Carta IEDI
Spread no Brasil e no Mundo
O spread nas operações bancárias no Brasil não tem paralelo no mundo. Spread é a diferença entre a taxa de aplicação nas operações de financiamento e a taxa de captação de recursos pelas instituições financeiras.
Segundo dados do FMI, o spread de 43,7 pontos percentuais ao ano no Brasil na média de 2003, é o maior entre 102 países com dados disponíveis. Considerando o spread apurado pelo Banco Central do Brasil para 2003, que é mais baixo - média de 31,9 pontos percentuais ao ano -, apenas o Paraguai tem spread superior ao brasileiro. Outros países com níveis também elevados, embora significativamente inferiores ao brasileiro (entre 12 e 20 pontos percentuais ao ano), são: São Tomé e Príncipe, Quirguistão, Congo, Mauricius, Argentina, Geórgia, Zâmbia, Bolívia, Armênia, Quênia e Venezuela.
Com relação a países emergentes com os quais o Brasil concorre no mundo do comércio e pela atração de capitais, a comparação pode ser resumida no seguinte resultado: o spread médio cobrado nas operações de crédito no país (de 31,9 pontos percentuais ao ano em 2003, segundo o conceito do BCB) é três vezes maior do que o mais alto spread dentre os demais principais países emergentes, no caso, a Rússia. Em comparação com países desenvolvidos, o spread brasileiro é muitas vezes superior.
Spread e lucro das instituições financeiras são coisas diferentes. O primeiro inclui o lucro, mas deve cobrir itens de custos, como os custos derivados do depósito compulsório dos bancos, custos operacionais das instituições (o custo de intermediação financeira, incluindo impostos) e o custo de inadimplência nos empréstimos.
No Brasil todos esses itens assumem valores muito elevados, seja em função da instabilidade da economia, seja de dificuldades das instituições financeiras na execução de garantias. Por outro lado, o baixo volume de crédito, os excessivos impostos sobre a intermediação bancária e os exagerados compulsórios, tornam cara a intermediação financeira e são fatores adicionais de muita importância. Em recente estudo, o FMI apontou a falta de uma maior concorrência no setor bancário como um fator a mais que explica o nível do spread brasileiro.
É muito urgente encaminhar uma real solução ao problema, pois estamos diante de uma situação do tipo “pior dos dois mundos”: no Brasil, ao lado de uma das maiores taxas básicas do mundo, vigora o maior spread mundial. Atualmente, o que explica as altas taxas de juros do crédito, é, destacadamente, o elevado spread, responsável por 2/3 da taxa final que o tomador de recursos paga no crédito. A alta taxa básica de captação responde por 1/3 da taxa final.
Aos níveis atuais desses dois componentes, em termos reais, quem tomar um financiamento hoje no Brasil estará pagando, em média, 23,4% ao ano se for pessoa jurídica, 55,6% ao ano se for pessoa física e 37,5% ao ano na média global. São taxas incompatíveis, mesmo se comparadas aos melhores retornos de aplicações de investimentos na economia real, o que deprime o crescimento e o emprego na economia. Limitam, por outro lado, o acesso ao crédito e conseqüentemente aos bens de maior valor unitário por parte da ampla maioria da população.
A nova Lei de Falências e o cadastro positivo de crédito são, hoje, as principais ações do governo para promover a redução do spread nas operações de crédito. Essas necessárias medidas teriam resultados mais imediatos e duradouros se fossem acompanhadas de outras imprescindíveis ações, como:
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revisão dos tributos incidentes sobre a intermediação financeira;
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redução significativa do depósito compulsório dos bancos;
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ampliação da concorrência na oferta de crédito por meio dos bancos públicos e do estímulo à intermediação não-bancária e ao desenvolvimento do mercado de capitais.
Ver a seguir para mais informações sobre spreads no Brasil e no mundo.
Observações gerais. Os dados básicos do levantamento são do FMI (International Finance Statistics, IFS). Spread é a diferença entre a taxa de aplicação nas operações de financiamento e a taxa de captação de recursos pelas instituições financeiras e é medido em pontos de percentagem ao ano.
