Carta IEDI
Expansão global sob riscos menores
Para o FMI, a economia mundial continua “curando suas feridas”, após mais de três anos de pandemia, que provocou, segundo a instituição, o maior choque adverso dos últimos 75 anos. Isso vem se dando, em um contexto de crescente divergência do ritmo de crescimento entre as diferentes regiões do mundo.
Após a rápida retomada em 2021, o dinamismo econômico recente segue moderado em função de dois conjuntos de fatores: por um lado, as consequências de longo prazo da pandemia, a guerra da Ucrânia, a crescente tensão geopolítica e eventos climáticos extremos; e, por outro lado, fatores cíclicos como o aperto na política monetária, para conter a inflação, e a retirada de estímulos fiscais diante do elevado endividamento público.
No cenário básico do FMI recentemente divulgado, a economia mundial desacelerará de +3,5% em 2022 para +3% em 2023 e, então, para +2,9% em 2024. A projeção de 2023 manteve-se inalterada frente ao cenário divulgado em jul/23 e a de 2024 foi reduzida em apenas -0,1 ponto percentual.
Outros organismos internacionais também esperam um dinamismo mais modesto nos próximos anos. A OCDE, em seu último cenário, divulgado em set/23, também projetava expansão de +3,0% para o PIB global de 2023, mas espera uma desaceleração mais intensa do que o Fundo em 2024, para +2,7%.
Já a UNCTAD, que também divulgou atualização de seu cenário em out/23, tal como o FMI, possui expectativas mais pessimistas em relação tanto a 2023 como a 2024. A instituição estima um crescimento do PIB mundial de +2,4% em 2023 e de +2,5% em 2024.
Se o atual cenário do FMI se confirmar, o crescimento da economia internacional em 2023-2024 ficará aquém da média histórica dos últimos 20 anos (2000-2019), que foi de +3,8%. Além disso, as projeções recentes seguem abaixo daquelas anteriores à pandemia em vários países e regiões.
Os Estados Unidos tiveram a recuperação mais forte entre a economias avançadas, sendo o único país no qual o resultado projetado para 2023 supera o estimado pré-pandemia. Na China, a desaceleração de 2022, decorrente da política do Covid-19 zero e da crise do setor imobiliário, resultou numa perda de 4,2% na mesma base de comparação. Economias de Mercado Emergente e em Desenvolvimento (EMEDs) exceto China registraram recuperações ainda mais fracas, especialmente as de baixa renda, cuja perda média de produto real superou 6,5%.
Em 2023, as economias avançadas (EAs) lideram a desaceleração do crescimento global, com a atividade mais forte no setor de serviços sendo compensada, sobretudo, pelo baixo dinamismo do setor manufatureiro, tal como já foi apontado pela UNIDO.
O crescimento nas EAs deve arrefecer de +2,6% em 2022 para +1,5% no presenta ano, segundo o FMI. Em 2024 deve ficar em +1,4%. Cerca de 90% deste grupo de países devem crescer menos em 2023 do que no ano anterior, notadamente o Reino Unido e a área do euro. No caso dos EUA, o Fundo espera que se mantenha o mesmo de 2022 (+2,1%). O Japão será a única economia avançada que deve se sair melhor na visão do FMI (+1% em 2022 e +2% em 2023).
Para os emergentes e em desenvolvimento (EMEDs), o FMI prevê virtual estabilidade do ritmo de crescimento do PIB, passando de +4,1% em 2022 para +4% em 2023 e 2024. Duas regiões, poderem, ganharão robustez, segundo o Fundo: Ásia Emergente e em Desenvolvimento (de +4,5% em 2022 para 5,2% em 2023) e Europa Emergente e em Desenvolvimento (de +0,8% para +2,4%, respectivamente).
Já a América Latina e Caribe perderá dinamismo, embora menos do que o FMI esperava no seu cenário anterior. O PIB da região, que cresceu +4,1% em 2022, deve registrar alta de +2,3% em 2023, isto é, 0,4 ponto percentual a mais do que na projeção de jul/23. Muito disso está influenciado pelo Brasil, que é a maior economia da região.
