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                          Carta IEDI

                          Edição 1324
                          Publicado em: 15/08/2025

                          O Brasil na transição energética: oportunidades a serem aproveitadas

                          Sumário

                          O desafio climático e ambiental pelo qual o mundo passa tem produzido no Brasil um relativo consenso de que muitas oportunidades podem ser abrir para o desenvolvimento do país. Seja pelas nossas riquezas naturais, seja porque já temos expertise em áreas importantes para a transição energética, como em biocombustíveis.

                          O IEDI vem apontando estas oportunidades há algum tempo, como na Carta n. 1075 “Transição Verde: oportunidades e desafios para o Brasil”, de 2021; Carta n. 1209 “A necessidade de uma estratégia “net zero” para o Brasil, segundo o Banco Mundial”, de 2023; e nas Cartas n. 1247 “Oportunidades da Sustentabilidade Ambiental” e n. 1291 “Descarbonização e oportunidades para o Brasil”, de 2024, para citarmos alguns exemplos.

                          O impacto destas oportunidades, se bem aproveitadas, foi recentemente estimado por estudo realizado pela UFRJ e PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) que estima que o PIB brasileiro poderia ser acrescido em 0,28 ponto percentual ao ano entre 2025 e 2040 (de 2,1% para 2,38% a.a.) se o Plano de Transformação Ecológica (PTE), coordenado pelo Ministério da Fazenda e que faz parte das NDCs do país, fosse integralmente implementado.

                          Os desafios para a realização deste potencial sabemos que não são poucos. Internamente, por exemplo, exige um ambiente de negócios com menos distorções e custos sistêmicos e um arranjo macroeconômico que viabilize taxas de juros mais baixas, destravando os investimentos necessários para impulsionar a inovação e a produtividade do nosso sistema produtivo.

                          A Carta IEDI de hoje aborda um outro estudo sobre o tema, realizado por pesquisadores do Laboratório de Política Industrial NET Zero da Johns Hopkins University, intitulado “New industrial policy for a new world: Seizing Brazil’s opportunities in the energy transition”, que identifica mais especificamente as principais oportunidades para o Brasil, mas também avalia as iniciativas recentes do programa Nova Indústria Brasil (NIB).

                          Para os autores, além de contar com uma base industrial produtora de bens complexos e com uma agricultura mecanizada, o país possui vantagens competitivas em minerais essenciais, recursos energéticos renováveis e biocapacidade que, se bem exploradas, podem tornar o Brasil um grande produtor e exportador de energia, materiais e tecnologias verdes. 

                          Ao combinar significativa dotação de recursos naturais com forte potencial em manufatura avançada, o Brasil está bem posicionado para se tornar uma potência de primeira ordem no novo sistema energético mundial, segundo o estudo.

                          Sete cadeias são identificadas como as mais promissoras para ensejar o fortalecimento industrial e tecnológico do Brasil neste contexto de um novo “sistema energético mundial”: minareis críticos para a transição energética; baterias e seus componentes; veículos elétricos e híbridos; biocombustíveis para aviação; aço de baixo carbono; produção de geradores de energia eólica; e fertilizantes verdes. 

                          Para chegar em cada uma dessas cadeias, os autores levaram em consideração: a posição brasileira no cenário competitivo do mercado global; a base produtiva doméstica existente e as iniciativas de políticas e as respostas empresariais já identificadas. Ou seja, são cadeias ancoradas em competências e vantagens que já possuímos e com sinais positivos de aderência das estratégias empresariais.  

                          O estudo também alerta para importantes gargalos existentes no país, em geral já bastante conhecidos. É o caso da deficiência de nossa educação e do desafio de capacitar mão de obra para atender a demanda dos clusters tecnológicos que serão criados com o objetivo de explorar o potencial do país na transição energética. É igualmente o caso da integração da ciência com a inovação e das empresas com as universidades nas cadeias produtivas promissoras. 

                          Na avaliação dos autores, o programa Nova Indústria Brasil (NIB), lançado em janeiro de 2024, demostra uma compreensão do potencial que o Brasil pode explorar na transição energética, mas apontam algumas fragilidades importantes:

                               •  A orientação por missão da NIB é ampla demais para fornecer o foco necessário. 

                               •  Os recursos alocados à NIB provavelmente serão distribuídos de forma pulverizada entre muitas prioridades, o que não garante ao Brasil alcançar uma posição de destaque mundial em setores altamente competitivos. 

                               •  Não está claro quais serão os mecanismos de colaboração entre governo, empresas, sindicatos, sociedade civil e especialistas independentes ao longo da sua implementação. 

                               •  Não há na NIB um plano para criar clusters baseados em conhecimento e elaborar combinações de políticas específicas para cada uma das cadeias prioritárias. 

                          Para que o país aproveite as oportunidades que estão se abrindo, os autores recomendam que a política industrial brasileira tenha três características principais:

                               •  Foco: estabelecimento de metas claras em poucos setores, priorizando oportunidades específicas e quantitativas.

                               •  Coordenação forte: melhoria dos fluxos de informação entre governo, indústria, especialistas e diferentes níveis de governo.

                               •  Investimentos estruturais em educação e inovação: construção de uma base de conhecimento focada em áreas estratégicas para competir globalmente.

                          Na avaliação dos autores, além de apoiar projetos e fornecer capital, também deve estar na agenda da política pública a criação de condições para mudanças estruturais por meio de investimentos em infraestrutura, capital humano e energia acessível.

                          Os autores reconhecem, ainda, as restrições fiscais enfrentadas pelo Brasil, por isso, inclusive, a ênfase na necessidade de evitar políticas fragmentadas. Além disso, argumentam que investimentos estratégicos podem ser viabilizados pela ação do BNDES, desde que a política industrial esteja integrada, reduzindo a necessidade de recursos orçamentários.

                          Introdução

                          A Carta IEDI de hoje aborda os principais pontos de um estudo recente da Johns Hopkins University intitulado “New industrial policy for a new world: Seizing Brazil’s opportunities in the energy transition” de autoria de Adriana Mandacaru Guerra e outros pesquisadores do Laboratório de Política Industrial NET Zero (NZIPL).

                          Segundo os autores, a transição para uma economia de baixo carbono abre para o Brasil inúmeras oportunidades de desenvolvimento industrial doméstico em base sustentável, com acesso a novos mercados de exportação, atração de investimentos produtivos nos setores essenciais à transição energética e agregação de valor. 

