Carta IEDI
O comércio mundial e os subsídios chineses
Esta Carta IEDI busca discutir os efeitos dos subsídios chineses sobre os fluxos internacionais de comércio no período entre 2009 e 2022, a partir da análise feita por pesquisadores do FMI no recente estudo “Trade Implications of China’s Subsidies”, de autoria de Lorenzo Rotunno e Michele Ruta.
A análise dos pesquisadores do FMI complementa e atualiza as evidências da série de estudos sobre comércio Brasil-China que o IEDI vem divulgando nas últimas semanas: Carta n. 1292 “O comércio Brasil-China e a perda de complexidade econômica brasileira”, Carta n. 1294 “A complexidade das exportações brasileiras e a concorrência da China” e a Carta “O efeito China no aumento das importações brasileiras”, a ser divulgada proximamente.
A investigação do FMI sobre os impactos dos subsídios sobre o comércio mundial, em nível de produto e de setor, vem em momento oportuno, dada a crescente utilização de diferentes instrumentos de política industrial por um vasto conjunto de países, como China, Estados Unidos e países europeus, em meio a uma nítida disputa tecnológica em áreas estratégicas.
Segundo estudo anterior do FMI, como discutido na Carta IEDI n. 1254, apenas em 2023, os governos ao redor do mundo adotaram cerca de 2.500 novas medidas de política industrial, sendo 71% delas com potencial de afetar o comércio internacional.
Dentre elas, os subsídios se destacam como instrumento em diversas políticas, a exemplo do Inflation Reduction Act e do Chips and Science Act nos Estados Unidos, o Green Deal europeu e o Digital Europe Program, bem como o Made in China 2025. As informações sobre subsídios e outros instrumentos de política industrial adotados pelos países foram obtidas da base de dados Global Trade Alert (GTA).
O estudo em tela chega a resultados importantes que suscitam o debate nacional e internacional sobre os efeitos da estratégia chinesa nos fluxos de comércio internacional, sintetizados a seguir.
• Os pesquisadores do FMI encontraram evidências empíricas de que os subsídios adotados pela China ampliaram, no agregado, suas exportações e reduziram suas importações.
• Como efeito direto, as exportações chinesas de produtos subsidiados foram 0,9% maiores do que as exportações de produtos não subsidiados, após a adoção dos subsídios.
• Embora pequenos à primeira vista, estes efeitos percentuais são de importância econômica. Do lado das exportações, o aumento percentual estimado nas exportações de produtos subsidiados em relação aos não subsidiados é equivalente a um sexto do aumento percentual médio anual das exportações chinesas em nível de produto. Além disso, os efeitos estimados aplicam-se a uma grande parte do comércio da China (77% das exportações do país).
• Este efeito contudo, varia muito entre os setores. Em máquinas elétricas, por exemplo, que é um dos setores considerados estratégicos no programa Made in China, o efeito estimado no estudo do FMI chega a +7%.
• O impacto direto dos subsídios foi mais acentuado para as economias emergentes do G20, do qual o Brasil faz parte. As exportações chinesas de bens subsidiados para estes países foram de 2,1% maior.
• As estimativas de impacto direto às economias avançadas não se mostraram estatisticamente significativas, provavelmente em decorrência de medidas de defesa comercial tomadas por estes países, segundo os autores.
• Os pesquisadores do FMI também estimaram o efeito de subsídios para as exportações dos Estados Unidos e União Europeia. Nestes casos, o impacto encontrado foi de +0,8% e de +2,7%, respectivamente. Ou seja, a China não é um caso isolado.
• As importações chinesas, por sua vez, ainda tomando em conta apenas os efeitos diretos dos subsídios, tenderam a diminuir. Os pesquisadores do FMI encontram um efeito de -0,9% na importação de bens subsidiados vis-à-vis aqueles não subsidiados.
• Para as importações chinesas, o resultado negativo da adoção de subsídios se concentrou nas economias avançadas, pertencentes ao G20 (-3%) ou não (-4,8%), indicando um caráter de substituição de importação de bens mais sofisticados na estratégia chinesa.
• O estudo também contemplou os efeitos indiretos dos subsídios chineses, isto é, aqueles derivados dos encadeamentos existentes nas cadeias produtivas, que se mostraram mais expressivos do que os efeitos diretos.
• Os subsídios concedidos a setores a montante (isto é, no início da cadeia produtiva) expandiram as exportações de setores a jusante (ou seja, mais ao final da cadeia e associados a bens finais). Ou seja, o subsídio nos insumos gera competitividade dos produtos ao longo das cadeias.
