimento do nível de atividade neste início do segundo semestre.
As vendas reais do varejo estão em uma gangorra há meses, pelo menos desde final do ano passado. Esta oscilação entre altas e baixas freia a expansão do setor, mas é mais favorável do que a sequência de recuos que a indústria vem apresentando.
No desempenho recente dos diferentes ramos do varejo auferido pela série com ajuste sazonal, que é mais sensível às mudanças de curto prazo, dois padrões se destaquem. Há quem oscile muito perto da estabilidade, isto é, em torno de zero, e há quem venha apresentando quedas seguidas, após um período de resultados erráticos.
O primeiro caso inclui segmentos de peso para o varejo como um todo, como supermercados, alimentos, bebidas e fumo, cujas vendas vêm sendo restringidas por aumentos de preço, além do quadro de elevado desemprego, e veículos e autopeças, cuja cadeia produtiva sofre com a escassez de insumos. O ramo de produtos farmacêuticos e de perfumaria também pertence a este primeiro grupo.
No segundo grupo, mais numeroso, estão metade dos dez ramos acompanhados pelo IBGE: material de construção, combustíveis e lubrificantes e equipamentos de escritório, informática e comunicação já acumulam três meses seguidos de queda, enquanto móveis e eletrodomésticos e livros, jornais e papelaria caíram nos últimos dois meses.
A exceção ficou por conta de tecidos, vestuário e calçados, em alta tanto em ago/21 (+1,1%) como jul/21 (+2,0%) na série com ajuste sazonal. Isso, porém, após fortes declínios, devido aos períodos de recrudescimento da pandemia e das medidas restritivas.
Serviços
O setor de serviços, em ago/21, andou em direção oposta à indústria e ao comércio ao apresentar novo mês de crescimento de seu faturamento real. O sinal positivo foi bastante disseminado entre seus diferentes ramos, mas a intensidade da alta deixou a desejar, sugerindo que o enfraquecimento geral do nível de atividade econômica não poupou o setor.
Na passagem de jul/21 a ago/21, já descontados os efeitos sazonais, o faturamento dos serviços como um todo se expandiu em +0,5%. Esta foi a menor taxa positiva de 2021, ainda que o setor mal tenha voltado a patamares anteriores à pandemia. Só a partir de mai/21 seu faturamento total voltou a ficar sistematicamente acima de fev/20, chegando a 4,6% agora em ago/21.
O crescimento foi fraco, mas mostrou-se mais bem distribuído do que no mês anterior. Em ago/21, quatro dos cinco segmentos acompanhados pelo IBGE ficaram no azul na série com ajuste sazonal. Em jul/21, haviam sido apenas dois. A exceção agora coube aos serviços profissionais, administrativos e complementares, que, após três altas seguidas, registraram -0,4%. Este segmento encontra-se virtualmente estagnado no início do 2º sem/21.
Transportes e seus auxiliares, informação e comunicação e outros serviços foram os três segmentos que, em ago/21, reagiram ao declínio sofrido em jul/21. Estes três segmentos são justamente aqueles que já conseguiram virar a página da crise da Covid-19, mais do que compensando as perdas anteriores. Também foram os que menos sofreram com a crise, sobretudo, informação e comunicação, por sua essencialidade em tempos de distanciamento social e trabalho remoto, e outros serviços, que reúnem um conjunto muito diversificado de atividades, conferindo a este segmento alguma resiliência.
Em comparação com fev/20, o nível de faturamento real dos serviços de informação e comunicação de ago/21 está 11,0% acima, o de outros serviços 9,0% acima e o de transportes, seus auxiliares e correios, 8,1% acima do pré-pandemia.
O segmento com maior dinamismo foi o de serviços prestados às famílias, cujo faturamento real subiu +4,1% em ago/21 ante jul/21, com ajuste sazonal. Foi o quinto mês consecutivo de expansão, o que é bastante necessário, já que este ramo permanece muito longe do pré-pandemia. Está em um patamar 17,4% abaixo de fev/20, ou seja, ainda é longo o caminho da recuperação.