                          Além de contar com uma base industrial produtora de bens complexos e com agricultura mecanizada, o país possui vantagens competitivas em minerais essenciais, recursos energéticos renováveis e biocapacidade que se exploradas podem tornar o Brasil um grande produtor e exportador de energia, materiais e tecnologias verdes. 

                          Tendo como ponto de partida, a posição potencial do Brasil na geopolítica da transição energética e a análise crítica da política Nova Indústria Brasil (NIB), o estudo examina as oportunidades do Brasil em sete setores industriais verdes altamente promissores no futuro sistema energético mundial: 

                               •  metais críticos para a transição energética, 

                               •  baterias e seus componentes, 

                               •  veículos elétricos e híbridos, 

                               •  biocombustíveis para aviação, 

                               •  aço de baixo carbono, 

                               •  produção de geradores de energia eólica e fertilizantes verdes. 

                          Para cada um desses sete setores, os autores avaliam: i) a posição brasileira no cenário competitivo do mercado global; ii) a base produtiva doméstica existente e iii) as iniciativas de políticas e as respostas empresariais. 

                          O estudo também discute os gargalos existentes no país tanto em termos de mão de obra capacitada necessária para atender a demanda dos clusters tecnológicos que serão criados com o objetivo de explorar o enorme potencial do país e posicioná-lo como líder na geopolítica da transição energética, como da integração da ciência com a inovação e das empresas com as universidades nas novas cadeias produtivas prioritárias. 

                          A nova ordem energética e o potencia brasileiro

                          De acordo com os pesquisadores da Johns Hopkins University, no contexto da transição climática, os países mais importantes são aqueles que possuem potencial solar e eólico de ponta, reservas de minerais críticos, recursos de biomassa e potencial de hidrogênio. 

                          Ao combinar significativa dotação de recursos naturais com forte potencial em manufatura avançada (figura abaixo), o Brasil está bem posicionado para se tornar uma potência de primeira ordem no novo sistema energético mundial, ao lado da China, Estados Unidos e Rússia.

                             

                          Atualmente, além de produzir e exportar bens de consumo complexos, o Brasil conta com uma matriz energética limpa a preços competitivos, o que proporciona uma base sólida para indústrias intensivas em energia. Ademais, detém também importantes reservas de petróleo e gás e expertise na área, que podem contribuir durante a transição, sem que seja necessário expansão adicional no uso dessas fontes.

                          A ampla disponibilidade de energia limpa e barata é, segundo o estudo, uma fonte fundamental da vantagem do Brasil na indústria manufatureira. No contexto de realocação de indústrias para locais com fontes de energia renovável e de baixo custo (powershoring), o Brasil tem grande potencial para se destacar país como produtor de produtos intensivos em energia em todos os setores essenciais para a economia verde mundial, particularmente de aço de baixo carbono, mas também no processamento direto de lítio e fabricação de máquinas para as cadeias de suprimentos de energia eólica e baterias.

                          Além de vantagens adicionais, representadas na figura acima, o estudo assinala que o Brasil conta igualmente com instituições financeiras de desenvolvimento (IFDs), essenciais para o financiamento de projetos de diversificação econômica na transição energética. 

                          Na avaliação do potencial industrial brasileiro, contudo, os autores ressaltam que é preciso considerar os efeitos da desindustrialização, expressa no forte declínio da participação da indústria no PIB, que de 36% em 1985 se reduziu a 13% em 2022. De igual modo, ocorreu o rápido crescimento das exportações agrícolas e minerais brasileiras ao mesmo tempo em que diminuíram as exportações brasileiras de máquinas, produtos químicos e automóveis. 

                           

                          O estudo sublinha que o processo desindustrialização no Brasil coincidiu, sobretudo a partir de 2012, com a restruturação do comércio bilateral Brasil-China em benefício da indústria de transformação chinesa. A China investiu nos setores agrícola e extrativo mineral do Brasil e se tornou o maior parceiro comercial do Brasil, respondendo por 32% das exportações e 23% das importações em 2021. Soja, minério de ferro e petróleo bruto são os principais produtos exportados para a China.

                          Atualmente, há expressivos investimentos chineses na indústria brasileira, casos da instalação de fábricas de baterias e veículos elétricos da BYD e da GWM, além de expansão da presença no país da Goldwind, maior fabricante mundial de turbinas eólicas. Segundo os autores do estudo, esses investimentos podem, se administrado estrategicamente, ajudar a reconstruir a indústria brasileira.

                          As iniciativas da Nova Indústria Brasil (NIB)

                          Na avaliação dos autores, a nova política industrial Nova Indústria Brasil (NIB), lançada em janeiro de 2024, demostra uma compreensão clara dos contornos da ordem mundial emergente e do lugar potencial que o Brasil pode ocupar se explorar as oportunidades associadas à transição energética. 

                          A NIB se diferenciaria das iniciativas anteriores de política industrial ao definir intervenções para incentivar a produção e o investimento em determinados setores organizados em torno de missões, destacando as sinergias intersetoriais necessárias para alcançá-las. 

                          Entre as seis missões delineadas pela NIB, o estudo examinou as Missões 3 e 5, consideradas as mais relevantes para a descarbonização e as políticas industriais verdes. 

                          A Missão 3 concentra-se em infraestrutura, abrangendo iniciativas relacionadas a veículos elétricos e, por extensão, ao desenvolvimento de baterias. A Missão 5, explicitamente dedicada à descarbonização, inclui esforços direcionados a biocombustíveis, energia eólica e solar, e setores intensivos em energia, como aço e cimento. 

                          Os autores destacam que a complementaridade entre essas duas missões é evidente. Por exemplo, o programa de infraestrutura de larga escala do governo, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), representa alguns dos investimentos da Missão 3 e poderia ser alavancado para impulsionar a demanda por painéis solares, aço e cimento de baixo carbono, alinhando o desenvolvimento da infraestrutura com as metas de sustentabilidade. 

                          Para a Missão 3, Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) mapeou três cadeias: Sistemas de Propulsão, Baterias Elétricas e Transporte Metroferroviário. As metas de curto prazo fixadas para 2026, incluem 500 mil unidades habitacionais sociais equipadas com painéis solares e 3% dos novos veículos do país eletrificados com baterias nacionais. Esses números devem aumentar para 1,4 milhão de unidades habitacionais sociais com painéis solares e 33% dos novos carros equipados com baterias nacionais até 2033.