No caso brasileiro, o crescimento do PIB deve atingir +3,1% em 2023 contra +2,1% no cenário precedente, puxado, no lado da oferta, pelo desempenho da agricultura e dos serviços no primeiro semestre do ano e, no lado da demanda, pelo consumo das famílias, em função da melhora no mercado de trabalho e na inflação.
A desaceleração no Oriente Médio e Ásia Central, segundo o FMI, será a mais intensa entre as regiões emergentes e em desenvolvimento, de +5,6% em 2022 para +2%. Já na África Subsaariana a perda de ritmo será de +4% em 2022 para +3,3%.
A atualização do cenário para 2023-2024 do FMI tem como base algumas hipóteses a respeito das políticas macroeconômicas dos países, dos preços e da evolução do comércio internacional, explicitadas a seguir:
• Perda de ritmo do volume do comércio global pelo segundo ano consecutivo, mas de forma muito mais intensa que no ano passado, de 5,1% em 2022 para 0,9% em 2023;
• Queda de 36% nas cotações das commodities energéticas e de 6,3% das commodities não-energéticas;
• Desaceleração da inflação global de 8,7% em 2022 para 6,9% em 2023 e 5,8% em 2024.
• Manutenção da orientação restritiva da política monetária nas economias avançadas em 2023, com cortes nas taxas de juros básicas somente em 2024;
• Política fiscal menos restritiva nos países desenvolvidos em 2023 e orientação em média neutra nos emergentes;
Cabe mencionar que o viés negativo do balanço de riscos do cenário básico do Fundo diminuiu na comparação com o cenário anterior, embora preocupações quanto à evolução da inflação global e o risco de recessão sigam elevadas.
O risco de um “hard landing” (queda do PIB global para menos de +2%) em 2023 é agora de somente 5% contra 25% no balanço de riscos anterior (cenário de abr/23). Para 2024 este risco é de 15% contra 25% na mesma base de comparação.
Os principais fatores considerados pelo Fundo para a possibilidade de um “hard landing” foram: do lado positivo, uma maior desaceleração da inflação e a recuperação mais rápida da demanda doméstica; do lado negativo, menor crescimento da economia chinesa; maior volatilidade dos preços das commodities; persistência das pressões inflacionárias; políticas monetárias mais restritivas; crises de dívida externa nas EMEDs; aumento da tensão geopolítica e de protestos sociais.
O FMI recomenda, ainda, políticas para garantir um crescimento econômico sustentável com baixa inflação, e ações para a mitigação dos efeitos adversos da mudança climática e para a proteção da população mais vulnerável.
Para o Fundo, as políticas com impactos no curto prazo devem garantir a estabilidade de preços e a normalização da política fiscal; fortalecer a supervisão financeira; proteger os mais vulneráveis, prevenir crises de dívida externa nas EMEDs; melhorar a segurança alimentar; e aumentar a oferta de trabalho.
Entre as proposições com impacto no médio prazo encontram-se: reformas macroestruturais voltadas para o crescimento da produtividade; aceleração da transição verde e mitigação dos efeitos da mudança climática; estabelecimento de um “corredor verde” para os minerais essenciais e aumento do compartilhamento de dados sobre tais minerais; e fortalecimento da cooperação multilateral e atenuação dos efeitos da fragmentação geopolítica.
Introdução
Esta Carta IEDI apresenta o cenário atual do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o desempenho da economia global em 2023 e 2024, divulgado no World Economic Outlook (WEO) de out/23. A primeira seção apresenta os principais dados deste cenário, bem como a de outras instituições multilaterais, a título de comparação. Na seção seguinte, o cenário do FMI é detalhado por grupos de países. A terceira seção sumariza o balanço de riscos e a quarta seção resume as recomendações de política do FMI.
Cenário para a economia global
Para o FMI, a economia mundial continua “curando as feridas”, após mais de três anos da pandemia do Covid-19, considerado pelo Fundo como o maior choque enfrentado nos últimos 75 anos. O contexto internacional segue apresentando crescente divergência de ritmo de expansão econômica entre as regiões.
