Carta IEDI
Apesar das adversidades, mais emprego na indústria em 2023
A presente Carta IEDI faz parte do acompanhamento periódico que o Instituto realiza sobre o emprego e da renda dos ocupados no setor privado brasileiro, com ênfase na indústria de transformação. O estudo toma como base os microdados da PNAD Contínua divulgada pelo IBGE e, nesta edição, destaca o desempenho de 2023, em particular o do último trimestre do ano passado.
Como já observamos em outras ocasiões, a contribuição de 2023 para o quadro do emprego veio menos do ritmo de criação de novas vagas e mais de aspectos qualitativos, como a expansão mais robusta dos postos com carteira assinada, e do aumento do rendimento real do trabalho. A indústria, a despeito do baixo dinamismo de sua produção, ajudou neste processo.
No setor privado como um todo, após expansões de +6,1% em 2021 e de +7,8% em 2022, a ampliação da ocupação desacelerou para +1,8% em 2023. Cabe notar que, em 2022, o número de pessoas ocupadas já havia se recuperado do choque adverso provocado pela pandemia: na média dos trimestres do ano ficou em patamar 4% acima do de 2019, avançando para 5,3% acima em 2023.
Outro fator que concorreu para tal desaceleração é que as atividades econômicas que melhor desempenharam no ano passado são, em geral, pouco empregadoras. Ou seja, seu bom resultado pouco ajuda a melhorar a situação do emprego e renda das famílias.
Vejamos os dois principais destaques do resultado do PIB no ano passado: a agropecuária, com uma alta de +15,1%, e a indústria extrativa, com +8,7%, como discutido na Análise IEDI de 01/03/2024. No primeiro caso, a participação no emprego privado total em 2023 foi de 9,5% e no segundo caso, de apenas 0,6%.
A baixa participação do ramo extrativo, que é uma atividade sabidamente intensiva em capital, tirou força no impacto agregado do expressivo aumento do número de seus ocupados: +8,3%, fazendo dele o setor que mais criou empregos em 2023.
Por outro lado, a despeito da maior participação da agropecuária, é um setor que vem repetidamente cortando postos de trabalho, dada a sua mecanização. Assim, a alta de dois dígitos do PIB da agropecuária em 2023 veio acompanhada de retração de -5,0% do seu número de ocupados, intensificando bastante o declínio de -1,6% de 2022.
Assim, recomposto o gap provocado pela pandemia e a baixa capacidade de geração de empregos dos setores de maior dinamismo, era de se esperar que houvesse alguma acomodação do aumento de vagas ocupadas em 2023, que só não foi maior porque o setor de serviços, mesmo desacelerando, seguiu crescendo e compensando a evolução de outras atividades.
Em 2023, o número de ocupados nos serviços registrou +3,9%, isto é, três vezes maior do que a alta do setor privado como um todo. Importante na expansão dos ocupados em geral, o setor de serviços ajudou proporcionalmente menos naquilo que marcou o ano passado, ou seja, na melhora qualitativa das ocupações em função do avanço dos postos formais de trabalhos.
Do adicional de 1,5 milhão de novos ocupados no setor de serviços em 2023, uma parcela minoritária de 44% dizia respeito a empregos com carteira assinada (+675 mil). Este papel de alavancar os postos formais recai sobre outros setores, como a indústria, ainda que não seja tão intensiva em trabalho como os serviços e a despeito da fraca evolução que apresentou no ano passado.
Mesmo tendo sido o setor econômico que pior se saiu em 2023, com queda de -1,3% em seu PIB e retração de -1,0% de sua produção física, a indústria de transformação aumentou o seu número de ocupados em +0,4% em relação a 2022, puxado por 57% de seus ramos. O crescimento dos postos com carteira assinada no setor foi de +2,0%. Os ramos de média intensidade tecnológica foram os que mais aumentaram vagas com carteira (+6,0%).
Vale mencionar que ao lado dos serviços, a indústria de transformação foi a única atividade do setor privado analisada nesta Carta que manteve aumento de emprego desde a pandemia, inclusive no contraste do 4º trim/23 com o 4º trim/22 (+0,5%). A diferença é que enquanto seu nível de atividade caiu, o PIB e o faturamento real dos serviços avançaram no ano passado.
