Carta IEDI
Subsídio como Estratégia de Desenvolvimento
Dentre os países em desenvolvimento, o Brasil se destaca por ser um dos que menos concedem subsídios ao setor privado, segundo um recente estudo da OMC – World Trade Report 2006: Exploring the links between subsidies, trade, and the WTO, disponível em http://wto.org. Utilizando dados correspondentes ao período 1998-2002, a OMC calcula que as subvenções do governo brasileiro representavam 0,3% do PIB, correspondendo a 1,8% das despesas públicas. No mesmo período, estas despesas correspondiam a 21% dos gastos públicos totais na Índia, 7,9% na Malásia, 5,7% na China, 3,9% na África do Sul, 3,8% na Tailândia, 3,6% no Chile e 3,3% no México.
No Brasil, o setor serviços foi o que mais recebeu subvenções do governo no período 1999-2003 (média anual superior a 56%), enquanto à indústria foram destinados apenas 20,4% dos recursos, dos quais mais de 62% alocados na indústria automotiva.
Em uma parcela não desprezível certamente reside nesse baixo apoio que o setor público brasileiro confere ao setor privado em geral e ao segmento industrial em particular, uma das principais razões do baixo crescimento estrutural da economia brasileira nas últimas décadas.
No relatório, a OMC estima que os subsídios concedidos pelos governos superam US$ 1 trilhão por ano, valor equivalente a 4% do PIB global. Os governos concedem subsídios por inúmeras razões: busca do desenvolvimento industrial, apoio à pesquisa e desenvolvimento científico-tecnológico, suporte a setores em dificuldade, fomento à criação de “campeões nacionais” em alguns setores, apoio à criação de infra-estrutura, proteção ambiental e distribuição de renda.
Os subsídios apresentam, na avaliação dos pesquisadores da entidade, inúmeras vantagens em relação a outros instrumentos de intervenção governamental, dentre as quais, destaca-se a transparência, uma vez que tais despesas são especificadas no orçamento. Não obstante, há o risco de o governo ser capturado por setores e grupos de interesse que buscam a perpetuação dos benefícios.
De acordo com a OMC, os subsídios podem ser instrumentos úteis para corrigir “alocações de recursos pelo mercado inconsistentes com objetivos sociais”. Porém, também podem distorcer o comércio e gerar reações de parceiros, sobretudo, quando visam reduzir vantagens estratégicas.
Os subsídios são um dos vários instrumentos sujeitos às regras dos acordos multilaterais de comércio. O relatório também examina as diferenças de visão entre os países-membros tanto em relação à efetividade das regras na prevenção de distorções do comércio como à flexibilidade necessária para “acomodar objetivos particulares, considerados importantes e legítimos, como a promoção do desenvolvimento”.
As informações apresentadas no estudo revelam que há diferenças marcantes entre os países tanto no que se refere aos setores que subsidiam como em relação ao volume de recursos destinados pelos governos na promoção e/ou proteção das atividades e setores priorizados.
Em alguns países, a agricultura é o setor mais favorecido (caso dos países europeus), enquanto em outros é a indústria e os serviços. No setor industrial, a ajuda governamental beneficia, sobretudo, mineração, siderurgia, construção naval e indústria automotiva. No setor de serviços, as subvenções concentram-se em transporte, turismo, bancos, telecomunicações e audiovisual.
Em termos de proporção do PIB, países industrializados recorrem mais à prática de subsídios do que os países em desenvolvimento. Entre os países industrializados, a Suíça e a Áustria foram os que mais concederam subvenções no período 1998-2002: 4,1% e 3,0%, respectivamente. No conjunto dos 25 países da União Européia, o gasto médio com subsídio foi de 1,5% do PIB da área no período analisado, enquanto nos Estados Unidos, tais despesas foram de 0,5% do PIB. Em posição intermediária, aparece o Japão, onde os gastos com subsídios totalizaram 0,8% do PIB no período em foco.