Após a rápida retomada em 2021, a recuperação econômica permanece moderada em função de dois conjuntos de fatores, segundo o Fundo: por um lado, as consequências de longo prazo da pandemia, a guerra da Ucrânia, a crescente tensão geopolítica e eventos climáticos extremos; por outro lado, fatores cíclicos como o aperto na política monetária para conter a inflação e a retirada de estímulos fiscais.
No cenário básico do FMI de out/23, a economia mundial desacelerará de 3,5% em 2022 para 3% em 2023 e, então, para 2,9% em 2024. Na comparação com as projeções de jul/23, houve uma pequena redução, de apenas 0,1 ponto percentual (p.p.) no crescimento previsto para 2024. Não houve alteração para o desempenho de 2023.
Tomando as expectativas mais recentes, isto é, veiculadas a partir de set/23, cabe uma comparação com outros organismos multilaterais de destaque. Para 2023, a OCDE, em seu cenário divulgado em set/23, espera a mesma alta que o FMI (+3,0%), mas projeta uma desaceleração ainda intensa em 2024, para 2,7%.
Já a UNCTAD, que também divulgou atualização de seu cenário em out/23, tal como o FMI, possui expectativas mais pessimistas em relação tanto a 2023 como a 2024. A instituição projeta um crescimento do PIB global de 2,4% em 2023 e de 2,5% em 2024.
Se ao cenário básico do FMI se confirmar, a economia mundial crescerá no biênio 2023-24 abaixo da média histórica dos últimos vinte anos (2000-2019), que foi de 3,8%. Além disso, as projeções de crescimento seguem inferiores às previstas antes da pandemia em vários países e regiões.
Os Estados Unidos tiveram a recuperação mais forte entre a economias avançadas (EAs), sendo o único país no qual o crescimento projetado para 2023 supera o estimado pré-pandemia. Na área do Euro, que teve uma retomada menos intensa, a projeção encontra-se 2,2% abaixo como reflexo da maior exposição à guerra na Ucrânia e seus efeitos adversos sobre os termos de troca associados à alta dos preços da energia importada.
Na China, a desaceleração em 2022, decorrente da política do Covid-19 zero (ver carta IEDI n. 1169) e da crise do setor imobiliário, resultou numa perda de 4,2% na comparação com as projeções do pré-pandemia.
Outras Economias de Mercado Emergente e em Desenvolvimento (EMEDs) registraram recuperações ainda mais fracas, especialmente as de baixa renda (EDBRs), cuja perda média de produto real superou 6,5%. Taxas de juros mais altas e depreciações cambiais exarcebaram as dificuldades dessas economias, colocando mais da metade delas em situações de sobreendividamento ou crise de dívida de acordo com a análise de sustentabilidade da dívida do FMI.
As projeções de crescimento para vários países e regiões sofreram mudanças, com destaque para a revisão positiva no caso dos Estados Unidos e para as revisões negativas nos casos da área do Euro e China, como detalhado na próxima seção.
Hipóteses subjacentes ao cenário do FMI
O cenário básico do FMI se baseia em um conjunto de hipóteses sobre a condução das políticas macroeconômicas e as evoluções de preços e do comércio internacional, como será apresentado em seguida.
(1) Preços das commodities. As projeções para as cotações das commodities energéticas e para o preço de petróleo em 2003 são de quedas de 36% e 17%, respectivamente, devido à desaceleração da atividade econômica global e à redução prevista dos preços do gás natural e do carvão em 61% e 51%, respectivamente, na comparação com os seus picos.
Já para as commodities não-energéticas, o FMI espera uma deflação de 6,3%. As cotações dos metais básicos devem cair 4,7% como reflexo de expectativas negativas em relação ao setor imobiliário na China.
Para os preços dos alimentos, projeta-se um recuo de 6,8% após a alta de 14,8% em 2022, com as cotações ainda permanecendo bem acima dos patamares de 2021. Na comparação com o cenário de julho de 2023, a revisão para cima do preço do trigo em função da suspensão da Iniciativa do Mar Negro (ver Carta IEDI n. 1200) foi praticamente anulada pela revisão para baixo das projeções dos preços de outros alimentos.