                          Já para a Missão 5, as cadeias produtivas de interesse para a política industrial brasileira são: biocombustíveis (Diesel Verde, SAF e Etanol), Hidrogênio Verde, Biometano, Indústria Pesada (Aço e Cimento de Baixo Carbono), Turbinas Eólicas e Painéis Solares. Porém, as metas apresentadas pelo MDIC para 2026 foram modestas, segundo os autores, e incluíram apenas o aumento da participação de biocombustíveis e eletricidade na matriz de transportes do país para 27%. A meta para 2033 é elevar essa participação para 50%.

                          À semelhança de iniciativas anteriores de política industrial, o governo brasileiro estabeleceu linhas de crédito setoriais, agora organizadas em missões intersetoriais. De acordo com os autores, o governo forneceu orientação crucial para o setor privado ao prometer financiamento para os anos de 2025 e 2026. Para a Missão 3, foram anunciados US$ 10,8 bilhões em novos investimentos diretos, além de US$ 48 bilhões adicionais em financiamento para impulsionar a demanda no setor da construção civil. Já a Missão 5 recebeu um compromisso de US$ 2,36 bilhões para setores-chave.

                          Com investimento público e financiamentos, o governo procura induzir os investimentos privados. No âmbito da NIB, já foram anunciados compromissos significativos do setor privado: aproximadamente US$ 176 bilhões para a Missão 3 e US$ 63 bilhões para a Missão 5. 

                          Além do crédito subsidiado, as missões da NIB contam com incentivos fiscais bem como o uso do poder de compra do governo. Os processos de compras preferenciais para promover setores prioritários da NIB preveem a priorização de produtos nacionais em detrimento dos importados. 

                          Na Missão 3, o programa Mover se destaca com um total prometido de US$ 3,2 bilhões em créditos tributários para empresas automotivas que cumpram as condicionalidades de sustentabilidade e inovação.

                          Na Missão 5, iniciativas não financeiras foram compartilhadas com o Ministério de Minas e Energia e o Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas. O programa Combustível do Futuro criou metas progressivas claras para a adição de biocombustíveis à gasolina e ao diesel e para a descarbonização de viagens aéreas, embora não tenha estabelecido consequências claras para o não cumprimento das metas fixadas para o uso de combustíveis sustentáveis para aviação (SAF) em voos domésticos,

                          O estudo destaca que a criação da Comissão Interministerial de Compras Públicas para o Desenvolvimento Sustentável (CICS) foi um grande avanço, introduzindo margens de preferência para produtos locais e aqueles feitos com materiais reciclados. Contudo, sugere que esses benefícios concedidos aos setores de veículos e cimento sejam estendidos ao aço nacional, particularmente a opções mais sustentáveis, como o aço produzido com carvão de biomassa (biochar) e o aço em forno de arco elétrico com utilização de sucata como matéria prima (Scrap-EAF).

                          O governo brasileiro também aprovou o Marco Legal para o Hidrogênio de Baixo Carbono, criando um ambiente regulatório para o setor, estabelecendo um regime tributário especial para sua produção e desenvolvimento — Rehidro e o Programa para o Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixo Carbono (PHBC). Segundo os autores, essas políticas são essenciais para os setores de aço de baixo carbono e de fertilizantes. 

                          Não obstante a avaliação, no geral, positiva da NIB, os autores do estudo consideram que a nova estratégia industrial brasileira apresenta algumas fragilidades. 

                          Em primeiro lugar, “a política industrial funciona melhor quando visa subsetores ou áreas tecnológicas específicas, para os quais os problemas podem ser formulados de forma precisa e dinâmica e todos os setores da sociedade podem trabalhar juntos para formular soluções. A orientação à missão da NIB é ampla demais para fornecer o foco necessário”. 

                          Em segundo lugar, em decorrência da amplitude das missões, os recursos governamentais alocados à NIB, que somam aproximadamente US$ 60 bilhões, provavelmente serão distribuídos de forma pulverizada entre muitas prioridades, o que não garante ao Brasil alcançar uma posição de destaque mundial em setores altamente competitivos. 

                          Em terceiro lugar, não estão claros quais os mecanismos de colaboração entre governo, empresas, sindicatos, sociedade civil e especialistas independentes. Essa pode ter sido a razão pela qual a maioria das combinações de políticas setoriais ter demorado para ter sido detalhada. Segundo os autores, esse problema ainda pode ser contornado, mas à medida que o governo avança, o tempo está se esgotando.

                          Finalmente, embora a experimentação e a interação dinâmicas sejam necessárias para o sucesso das políticas industriais, para os autores do estudo não há na NIB um plano claro para criar clusters baseados em conhecimento e elaborar combinações de políticas específicas para cada um dos setores prioritários. 

                          Setores industriais promissores no novo contexto energético

                          Segundo o estudo da Johns Hopkins University, o Brasil pode se posicionar entre os líderes nas indústrias do futuro sistema energético, aproveitando seus pontos fortes na agricultura e na mineração. No entanto, para concretizar esse potencial, será preciso atenção focada e direcionada aos setores, relativamente fracos, da indústria de transformação.

                          Como já mencionado, os autores destacam algumas oportunidades importantes para a política industrial verde brasileira, as quais possibilitariam ao país capitalizar sua liderança mundial em recursos naturais, em sete setores industriais altamente promissores no futuro sistema energético mundial de baixo carbono: metais críticos para a transição energética, baterias e seus componentes, veículos elétricos e híbridos, biocombustíveis para aviação, aço de baixo carbono, produção de geradores de energia eólica e fertilizantes verdes. 

                          Um quadro-resumo, que inclui informações sobre a posição do Brasil no cenário internacional, a base de produção doméstica, iniciativas de política, reação empresarial e oportunidades e perspectivas, é apresentado ao final dessa seção.

                          Minerais críticos. O Brasil se destaca como uma potência na mineração, ocupando posição de liderança em muitos metais cruciais para a transição verde. É o segundo maior produtor mundial de minério de ferro, grafite e silício metálico, além de ser um grande produtor de bauxita e de manganês. O país possui igualmente expressivas reservas de níquel e de lítio. 

                           

                          A base produtiva doméstica é robusta em exploração e extração, mas ainda apresenta fragilidades nas etapas intermediárias e finais da cadeia, como o refino e a fabricação de componentes para baterias. O Brasil possui expertise química e recursos naturais que podem ser aproveitados para avançar nessas etapas, mas a ausência de uma cadeia de suprimentos integrada limita o potencial de captura de valor.

                          Graças à abundância de recursos naturais e expertise consolidada, os autores do estudo consideram, contudo, que o Brasil tem oportunidades de desenvolver uma forte posição tecnológica em toda a cadeia produtiva dos metais essenciais para transição energética: exploração e desenvolvimento, extração, beneficiamento da mina, refino e gestão de rejeitos, e reciclagem e reprocessamento. 

