Carta IEDI
O Brasil e a indústria mundial no 1º sem/22
Os dados recentemente divulgados pela UNIDO (United Nations Industrial Development Organization) sobre a evolução da produção da indústria de transformação no mundo permitem avaliar em perspectiva comparada o desempenho da indústria brasileira na primeira metade de 2022.
Ao longo do semestre, a indústria mundial apresentou desaceleração, passando de uma alta de +3,7% no 1º trim/22 para +3,1% no 2º trim/22, com ajuste sazonal frente ao mesmo trimestre de 2021. Na comparação de abr-jun/22 ante jan-mar/22 a variação foi de apenas +0,2%, também com ajuste.
Todos os grupos de países assinalaram variações positivas, com destaque para os países industrializados de renda média, grupo que inclui o Brasil. África e Ásia e Oceania foram as regiões que apresentaram maior desaceleração.
Na indústria brasileira, como as Análises do IEDI têm mostrado, não se verificou perda de ritmo, mas os dados da UNIDO deixam claro que, mesmo assim, estamos muito aquém do desempenho industrial mundial.
Do 1º trim/22 para o 2º trim/22, o resultado interanual da indústria de transformação do Brasil progrediu de -4,5% para +0,6%, considerados os dados com ajuste sazonal, tal como faz a UNIDO. A despeito da melhora, a alta de +0,6% é quase 1/5 do resultado do setor no mundo (+3,1%).
E nossa defasagem só aumenta quando comparamos com o desempenho industrial de países mais parecidos com o Brasil. Os países industrializados de renda média, grupo ao qual pertencemos, registraram expansão de +4,0% em sua produção industrial no 2º trim/22, ou seja, quase 7 vezes maior do resultado brasileiro.
Já no agregado da América Latina, a alta no 2º trim/22 chegou a +4,9%, o que representa um ritmo de expansão quase 8 vezes mais robusto do que o a indústria de transformação no Brasil.
Também ficamos longe dos países industrializados de alta renda (+2,4% ante o 2º trim/22) e da China (+2,3%), que registraram importante desaceleração em relação ao resultado do 1º trim/22.
Regionalmente, foi na Europa que a indústria cresceu menos, devido, sobretudo, ao conflito armado na Ucrânia e seus desdobramentos sobre o custo da energia para as empresas e a corrosão do poder de compra dos consumidores em função da alta da inflação. Sua produção industrial cresceu +1,6% no 2º trim/22, isto é, ainda assim quase 3 vezes mais do que a produção industrial no Brasil.
Os maiores avanços couberam à América Latina, que como vimos, cresceu +4,9%, registrando importante aceleração em relação ao 1º trim/22 (+2,3%), e à América do Norte, que ao ampliar sua produção industrial em 4,5% no 2º trim/22 manteve seu dinamismo em relação a jan-mar/22 (+4,7%). Muito da melhora latino-americana foi porque no Brasil a indústria parou de se contrair.
A partir de dados coletados pela UNIDO, o IEDI estabeleceu um ranking com o desempenho industrial em 113 países em 2022. A melhora da indústria brasileira fez sua posição subir do 1º trim/22 para o 2º trim/22, mas mesmo assim seguiu na metade inferior do ranking internacional do setor. No 2º trim/22, avançamos para 81ª posição, atrás de países como China (70º com +2,3%), EUA (46º com +4,5%) e México (41º com +5,2%).
Assim, no acumulado do 1º sem/22, enquanto no mundo a indústria variou +0,1%, no Brasil caiu -2,0%, frente ao mesmo período do ano anterior, com ajuste sazonal. No ranking feito pelo IEDI, ficamos entre os últimos: o Brasil ocupa a 100ª colocação entre os 113 países identificados pela UNIDO na comparação com o 1º sem/21.
Um último dado importante a ser levado em conta. No mundo, a UNIDO mostra que as indústrias de alta e média-alta tecnologia crescem acima do agregado da indústria de transformação: +3,7% ante +3,1% no 2º trim/22. No Brasil, como analisou a Carta IEDI n. 1162, a alta e a média-alta tecnologia não só se saíram pior do que o agregado total do setor, como seguiram em contração no 2º trim/22.
A indústria de transformação mundial no 2º trim/22
O relatório da UNIDO (United Nations Industrial Development Organization), revela que a indústria manufatureira mundial continuou mostrando enfraquecimento dos impactos negativos provindos da pandemia de Covid-19, no 2º trim/22.