(2) Comércio internacional. O volume de produtos comercializado mundialmente também perderá ritmo pelo segundo ano consecutivo, de acordo com o FMI, mas de forma muito mais intensa do que vinha ocorrendo, passando de 5,1% em 2022 para 0,9% em 2023. Este ritmo é muito inferior à média anual de 4,9% registrada nas duas décadas anteriores à pandemia (2000-2019).
Essa projeção reflete não somente a trajetória da demanda global, mas também a mudança na composição da demanda a favor dos serviços domésticos, os efeitos defasados da apreciação do dólar e o aumento das barreiras comerciais. Em 2022, os países impuseram mais de 3.000 restrições ao comércio exterior, enquanto em 2019 esse número não chegou a 1.000.
(3) Política monetária. As projeções para as taxas de juros nas economias avançadas (EAs) foram revistas para cima na comparação com o cenário de abr/23 (Carta IEDI n. 1200) como reflexo da orientação contracionista da política monetária sinalizada pelos bancos centrais.
O FMI espera que as taxas de juros básicas nos Estados Unidos, Reino Unido e Área do Euro atinjam os patamares máximos de, respectivamente, 5,4%, 6% e 3,9% em 2023 e que iniciem os respectivos cortes só em 2024. Com isso, as projeções para as taxas de juros de longo prazo também foram revisadas para cima.
(4) Política fiscal. O FMI projeta uma política fiscal menos restritiva nas economias avançadas em 2023 após o aumento do resultado primário em 2022, enquanto no caso dos países emergentes e em desenvolvimento, a orientação deve ser, em média, neutra. Espera-se a consolidação fiscal em ambos grupos em 2024. O FMI espera ajustes fiscais mais contracionistas em economias que registraram alta mais expressiva da dívida pública no período recente.
(5) Inflação global. A projeção atual do FMI é de uma desaceleração da inflação ao consumidor (média anual) de 8,7% em 2022 para 6,9% em 2023 e, então, para 5,8% em 2024. Embora a política monetária contracionista tenha um papel nessa trajetória, seu principal determinante é a queda dos preços internacionais das commodities.
O FMI espera que a inflação caia em quase 3/4 das economias, mas o ritmo de desinflação é maior nas economias avançadas (EAs). Nesse grupo de países, a projeção é de uma queda de 2,7 pontos percentuais (p.p.) da inflação, quase o dobro da projetada para os emergentes e em desenvolvimento (-1,3 p.p.).
Essa diferença decorre dos arcabouços de política monetária mais sólidos, mas também da menor exposição das EAs a choques de preços de commodities e cambiais.
Desempenho por grupo de países
No cenário básico do FMI, as economias avançadas (EAs) lideram a desaceleração do crescimento global em 2023, com a atividade mais forte no setor de serviços sendo compensada, sobretudo, pelo baixo dinamismo do setor manufatureiro.
O crescimento deste grupo de países deve recuar de 2,6% em 2022 para 1,5% em 2023, desacelerando ligeiramente para 1,4% em 2024. Cerca de 90% das EAs devem crescer menos em 2023 do que no ano anterior.
O crescimento projetado para a economia dos EUA é de 2,1% em 2023 (mesmo patamar do que em 2022) e 1,5% em 2024, percentuais 0,3 p.p. e 0,5 p.p. superiores aos previstos no cenário de jul/23 do FMI. Essa revisão positiva decorreu do investimento mais forte no segundo trimestre e do crescimento resiliente do consumo associado ao mercado de trabalho ainda aquecido. Além disso, o FMI espera uma orientação expansionista da política fiscal em 2023.
Para a Área do Euro, o Fundo prevê uma forte perda de ritmo, de 3,3% em 2022 para 0,7% em 2023, seguida de uma modesta aceleração para 1,2% em 2024 (percentuais 0,2 p.p. e 0,3 p.p. inferiores às projeções de jul/23, respectivamente). Há, porém, uma significativa divergência das projeções para as principais economias da região.