Maiores detalhes sobre o estudo são apresentados a seguir.
Subsídios: algumas definições. De acordo com o relatório da OMC, não existe uma definição geral e aceitável de subsídio. As definições existentes são tipicamente estabelecidas de acordo com objetivos específicos e variam consideravelmente em termos de abrangência. Assim, embora subsídios possam envolver gastos orçamentários, também pode se basear em intervenções regulatórias sem impacto financeiro direto sobre o orçamento público. Igualmente, podem se referir à provisão de produtos e serviços pelo setor público abaixo do preço de mercado. Ou ainda, podem ser definidos como qualquer intervenção governamental que afete os preços relativos. Todavia, as definições mais freqüentes de subsídio consideram a transferência de recursos do governo para entidades privadas, sem reciprocidade de contrapartida equivalente (“unrequited transfer by government”).
Em geral, as definições de subsídio distinguem entre categorias de receptadores, tais como produtores e consumidores ou nacionais e estrangeiros. Os programas de subsídios podem igualmente limitar a concessão de subsídios a subgrupos dentro dessas categorias. Quanto mais reduzido for o grupo de potenciais beneficiários dos subsídios, mais específico será o programa de subsídio. Já um programa de subsídios com amplo rol de beneficiários é considerado geral.
A inexistência de uma definição comum de subsídio se reflete nas estatísticas. Nas estatísticas de contas nacionais, subsídios são definidos estritamente como pagamentos diretos realizados pelo governo às empresas residentes. Não estão contemplados nessa definição nem os incentivos fiscais nem as garantias de crédito.
Já nas estatísticas da OCDE, os subsídios são definidos de maneira mais ampla. Por exemplo, a medida desenvolvida pela organização para quantificar o suporte doméstico aos produtores agrícolas (“producer subsidy equivalent” - PSE) inclui as políticas governamentais que têm impacto sobre o comércio. São considerados como subsídios tanto o pagamento direto como as medidas de garantia de preço.
O Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias (SCM, na sigla em inglês) da OMC adota uma definição ampla, incorporando suas várias possíveis formas: pagamento direto; incentivos fiscais; crédito preferencial e seguro de crédito; compra e provisão de bens e serviços pelo setor público; obrigações contingentes. A definição não se aplica, contudo, à provisão pública de serviços de infra-estrutura geral e às medidas regulatórias, como proteção de fronteiras.
Justificativas e Finalidades. De acordo com teoria econômica, sob a assunção de mercados perfeitos, a utilização de subsídios assim como de qualquer outro tipo de intervenção governamental é indesejável, porque se traduz na redução do bem-estar. Assim, a utilização de subsídio torna-se justificável somente na presença de imperfeições ou falhas de mercado, que são bastante freqüentes no mundo real. A existência de imperfeições ou falhas de mercado implica em custos que reduzem a eficiência alocativa dos mercados. Todavia, não há consenso estabelecido sobre a relevância dos subsídios como instrumentos de promoção da eficiência econômica.
O relatório da OMC considera que a existência de falhas de mercado justificaria a intervenção governamental e a utilização de subsídio como instrumento dessa intervenção. São examinados dois tipos de falhas de mercado - existência de economias de escala e de externalidades positivas - para ilustrar como os governos utilizam os subsídios em várias situações para aumentar o bem-estar doméstico. Entretanto o estudo ressalta que as decisões dos membros do governo em relação aos subsídios podem ser pelo menos em parte influenciada por grupos de interesse, cujo suporte político pode ser crucial na eleição. Ou seja, embora os subsídios sejam um instrumento importante para eliminar falha de mercado, há o risco de o governo ser capturado por setores e grupos de interesse que buscam a perpetuação dos benefícios.