                          De acordo com o estudo, o Brasil registrou desenvolvimentos importantes na exploração das reservas de níquel e lítio. Em 2022, TechMet, empresa da qual a Corporação Financeira Internacional de Desenvolvimento (DFC) dos Estados Unidos é acionista, inaugurou a Mina Piauí, com uma meta de produção anual de 25.000 t de níquel contido até 2025. 

                          No que se refere ao lítio, em Minas Gerais, onde há promissoras jazidas, a Sigma Lithium, empresa canadense de beneficiamento industrial do lítio, desenvolve com apoio do BNDES um ambicioso plano de expansão do complexo industrial da Grota do Cirilo no Vale do Jequitinhonha, que expandirá a produção para 104.000 t de carbonato de lítio equivalente anualmente. As estimativas indicam que Grota do Cirilo contém cerca de 109 milhões de toneladas de lítio. 

                          Porém, a queda nos preços internacionais do níquel e do lítio ao longo de 2023 e 2024 sugere que será difícil financiar projetos de investimento nesses setores, se não houver um grupo de países que sustente a demanda por novos projetos de exploração de minerais ou que viabilize alguma forma de garantia dos preços internacionais desses minerais críticos. 

                          Nesse contexto, os autores sugerem que o Brasil priorize o processamento de grafite e de manganês, o que, além de agregar valor à economia brasileira, ajudaria os parceiros a reduzir os riscos nas cadeias de suprimentos.

                          O Brasil já é um importante produtor de grafite. Do ponto de vista doméstico, adicionar etapas de processamento à produção de grafite agregaria valor à commodity e aumentaria as exportações. Do ponto de vista mundial, o grafite é um mineral de alta prioridade para diversificação das fontes de suprimento das economias ocidentais, já que a China domina a produção de grafite refinado.

                          Segundo o estudo, o sulfato de manganês é um componente central na fabricação de cátodos para baterias de íons de lítio. Embora não sejam esperadas deficiências na oferta de manganês, projeta-se escassez de sulfato de manganês. O processamento industrial do manganês representa, portanto, outra oportunidade para o Brasil agregar valor à sua base de recursos existente, ao mesmo tempo em supre parceiros comerciais dos minerais essenciais para a transição energética.

                          Na avaliação dos autores, o Brasil avançou recentemente em sua política de mineração e reestruturou o Conselho Nacional de Política Mineral (CNPM). Em parceria com o Ministério de Minas e Energia, o BNDES também lançou o Fundo de Minerais Críticos no valor de R$ 1 bilhão, para financiar startups e empresas de médio porte que atuem na pesquisa, desenvolvimento e implantação de novas minas. Em janeiro de 2025, foi anunciado um novo financiamento no valor de R$ 5 bilhões, em um esforço conjunto entre Finep e BNDES, destinado a projetos de processamento de minerais críticos para a transição energética e descarbonização.

                          As perspectivas para o setor de minerais críticos são positivas, desde que haja estabilidade regulatória, estímulo à inovação e políticas industriais que promovam a integração da cadeia produtiva. O Brasil tem potencial para se consolidar como fornecedor seguro e diversificado de minerais estratégicos, contribuindo para a transição energética global e reduzindo a dependência de mercados concentrados.

                          Baterias e seus componentes. De acordo com o estudo, o Brasil vem trabalhando para fortalecer sua cadeia de suprimentos de baterias, contando atualmente com cerca de 1,2% da capacidade global de produção, equivalente a 15 GW em 2023. A maior parte dessa produção é liderada pela empresa chinesa BYD, que está expandindo suas operações com novas fábricas em Camaçari na Bahia, onde pretende, além de automóveis, produzir ônibus elétrico e realizar o processamento de lítico. A BYD está igualmente ampliando a produção de baterias de fosfato de ferro-lítio em sua fábrica em Manaus.

                          Além da chinesa BYD, empresas como a norte-americana BorgWarner e a Inventus também investem em unidades produtivas, embora em menor escala. A BorgWarne produz em São Paulo baterias de 200 MWh, voltada para a produção de veículos híbridos e elétricos, enquanto a Inventus Power produz baterias de íons de lítio para eletrônicos em Manaus. 

                          Apesar desse avanço, os autores sublinham que o setor brasileiro de baterias ainda enfrenta desafios estruturais significativos, especialmente na fabricação de materiais catódicos, anódicos, separadores e máquinas especializadas, o que limita o valor agregado nacional.

                          A competitividade global do setor de baterias é elevada, com excesso de capacidade pressionando as margens e dificultando a entrada de novos players. Para o Brasil, o fortalecimento da cadeia produtiva depende da capacidade de inovar, absorver tecnologia e desenvolver competências locais, evitando a dependência de fornecedores estrangeiros.

                          A base produtiva doméstica para baterias é considerada frágil quando comparada a outras economias emergentes. O verdadeiro valor na cadeia de baterias está nas etapas iniciais, como mineração e processamento de materiais, onde o Brasil já possui vantagens competitivas, especialmente em minerais críticos como níquel, lítio e grafite. No entanto, a ausência de uma indústria robusta de máquinas e equipamentos para o setor impede que o país capture os benefícios econômicos mais amplos associados à produção de baterias.

                          Em termos de políticas públicas, o programa Mover, que integra a Missão 3 da NIB, tem buscado aumentar gradualmente o conteúdo local nas baterias, utilizando o setor automotivo como alavanca para impulsionar a produção nacional. Além de incentivos fiscais, o governo aumentou as tarifas de importação de veículos elétricos, com o objetivo de estimular a instalação de fábricas e a produção doméstica de baterias. Em 2024, o BNDES já concedeu empréstimos significativos da ordem de US$ 140 milhões para apoiar a produção de veículos híbridos e elétricos da Volkswagen, sinalizando o compromisso do governo com o desenvolvimento do setor.

                          As respostas empresariais têm sido lideradas por multinacionais, que investem em novas fábricas e expansão da produção. Contudo, os autores destacam que há o risco de o Brasil se tornar um "enclave de baterias", onde empresas estrangeiras produzem utilizando conhecimento e insumos importados, gerando pouco valor agregado para a economia local. A dependência de cadeias estrangeiras e a fragilidade na produção de componentes intermediários são desafios que precisam ser superados para garantir a competitividade do setor.

                          O Brasil possui potencial para avançar na produção de ânodos de grafite e silício, aproveitando seus recursos naturais e expertise química. Essas áreas representam oportunidades estratégicas para agregar valor e fortalecer a cadeia produtiva nacional, desde que haja políticas de absorção tecnológica e estímulo à inovação.

