Carta IEDI
Bens de Consumo Semiduráveis e Não Duráveis: Um Setor Ainda em Recessão
O desemprego, a queda de rendimento e o crédito caro estão cobrando seu preço. A indústria brasileira como um todo está em recuperação, mas um segmento que tem peso elevado na indústria em todas as regiões do país e é grande empregador - o que produz bens de consumo semiduráveis e não duráveis para a população (alimento, vestuário, calçados, utensílios domésticos, mobiliário, etc) - ainda se encontra em recessão. Isto vem ditando a lentidão e os tropeços da produção industrial, desde que esta começou a ensaiar uma reativação a partir de julho de 2003.
A última pesquisa do IBGE sobre a produção industrial de novembro último, mostra um excelente resultado para bens de capital com uma evolução de 3,9% frente a outubro e 8,4% comparativamente a novembro de 2002, e resultado satisfatório para bens de consumo duráveis cujo aumento foi de 2,2% e 3,6%, respectivamente, na primeira e na segunda base de comparação.
Mas, o segmento que produz para o consumo de massa registrou índices muito ruins, o que derrubou todas as projeções de analistas sobre o crescimento industrial no mês. A produção de semiduráveis e não duráveis caiu 1,6% na comparação com outubro e 7,1% relativamente a novembro de 2002, o que trouxe a média da indústria geral para decepcionantes índices de crescimento: 0,8% com relação a outubro e de 0,3% com relação a novembro de 2002.
A população pode até estar mais disposta a consumir como mostram as pesquisas de opinião. Mas, sem renda e com crédito ainda muito caro e de difícil acesso, de onde vai tirar recursos para consumir?
Nossos indicadores de tendência mostram uma trajetória firme de recuperação a partir de julho de 2003, para bens de capital e bens duráveis. Em contraste, para bens o segmento de bens semiduráveis e não duráveis, os dados sugerem que a modesta trajetória de recuperação iniciada em setembro não se sustentou. Ocorre que este é um segmento empregador e se ele não cresce ou declina, o emprego industrial também não cresce ou evolui apenas modestamente. Os maiores volumes de emprego e de massa salarial que poderiam acompanhar a recuperação industrial ficam, assim, comprometidos, com o que este segmento “patina” e o círculo vicioso se repete.
Este círculo pode ser rompido, mas para isso é necessário que os segmentos que vem liderando a recuperação (bens de capital e bens de consumo duráveis) cresçam com maior intensidade do que vem ocorrendo e que o emprego seja impulsionado por políticas dedicadas. Em um momento como esse é sentida a falta de políticas fora do eixo estrito das políticas macroeconômicas (juros, câmbio, fiscal). Infelizmente, o Brasil da última década renunciou e perdeu tradição nessas políticas e, ao que parece, ainda não recuperou condições para voltar a promovê-las com a presteza que a conjuntura da economia exige. Certas ações e programas já deveriam estar em curso:
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Programa “moder-máquina” (o “moderfrota” da agricultura adaptado à industria) para potencializar o crescimento do setor de bens de capital;
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Ações mais efetivas de redução do spread bancário para baixar o custo e ampliar o acesso ao crédito ao consumo geral e de bens duráveis por parte das famílias. Os spreads e o custo do crédito vêm caindo, porém muito vagarosamente.
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Programa de habitação popular para estancar a grave retração da construção civil que, como poucos, é um setor capaz de contribuir com o aumento do emprego e da massa salarial.
Leia mais sobre a produção industrial de novembro no texto abaixo.
Os Resultados de Novembro e a Tendência da Indústria. Em novembro, descontados os efeitos sazonais, a produção física industrial brasileira aumentou 0,8% com relação ao mês de outubro, tendo como líderes os setores de bens de capital e de bens duráveis. Em relação a novembro de 2002, o crescimento foi menor: 0,3%, contra 1,1% em outubro e 4,6% em setembro. No ano (período janeiro-novembro), a indústria geral ficou praticamente estagnada (0,1%) e nos doze meses findos em novembro último a variação foi de 0,4% (contra 0,8% em doze meses terminados em outubro de 2003).
Estes resultados mostram que a recuperação está ocorrendo de forma lenta e a razão disto está na forte queda da renda real da população (-13% em relação a novembro de 2002), do elevado desemprego e do crédito ainda caro, a despeito dos cortes efetuados pelo Banco Central na taxa de juros básicos e da ligeira redução dos spreads praticados pelo sistema bancário.
Um crescimento industrial maior e mais regular dependerá da reativação do consumo interno. A redução da renda real constitui uma barreira para isto. Por isso, o barateamento e o maior acesso ao crédito e a execução de políticas de geração de emprego (na área habitacional, por exemplo) são recomendáveis.

Nossos indicadores de tendência mostram uma trajetória firme de recuperação a partir de julho de 2003, para bens de capital e bens duráveis. Em contraste, para bens o segmento de bens semiduráveis e não duráveis, os dados sugerem que a modesta trajetória de recuperação iniciada em setembro não se sustentou. Com isso, a indústria geral dá sinais negativos, mas que ainda não devem ser interpretados como uma reversão da tendência de reativação da indústria.