• Por exemplo, os subsídios ao setor siderúrgico chinês estiveram associados ao aumento de 3,5% das exportações de automóveis da China, segundo as estimativas do estudo do FMI.
• Sobre o fenômeno de excesso de capacidade produtiva chinesa, os pesquisadores do FMI não encontraram evidências estatisticamente significativas nem sobre preços nem sobre quantidades exportadas pela China, ao menos em seu agregado. Há indícios mais robustos no impacto positivo do volume exportado em elos finais das cadeias produtivas decorrente de subsídios em setores upstream.
• Esta conclusão geral, entretanto, tende a esconder importantes diferenças setoriais. Constatou-se que os subsídios chineses contribuíram para reduzir os preços de produtos exportados e aumentar as quantidades exportadas em alguns setores, como produtos metálicos, móveis e equipamentos de comunicação, mas não em outros, como de equipamentos elétricos.
Em resumo, o estudo do FMI constata efeitos diretos dos subsídios chineses mais expressivos para o comércio da China com as economias emergentes do G20, enquanto que os efeitos indiretos são mais pronunciados no caso do comércio com as economias avançadas do G20. Subsídios concedidos à produção de insumos melhoram as exportações de setores posicionados mais ao final das cadeias produtivas.
Ademais, embora não se tenha encontrado evidência significativa de que, no agregado, os subsídios chineses tenham efeito sobre preços e quantidades exportadas, há diferenças setoriais relevantes indicando sobrecapacidade produtiva em alguns casos.
As tendências dos subsídios chineses
Com base em dados da base Global Trade Alert (GTA), o recente estudo do FMI “Trade Implications of China’s Subsidies”, de autoria de Lorenzo Rotunno e Michele Ruta, investiga o impacto da adoção de subsídios chineses sobre o comércio internacional. O período analisado se estende de 2009 a 2022.
Os subsídios são definidos como transferências financeiras dos governos para as empresas de modo a criar alguma vantagem para seus beneficiários. A base de dados registra as datas de anúncio, implementação e remoção de cada política, o país que implementou a medida e o conjunto de produtos alvos da medida (a seis dígitos de desagregação).
Uma limitação desta base de dados, segundo os autores do estudo, é o fato de que não há informações sobre os valores monetários dos subsídios ou de subsídios introduzidos antes de 2009.
O tema proposto no estudo e suas conclusões são de grande interesse diante do atual contexto de crescente adoção de medidas de política industrial – notadamente, subsídios – por diversos países ao redor do globo, incluindo China, Estados Unidos e União Europeia, como discutido na Carta IEDI n. 1254 “Padrões das Atuais Políticas Industriais no Mundo, segundo o FMI”.
A corrida tecnológica entre China e Estados Unidos (ver a Carta IEDI n. 1088, por exemplo), bem como o acirramento de tensões geopolíticas, inclusive no território europeu, marcam um cenário internacional de disputas e reforço da lógica de protecionismo pelos países, visando assegurar a produção doméstica de bens, serviços e tecnologias considerados estratégicos.
A China tem sido um dos países que mais implementam políticas de subsídios ao longo dos últimos anos. Em 2022, somavam-se 5.400 medidas introduzidas desde 2009 e ainda em curso, o que correspondia a 2/3 do total do número de subsídios adotados pelas economias avançadas do G20 naquele ano.
Ademais, para a China, os subsídios representavam cerca de 95% de todas as suas políticas industriais compiladas na base GTA com impactos sobre o comércio, o que indica que os subsídios representam o instrumento mais comum de política industrial adotado pelo país asiático, como ilustra a figura abaixo.
A maior utilização de subsídios pela China tem se concentrado em poucos setores. Conforme aponta o gráfico a seguir, grande parte dos subsídios em 2022 se destinava a produtos das indústrias química, de máquinas e equipamentos, automotiva e de metais.
Em larga medida, esses setores estão contemplados dentre os dez setores prioritários elencados no programa Made in China 2025, lançado em 2015, e que foi tema da Carta IEDI n. 827 “Indústria 4.0 – A iniciativa Made in China 2025” e, mais recentemente, também abordada na Carta n. 1094 “O 14º Plano Quinquenal Chinês: transformando a China em potência industrial e tecnológica”.
É possível notar, ainda, que tanto Estados Unidos como China ampliaram seus subsídios a produtos de tecnologia avançada comparativamente a outros produtos. Conforme definição do US Census Bureau, os produtos de tecnologia avançada estão relacionados a: biotecnologia, ciências da vida, equipamentos óptico-eletrônicos, informação e comunicação, eletrônicos, manufatura flexível, materiais avançados, produtos aeroespaciais, armamentos militares e tecnologia nuclear.