A Alemanha deve registrar uma recessão mais forte do que a esperada pelo FMI em jul/23 (-0,5% contra -0,3%), devido à maior desaceleração dos setores sensíveis à alta da taxa de juros e da demanda externa.
Já para a França, a revisão do cenário foi positiva (de 0,8% para 1%) devido ao desempenho melhor do que o esperado da produção industrial e da demanda externa no 1º semestre. O crescimento projetado para a Itália e para a Espanha não sofreram alteração (0,7% e 2,5%, respectivamente)
Nas demais EAs, também há assimetrias no crescimento projetado. A economia britânica registrará a maior desaceleração entre as principais economias desse grupo, de 4,1% em 2022 para 0,5% em 2023, como reflexo da política monetária restritiva e do impacto dos preços elevados da energia importada.
Em contrapartida, o crescimento da economia do Japão deve acelerar de 1% em 2022 para 2% em 2023 (0,6 p.p. acima do projetado em jul/23), puxado pelo aumento do consumo e do turismo doméstico num contexto de política monetária acomodatícia, bem como pela recuperação das exportações do setor automobilístico, com a normalização das cadeias globais de valor.
Para os emergentes e em desenvolvimento (EMEDs), o FMI prevê uma virtual estabilidade do ritmo de crescimento econômico, passando de 4,1% em 2022 para 4% em 2023 e 2024. Nesse grupo, há também significativas divergência regionais, com o crescimento em duas regiões acelerando em 2023 e perdendo ritmo em 2024.
A primeira região que segue esse padrão é a Ásia Emergente e em Desenvolvimento, que permanecerá líder em termos de dinamismo no grupo de EMEDs. O crescimento de seu PIB deve acelerar de 4,5% em 2022 para 5,2% em 2023 e, então, perder um pouco de dinamismo em 2024, para 4,8%.
Esses resultados estimados são, respectivamente, 0,1 p.p. e 0,2 p.p. inferiores aos projetados em jul/23, devido ao desempenho pior do que esperado da economia chinesa, em função da crise em seu setor imobiliário com efeitos negativos sobre o investimento doméstico. Já o crescimento da economia indiana deve se manter forte, no patamar de 6,3 no biênio 2023-2024, como reflexo do consumo mais aquecido do que esperado no 2° trimestre.
A segunda região a ser destacada é a Europa Emergente e em Desenvolvimento, cujo crescimento do PIB deve aumentar de 0,8% em 2022 para 2,4% em 2023 (contra 1,8% no cenário de jul/23). Em 2024, o ritmo deve refluir para 2,2%.
Nesta região, a mudança favorável frente ao cenário de jul/23 reflete revisões positivas para três de seus países. Em primeiro lugar, o desempenho projetado para a economia russa (que contraiu 2,1% em 2022) passou de 1,5% no cenário de jul/23 para de 2,2% no cenário de out/23, como reflexo da combinação de um expressivo estímulo fiscal com dinamismo no investimento e no consumo.
Em segundo lugar, a Ucrânia teve seu crescimento previsto revisado para 2%, isto é, 5 p.p. acima da projeção de jul/23. Isto está associado, segundo o Fundo, ao investimento e ao consumo mais aquecidos do que o esperado num contexto de queda da inflação e estabilidade no mercado de câmbio.
Em terceiro lugar na melhoria de desempenho da Europa Emergente e em Desenvolvimento, está cenário mais favorável para a Turquia, que deve crescer 4% em 2023 (1 p.p. acima do projetado em jul/23), em função da expansão mais forte da demanda doméstica.
Em contrapartida, o FMI espera que o dinamismo nas demais regiões emergentes e em desenvolvimento perderá intensidade.
Na América Latina e o Caribe, o ritmo de expansão do PIB deve sofrer forte recuo, de 4,1% em 2022 para 2,3% em 2023 e 2024, como reflexo do predomínio de políticas monetária e fiscal restritivas na região, do ambiente externo menos favorável e dos menores preços das commodities. Apesar disso, houve uma revisão positiva frente ao cenário de jul/23, de +0,4 p.p., que está associada ao crescimento maior do que esperado nas duas principais economias da região.