Em termos absolutos, o adicional de ocupados com carteira (+150 mil) na indústria de transformação foi 3,5 vezes maior do que o aumento do total privado de ocupados no setor, o que significa uma formalização mais elevada desta parcela da indústria.
Em 2023, a parcela do emprego com carteira no emprego privado total da indústria de transformação foi de 66,6%, com alta de +1,0 ponto percentual ante 2022 e bem acima dos níveis da agropecuária (20%), dos serviços (39,8%) e da média do setor privado em geral (42,6%).
Com esta evolução, a indústria de transformação contribuiu com uma fração de 4% do aumento total do emprego privado em 2023, mas com 12% na expansão do número de ocupados com carteira assinada no setor privado.
Fosse o Brasil um país mais industrializado e com melhores condições para deslanchar o crescimento da produção da indústria de transformação, seu quadro do emprego seria qualitativamente melhor.
Cabe observar que empregos formais, além de assegurarem proteção às famílias frente a doenças, desemprego ou após o término de sua vida profissional, também potencializam o consumo e, por consequência, o dinamismo econômico geral, já que possibilitam um fluxo regular de renda, maior acesso ao crédito e melhor planejamento financeiro às famílias.
O comércio, a seu turno, também gerou proporcionalmente mais emprego com carteira assinada em 2023, mas neste caso, diferentemente da indústria, sua ocupação privada total ficou estagnada no ano passado (+0,1%) e chegou a recuar no contraste do 4º trim/23 com o 4º trim/22 (-0,3%).
A segunda evolução de destaque em 2023 diz respeito ao rendimento real dos ocupados, favorecida pelo avanço do emprego com carteira e sobretudo pela desaceleração da inflação. A alta no ano passado foi de +5,5%, muito acima daquela de 2022 (+0,9%).
Na indústria de transformação, houve inversão de sinal. A queda de -2,7% em 2022 deu lugar a um aumento de +4,6% em 2023, com tendência de aquecimento no final de ano: +5,9% no 4º trim/23 ante o 4º trim/22. Nesta última comparação, a média do rendimento real do setor privado, em contraste, apontou desaceleração, para +3,3%.
O emprego privado em 2023
Esta Carta IEDI faz parte do acompanhamento periódico que o IEDI realiza sobre o emprego e da renda no setor privado brasileiro, com ênfase na indústria de transformação, como base nos microdados da PNAD Contínua. Nesta edição, foram analisadas as informações anuais (média dos trimestres) e do 4º trim/23, divulgados recentemente pelo IBGE.
As perdas de emprego ocorridas na pandemia, entre 2019 e 2020, foram de -7,5 milhões de postos de trabalho, mais do que recuperados até 2022, quando o total de ocupados atingiu 86,1 milhões (+10,8 milhões de empregos, em relação a 2020). Este resultado refletiu o forte ritmo de crescimento interanual da ocupação em 2022, de +7,8% com incremento de 6,2 milhões de ocupações. A indústria de transformação registrou, neste período, alta de 6,1%, agregando 654 mil novos empregos no mercado de trabalho.
Em 2023, a ocupação do setor privado cresceu bem menos, +1,3% em relação a 2022 o que significou 1,1 milhões de pessoas ocupadas a mais no país. A composição da expansão econômica no ano passado, menos calcada no mercado interno, conforme discutido na Análise IEDI de 01/03/24, foi um dos fatores da desaceleração na geração de empregos, além é claro, da superação dos efeitos negativos da pandemia.
Os setores protagonistas do avanço do PIB em 2023 - a agropecuária (+15,7%) e a extrativa mineral (+8,7%), como se sabe, são pouco empregadores. No primeiro caso, o aumento da mecanização na produção agrícola nos últimos anos tem impactado o nível de emprego do segmento.
Entre 2022 e 2023, o estoque de ocupados no setor agropecuário perdeu 433 mil postos de trabalho com queda de 5,0%. Já, na extrativa mineral o número de ocupados é pequeno, abaixo de 500 mil empregados, o que atenua o efeito sobre o emprego agregado do aumento expressivo de 8,3% entre 2022 e 2023, somando 38 mil empregos a mais.