                          O estudo ressalta que o futuro do setor de baterias no Brasil dependerá da articulação entre políticas públicas, investimentos empresariais e desenvolvimento tecnológico. A criação de um ecossistema de inovação e a integração das etapas produtivas são essenciais para que o país possa capturar maior valor na cadeia global de baterias e consolidar-se como player relevante nesse mercado estratégico.

                          Veículos elétricos e híbridos. O setor automotivo brasileiro é um dos mais consolidados do mundo, posicionando o país como o oitavo maior produtor global de veículos. Nos últimos anos, o mercado interno demonstrou grande dinamismo, com vendas de veículos elétricos e híbridos crescendo 88,7% entre 2023 e 2024. Esse crescimento reflete não apenas o potencial do mercado brasileiro, apoiado pela expertise brasileira em biocombustíveis, em especial etanol, mas também a resposta positiva a políticas públicas voltadas à eletrificação e à descarbonização da frota.

                          A base produtiva doméstica é robusta, mas ainda dominada por multinacionais, com produção local de veículos elétricos e híbridos em estágio inicial. Empresas como Toyota e Volkswagen têm investido em linhas de produção de veículos eletrificados, enquanto a BYD anunciou grandes projetos industriais, incluindo a instalação de uma fábrica em Camaçari. O setor automobilístico brasileiro passou por momentos de incerteza, com a saída de grandes players como Ford e Mercedes, mas se recuperou graças a sinais de revitalização impulsionados por políticas públicas.

                          O programa Mover e os financiamentos do BNDES têm sido fundamentais para incentivar a produção nacional de veículos elétricos e híbridos. O aumento das tarifas de importação para veículos elétricos visa estimular a instalação de fábricas locais e fortalecer a cadeia produtiva nacional. Essas medidas são complementadas por incentivos fiscais e políticas de estímulo à P&D, buscando criar um ambiente favorável à inovação e ao desenvolvimento tecnológico no setor.

                          As respostas empresariais têm sido significativas, com multinacionais anunciando mais de US$ 20 bilhões em investimentos até 2033. A Toyota, por exemplo, aposta em motores híbridos flex-fuel, aproveitando a tradição brasileira em biocombustíveis. A Volkswagen e a BYD também ampliam seus investimentos, sinalizando confiança no potencial do mercado brasileiro de veículos verdes.

                           

                          Apesar dos avanços, o estudo ressalta que persistem desafios importantes. A maioria das empresas multinacionais realiza suas atividades de pesquisa e desenvolvimento no exterior, limitando o valor agregado nacional. O risco é que o Brasil se torne apenas um mercado consumidor ou montador, sem desenvolver competências locais em inovação e tecnologia. Para evitar esse cenário, é fundamental, na avaliação dos autores, estimular a P&D nacional e promover a integração da cadeia produtiva.

                          Oportunidades importantes surgem da combinação entre matriz energética limpa, tradição em biocombustíveis e potencial de crescimento do mercado interno. O Brasil pode se tornar um polo de veículos verdes, desde que consiga criar um ecossistema de inovação e absorção tecnológica que envolva empresas, universidades e centros de pesquisa.

                          Ou seja, o sucesso do setor dependerá, segundo os autores, da capacidade de articular políticas públicas, investimentos empresariais e desenvolvimento tecnológico. A criação de um ambiente favorável à inovação e o fortalecimento da cadeia produtiva são essenciais para consolidar o Brasil como referência em veículos elétricos e híbridos, contribuindo para a transição energética e a descarbonização do transporte.

                          Combustíveis Sustentáveis de Aviação (SAF). O Brasil possui um potencial significativo para liderar o mercado global de combustíveis sustentáveis de aviação (SAF), graças à sua forte bioeconomia e à produção massiva de etanol de cana-de-açúcar. O país conta com uma base produtiva diversificada, capaz de fornecer matérias-primas como sebo bovino, óleo de soja, óleo de palma e etanol, essenciais para diferentes rotas tecnológicas de produção de SAF, por exemplo: a rota de ésteres e ácidos graxos hidroprocessados (HEFA) e a rota álcool-para-jato (AtJ). Projetos relevantes, como os da Brasil BioFuels, Essential Energy USA, Petrobrás, Shell e Raízen, demonstram o dinamismo do setor e o interesse de grandes players nacionais e internacionais.

                          A base produtiva doméstica é robusta, com destaque para a produção de etanol. Em 2023, Brasil produziu 35,4 bilhões de litros de etanol em 2023, principalmente a partir de cana-de-açúcar, o qual é adicionado em sua maior parte à gasolina. A produção brasileira de etanol pode ser direcionada para a rota de conversão álcool-para-jato (AtJ), conferindo ao Brasil uma vantagem competitiva devido à baixa intensidade de carbono do etanol de cana. A intensidade de carbono do etanol de cana é um terço das emissões do etanol de milho e menos da metade das emissões do SAF elaborado a partir de óleos de canola, palma ou soja.

                           

                          Segundo os autores, a conversão de álcool para jato (AtJ) ainda não é totalmente comercial, portanto, o Brasil tem a oportunidade de entrar na cadeia de valor da tecnologia desde o início. A Shell e a Raízen estão explorando um projeto de AtJ no Brasil.

                          No campo das políticas públicas, o Brasil prevê a entrada em vigor da legislação relativa ao SAF a partir de 2027, com exigências progressivas de redução das emissões de carbono pelas companhias aéreas. A lei do Combustível do Futuro estabelece metas claras, criando um ambiente regulatório favorável ao desenvolvimento do setor. Além disso, financiamentos do BNDES e da FINEP têm apoiado projetos de SAF, estimulando a inovação e a produção nacional.

                          As respostas empresariais têm sido expressivas, com empresas como Acelen, Shell, Raízen e Petrobras investindo em projetos de SAF e buscando parcerias internacionais para transferência de tecnologia. 

                          Dentre os principais players, a Acelen, controlada pela empresa de investimentos soberano Mubadala, dos Emirados Árabes, se comprometeu a produzir 1 bilhão de litros por ano de SAF a partir da palmeira macaúba, com tecnologia licenciada da Honeywell, e recebeu um empréstimo do BNDES de aproximadamente US$ 43 milhões. Outro potencial player importante é a Petrobras, que está desenvolvendo SAF a partir de óleo de soja e sebo bovino, enquanto a Shell, está considerando investir em usinas de SAF AtJ. 