A pandemia exerce uma influência significativa sobre a produção manufatureira global com grandes diferenças regionais e setoriais. Segundo a UNIDO, o conflito atual na Ucrânia é mais uma importante fonte de incerteza, dados os seus efeitos sobre a oferta de matérias-primas, alimentos e energia.
Isso extendeu os problemas das cadeias de suprimentos globais verificados no início da pandemia e levou a um aumento dos preços das commodities e a uma aceleração generalizada da inflação pelo mundo.
No 2° trim/22, a produção industrial mundial registrou variação de +0,2% em relação ao trimestre imediatamente anterior, já corrigidos os efeitos sazonais, assinalando, assim, baixíssimo dinamismo.
Em comparação com o mesmo período do ano anterior, houve aumento de +3,1%, implicando uma leve desaceleração do ritmo de crescimento da produção manufatureira no mundo. Vale lembrar que a alta nesta comparação havia sido de +3,4% no 4º trim/21 e de +3,7% no 1° trim/22.
Dessa forma, enfatiza a UNIDO, a indústria mundial já alcançou os níveis pré-pandemia, mas vem crescendo a uma velocidade moderada.
Embora generalizada, a recuperação industrial no mundo continua ocorrendo em compasso bastante distinto entre as regiões e os grupos de países, como mencionado anteriormente.
Na China, por exemplo, o setor manufatureiro retornou ao seu nível de produção pré-crise já no 2º trim/20. Entretanto, no 2° trim/22 teve um fraco resultado para os padrões do país: apenas +2,3% frente ao mesmo período de 2021, o mais baixo nos últimos dois anos.
Muito disso, menciona a UNIDO, foi provocado pelas medidas de contenção da Covid-19, bastante rígidas em algumas grandes cidades industriais da China neste último trimestre em análise.
No 2° trim/22, dentre as economias industrializadas, o crescimento de +0,1% frente ao trimestre anterior foi puxado pelo resultado do grupo de países de média renda, excluindo a China (+0,3%). Na comparação interanual, os países industrializados tiveram alta de +2,6%, também por conta do resultado do subgrupo dos países de renda média, excluindo a China (+4,0%).
A China, por sua vez, teve um decréscimo de -0,1% no 2º trim/22 frente ao trimestre anterior, em comparação com a alta de +1,4% do trimestre anterior. Em relação ao mesmo período de 2021, China também ficou abaixo do total mundial (+3,1%), com alta de +2,3%.
A seu turno, os países industrializados de alta renda expandiram sua produção industrial em apenas +0,1% no 2º trim/22 frente ao período imediatamente anterior. Em comparação com mesmo período de 2021, a indústria desses países cresceu +2,4%.
O desempenho industrial das economias industrializadas
A indústria de transformação das economias industrializadas, que corresponde a mais de 90% da produção industrial global, registrou alta de +2,6% no 2º trim/22 ante o mesmo período de 2021, a menor variação positiva desde o 4° trim/2020.
Em relação ao trimestre imediatamente anterior, na série com ajuste sazonal, a produção desse grupo de países, variou apenas +0,1% no 2° trim/22, após variação positiva de +1,4% no trimestre imediatamente anterior. Frente ao 2º trim/21, a alta foi de +2,6%.
O melhor desempenho foi reportado pelas economias industriais de renda média, com um crescimento interanual de +2,7% quando incluíada a China, seguido por economias industriais de alta renda com +2,4%.
Entre os países desse grupo, a Colômbia assinalou o ritmo mais dinâmico de crescimento da produção, com alta de +21,0% frente ao 2º trim/21, seguido por Israel e Bulgária com um crescimento da produção de aproximadamente +16,0%. Polônia e Turquia também se destacaram, crescendo +12,1% e +10,6%, respectivamente.
A China, por sua vez, registrou um crescimento da produção de apenas +2,3% no 2º trim/22, quase a metade do desempenho do primeiro trimestre do ano (+4,2%), na comparação com o mesmo período de 2021.
Por outro lado, a Irlanda indicou decréscimo de -5,0% pelo terceiro trimestre consecutivo, enquanto a Bielorrússia sofreu uma queda de produção de cerca de -10%, sempre na comaração interanual.