Dentre os vários objetivos nos quais os governos fazem uso de subsídios, destacam-se: desenvolvimento industrial, promoção de inovações e de indústrias estratégicas, redistribuição de renda, proteção ambiental, a segurança nacional, proteção à diversidade e herança cultural. Há diferentes justificativas para a concessão de subsídio com estes vários objetivos, todavia nem todas são fornecidas pela teoria econômica convencional e pelo conceito de eficiência econômica, como é o caso da promoção da distribuição mais equânime da renda e do desenvolvimento regional, cuja justificativa é moral, filosófica e política.
Na concessão de subsídios ao desenvolvimento industrial, a justificativa mais freqüente utilizada pelos formuladores de política nos países em desenvolvimento é o argumento da indústria infante. Na presença de países desenvolvidos, novas indústrias não se desenvolvem nos países em desenvolvimento sem o auxílio estatal. A intervenção e o suporte estatal é necessário devido à existência de problemas de informação relacionados às barreiras de entrada no mercado e à difusão de conhecimento entre os produtores como também relacionados às dificuldades enfrentadas por consumidores e credores no mercado de capitais. Ao mesmo tempo, a intervenção estatal se justificaria devido a problemas de coordenação gerados pela existência de investimentos interdependentes associados à verticalização na produção, grandes economias de escala e restrições ao comércio.
As atividades de pesquisa e desenvolvimento também são estimuladas pelos governos mediante a concessão de subsídios, devido às externalidades positivas presentes na criação e produção de conhecimento. Em geral, o setor privado investe menos em P&D do que seria desejável do ponto de vista nacional por duas razões principais. Em primeiro lugar, se grandes investimentos em P&D são um pré-requisito à produção em uma indústria com economias de escala então a produção pode não ser lucrativa para uma empresa privada individual tanto quanto é benéfica para a sociedade como um todo. Em segundo lugar, o apoio governamental às atividades de P&D se justifica pelo fato de que o conhecimento possui característica de bem público, ou seja, os benefícios sociais dos novos conhecimentos gerados pelas empresas inovadoras em suas atividades de pesquisa e desenvolvimento excedem os benefícios apropriados por essas empresas.
As externalidades positivas presentes na produção do conhecimento nas atividades de P&D não seriam eliminadas inteiramente pelo regime de propriedade intelectual. Por essa razão, os investimentos privados em P&D permaneceriam baixos, do ponto de vista social, na ausência de estímulos do governo, em particular, sob a forma de subsídios, inclusive sob a forma de aporte financeiro direto.
O suporte governamental às indústrias intensivas em P&D também ocorre para assegurar vantagens nacionais das indústrias-líderes que atuam em setores com elevadas economias de escala. O suporte estatal aos chamados “campeões nacionais” seria feito, nesse caso, de acordo com as estratégias de política comercial.
Ainda no que se refere à promoção do desenvolvimento industrial, o relatório da OMC conclui, a partir de um survey da literatura de política industrial, que as políticas de estímulo às exportações apresentam maiores vantagens que as políticas de substituição de importações. Em primeiro lugar, haveria uma maior chance de desenvolver indústria na qual o país possui vantagens comparativas. Em segundo lugar, a vantagem estaria na maior transparência do custo dos subsídios, o qual é explicitado no orçamento, em comparação com as despesas com tarifas. Um terceiro argumento refere-se ao fato de que o desempenho das exportações não é um critério que possa ser falsificado pelas empresas ou por burocratas.
Os governos fornecem assistência aos exportadores de diferentes maneiras, que inclui desde a concessão de crédito a taxas preferências ao apoio à realização de feiras e divulgação de informações. As imperfeições do mercado de capitais fornecem a justificativa para os subsídios de crédito e para os seguros de crédito às exportações. Em muitos países, os governos possuem agências específicas para financiar exportações de bens e serviços domésticos nos mercados internacionais, como o Eximbank dos Estados Unidos, a NEXI do Japão, a COFACE da França, a EULER HERMES da Alemanha.
Políticas de promoção às exportações vêm sendo utilizadas pelos países industrializados há várias décadas. Porém, segundo a OMC, tais políticas se generalizaram crescentemente desde 1970 tanto sob a forma de suporte a potenciais exportadores como aos potenciais importadores no exterior.