No caso do Brasil, a alta do PIB deve atingir 3,1% (contra 2,1% no cenário precedente), segundo o FMI, puxado pelo desempenho da agricultura e dos serviços no 1º semestre e, do lado da demanda, pelo consumo aquecido. O México, por sua vez, deve crescer 3,2% (contra 2,6% na projeção de jul/23), devido ao maior dinamismo dos setores de construção civil e dos serviços, bem como da demanda externa dos EUA.
A desaceleração no Oriente Médio e Ásia Central, de acordo com o FMI, será a mais intensa entre as regiões emergentes e em desenvolvimento. O crescimento do PIB da região, que foi de 5,6% em 2022, cairá para 2% em 2023, isto é, 0,5 p.p. abaixo da projeção do cenário de jul/23. A revisão negativa para 2023 nesta região decorreu do crescimento mais modesto do que o esperado em dois países: Arábia Saudita e Sudão.
A Arábia Saudita deve crescer somente 0,8% em 2023 (contra 1,9% no cenário de jul/23), devido a cortes na produção de petróleo tanto unilaterais como acordados no âmbito da OPEP. Redução ainda maior na projeção coube ao Sudão, da ordem de 20 p.p., como reflexo da eclosão de um conflito armado em abr/23, da deterioração da segurança doméstica e da piora na situação humanitária.
Já a África Subsaariana registrará a menor desaceleração entre as regiões emergentes e em desenvolvimento, segundo o Fundo. O crescimento do PIB da região passará de 4% em 2022 para 3,3% em 2023 (contra 3,5% no cenário de jul/23). Para 2024, projeta-se um ganho de ritmo: para 4%.
O menor crescimento em 2023 nesta parte da África reflete o impacto de choques climáticos, a perda de rimo da economia global e problemas na oferta, sobretudo de energia. As duas principais economias da região devem crescer menos do que em 2022: a Nigéria deve desacelerar de 3,2% para 2,9% e a África do Sul de 1,9% para 0,9%.
Balanço de riscos
O viés negativo do balanço de riscos do cenário básico do FMI diminuiu na comparação com o cenário de abr/23 (o cenário de jul/23 não traz o balanço de risco), embora preocupações quanto à evolução da inflação global e o risco de recessão sigam elevadas.
A atividade econômica mostrou-se mais resiliente do que o esperado e a inflação se encontra em trajetória descendente, surpreendendo positivamente em vários países. Além disso, o risco de instabilidade financeira também diminuiu graças à ação rápida e eficaz as autoridades nos Estados Unidos e na Suíça para conter a turbulência bancária no primeiro semestre (Carta IEDI n. 1200).
Neste contexto, o risco de um “hard landing”, isto é, de queda do crescimento do PIB global abaixo de 2%, em 2023 é agora de somente 5% contra 25% no cenário de abr/23. Para 2024 este risco refluiu de 15% contra 25% no balanço anterior de riscos.
Os principais fatores de risco apontados pelo FMI, tanto positivos como negativos, são sintetizados a seguir.
Do lado positivo, podem contribuir para que o crescimento seja maior do que o esperado no cenário básico de out/23.
• Maior desaceleração da inflação, associada a um pass-through mais expressivo dos preços menores da energia importada ou uma compressão das margens de lucro para absorver o aumento dos custos.
• Recuperação mais rápida da demanda doméstica, já que a poupança acumulada durante a pandemia ainda continua elevada.
• Adicionalmente, o mercado de trabalho nos Estados Unidos pode se revelar mais aquecido e a política macroeconômica expansionista na China pode impulsionar a recuperação, com desdobramentos para a economia global.
Do lado negativo, o número de fatores de risco é maior e inclui os aspectos discutidos a seguir.
A economia chinesa pode crescer menos do que o esperado, com transbordamentos significativos nos parceiros comerciais, o que dependerá da resposta de política do governo. Para evitar uma maior desaceleração, avalia o FMI, essa resposta deve manter a estabilidade financeira, priorizando a reestruturação do setor imobiliário e das finanças dos estados com situação fiscal mais frágil devido a investimentos neste setor.