Nos demais setores, a desaceleração do PIB dos serviços e da construção civil em 2023 e as quedas de -0,5% na indústria de transformação e de -0,1% no comércio, comprometeram o resultado do mercado de trabalho.
Entre 2022 e 2023, o pior desempenho ocorreu na construção civil com queda interanual de 1,7% na ocupação e menos 124 mil ocupações. O emprego industrial cresceu 0,4%, com acréscimo de 42 mil postos de trabalhos, sendo que o seu estoque de ocupados atingiu 11,4 milhões. No comércio, o emprego praticamente não cresceu e no setor de serviços o ritmo de crescimento caiu para menos da metade, de 10,8% para 3,9%, entre 2022, neste período.
Já o emprego no setor privado com carteira de trabalho assinada registrou, em 2023, desempenho melhor, crescendo 3,5% na comparação interanual. Em todos os setores houve crescimento dessa modalidade de emprego, com mais intensidade do que o total da ocupação. Esta foi uma característica do mercado de trabalho do ano passado, qual seja, a de criar mais vagas formais vis-à-vis os demais tipos de postos de trabalho.
Neste tipo de emprego, a indústria de transformação assinalou alta de 2,0%, o equivalente a mais 150 mil pessoas empregadas. O setor com a maior taxa de crescimento foi a indústria extrativa mineral, onde a ocupação cresceu 10,6% (+53 mil postos de trabalho), seguida de Serviços, comércio, construção civil e agropecuária com altas de, respectivamente, 4,4%, 3,5% 2,0% e 1,0%, neste período.
Neste contexto, com exceção do setor de serviços, a proporção de empregados com carteira assinada no total da ocupação cresceu em todos os setores, na passagem de 2022 para 2023 e na comparação com 2020. Dois segmentos da indústria se destacaram com os maiores percentuais: na indústria de transformação esse indicador alcançou 66,6% com 1,1 p.p. acima do patamar de 2020; na extrativa mineral a proporção de emprego com carteira assinada é a mais elevada com 84,1% em 2023 (+3,5 p.p., em relação a 2020).
Os menores percentuais de carteira assinada no total do emprego se localizaram, em 2023, na agropecuária (20,0%) e na construção civil (24,3%), seguido pelo comércio com 48,8%.
No que diz respeito ao rendimento médio real habitual, do trabalho principal dos ocupados, o ano de 2023 foi positivo e superior ao resultado de 2022. No total agregado do setor privado, este rendimento atingiu R$ 2.679 com alta interanual de 5,5%, superior à variação de 2022 (+0,9%).
Em termos setoriais, as indústrias extrativas mineral e de transformação obtiveram valores absolutos acima da média do setor privado de, respectivamente, R$ 4.441 e R$ 2.724 com crescimentos de 14,2% (extrativa mineral) e 4,6% (indústria de transformação). Nos serviços, o patamar de rendimentos reais foi de R$ 2.949, com alta de 5,7%, neste período em tela.
Resultados do 4º trimestre de 2023
A despeito do PIB ter permanecido estável entre o 3º e 4º trimestre de 2023, excluída a sazonalidade, e na comparação interanual ter apresentado algum arrefecimento no final do ano (2,1% no 4º trim/23), a economia brasileira voltou a criar postos de trabalho com maior intensidade neste período.
Na comparação interanual, o setor privado nos últimos três meses do ano passado agregou 1,5 milhão de ocupações na economia com expansão de 1,8%. Estes indicadores no 3º trim/23 foram de, respectivamente, +508 mil empregos e variação de +0,6%.
Em termos setoriais, os serviços apresentaram desempenho mais expressivo (+4,8%), com acréscimo de 1,9 milhão de postos de trabalho, em relação ao mesmo período de 2022, seguido pela construção civil (1,1% e +78 mil empregos). Já na agropecuária e no comércio houve recuos do emprego de, respectivamente, -5,9% e -0,3%. O resultado positivo da indústria no último trimestre de 2023 na comparação interanual (+0,5% e +60 mil postos de trabalho) reverteu a queda da ocupação observada no trimestre anterior.