Uma forma particular de promoção de exportação muito utilizada pelos países em desenvolvimento ao longo das últimas décadas tem sido a chamada Zona de Processamento de Exportações (ZPE ou EPZ, na sigla em inglês). As ZPEs se referem a uma área geográfica de um país na qual as barreiras ao comércio são bastante reduzidas e são ofertados incentivos para atrair investidores estrangeiros para produzir no local bens e serviços a serem exportados. Embora atualmente uma parcela expressiva das exportações de manufaturados dos países em desenvolvimento se origine das ZPEs, não há, segundo a OMC, consenso entre os especialistas se tal instrumento de promoção do desenvolvimento industrial é eficiente em termos do custo econômico.




Gastos com Subsídios. A OMC estima que os subsídios concedidos pelos governos superem US$ 1 trilhão por ano, valor equivalente a 4% do PIB global. Porém, a quantificação precisa da incidência de subsídios é dificultada sobremaneira por dois fatores principais: falta de informações confiáveis e sistemáticas e ausência de definição padronizada. Na tentativa de avaliar os gastos com subsídio, o relatório apresenta informações coletadas em três tipos adicionais de fontes: relatórios nacionais e supranacionais sobre subsídios, as notificações dos países-membros à OMC e os relatórios Trade Policy Review da própria entidade, que contêm informações detalhadas, ainda que não completas, sobre as políticas comerciais dos países-membros.
Embora os acordos estabeleçam a obrigatoriedade de notificar as despesas com subsídio à OMC, há uma clara discrepância entre as informações apresentadas nas contas nacionais e as notificações à organização, o que exige grande cautela na análise dos dados. A divergência de informações se aplica tanto para os países desenvolvidos como para os países em desenvolvimento. Menciona-se, por exemplo, que em uma amostra de 13 países com informação sobre as despesas com subsídios no período 1998-2002, apenas em dois casos - Brasil e Coréia do Sul - , não há diferença expressiva entre as informações extraídas das contas nacionais e as notificações à OMC. Para os demais, as diferenças são enormes, com destaque para Alemanha e Japão que notificaram à OMC menos de 10% das despesas com subsídios contabilizadas nas contas nacionais.
Além disso, as distintas definições e sistemas de classificação de informação sobre subsídio dificultam a comparabilidade e a conciliação dos dados disponibilizados pelas múltiplas fontes. Os raros dados de fontes internacionais que permitem a comparação entre países são divulgados ou com elevada agregação ou estão disponíveis para alguns poucos subsetores e/ou instrumentos, por exemplo, respectivamente, agricultura e pesca e crédito à exportação.
Em termos de proporção do PIB, países industrializados recorrem mais à prática de subsídios do que os países em desenvolvimento. A partir dos dados das contas nacionais para uma amostra de cinqüenta e cinco países, o estudo da OMC mostra que, no período 1998-2002, os governos dos países desenvolvidos gastaram em média com subsídio 1,4% do PIB, mais do que o gasto médio dos países em desenvolvimento (0,6% do PIB) no mesmo período. Porém, as informações são muito fragmentadas e escassas para permitir maiores conclusões.
Dentre os países industrializados, a Suíça e a Áustria foram os que mais concederam subvenções no período 1998-2002: 4,1% e 3,0%, respectivamente. No conjunto dos 25 países da União Européia, o gasto médio com subsídio foi de 1,5% do PIB da área no período analisado, enquanto nos Estados Unidos, tais despesas foram de 0,5% do PIB. Em posição intermediária, aparece o Japão, onde os gastos com subsídios totalizaram 0,8% do PIB no período em foco.