A política fiscal chinesa também pode reorientar os gastos para setores com multiplicadores fiscais mais elevados. No âmbito da política monetária, o banco central chinês ainda tem espaço para reduzir a taxa de juros diante da inexistência de pressões inflacionárias.
Outro risco adverso refere-se aos preços das commodities, que podem se tornar mais voláteis devido a fatores climáticos e geopolíticos, com consequências particularmente negativas sobre as economias em desenvolvimento de baixa renda, em função do maior peso dos alimentos e da energia na cesta de consumo da população.
Além do El Niño, a frequência e intensidade dos choques de natureza climática aumentaram este ano, tornando maior o risco de quebras de safra, com impactos negativos sobre o preço dos alimentos e a segurança alimentar.
No âmbito geopolítico, a guerra na Ucrânia e outros conflitos políticos podem se intensificar, desencadeando interrupções na oferta de commodities e pressionando os preços dos cereais, fertilizantes e energia.
Neste contexto, o aumento das barreiras às exportações de produtos agrícolas para conter os preços domésticos pode reforçar a alta das cotações. Além disso, crises energéticas podem se acentuar se a redução do investimento em energias fósseis não for contrabalançada pelo aumento da oferta de energia limpa.
Um terceiro fator de risco é a persistência das pressões inflacionárias derivadas de mercados de trabalho aquecidos e da demanda por aumentos salariais para compensar a alta do custo de vida. Isso pode vir a resultar em políticas monetárias mais restritivas, argumenta o FMI.
Nos países onde as margens de lucro aumentaram no passado recente, pode haver espaço para acomodar essas pressões trabalhistas sem desencadear alta dos preços. Além disso, o Fundo alerta para o fato de que a canalização das poupanças acumuladas para consumo pode reduzir a eficácia da política monetária.
Políticas monetárias mais restritivas, em resposta à alta inesperada da inflação, podem desencadear uma reprecificação nos mercados financeiros, com aumento das taxas de juros esperadas e queda nos preços dos ativos.
Assim, as condições financeiras globais podem se tornar mais apertadas, com consequências negativas sobre os balanços de instituições financeiras bancárias e não-bancárias. É um quarto risco adverso elencado pelo Fundo. Além disso, um movimento de fuga para qualidade com apreciação do dólar teria implicações negativas para o comércio e o crescimento global e para a inflação nas economias emergentes e em desenvolvimento.
O FMI também menciona que o custo de captação externa para as EMEDs continua elevado, reduzindo o espaço fiscal para gastos essenciais e aumentando o risco de crises de dívida. A porcentagem dessas economias com spreads sobre seus títulos soberanos em níveis de estresse (acima de 1000 pontos base) atingiu 24% em ago/23 contra 9,3% em 2021.
Com isso, 56% das economias de baixa renda e 25% das economias emergentes estão com alto risco de uma crise de dívida ou já estão nesta situação, mesmos percentuais que em 2022. Este é um fator que pode comprometer o desempenho da economia mundial, enfatiza o Fundo.
Por fim, o FMI também chama atenção para o risco de ocorrer um aumento da fragmentação geopolítica no mundo. A separação da economia global em dois blocos associada à guerra da Ucrânia e outras tensões ou conflitos pode se intensificar, com desdobramentos adversos sobre o comércio internacional, os movimentos transfronteiras de capitais, de tecnologia e de trabalhadores e dos pagamentos internacionais.
Adicionalmente, essa fragmentação dificultará ainda mais a cooperação multilateral na oferta de bens públicos globais, como a luta contra a mudança climática e futuras pandemias, e o provimento de energia e segurança alimentar.
Novas eventuais elevações de preços dos alimentos e da energia podem desencadear protestos sociais, com impacto negativo sobre a atividade econômica e sobre reformas necessárias para viabilizar a transição verde.
Recomendações de política
O FMI recomenda iniciativas políticas com impactos no curto e no médio prazo para garantir um crescimento sustentável com baixa inflação, a mitigação dos efeitos negativos da mudança climática e a proteção dos mais vulneráveis. Os quadros a seguir sintetizam estas proposições do Fundo.