Desempenho industrial das outras economias em industrialização
As demais economias em industrialização, conforme divisão realizada pela UNIDO, compreendem um grupo de 55 países bastante heterogêneo, entre os quais, Chile, Hong Kong, Dinamarca, Taiwan, Grécia, Portugal, Índia e Vietnã, entre outros.
No 2º trim/22 este grupo de países apresentaram um crescimento de +10,4% frente ao 2º trim/21 e de +1,9% frente ao trimestre imediatamente anterior, sempre com ajustes azonal.
Os países de renda média e alta desse grupo registraram um aumento significativo de +9,7% e 13,2%, respectivamente, no 2° trim/ 2022. Frente aos dados do 1º trim/22, a produção dos países de alta renda cresceu +2,2% e dos de média renda, +1,8%.
No entanto, as economias de baixa renda (Burkina Faso, Burundi, Madagascar, Moçambique, Ruanda, Togo e Uganda) ainda não se recuperaram da crise, visto que sua produção manufatureira permanece abaixo do nível pré-pandemia e, adicionalmente, registrou queda significativa no 2º trim/22 em comparação com o trimestre anterior (-1,8%) e variação de apenas +0,1% frente ao 2º trim/21.
Desempenho industrial por região
Em nível regional, no 2º trim/22, os países da América Latina e Caribe mostraram a melhor performance, com uma expansão de +4,9% frente ao 2º trim/21, atribuído aos resultados da indústria da Argentina (+7,8%), México (+5,2%) e Colômbia (+21,2%). A indústria brasileira pouco cresceu (+0,6%), mas ao menos ficou no terreno positivo.
Em relação ao trimestre imediatamente anterior, a indústria da América Latina também se destacou, com uma alta de +1,4%, já descontados os efeitos sazonais. Foi o melhor resultado nesta comparação entre as regiões analisadas pela UNIDO e vem mostrando consistência em sua trajetória, com alguma aceleração.
Na América do Norte, a produção industrial cresceu +4,5% em abr-jun/22 ante o mesmo período do ano anterior, seguindo um avanço de +4,7% no trimestre anterior na mesma base de comparação. Esse resultado está ligado à atividade manufatureira dos Estados Unidos, que registrou variação de +4,5%.
Frente ao trimestre imediatamente anterior, a indústria da América do Norte manteve trajetória positiva ao longo de todo o ano de 2022: +1,1% no 1° trim/22 e +1,0% no 2º trim/22, registrando consistência na trajetória, tal como a América Latina, mas neste caso com algum sinal de desaceleração.
As economias asiáticas e da Oceania, por sua vez, obtiveram avanço de +3,1% no 2° trim/22 frente ao mesmo período de 2021, isto é, o mesmo ritmo registrado pelo total da indústria mundial, embora o resultado da indústria japonesa tenha sido negativo (-3,6%). Frente ao trimestre imediatamente anterior, a indústria desse grupo de países assinalou decréscimo de -0,2%.
Na Europa, apesar dos efeitos do conflito na Ucrânia, a produção industrial manteve-se em território positivo, elevando-se em +1,6% no 2º trim/22 frente ao mesmo período de 2021, após variação de +1,8% no trimestre anterior na mesma base de comparação. Ainda assim, é a região que menos tem crescido em 2022.
Em comparação com o trimestre anterior, a Europa registrou variação de apenas +0,3% em abr-jun/22, já descontados os efeitos sazonais. Ainda que positivo, este resultado é da ordem de ¼ do ritmo de expansão do 1º trim/22 (+1,3%).
Entretanto, a UNIDO alerta que esta expansão pode estar em risco devido a interrupções nas cadeias de suprimentos e preços crescentes de energia e das commodities em razão da guerra na Ucrânia e sanções à Rússia e dos efeitos remanescentes da pandemia.
Destacam-se os resultados da indústria espanhola, que cresceu +4,3%, da França (+2,0%), Itália (+1,9%) e Reino Unido (+1,8%) frente ao 2º trim/21, enquanto a Alemanha amargou declínio da produção industrial pelo terceiro trimestre consecutivo: -1,3% no 4º tri/21, -1,2% no 1º trim/22 e -1,3% no 2º trim/22.