                          O setor já atraiu investimentos de quase US$ 3 bilhões até 2027, evidenciando o interesse de investidores globais e fundos soberanos no potencial brasileiro. A Finep e o BNDES também lançaram uma chamada pública de projetos oferecendo US$ 1 bilhão para projetos de SAF. No total, de acordo com o estudo, foram recebidas propostas no valor de US$ 20 bilhões para o desenvolvimento de SAF.

                          Entre os desafios enfrentados pelo setor está a maturidade comercial da rota AtJ, que ainda demanda avanços tecnológicos para se tornar viável em larga escala. Há também o risco de o Brasil exportar etanol sem valor agregado, perdendo oportunidades de capturar maior valor na cadeia produtiva. A colaboração internacional e o desenvolvimento de tecnologia local são essenciais para superar esses desafios.

                          De acordo com os autores, oportunidades importantes surgem do desenvolvimento de tecnologia e produção local de SAF, aproveitando mercados de carbono e preços premium para combustíveis de baixo carbono. A integração entre setores agrícola, energético e industrial pode potencializar a competitividade brasileira e consolidar o país como líder global em SAF.

                          O fortalecimento do setor dependerá da continuidade das políticas de incentivo à inovação, da cooperação internacional e do desenvolvimento de competências locais. Na avaliação dos pesquisadores do NZIPL, o Brasil possui todas as condições para capturar valor na cadeia global de SAF, contribuindo para a descarbonização do transporte aéreo e para a transição energética mundial.

                          Aerogeradores. O Brasil é o terceiro maior mercado eólico do mundo, com 5 GW de capacidade instalada em 2023. A produção nacional de turbinas eólicas é liderada por empresas globais como Vestas, GE, Nordex, Siemens Gamesa, Goldwind e a brasileira WEG, que fabricam turbinas e componentes no país. A fabricação local cobre de 85% a 95% do conteúdo das turbinas, com destaque para torres, pás, rolamentos e peças fundidas, enquanto as caixas de engrenagens ainda são majoritariamente importadas.

                          De acordo com o estudo, a base produtiva doméstica foi construída a partir de políticas industriais lideradas pelo BNDES, que, entre 2012 e 2016, condicionou empréstimos à utilização de componentes nacionais, com metas iniciais de 60% para conteúdo local, reduzidas para 30% em 2016. Essas políticas permitiram o desenvolvimento de uma cadeia de suprimentos local, especialmente em segmentos como lâminas, torres e peças fundidas. Empresas nacionais, como a WEG, expandiram sua atuação para a produção de componentes eólicos, tornando-se referências no setor.

                          As políticas públicas evoluíram ao longo do tempo, flexibilizando metas de conteúdo local para se adaptar à maturidade da indústria e à disponibilidade de fornecedores nacionais. O setor também enfrenta desafios logísticos, especialmente para exportação de grandes componentes, devido a gargalos de infraestrutura que limitam o acesso a mercados internacionais, inclusive da América Latina. Como resultado, de acordo com o estudo, o único componente importado para turbinas eólicas no Brasil atualmente são as caixas de engrenagens, com conteúdo local oscilando em torno de 85% a 95%, dependendo do hardware escolhido para um determinado projeto.

                          O setor de aerogeradores no Brasil passa atualmente por mudanças importantes, com o aumento das tarifas de importação para turbinas eólicas e a busca por maior competitividade frente à importação de painéis solares. Na visão dos autores, o desenvolvimento do marco legal para energia eólica offshore representa uma oportunidade estratégica, podendo ampliar significativamente a capacidade instalada e impulsionar a indústria nacional.

                          As respostas empresariais têm sido positivas, com investimentos em inovação e desenvolvimento de turbinas de maior capacidade, como o projeto da WEG para turbinas onshore de 7 MW. No entanto, a integração regional e a superação dos desafios logísticos são essenciais para consolidar o Brasil como exportador de componentes eólicos.

                          Oportunidades importantes surgem do desenvolvimento da energia eólica offshore, que pode suprir até 19% da demanda nacional de eletricidade em cenários ambiciosos. O fortalecimento da indústria depende, contudo, de políticas coordenadas, investimentos em infraestrutura e apoio à inovação industrial, visando criar um ecossistema competitivo e sustentável.

                          O futuro do setor de aerogeradores no Brasil dependerá, na avaliação dos autores, da capacidade de articular políticas industriais, investimentos empresariais e desenvolvimento tecnológico. A integração da cadeia produtiva e a superação dos gargalos logísticos são fundamentais para consolidar o país como referência global em energia eólica.

                          Aço de Baixo Carbono. A indústria siderúrgica brasileira possui uma base sólida, sustentada por energia limpa e mineração robusta, o que confere ao país potencial para liderar a produção de aço de baixo carbono. Atualmente, a maior parte da produção nacional de aço ainda depende do processo alto forno – forno de oxigênio básico (BF-BOF), intensivo em carbono, mas há iniciativas relevantes para a adoção de tecnologias mais limpas, como o uso de biocarvão e parcerias internacionais para produção de ferro briquetado com hidrogênio.

                          Segundo o estudo, o Brasil é visto como destino de baixo custo para produção de ferro e aço verde, com potencial para se tornar grande exportador nesse segmento. O baixo custo de capital e a eletricidade barata posicionam o país como produtor potencialmente competitivo de aço verde, especialmente por meio das rotas de forno elétrico a arco (EAF), primário e/ou com utilização de sucata, e ferro de redução direta com hidrogênio (DRI-H2-EAF). No entanto, a adoção dessas tecnologias exige grandes investimentos e o desenvolvimento de expertise nacional em novas rotas produtivas.

                           

                          Na esfera das políticas públicas, o foco tem sido a defesa da indústria nacional, com elevação de tarifas para produtos siderúrgicos importados, especialmente da China. Apesar da importância estratégica do setor, ainda faltam políticas específicas para descarbonização, o que limita o avanço em direção ao aço de baixo carbono. A integração com a taxonomia sustentável e a criação de demanda para aço verde são vistas como oportunidades para estimular a transição.

                          Empresas como Vallourec, Gerdau, ArcelorMittal e Vale têm investido em projetos de descarbonização e parcerias internacionais. A Vallourec, por exemplo, expandiu suas operações de biochar com apoio do Fundo Clima do BNDES, com um empréstimo de US$ 9 milhões. A Vale, por sua vez, estabeleceu parcerias para produção de ferro briquetado com hidrogênio, embora ainda não existam plantas de DRI em operação no Brasil.