Para uma amostra menor de países desenvolvidos, o relatório apresenta informações sobre a evolução do nível dos subsídios ao longo de um período histórico mais amplo 1950-2004. Observa-se que, em geral, após ter aumento de forma expressiva na década de 1970, os gastos com subsídios como proporção do PIB se reduziram ligeiramente entre 1990-1999, estabilizando-se nesse patamar mais baixo no período 2000-2004. A notável exceção foram os Estados Unidos, cujo nível de subsídios se mantém inalterado em 0,4% do PIB desde o início da década de 1970.
Dentre os países em desenvolvimento, o Brasil se destaca por ser um dos que menos concedem subsídios ao setor privado, segundo a OMC. No período 1998-2002, as subvenções do governo brasileiro representavam 0,3% do PIB, correspondendo a 1,8% das despesas públicas. No mesmo período, estas despesas correspondiam 21% dos gastos públicos totais na Índia, 7,9% na Malásia, 5,7% na China, 3,9% na África do Sul, 3,8% na Tailândia, 3,6% no Chile e 3,3% no México.
Quanto à instância de governo responsável pela concessão de subsídios, os dados apresentados pela OMC revelam que, em 2003, o governo central respondia por mais da metade dos gastos com subsídios em 17 dos 21 países da amostra. Os Estados Unidos e o Canadá se destacam por estarem nos extremos, em situação oposta. O governo central norte-americano responde por 99,7% das despesas totais com subsídio, enquanto, no Canadá, essa participação é de apenas de 25,4%. No Brasil e na Índia, únicos dois países em desenvolvimento incluídos na amostra, a participação do governo central nos gastos com subsídios era, respectivamente: 77,2% (em 2001) e 55,5% (1999-2002).




Panorama Setorial. Os problemas de carência de informação sobre as despesas de subsídios são ainda mais sérios, segundo o estudo da OMC, no que se refere à distribuição setorial. Embora as informações sobre a distribuição setorial estejam disponíveis apenas para um conjunto pequeno de países, há diferenças marcantes tanto no que se referem aos setores que subsidiam como em relação ao volume de recursos destinados pelos governos na promoção e/ou proteção dos setores e/ou atividades priorizadas.
Considerando apenas os subsídios notificados à OMC no período 1999-2002, observa-se que a agricultura é o setor que mais recebeu subsídios no Japão (78%) e nos Estados Unidos (60%), enquanto na Austrália, o setor mais beneficiado é a indústria (51%). Já na União Européia, 80% dos subsídios são horizontais, ou seja, não há especificação de nenhum setor ou indústria beneficiado.
De acordo com a OMC, no Brasil, o setor serviços foi o que mais recebeu subvenções do governo no período 1999-2003 (média anual superior a 56%), enquanto a agricultura recebeu em média menos de 20% dos subsídios totais. Já à indústria foram destinados apenas 20,4% dos recursos, dos quais mais de 62% alocados na indústria automotiva.
No que se refere aos subsídios concedidos ao setor industrial, o estudo da OMC apresenta informações para um conjunto de 54 países. No período 1999-2002, o valor médio dos subsídios horizontais concedidos às empresas industriais e dos subsídios às indústrias específicas foi de 0,2% do PIB. Todavia, os dados revelam grande diversidade entre os países-membros. Por exemplo, em 2002, os governos da Tailândia, Japão, Canadá e Argentina destinaram volume extremamente reduzido de subvenções ao setor industrial; enquanto outros como Hungria e Israel concederam subsídios industriais em volume superior a 1% do PIB. Já no Brasil, considerando as notificações à OMC, o volume de subsídios concedidos à indústria em termos do PIB reduziu-se de 0,39% em 1999 para 0,08% em 2002.
Em relação às atividades de P&D, o estudo da OMC destaca que embora os gastos venham crescendo em todo o mundo, os países de renda mais elevada investem muito mais em P&D como proporção do PIB do que os países em desenvolvimento. Na década de 1990, os países de alta renda investiram em P&D em média o equivalente a 1,73% (contra 1,19% na década de 1960), enquanto os países em desenvolvimento investiram em média apenas 0,59% do PIB (0,21% na década de 60). Todavia, quando considerados apenas os gastos com P&D financiados pelo governo, a diferença entre países de alta renda e em desenvolvimento se torna menos nítida. Por exemplo, os governos do Japão, Brasil, União Européia e Índia alocaram montantes próximos a 0,6% do PIB no período 1999-2003.