No caso das da África, houve variação de +3,3%, comparativamente ao 2º trim/21 e -0,1% em relação ao 1º trim/22. Na comparação interanual, foram observadas variações positivas na Nigéria (+3,6%), Egito (+2,7%), Angola (+31,1%) e Mauritânia (+16,5%).
Análise setorial
Segundo a UNIDO, além da crise sanitária devido à Covid-19, nos últimos 2 anos, incertezas relacionadas ao aumento das restrições ao comércio internacional tiveram grande influência sobre os produtores industriais e levaram a uma desaceleração gradual da atividade do setor, a partir 2018, embora com impactos variados em diferentes ramos industriais.
Ao invés destes fatores de desaceleração da indústria mundial se dissiparem nos últimos meses, permaneceram presentes e em algumas regiões foram intensificados com a eclosão do conflito armado na Ucrânia e as sanções econômicas às Rússia.
A recuperação mais rápida foi registrada pelas indústrias de média-alta e alta tecnologia. Em contraste, a recuperação mais lenta foi registradas por indústrias de baixa tecnologia. Na comparação com o trimestre anterior, todos os segmentos relataram crescimento moderado.
No 2° trim/2022, as indústrias classificadas como média-alta e alta tecnologia continuaram com desempenho superior aos demais setores, crescendo na comparação anual taxa de crescimento de +3,7%. Enquanto as indústrias de baixa tecnologia cresceram +2,4%, as de média-baixa tecnologia registraram uma expansão de apenas +0,8%.
A taxa de crescimento das indústrias de média-alta e alta tecnologia permaneceu consistente com o resultado da produção de computadores, eletrônicos e produtos ópticos e equipamentos elétricos.
A produção de veículos automotores, reboques e semirreboques (setor de alta tecnologia) ainda não retornou a patamares pré-pandemia. Porém, em comparação com o trimestre anterior, os dados mais recentes mostram que a produção mundial de veículos automotores está em vias de recuperação, mas alguns países já ultrapassaram o pré-pandemia.
A produção das indústrias de média-baixa tecnologia desacelerou, segundo comenta a UNIDO, principalmente devido à queda na produção de metais básicos (-0,5% ante o 2º tirm/21).
Ranking Indústria de Transformação Mundial
A partir da base de dados da, UNIDO, o IEDI elaborou um ranking internacional de crescimento da produção da indústria de transformação com 113 países para o acumulado de 2022.
As séries empregadas pela UNIDO possuem ajuste sazonal, embora usualmente o IBGE use dados sem ajuste nas comparações frente ao mesmo período do ano anterior. Por esta razão, pode haver pequena alteração em relação aos dados de resultado divulgados pelo IBGE.
No acumulado do primeiro semestre de 2022, o desempenho divulgado pela UNIDO com ajuste sazonal para a indústria de transformação do Brasil aponta para uma variação negativa de -2,0% frente ao mesmo período de 2021.
Embora negativo, o quadro geral da indústria brasileira vem se amenizando, como o IEDI já mencionou em suas análises, tanto é que, no 1º trim/22, a queda, que foi de -4,5%, se mostrava bem mais intensa.
Dessa forma, a indústria de transformação no Brasil ficou na 100ª posição no ranking em 2022 até junho, isto é, na metade inferior da amostra, entre as que menos cresceram no ano passado.
Ainda assim, nosso desempenho superou o resultado de alguns países importantes, como o da Japão (-2,1%) e Irlanda (-10,1%), entre os países industrializados. Nenhum país emergente de destaque ficou abaixo do Brasil no ranking.
O segundo trimestre de 2022 contribuiu muito para a melhora de colocação do Brasil no ranking, visto que no acumulado entre janeiro e março o Brasil ocupava a 109ª posição.
Considerado apenas o desempenho do 2º trim/22 frente ao 2º trim/21, o Brasil apresentou resultado de +0,6%, o que colocou o país na 81ª posição entre os 113 países identificados pela UNIDO, após também termos ficado na 109ª posição no 1º trim/22.
Voltando ao acumulado da primeira metade de 2022, as primeiras colocações couberam a Filipinas (+33,7%), Trinidad e Tobago (+25,0%) e do Quirguistão (+24,0%). Ademais, destacam-se também pelo resultado positivo a Turquia (+10,2%), que mantém taxa de crescimento de dois dígitos desde o 2º trim/21, e Índia (+6,5), que havia crescido apenas +1,1% no acumulado entre jan-mar/22.