A figura a seguir ilustra a dinâmica competitiva – e, em parte, também retaliatória – dos subsídios adotados pelas duas maiores potências mundiais nesses segmentos de alta tecnologia, particularmente após 2020.
Complementarmente, pode-se observar como se comportou o número de subsídios chineses destinados a produtos dentro de indústrias estratégicas e que têm sido alvo de questionamentos comerciais por parte dos Estados Unidos e da União Europeia. Tais produtos são turbinas eólicas, painéis solares, baterias de lítio e veículos elétricos.
Dentre esses produtos, conforme destacado pelo gráfico abaixo, as baterias e os painéis solares foram os que mais tiveram aumento dos subsídios após 2015, ao passo que a tendência para veículos elétricos e turbinas eólicas foi, em geral, semelhante à dos demais produtos.
Os efeitos dos subsídios chineses sobre as exportações e importações
O estudo do FMI propõe a análise empírica dos efeitos dos subsídios chineses sobre os fluxos comerciais de exportação e importação em duas partes.
•Na primeira parte, investigam-se os efeitos diretos da implementação dos subsídios ao nível de produto.
•Na segunda parte, avaliam-se os efeitos indiretos através dos encadeamentos produtivos ao nível setorial, a fim de estimar os impactos dos subsídios chineses sobre as exportações e importações de indústrias ofertantes e demandantes ao longo da cadeia.
Efeitos diretos dos subsídios chineses sobre o comércio ao nível de produto
O modelo proposto no estudo do FMI estima resultados dos subsídios chineses para as exportações e as importações do país, uma vez implementados. Os autores realizam diversos tipos de controle das variáveis e consideram os fluxos totais de exportação e importação da China, bem como esses fluxos por grupo de parceiros comerciais, como as economias avançadas do G20, as economias emergentes do G20, outras economias avançadas e outras economias emergentes, em uma amostra de 150 países.
A partir da análise realizada, é possível constatar que o fato de receber um subsídio aumenta o valor das exportações ao nível de produto na China, em média, em 0,9%. O mesmo efeito, porém com sinal oposto, é encontrado no caso das importações (queda de 0,9%). Embora pequenos à primeira vista, estes efeitos percentuais são de importância econômica, segundo os autores.
Do lado das exportações, o aumento percentual estimado nas exportações de produtos subsidiados em relação aos não subsidiados é equivalente a 1/6 do aumento percentual médio anual nas exportações chinesas em nível de produto. Do lado das importações, a redução é mais notável, já que em média as importações da China cresceram 3% ao ano entre 2009-2022. Além disso, os efeitos estimados aplicam-se a uma grande parte do comércio da China, já que os subsídios chineses cobrem 77% das exportações do país e 83% de suas importações, segundo o estudo.
O efeito dos subsídios sobre as exportações também é observado para Estados Unidos e União Europeia. Nestes casos, o impacto é de 0,8% e 2,7%, respectivamente (conforme dados do próximo gráfico). Para as importações, contudo, não há efeito estatisticamente significativo no caso americano e nota-se uma relação positiva entre subsídios e importações no caso europeu, diferentemente do que se verifica para a China.
Também é possível observar que o efeito positivo dos subsídios chineses sobre as exportações é puxado, sobretudo, pelas exportações chinesas às economias emergentes do G20, dado as exportações do país de produtos subsidiados a esse grupo de países são 2,1% maiores do que as exportações chinesas de outros produtos para a mesma destinação.
Para os demais parceiros, os coeficientes são menores e não são estatisticamente significativos, podendo indicar, por exemplo, que os produtos chineses subsidiados não ganham parcela de mercado em economias avançadas. Isso pode ser explicado pela adoção de maiores barreiras à entrada nesses países e também por medidas protecionistas retaliatórias.
Pelo lado das importações, as estimativas revelam forte efeito de substituição de importações entre os diferentes parceiros comerciais chineses. O efeito de redução das importações é mais pronunciado para as economias avançadas do que economias emergentes, sendo de 3% no caso de economias avançadas do G20 e 4,8% no caso das demais economias avançadas, quando se comparam produtos subsidiados em relação aos outros produtos. No caso das economias emergentes do G20 o efeito também não é desprezível e chega a 2,3%.
Assim, os resultados sugerem que as importações chinesas declinam e as exportações aumentam apenas no caso de produtos subsidiados pela China, puxados por aquelas destinadas às grandes economias emergentes.