                          O setor enfrenta desafios significativos, como a necessidade de grandes investimentos, o desenvolvimento de expertise em novas tecnologias e a criação de políticas industriais direcionadas para descarbonização. O incentivo à produção de aço de baixo carbono a partir de sucata via processo Scrap-EAF e a promoção de políticas de reciclagem são caminhos imediatos para acelerar a descarbonização, aproveitando a matriz energética limpa do país.

                          O estudo destaca que oportunidades importantes surgem da proposta de criação de um clube climático para o aço no âmbito do G-7 e da implementação de mecanismos de ajuste de carbono nas fronteiras (CBAM) da União Europeia. O Brasil deveria considerar a criação de um clube climático para o aço brasileiro bem como a implementação de um CBAM nacional, ambos alinhados à taxonomia sustentável brasileira. Essas medidas podem proteger a indústria nacional e estimular investimentos em tecnologias de baixo carbono.

                          O avanço do setor de aço de baixo carbono dependerá da articulação entre políticas públicas, investimentos empresariais e desenvolvimento tecnológico. A criação de demanda para aço verde e a integração com cadeias globais de valor são essenciais para consolidar o Brasil como líder nesse segmento estratégico.

                          Fertilizantes verdes. O Brasil é o maior importador mundial de fertilizantes, especialmente amônia e ureia, o que o torna altamente dependente de fornecedores externos. A produção nacional atende apenas cerca de 15% da demanda, com projetos como o da Atlas Agro em Uberaba e a reativação da fábrica da Petrobras em Araucária buscando reverter esse quadro. O desenvolvimento de fertilizantes verdes, baseados em hidrogênio de baixo carbono, representa uma oportunidade estratégica para reduzir importações, criar valor agregado e impulsionar a cadeia do hidrogênio.

                           

                          Na avaliação dos autores, a base produtiva doméstica é limitada, mas vem sendo fortalecida por iniciativas empresariais e políticas públicas. O marco legal do hidrogênio verde, aprovado em 2024, e o Plano Nacional de Fertilizantes, que prevê elevar a produção doméstica para 55% até 2050, são exemplos de esforços para estimular o setor. O setor de fertilizantes foi incluído na Missão 1 do NIB, demonstrando sua importância para a economia e para a segurança alimentar do país.

                          Empresas como as europeias Atlas Agro e Yara e as brasileiras, Petrobras e Embrapa têm investido em projetos de fertilizantes verdes e descarbonização, buscando desenvolver competências locais e integrar a cadeia produtiva. Segundo o estudo, o projeto da Atlas Agro, por exemplo, utilizará energia limpa para produzir hidrogênio verde, amônia e fertilizantes nitrogenados, reduzindo a pegada de carbono e criando valor agregado nacional.

                          Apesar dos avanços, os autores destacam que a dependência de importações de fertilizantes é difícil de romper, e a maioria dos projetos ainda está em fase inicial devido à aprovação tardia do marco regulatório. Novas tarifas sobre fertilizantes importados foram consideradas, mas descartadas para evitar aumento de custos para o setor agrícola, o que contraria o objetivo de fortalecer a produção nacional.

                          O desenvolvimento de fertilizantes verdes pode impulsionar a cadeia do hidrogênio, promover a transferência de tecnologia e criar empresas nacionais ao longo da cadeia de valor. Investimentos em conhecimento químico e inovação são essenciais para consolidar o setor e garantir sua competitividade no longo prazo.

                          O fortalecimento do setor de fertilizantes verdes dependerá de incentivos claros, integração com políticas de descarbonização e articulação entre empresas, governo e centros de pesquisa. A revitalização da capacidade produtiva nacional é um primeiro passo para lançar as bases de uma indústria sustentável e competitiva.

                          De acordo com o estudo, o futuro do setor está atrelado à capacidade do Brasil de superar desafios estruturais e criar um ambiente favorável à inovação e à integração produtiva. O país tem potencial para se consolidar como referência em fertilizantes verdes, contribuindo para a segurança alimentar, a descarbonização da agricultura e o desenvolvimento sustentável.

                          Integração das estratégias setoriais. O estudo da Johns Hopkins aborda também a necessidade de integração das estratégias setoriais brasileiras para impulsionar o desenvolvimento e a descarbonização, destacando a importância de transformar estruturalmente os sistemas produtivos. 

                          Na avaliação dos autores, além de apoiar projetos e fornecer capital, o governo deve criar condições para mudanças estruturais por meio de investimentos em infraestrutura, capital humano e energia acessível. O mapeamento das cadeias de valor apresentado abaixo é proposto como ponto de partida para identificar investimentos estratégicos que possam garantir a competitividade global do país.

                           

                           

                          Alavancas do desenvolvimento e da descarbonização 

                          Na avaliação dos autores, os investimentos em educação e em ciência, tecnologia e inovação são importantes impulsionadores do desenvolvimento e da descarbonização. Para explorar o seu enorme potencial e se posicionar como líder na geopolítica da transição energética, o Brasil precisará promover a capacitação de mão-de-obra bem como a integração da ciência com a inovação e das empresas com as universidades nas novas cadeias produtivas prioritárias. 

                          Investimentos em Educação. No campo da educação e inovação, o estudo enfatiza que, mesmo com políticas industriais bem desenhadas, o sucesso dos clusters tecnológicos depende da qualificação da força de trabalho. O Brasil, atualmente, enfrenta o desafio de capacitar 14 milhões de pessoas para atender à demanda formal, sendo que possui uma das menores taxas de matrícula em Educação Profissional e Tecnológica (EPT) entre os países da OCDE. 

                          O Marco Legal para o Ensino Técnico de 2023 surge como resposta parcial, ao estabelecer um sistema de monitoramento para a EPT e permitir a utilização de créditos do ensino técnico para obtenção de diploma universitário, integrando-se à Política Nacional de Educação Profissional e Tecnológica (PNEPT). De acordo com o estudo, em março de 2024, o novo PAC previu recursos para construir 100 novos IFs, com um total de 140 mil vagas, das quais ao menos 80% devem ser destinadas à EPT. 

                          O estudo defende que, além de políticas horizontais de capital humano, o Brasil precisa adotar uma abordagem vertical, direcionando investimentos em capacitação para setores com maior potencial, especialmente em nichos de descarbonização. 

                          O papel do SENAI e do SENAC, integrantes do "Sistema S", no atendimento às demandas industriais é destacado, porém, na avaliação dos autores, como entidades dirigidas por empresas, são mais reativa aos incentivos de mercado do que às políticas públicas, o que limita a atuação proativa em favor da mudança. 