<<20060922-09.gif|Fonte: OMC - World Trade Report, 2006, Tabela 9, p. 117. Elaboração Própria.|>>



Regras da OMC para os Subsídios. As regras de subsídios da OMC passaram por expressivas mudanças ao longo dos anos. As alterações introduzidas tiveram o propósito de tornar as regras mais estritas e mais precisas. Quanto o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês) foi criado em 1947 não havia no seu texto legal nem uma definição precisa de subsídio nem nenhuma proibição. Fixava apenas a necessidade de notificação dos subsídios concedidos pelos países signatários do Acordo.
Ao longo das sucessivas rodadas de negociação das revisões do Acordo, as regras de subsídio foram sendo modificadas. Assim, em 1960, ficaram proibidos os subsídios à exportação de produtos manufaturados, que resultassem em um preço inferior ao praticado no mercado doméstico. Na Rodada de Tóquio, confirmou-se essa proibição, ao mesmo tempo em que se definiu tratamento diferencial e especial para os países em desenvolvimento signatários do acordo.
Na Rodada Uruguai, ocorreu o principal avanço na direção da definição de regras mais precisas para os subsídios, com a aprovação do Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias (SCM, na sigla em inglês). Além de definir subsídios como uma contribuição financeira do Estado que confere um benefício ao receptador, o SCM introduziu o conceito de especificidade que, em termos gerais, refere-se ao acesso explícito e limitado ao subsídio de um conjunto particular de beneficiários. Os subsídios específicos estão sujeitos a restrições no âmbito da OMC, uma vez que apresentam um potencial de distorção do comércio; enquanto os subsídios não-específicos, cujo acesso se baseia em critérios objetivos e condições neutras não estão sujeitos às regras da OMC. Um exemplo de subsídios não-específicos são os suportes financeiros concedidos pelos governos à infra-estrutura.
As regras de disciplina aos subsídios definidas no SCM não se aplicam, entretanto, ao setor agrícola, que foi objeto de um acordo em separado: o Acordo sobre Agricultura (AOA, na sigla em inglês). Igualmente, os subsídios concedidos ao setor de serviços também foram tratados em separado pelo Acordo Geral sobre Comércio de Serviço (GATS, na sigla em inglês). O GATS definiu instruções para negociação em torno dos subsídios relacionados ao comércio de serviços, mas não fixa regras. Porém, as regras gerais de não-discriminação (Nação mais Favorecida e Tratamento Nacional) se aplicam aos subsídios que afetam o comércio de serviços.
Após 47 anos de existência e oito rodadas de negociação, o GATT foi substituído pela OMC em 1995. Todavia, foram mantidos tanto o Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias (SCM) para os produtos manufaturados como os acordos específicos para os subsídios aos setores agrícolas e de serviços. O SCM se aplica ao conjunto dos membros da OMC, exceto os países menos desenvolvidos (LDC, na sigla em inglês). Todavia, os países em desenvolvimento contaram com um período de transição de até oito anos para se adaptarem às novas regras. Em alguns casos, extensões adicionais foram concedidas.
O SCM classificou os subsídios em três categorias: proibidos; acionável e não-acionável. São proibidos subsídios contingentes ao desempenho da exportação e à substituição de importação e conteúdo local. A categoria Subsídio Acionável refere-se aos subsídios que são permitidos, mas podem ser contestados por parceiros comerciais que se sintam prejudicados. A categoria de Subsídios Não-Acionáveis refere-se aos subsídios permitidos, que não podem ser compensados ou sujeitos a refutação multilateral. Nessa categoria estão os subsídios às atividades de P&D, às regiões menos desenvolvidas e proteção ambiental. Em 2000, essa categoria foi abolida, desde então todos os subsídios que não são expressamente proibidos tornaram-se passíveis de contestação.