Os efeitos dos subsídios chineses no comércio também podem ser observados a partir de importantes diferenças setoriais. Na indústria de máquinas elétricas e de móveis, os subsídios tendem a ampliar as exportações e reduzir as importações. Já no caso da indústria de metais, os subsídios tendem a promover as vendas de outras indústrias domésticas a jusante, isto é, mais ao final da cadeia produtiva.
Efeitos indiretos dos subsídios chineses sobre as exportações e importações através dos encadeamentos de insumo-produto
Os efeitos medidos anteriormente correspondem a impactos diretos nos fluxos de exportação e importação da introdução de subsídios pela China para um determinado produto. Falta, contudo, captar a influência indireta dos subsídios dados a outros produtos e indústrias decorrente dos encadeamentos existentes na matriz produtiva.
Nesse sentido, o estudo do FMI também propõe uma análise a partir da matriz de insumo-produto chinesa, com insumos intermediários e demanda final para 94 setores primários e manufatureiros.
Os dados sugerem que a distribuição dos subsídios chineses depende da posição da indústria ao longo da cadeia produtiva. A figura abaixo ilustra esse aspecto a partir das dez principais indústrias receptoras de subsídios na China (painel a) e o cruzamento do número de subsídios por setor e o índice de upstreamness (painel b), que mensura a distância do produto de uma indústria até o consumo final, sendo tanto maior quanto maior for essa distância. Pode-se observar que sete dos dez principais setores receptores de subsídios em 2022 apresentam um índice de upstreamness acima da média.
A fim de avaliar como os subsídios afetam os fluxos de comércio ao longo da cadeia produtiva, o estudo do FMI agrega os dados de comércio e de subsídios ao nível setorial. Os pesquisadores do FMI estimam coeficientes para as exportações e para as importações chinesas.
Os resultados indicam maiores efeitos dos subsídios concedidos às indústrias upstream (a montante), ou seja, no início da cadeia de fornecimento. Os efeitos constatados ao nível de produto favoráveis às exportações e de substituição das importações são reforçados pelos efeitos indiretos dos subsídios dados às indústrias localizadas no começo da cadeia produtiva. Esses efeitos indiretos são mais expressivos pelo lado das exportações do que das importações.
Segundo simulações do estudo, considerando a forte conexão entre os setores siderúrgico e automotivo, dado que cerca de 10% dos custos totais do setor automotivo correspondem a compras de aço, estima-se que um aumento do número de subsídios ao aço, conforme observado entre 2015 e 2022, levaria a um incremento de 3,5% nas exportações chinesas totais da indústria automotiva.
Os efeitos sobre as exportações são puxados, sobretudo, pelas exportações destinadas às economias avançadas do G20. Isso ajuda a qualificar os efeitos diretos anteriormente encontrados, uma vez que os subsídios dados a setores ofertantes da cadeia produtiva parecem ampliar as parcelas de mercado chinesas em setores a jusante (isto é, mais ao final da cadeia) nas economias avançadas do G20.
Conforme já mencionado, as medidas retaliatórias por parte dos governos desses países podem bloquear os efeitos diretos dos subsídios dados aos exportadores chineses, porém tendem a ter menor impacto sobre os subsídios chineses concedidos no início da cadeia produtiva e que ajudam as exportações de setores a jusante.
Basicamente, indica que os setores subsidiados no início da cadeia produtiva ampliam sua oferta e reduzem seus preços, permitindo aos setores compradores mais ao final da cadeia de se tornarem mais competitivos em mercados exportadores, o que se reflete também em uma redução das importações de produtos da mesma indústria.
Impactos dos subsídios chineses sobre preços e quantidades exportadas
As discussões propostas pelo estudo do FMI também incluem outro tema importante, de repercussão internacional: o debate sobre o excesso de capacidade produtiva na China em um cenário de baixo crescimento da demanda doméstica.
Há diversas preocupações levantadas por governos de países ocidentais, argumentando que as políticas de subsídios chineses podem criar um descasamento entre a demanda e a oferta doméstica, de modo a ampliar sua oferta nos mercados internacionais de produtos subsidiados, o que se manifestaria em maiores quantidades exportadas e menores preços desses bens.
Para avaliar esse tipo de impacto, o estudo do FMI considera que grandes economias, como China e Estados Unidos, ao implementarem políticas de subsídios, podem influenciar as quantidades e preços de suas exportações. A partir disso, constrói-se um arcabouço analítico para mensurar os efeitos dos subsídios sobre as exportações, controlando por um conjunto de variáveis, como fatores globais e internos ao país.