                          Por isso, os pesquisadores consideram estratégico investir nos Institutos Federais (IFs), especialmente após o anúncio de novos IFs com foco em EPT e parcerias com a Embrapii para criação de polos de inovação. Recomendam que essas iniciativas sejam alinhadas à agenda de descarbonização, implementando programas de formação adaptados a setores emergentes, como veículos elétricos e energia eólica, com ampliação conforme os resultados.

                          Investimento em C,T&I em setores prioritários. No âmbito da ciência, tecnologia e inovação (CT&I), o estudo ressalta que o Brasil já conta com um marco regulatório e diversos instrumentos de fomento, como subsídios, crédito subsidiado e incentivos fiscais, operados por instituições como BNDES e Finep. 

                          Ao articular ciência, tecnologia e inovação com políticas industriais bem direcionadas, o Brasil pode fortalecer cadeias produtivas prioritárias, impulsionar a competitividade global e promover uma transformação estrutural sustentável de sua economia.

                          O programa Mais Inovação Brasil, por exemplo, prevê investimentos significativos em projetos inovadores até 2026, priorizando missões estratégicas definidas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Historicamente, a articulação entre governo, indústria e universidades resultou em avanços notáveis em setores estratégicos, como petróleo (Petrobras), biocombustíveis (Embrapa) e aviação (Embraer), consolidando ilhas de excelência tecnológica e produtiva.

                          O estudo também apresenta dois estudos de caso emblemáticos: o ITA, criado para formar engenheiros e incubar a indústria aeronáutica nacional, em parceria com o Massachusetts Institute of Technology (MIT), e sua relação com a Embraer; e o Cenpes, centro de pesquisa da Petrobras, que evoluiu seu foco conforme as necessidades estratégicas da empresa, promovendo intercâmbio tecnológico internacional e desenvolvendo competências nacionais em áreas como exploração offshore.

                          Exemplos como o ITA e o Cenpes mostram, segundo os autores, como centros de pesquisa e universidades podem incubar e sustentar setores industriais estratégicos, promovendo transferência de tecnologia e geração de conhecimento aplicado.

                          Considerações Finais

                          O estudo ressalta o potencial do Brasil para assumir liderança na nova ordem geopolítica energética, aproveitando sua base de recursos naturais para desenvolver setores industriais de alto valor agregado e geração de empregos. Para que o país aproveite essas oportunidades, os autores recomendam que a política industrial brasileira tenha três características principais:

                               •  Foco: Estabelecimento de metas claras em poucos setores, priorizando oportunidades específicas e quantitativas.

                               •  Coordenação forte: Melhoria dos fluxos de informação entre governo, indústria, especialistas e diferentes níveis de governo.

                               •  Investimentos estruturais em educação e inovação: Construção de uma base de conhecimento focada em áreas estratégicas para competir globalmente.

                          Os autores reconhecem as restrições fiscais enfrentadas pelo Brasil, porém, sugerem que, mesmo sem grandes recursos orçamentários, o país pode realizar investimentos estratégicos via BNDES, desde que a política industrial seja integrada. Também apontam para a necessidade de evitar políticas fragmentadas.

                          Por fim, assinalando as dificuldades do desenvolvimento baseado na indústria manufatureira e nas exportações, especialmente diante da competição chinesa e da menor absorção de mão de obra pelo setor industrial, bem como as restrições importantes ao potencial de crescimento e desenvolvimento liderado por serviços, o estudo defende que o Brasil construa indústrias complexas e dinâmicas a partir dos seus recursos naturais, evitando a dependência de commodities. Isso requer, segundo os autores, políticas industriais focadas na criação de redes produtivas sofisticadas e na diversificação econômica, de modo a promover uma transformação estrutural ampla na economia brasileira. 

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                          No 1º trim/25, enquanto a indústria brasileira perdia dinamismo, a manufatura mundial ganhou velocidade, puxada pelos ramos de maior intensidade tecnológica.

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                          Carta IEDI n. 1321 - Rentabilidade industrial sob a pressão de juros e câmbio
                          Publicado em: 25/07/2025

                          O aumento dos juros no segundo semestre e a forte desvalorização cambial comprometeram a rentabilidade da indústria brasileira em 2024, levando sua margem líquida a patamares inferiores a 2020, ano do choque da pandemia.

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                          Carta IEDI n. 1320 - Em baixa rotação
                          Publicado em: 21/07/2025

                          Os últimos dados da indústria mostram que o setor segue em baixa rotação, somando mais meses de declínio, como agora em mai/25, do que de expansão.

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                          Carta IEDI n. 1319 - Dinâmica da produtividade, segundo a McKinsey
                          Publicado em: 04/07/2025

                          Estudo recente da McKinsey, identifica padrão recente do aumento da produtividade que complementam e também desafiam visões estabelecidas sobre o tema.

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                          Carta IEDI n. 1318 - Estabilidade industrial em abr/25
                          Publicado em: 23/06/2025

                          Nos quatro primeiros meses de 2025 sobre os quais já temos dados disponibilizados pelo IBGE, tem sido difícil a indústria em seu agregado ampliar produção, a exemplo de abr/25, quando ficou virtualmente estável.

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                          Carta IEDI n. 1317 - Inovação e Desenvolvimento: a trajetória chinesa
                          Publicado em: 18/06/2025

                          A China se tornou a “fábrica do mundo”, mas em um ritmo bastante acelerado vem também se firmando como um polo inovativo inconteste, constituindo competências industriais de alta tecnologia.

                           

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                          Carta IEDI n. 1316 - Sinais de arrefecimento sobretudo nas indústrias de alta e média-alta tecnologia
                          Publicado em: 13/06/2025

                          No 1º trim/25, os grupos de maior intensidade tecnológica foram os que mais desaceleraram, embora tenham se mantido com um desempenho superior ao agregado da indústria de transformação.

                           

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                          Carta IEDI n. 1315 - O crescimento global em meio à guerra comercial e ao aumento da incerteza
                          Publicado em: 06/06/2025

                          Embora não faltem especulações sobre ganhadores e perdedores da elevação de tarifas comerciais pelos EUA, os cenários mais recentes dos organismos multilaterais indicam enfraquecimento do PIB global e do comércio internacional. 

                           

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                          Carta IEDI n. 1314 - Desempenho modesto na indústria de menor intensidade tecnológica
                          Publicado em: 23/05/2025

                          No 1º trim/2025, o déficit da balança de bens da indústria de transformação voltou a aumentar, devido a um desempenho inferior dos ramos de menor intensidade tecnológica.

                           

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