A contestação de subsídios acionáveis pode ser efetuada via procedimentos de disputa na OMC ou pela adoção de medidas compensatórias, embora com distintos ônus da prova e diferentes medidas corretivas. Para obter uma medida corretiva multilateral é preciso provar que o subsídio ameaça ou prejudica seriamente a indústria doméstica de um outro país-membro. De acordo com o SMC, o efeito adverso do subsídio pode ser estabelecido claramente em quatro situações:
- Deslocamento ou impedimento de importações de um outro país-membro em um mercado subsidiado;
- Deslocamento ou impedimento de exportações de um outro país-membro em um mercado de um terceiro país;
- Significativa supressão ou queda de preço, significativa barateamento de preço, ou significativa diminuição das vendas;
- Aumento da participação do país-membro “subsidiador” no mercado mundial de um produto primário ou commodity.
Em seu artigo 27, o SCM contém provisões específicas das condições de tratamento especial e diferenciado que permitem aos países em desenvolvimento utilizar subsídios como instrumento de promoção do desenvolvimento. Todavia, embora a motivação dessas provisões tenha sido a de permitir aos países em desenvolvimento uma maior flexibilidade no uso de subsídios como instrumento de desenvolvimento, há um intenso debate no âmbito da OMC sobre o grau de adequação dessas provisões. De um lado, estão os que consideram que as provisões são muito lenientes ao permitir o uso de subsídios com efeito adverso sobre o comércio internacional. De outro lado, estão os que consideram que tais provisões são muito severas e restringem a possibilidade dos países em desenvolvimento em atingir seus objetivos de desenvolvimento.
O relatório da OMC destaca que a flexibilidade conferida aos países em desenvolvimento na utilização dos subsídios é considerável, mas não ilimitada. Isto foi demonstrado quando as exceções previstas no artigo 27 do SCM foram por duas vezes objeto de procedimentos de disputa na OMC em painéis do Mecanismo de Solução de Controvérsias: o caso da indústria automobilística da Indonésia e o contencioso Brasil-Canadá em torno das exportações da Embraer. Os árbitros do painel Indonésia Autos consideraram que os países em desenvolvimento possuíam imunidade incondicional à contestação de subsídios à substituição de importação durante um período específico de transição.
Porém, essa imunidade não se aplicava aos subsídios à exportação, os quais estavam sujeitos a condições adicionais, como o congelamento do nível de subsídio durante o período de transição. Assim, os árbitros do painel Brasil-Aeronaves consideraram que, se tais condições adicionais não tivessem sido observadas, os subsídios concedidos pelo governo brasileiro à Embraer deveriam ser proibidos. O ônus da prova coube ao país reclamante, o Canadá, o qual provou que o Brasil não cumpriu com a obrigação de reduzir o nível dos subsídios à exportação de aeronaves civis e de eliminá-los após o período de transição de oito anos. Por essa razão, o Brasil foi obrigado a modificar a legislação do programa de estímulo às exportações. No entanto, o Canadá não foi bem-sucedido em provar que o programa de subsídios do Brasil, em sua versão modificada, era inconsistente com as necessidades do país e que, portanto, o Brasil deveria ter eliminado os subsídios em um período inferior a oito anos. As decisões do júri foram posteriormente confirmadas no Órgão de Apelação do Mecanismo de Solução de Controvérsias.
Frente à demanda de alguns países em desenvolvimento por maior flexibilidade no uso de subsídios, em particular, subsídios à exportação, a quarta conferência ministerial da OMC, realizada em Doha em 2001, decidiu ampliar o período de transição para a eliminação de alguns subsídios específicos à exportação, em particular os incentivos fiscais concedidos às zonas de processamento de exportações (ZPEs). Em dezembro de 2001, foram aprovadas extensões para vinte e dois países em desenvolvimento.