A tendência de maior formalização do emprego também se manifestou no quarto trimestre de 2023. O emprego com carteira assinada no setor privado manteve no terceiro e no quarto trimestres a mesma taxa de expansão de 3,0%, em relação ao mesmo período de 2022, o equivalente a mais 1,1 milhão de pessoas ocupadas nessa modalidade de trabalho.
O resultado positivo na indústria (+1,4%) no 4º trim/23 também reverteu a queda do emprego com carteira assinada observada no trimestre anterior, com o acréscimo de 107 mil trabalhadores formais. À exceção da agropecuária (-2,8%), os demais grandes setores tiveram resultados positivos na geração de ocupações com carteira assinada neste período: serviços (5,2%), comércio (1,8%) e construção civil (0,6%).
Por dentro do emprego industrial no quarto trimestre de 2023
Dentre os setores da indústria analisados no 4º trim/23, em 12 deles a ocupação registrou elevação, e em 11 houve redução, na comparação interanual. Esse desempenho foi praticamente o mesmo do observado no trimestre anterior, quando 11 ramos haviam tido aumento do emprego.
As maiores altas na ocupação, no 4º trim/23, foram nos seguintes ramos: produtos químicos (14,3%), bebidas (12,6%) e móveis (11,4%). Já as maiores reduções ocorrem em: máquinas e equipamentos (-14,4%), celulose, papel e produtos de papel (-7,6%) e na fabricação de produtos de madeira (-7,3%).
Com relação à classificação dos setores da indústria de transformação segundo intensidade tecnológica, o emprego com carteira assinada no grupo de alta tecnologia apresentou resultado negativo pelo quarto trimestre consecutivo, todavia, o ritmo de queda foi menor no 4º trim/23 (-2,2%), na comparação interanual, frente a redução de -9,2% verificada no 3º trim/23.
Os empregos que mais cresceram no 4º trim/23 foram aqueles localizados nas empresas de média intensidade tecnológica com alta de 6,3% e incremento de 91 mil postos de trabalho. Os demais grupos também tiveram resultados positivo, mas com menor: média-alta (0,2%) e média-baixa (0,5%).
Tendo-se como referência o índice (4º trim/20 = 100), observa-se que a ocupação cresceu de certa forma firme nos grupos de média e média-alta tecnologia, atingindo patamares de, respectivamente, 22,4% e 18,4% em 4º trim/23.
Já os grupos de média-alta e média-baixa apontam para comportamentos um apouco mais fracos, na faixa de 15,0%. Por fim, a ocupação no grupo de alta tecnologia encerrou o período analisado praticamente no mesmo nível do final de 2020, embora tenha passado por patamares inferiores nos três primeiros trimestres de 2023.
Desempenho do rendimento médio real e da massa de rendimento no 4º trimestre de 2023
O rendimento médio real habitual dos ocupados no setor privado cresceu 3,3% no 4º trim/23, na comparação interanual, implicando ritmo inferior ao observado nos trimestres anteriores. Já na indústria de transformação, o rendimento manteve o crescimento de 5,9%. Assim, o rendimento médio na indústria (R$ 2.804) foi 3,1% superior ao rendimento do total dos ocupados (R$ 2.719).
Na indústria de transformação houve aumento do rendimento médio para os empregados com carteira assinada em 15 ramos e redução em outros 8. Destaques positivos foram observados em: produtos farmoquímicos e farmacêuticos (40,5%) e outros equipamentos de transporte, exceto veículos automotores (22,2%). No campo negativo se destacaram impressão e reprodução de gravações (-14,5%) e fabricação de celulose, papel e produtos de papel (-10,2%).
A massa de rendimento real habitual da indústria de transformação cresceu com um pouco mais de intensidade do que a do total do setor privado (6,6% ante 5,4%, respectivamente). É a primeira vez que a variação da indústria foi superior ao do setor privado desde o 4º trim/20, embora ambos estivessem no campo negativo à época, devido à pandemia do coronavírus.