Assim, busca-se estimar, empiricamente, os efeitos diretos e indiretos dos subsídios chineses sobre os preços e as quantidades exportadas, sendo as quantidades mensuradas conforme o peso líquido em quilogramas (kg) e os preços de exportação ao nível de produto dados pela média ponderada dos valores unitários bilaterais (dólares correntes por kg), em que a ponderação corresponde à participação do importador no total das exportações do produto. Também se utilizam os dados ao nível setorial para mensurar os efeitos indiretos, apontando, contudo, as limitações que esse tipo de agregação acarreta nas estimativas.
Os resultados encontrados pelos pesquisadores do FMI sugerem que os subsídios chineses estão, em média, associados a um menor preço das exportações nos produtos subsidiados relativamente aos demais produtos e em indústrias mais expostas a subsídios concedidos a montante na cadeia produtiva. É importante notar, contudo, que as estimativas dos efeitos são fracas e não são estatisticamente significativas, o que não permite uma conclusão definitiva.
Um padrão semelhante é observado para o efeito direto sobre as quantidades exportadas, também não estatisticamente significativo. Entretanto, os efeitos indiretos de subsídios concedidos a setores a montante na cadeia produtiva estão mais claramente associados a um aumento das quantidades exportadas em indústrias a jusante, com coeficientes estimados estatisticamente significativos.
Pode-se dizer, então, que em média as evidências de que os subsídios chineses contribuíram para reduzir os preços exportados e ampliar as quantidades exportadas ainda são fracas a partir das estimativas calculadas pelos pesquisadores do FMI. Apesar disso, há indícios que apontam para um efeito positivo de subsídios em setores a montante para as exportações de bens mais ao final das cadeias produtivas.
A conclusão geral, entretanto, tende a esconder importantes diferenças setoriais. No gráfico abaixo, apresentam-se os efeitos percentuais estimados dos subsídios chineses sobre preços e quantidades exportadas por setor. As evidências são consistentes com o argumento de que os subsídios chineses podem ter contribuído com ampliação da oferta ou ganhos de eficiência em alguns setores, mas não em outros, e que os subsídios apresentaram efeitos diversos sobre as quantidades e preços de exportação por indústria.
Por exemplo, os resultados indicam que os subsídios chineses diretos favoreceram maior quantidade ofertada e reduziram os preços de exportação em setores, como de equipamentos de comunicação, plásticos, químicos, metais, madeira e móveis. Nesses setores, há evidências mais compatíveis com o argumento de excesso de capacidade produtiva, em que os subsídios podem ajudar a reduzir custos e preços, ampliando as quantidades exportadas.
Porém, isso não é válido para todos os setores. Em alguns, como no caso de equipamentos elétricos, há um efeito direto positivo dos subsídios tanto nos preços como nas quantidades exportadas, o que pode indicar uma melhoria de qualidade nos produtos subsidiados deste setor, através da adoção de tecnologias e processos produtivos mais avançados.
Conclusões
O estudo do FMI traz importantes evidências empíricas sobre os impactos que os subsídios chineses possuem sobre os fluxos de exportação e importação do país no período de 2009 a 2022. Essa preocupação se reforça diante de crescentes medidas de subsídios adotadas não apenas pela China, mas também por Estados Unidos e União Europeia.
Os resultados mostram que os subsídios chineses, assim como de outras grandes economias, apresentam efeitos sobre o comércio internacional. Particularmente, as exportações de produtos e setores subsidiados na China tenderam a aumentar após os subsídios, se comparadas aos demais produtos e setores.
Isso decorre de efeitos diretos e indiretos que os subsídios possuem, no último caso relacionados aos encadeamentos dentro da estrutura produtiva chinesa, sobretudo a partir de setores que são ofertantes de insumos para setores a jusante.
Constata-se que os efeitos diretos dos subsídios são mais expressivos para o comércio da China com as economias emergentes do G20, enquanto que os efeitos indiretos são mais pronunciados no caso do comércio com as economias avançadas do G20. Também se observam importantes diferenças setoriais da adoção dos subsídios, com impactos maiores sobre as exportações, por exemplo, dos setores de máquinas elétricas e móveis.
A análise dos pesquisadores do FMI permitiu, ainda, contribuir para a discussão atual sobre o excesso de capacidade produtiva chinesa e a canalização de parte da produção doméstica para os mercados internacionais.
Embora as evidências no conjunto sejam fracas acerca dos efeitos dos subsídios sobre preços e quantidades exportadas, há resultados setoriais relevantes que qualificam o debate e revelam importante heterogeneidade industrial.
Encontram-se evidências de que os subsídios ampliaram as quantidades exportadas e reduziram os preços de exportação em setores relacionados à construção, como produtos metálicos e móveis, além de equipamentos de comunicação, porém não em outros, como equipamentos elétricos, em que tanto quantidade como preços se elevaram.