Desempenho da Indústria por Categorias de Uso. Os resultados de novembro de 2003 confirmam que a recuperação da produção industrial está sendo liderada pelos setores de bens de capital de bens de consumo duráveis. Por outro lado, evidencia que a produção de bens semiduráveis e não-duráveis ainda não se recuperou, o que vem limitando a intensidade e a regularidade da recuperação. Neste caso, a produção declinou expressivamente em todos os indicadores: -1,6% em relação ao mês anterior, -7,1% na comparação com novembro de 2002, - 5,3% no acumulado no ano (período janeiro-novembro) e -4,8% na variação em doze meses. Estes números refletem a contínua retração da renda real, as elevadas taxas de desemprego, o crédito ainda caro e escasso.
Neste segmento, as indústrias com pior desempenho foram medicamentos e vestuário e calçados, cujas produções caíram, respectivamente, 18,3% e 12,4% em comparação com novembro do ano passado.
Bens intermediários apresentou resultado positivo ainda que inferior a média da indústria na comparação com outubro (0,4% contra 0,8%). Nos demais indicadores, houve aumento da produção de intermediários acima da média da indústria geral: 0,7% na comparação com o mesmo mês do ano anterior, 1,4% na variação acumulada no período janeiro-novembro de 2003 e 1,7% no acumulado em doze meses.
O crescimento da produção de bens de capitais foi o mais destacado: 3,9% em relação ao mês anterior (na série com ajuste sazonal), 8,4% na comparação com novembro de 2002 e 0,4% na variação anual e na variação em doze meses. Para o resultado, contribuiu a forte demanda do setor de agronegócio por máquinas e equipamentos agrícolas, cuja produção aumentou 24% com relação a novembro/2002, como também do setor de transporte e de bens de capital para o setor industrial (crescimento, respectivamente, de 10,2% e 7,8% na mesma base de comparação).
A produção de bens duráveis também foi positiva na série com ajuste sazonal (2,2%) e na série mensal (3,6% em relação ao mesmo mês do ano anterior). Em novembro, o destaque foi produtos eletrodomésticos (7,4%), em especial da chamada “linha marrom” (rádio, tevê e aparelhos de som), cuja produção foi 20,7% maior com relação a novembro de 2002. Note-se que nos indicadores acumulados no ano e em doze meses, o segmento de duráveis continuou registrando resultados negativos: -1,6% no período janeiro-novembro e -0,9% em doze meses terminados em novembro. Ou seja, a relativa recuperação ao longo do segundo semestre ainda não foi suficiente para reverter a expressiva queda ao longo do ano.


Os Ramos e Gêneros da Indústria de Transformação. Em relação a outubro de 2003, a produção da indústria de transformação aumentou 0,3%. Para este resultado contribuiu a indústria mecânica (2,0%), que registrou desempenho positivo pelo quinto mês consecutivo. Ainda no complexo metal-mecânico, destaca-se a expansão da indústria metalúrgica (2,5%) e de material de transporte (5,7%). Registraram resultado negativo: perfumaria (-10,3%), borracha (-7,5%), madeira (-6,6%), vestuário e calçados (-4,1%) e química (-2,2%).

Na comparação com novembro de 2002, a indústria de transformação ficou estagnada. Dos vinte ramos pesquisados pelo IBGE, nove apresentaram crescimento, com destaque, pelo impacto na média global, para mecânica (8,5%) e material elétrico e de comunicações (9,0%). Dentre as onze indústrias que registraram queda, os de maior influência na média industrial foram: farmacêutica (-18,3%), vestuário e calçados (-12,4%), produtos alimentares (-2,8%) e química (-1,7%).
No período janeiro a novembro, a indústria de transformação registrou uma queda de 0,2% em relação ao mesmo período do ano anterior. Para este resultado contribuíram positivamente a indústria mecânica (9,0%), borracha (5,9%) e metalúrgica (4,5%), enquanto os principais impactos negativos originaram-se das indústrias: farmacêutica (-18,4%), vestuário e calçado (-12,4%), matérias plásticas (-11,0%) e fumo (-9%).


Setores da Indústria. Na classificação mais desagregada do IBGE (nível 100), a produção industrial de novembro último com relação a novembro de 2002, destaca-se a forte expansão da produção de: navios e embarcações (110%), material para produtos eletrônicos e de comunicação (30,2%), fertilizantes e adubos (26,7%), álcool (26,9%), fundidos e forjados de aço (22%), aparelhos de áudio e vídeo (20,7%), tratores e máquinas agrícolas (17,4%). As maiores quedas foram registradas na produção de cimento (-20,3%), medicamentos (-18,3%), vestuário (-17,6%) e sucos e alimentos em conserva (-16,6%).
No acumulado do ano, os destaques são: a indústria naval (81,16%), fundidos e forjados de aço (20,3%), celulose e pasta mecânica (15,1%), tratores (14,9%) e destilação de álcool (13,9%). Cabe chamar a atenção para a associação desses segmentos com a exportação e o setor agropecuário. As quedas mais acentuadas foram registradas, mais uma vez, nas indústrias de equipamento para produção e distribuição de energia elétrica (-23,2%), indústria de conservas e sucos (21,7%), indústria farmacêutica (18,4%), vestuário (17,7%), cimento (13,9%) e peças e estruturas de concreto (-12,8%). É notória a relação desses resultados com a crise do setor de construção, a retração do mercado de consumo de massa e a redução do investimento em energia elétrica.