Para o cálculo dos spreads referentes a diversos países foram apuradas as taxas médias mensais de aplicação e captação das operações de crédito no período janeiro/dezembro de 2003. Para os países com dados anteriores a dezembro de 2003, foram calculadas as taxas médias de doze meses até o mês do último dado disponível. Além do Brasil, foram reunidas informações para 101 países, cujos dados permitem o cálculo do spread.
Em geral, os dados do FMI para os países são para a taxa de empréstimo bancário e para a taxa do mercado monetário. A primeira foi utilizada como taxa de aplicação; a segunda como taxa de captação. Há casos em que a taxa de aplicação dos países se refere à “prime rate” ou à taxa para operações de capital de giro. No caso da taxa de captação, na ausência da taxa do mercado monetário, foi utilizada como taxa de captação a taxa de desconto do Banco Central ou a taxa de empréstimos interbancários, ou ainda, a taxa de títulos públicos de curto prazo. As tabelas ao final do texto discriminam para cada país as taxas de aplicação e de captação utilizadas no levantamento.
Para o Brasil, além do spread médio de 2003, calculado da mesma forma que os demais países, ou seja, a partir de dados do FMI (que considera como taxa de aplicação a taxa média prefixada para pessoas físicas e jurídicas), apresentamos o spread médio de 2003 apurado pelo Banco Central do Brasil. Este considera como taxa de aplicação a taxa média de operações com recursos livres das instituições financeiras com taxas pré e pós-fixadas, discriminando pessoas jurídicas e físicas. Também no caso do Brasil, são apresentados os spreads para fev/2003, último mês com dados disponíveis.
Comparação com outros países. Os spreads nas operações bancárias no Brasil não têm paralelo no mundo. Os gráficos a seguir e as tabelas ao fim do texto ilustram essa afirmação. Considerando os dados de spread bancário apurados pelo Banco Central do Brasil para 2003 - média de 31,9 pontos percentuais ao ano -, apenas o Paraguai tem spread superior ao brasileiro. Outros países com elevado spread (entre 12 e 20 pontos percentuais ao ano) no mesmo ano foram: São Tomé e Príncipe, Quirguíz, Congo, Mauricius, Argentina, Geórgia, Zâmbia, Bolívia, Armênia, Quênia e Venezuela.

Brasil e principais países emergentes e países desenvolvidos. Com relação a países emergentes com os quais o Brasil concorre no mundo do comércio e pela atração de capitais, a comparação pode ser resumida no seguinte resultado: o spread médio cobrado nas operações de crédito no país (de 31,9 pontos percentuais ao ano em 2003, segundo o conceito do BCB e de 29,4 pontos percentuais ao ano em fevereiro de 2004) é mais de três vezes o maior spread dentre os demais principais países emergentes, no caso, a Rússia.
Como mostra o gráfico a seguir, no caso do Brasil, ainda que consideremos apenas o spread sobre as operações com pessoas jurídicas (que é muito inferior ao spread sobre operações com pessoas físicas e ao spread médio total), que foi de 14,7 pontos percentuais ao ano na média de 2003 e de 14,4 pontos percentuais ao ano segundo o último dado disponível (fevereiro de 2004), a comparação seria ainda muito desvantajosa para o padrão brasileiro: esse spread é de 3 a 5 vezes superior ao dos demais principais países emergentes. O gráfico seguinte mostra que em comparação com países desenvolvidos, o spread brasileiro é também muitas vezes superior.


Determinantes do spread. Convém esclarecer que spread e lucro das instituições financeiras não são a mesma coisa. O primeiro inclui o lucro, mas deve cobrir alguns outros itens, tais como: custos que não o custo de captação das instituições, como os custos relativos a operações de crédito obrigatórias dos bancos para determinados setores a taxas favorecidas e os custos derivados do depósito compulsório dos bancos; custos operacionais das instituições (o custo de intermediação, incluindo impostos); o custo de inadimplência nos empréstimos.
No Brasil todos esses itens assumem valores altos, seja em função da instabilidade da economia que eleva o custo de inadimplência (ou, em uma visão “ex-ante” eleva a percepção de risco de inadimplência nas operações de crédito), seja em razão de dificuldades das instituições financeiras executarem garantias, seja ainda em conseqüência do baixo volume de crédito na economia brasileira, o que torna cara a intermediação financeira. Excessivos impostos sobre a intermediação bancária e exagerados compulsórios (atualmente, 45% sobre os depósitos à vista), os quais também não encontram correspondência em outros países, são fatores adicionais de muita importância para os exagerados spreads no país. Em recente estudo, o FMI apontou a falta de uma maior concorrência no setor bancário como um fator a mais que explica os spreads.
Portanto, o problema tem múltiplas causas, de forma que somente poderá ser resolvido se esta multiplicidade de fatores for devidamente levada em conta. Cabe sublinhar que é muito urgente encaminhar uma real solução ao problema, pois estamos diante de uma situação do tipo “pior dos dois mundos”: no Brasil, ao lado de uma das maiores taxas básicas do mundo, vigora o maior spread mundial.
Spread no Brasil: evolução recente. No período mais recente, as taxas de juros do crédito e os spreads bancários no Brasil caíram, mas este processo virtualmente parou nos últimos meses. Eis um resumo da evolução das taxas do crédito e do spread em 2003 e no início de 2004:
- A taxa de juros média do crédito das instituições financeiras para pessoas físicas e jurídicas baixou a partir de junho do ano passado, ou seja, a partir de quando o Banco Central iniciou a redução da taxa Selic. A taxa que alcançava quase 58% ao ano em maio de 2003, retrocedeu para 48,6% em outubro desse mesmo ano. Caiu quase 9 pontos percentuais. Desde então, a queda foi muito menor: em fevereiro último a taxa de juros era foi de 45,1% ao ano, acusando uma queda de apenas 3,5 pontos percentuais desde outubro de 2003.
- O spread bancário médio nesses mesmos meses caiu de 33,7% ao ano (maio/2003) para 30,5% em outubro de 2003, uma queda modesta de 3 pontos percentuais. De lá para cá, recuou para 29,4% ao ano (fev./2004), ou seja, quase nada. Isso significa dizer que, em sua maior parcela, a queda das taxas do crédito decorreram da redução do custo de captação das instituições financeiras, e muito pouco da redução da redução do spread.



Taxa de juros e spread: perspectivas.Vem caindo muito pouco e seu valor absoluto é alto demais, eis um resumo da situação do spread bancário no Brasil. Atualmente, como mostra a tabela a seguir, o spread corresponde à quase o dobro da taxa de captação, o que significa dizer que se por um passe de mágica a taxa básica ou de captação pudesse cai a zero, ainda assim a taxa de juros média do crédito no Brasil seria (com dados de fevereiro) de 29,5% ao ano (correspondente ao spread). Para o tomador de recursos pessoa jurídica, a taxa nominal ainda assim seria de 14,5% ao ano e para os financiamentos a pessoas físicas, 48,4% ao ano.
Ou seja, atualmente, o grande problema das altas taxas de juros do crédito no Brasil, deriva em 1/3 da taxa básica de captação e em 2/3 do spread. Aos níveis atuais desses dois componentes, em termos reais (considerando uma inflação de 5,5% para os próximos 12 meses), quem tomar um financiamento hoje no Brasil estará pagando, em média, 23,4% ao ano se for pessoa jurídica, 55,6% ao ano se for pessoa física e 37,5% ao ano na média global.


São taxas incompatíveis, mesmo se comparadas aos melhores retornos de aplicações de investimentos na economia real, o que deprime o crescimento e o emprego na economia. Limitam, por outro lado, o acesso ao crédito e conseqüentemente aos bens de maior valor unitário por parte da ampla maioria da população.
A nova Lei de Falências e o cadastro positivo de crédito são, hoje, as principais ações do governo para promover a redução do spread nas operações de crédito. Essas necessárias medidas teriam resultados mais imediatos e duradouros se fossem acompanhadas de outras, tais como:
- revisão dos tributos incidentes sobre a intermediação financeira;
- redução significativa do depósito compulsório dos bancos;
- ampliação da concorrência na oferta de crédito por meio dos bancos públicos e do estímulo à intermediação não-bancária e ao desenvolvimento do mercado de capitais.
Dados Adicionais





